Capítulo 3

No dia seguinte eu havia retornado a casa do viúvo e sua filha com minha mochila. No armazém,Laura havia ficado muito feliz em saber que seu cunhado havia me aceitado como sua empregada:

-Neto é um homem teimoso e um tanto rabugento,mas é uma boa pessoa.-ela dissera.

Bom,eu estava acostumada a lidar com coisas piores. Tinha quase certeza que um homem teimoso e rabugento era o menor dos problemas que eu já havia enfrentado.

Cheguei cedo ao rancho naquele dia, Neto já havia saído para o trabalho na madeireira e Ana ainda estava dormindo. Eu achava o cúmulo deixar uma menina daquela idade sozinha em casa. Mas pelo que Laura me dissera, uma vizinha, Jude, sempre passava para leva-la a escola.

O quarto que me fora destinado era pequeno e aconchegante. Tinha uma cama coberta por uma colcha de crochê colorida,uma comoda de madeira com espelho e um guarda roupa. A janela dava para os fundos da casa onde havia uma grande arvore e um pouco mais adiante o cercado de madeira.Larguei ali minha mochila e arregacei as mangas para começar o trabalho.

A bagunça da casa era tanta que conforme eu limpava o lugar ia se transformando. Estava entretida nos afazeres quando vi Ana no topo da escada,tinha uma cara de sono e usava um pijama branco.

- Você veio!- exclamou feliz.

-Achou que eu não viria?

Ela sorriu e assentiu:

- Venha até aqui, vou fazer panquecas pra você.

Eu precisava ir para casa,confirmar se estava tudo bem por lá.  Deixei o trabalho ao meio dia. O sol estava a pino, estacionei a caminhonete em frente a casa e fui andando em direção a varanda. Parecia tudo normal por ali. Perdigueiro tirava uma soneca á um canto, levantou a cabeça e me encarou. 

Logo que abri a porta o aroma exótico de temperos invadiu-me os sentidos. Havia barulho na cozinha, panelas batendo, o frigir de uma frigideira e uma voz doce que cantava uma canção:

A mulher estava parada diante do fogão, os cabelos muito cacheados presos em um coque no alto da cabeça. Usava uma camiseta, um tanto grande para suas formas delicadas e uma calça jeans, os pés descalços mostravam o quão à vontade ela estava. E cantava. Estava alheia a tudo e todos, concentrada em seus afazeres, a voz melodiosa preenchendo cada canto daquela casa que parecia ter ganhado vida com a presença dela:

-Nossa!- ela exclamou assustada ao me ver, então abriu um sorriso contido, meu coração deu salto. Eu não sabia oque estava acontecendo comigo, mas aquela mulher me confundia de alguma forma.

Pigarreei.

-Desculpa moça, eu não queria assustar...

- São Paulo...E estou aqui porque pretendo viajar para o Uruguai, onde minha avó nasceu..- ela deu um suspiro- Sei que parece estranho alguém vir de tão longe para uma cidadezinha como essa, mas eu procuro sossego senhor Valentine, um emprego, e um lugar para ficar até que possa seguir minha viagem. Está cidade parece perfeita para mim, e prometo que o senhor não irá se arrepender por ter me contratado..

Bom, eu não podia negar, a mulher parecia confiável e nós moradores de cidade pequena sempre sabíamos quando uma pessoa era ou não confiável.

- Mais alguma pergunta, senhor?

Olhei para ela:

- Não... Seu pagamento será feito a cada duas semanas moça..não é muito..

-Tenho certeza de que é o suficiente,senhor- Ela abriu um largo sorriso seus dentes muito brancos eram como porcelana. - Sente-se, vou lhe servir um prato de comida..

-Não, estou sem fome...Obrigado..

Na verdade eu estava com fome, mas precisava sair dali, tomar um ar. Despedi-me com um aceno de cabeça e saí sem olhar para trás.

*******

Essa é sua mãe Ana?- perguntei, a menina assentiu, seus olhos azuis cheios de tristeza.- Ela era muito bonita.

Fitei novamente o porta retrato que repousava sobre o criado mudo, a mulher da foto era realmente muito bonita, com seus cabelos dourados e o sorriso iluminado. Parecia muito feliz em seu delicado vestido de noiva. Era tão triste que uma menina tão pequena tivesse que viver sem a presença da mãe.

- Tia Laura disse que ela é um anjo agora..- disse a menina com sua voz infantil.

Sorri, meu coração aquecido por um sentimento de compaixão. Acariciei o cabelo louro dela e respirei fundo.

-Sim querida, ela é um anjo agora e está tomando conta de você.

- De verdade verdadeira?

-Sim..de verdade verdadeira..

Ela sentou-se na cama e se jogou em meus braços em um abraço apertado, não esbocei reação de inicio:

- Ela deve ter mandado você pra me cuidar..

Senti minha garganta arranhar, aquele menina despertava em mim um sentimento tão doce que a unica coisa em que eu pensava era que queria protege-la. Eu queria jamais deixa-la só novamente e fazer o possível para que fosse feliz..Retribui o abraço e foi então que o barulho vindo do corredor me chamou a atenção. Voltei-me para porta e Neto estava parado lá. Uma semana havia se passado desde que eu começara a trabalhar ali e nossa relação resumia-se a "Bom dia" e "Boa noite". Há dois dias ele havia chegado em casa e dissera-me que iria até a cidade vizinha fazer uma entrega de madeira e só retornaria no fim da semana.Bom, ali estava.

Afastei-me de Ana e levantei da cama, ele me cumprimentou com um aceno de cabeça.

-Papai..- disse a menina.

- Boa noite amor. - ele se aproximou da cama e depositou um beijo na testa da menina.- Olha só oque eu trouxe pra minha guriazinha.

Ana agarrou o pacote sorrindo.Resolvi deixa-los a sós, então sai do quarto e as ultimas palavras que ouvi me encheram de alegria:

- Sarah me ajudou com o dever de casa, ela é muito esperta papai, e amanhã vamos plantar flores!

- Você gosta dela?

- Sim!

Sorri satisfeita e me afastei.

★★★★★★

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Comments

Zenaide Sousa

Zenaide Sousa

Eu adoro histórias que tem crianças.🥰🥰

2023-05-07

5

Zenaide Sousa

Zenaide Sousa

Essa criança é um amor ❤️❤️

2023-05-07

0

Rozana Silva

Rozana Silva

que história linda
parabéns autora

2022-11-24

1

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