Capítulo 14

O chão abaixo de seus pés tremia, fazendo suas pernas bambearem. Melissa não sabia onde estava. Tudo estava escuro demais para que ela pudesse ver algo. Sua respiração acelerou e suas mãos tatearam a sua volta à procura de algo, qualquer coisa que pudesse permitir que ela se agarrasse à sua realidade, antes que a escuridão a tomasse, mas não havia nada. Lágrimas começaram a descer, mas a garota não as sentia. Ao tocar seu rosto, não havia nada. Melissa gritou, desesperada, algo parecia observá-la.

Quando Melissa acordou, já passava do meio dia. Ela se via sentada sobre a mesma cama em que Marrish a beijara suavemente. Seus pensamentos voaram como tantas outras vezes para o príncipe, talvez em busca da parcela de culpa que ela sabia ter. Ainda assim, quando saiu da cabine, não havia nenhum marinheiro seminu circulando pelo navio. ” Ótimo, ninguém vai me ver”, ela pensou, saindo com apenas a transparente camisola de linho que dormira agarrada a Marrish. Apreciando a quietude, Melissa acabou por ouvir Marrish, que conversava com uma mulher na casa dos quarenta anos em frente ao timão do navio. Ela era elegante, a pele clara parecia de porcelana, clara como se intocada pela poluição do mundo. Por alguns segundos, Melissa sentiu inveja dela. Marrish sorria segurando ambas suas mãos, e ela parecia igualmente animada quando concordou com algo e pulou em seus braços, abraçando-o. Desviando o olhar por alguns segundos, Melissa mal notou quando os dois olharam na direção dela. Marrish chegou primeiro e agarrou a mão de Melissa, que, corada, sorriu sem graça.

Quando a mulher se aproximou, com a elegância de quem flutua sobre a madeira, Marrish disse rapidamente:

-Melissa, essa é minha mãe, Katrina Morgan.

Katrina olhou-a de cima a baixo, e Melissa logo lembrou que estava praticamente pelada na frente da mulher, o que pareceu muito natural para Marrish. Reagindo à garota, Marrish retirou o casaco de couro preto que usava e envolveu Melissa, que, ainda corada, estendeu a mão na direção de Katrina.

-Ouvi falar muito sobre você, Melissa. - A mulher começou - seu pai era uma companhia espetacular durante todas as viagens que coincidimos de fazer juntos.

-Eu agradeço imensamente sua companhia a ele, madame. - Ela respondeu, com uma pequena reverência.

-Ah querida, por favor, acho que menos formalidade pra essa ocasião é o mais indicado, já somos praticamente velhas amigas, sua mãe fora muito gentil em me receber uma vez, enquanto você ainda estava em sua barriga.

Piscando devagar na direção da mulher, surpresa, Melissa engoliu em seco.

-Minha m-mãe? - perguntou, as palavras mal saindo de sua boca, tamanho nervosismo que se apoderara dela.

-Uma mulher incrível, e você se parece muito com ela – completou, ajeitando uma mecha de cabelo de Melissa, que escorria para frente se seu rosto, desgrenhada.

Quando Marrish sugeriu que as moças passeassem enquanto ele lava e arruma seus aposentos, Melissa não pensou que Katrina se ofereceria para fazer compras, embora a atitude fosse bem vinda (afinal, ela ainda precisava de um vestido para ir ao baile). “Talvez ela ache que não tenho roupas, já que me encontrou naquele estado” pensou, rindo de si mesma. Katrina fora o ser humano mais gentil do mundo desde que começaram a conversar.

Andando em silêncio pelas ruas acinzentadas de Almajid, Melissa enfim quebrou o gelo:

-Achei que haviam apenas fábricas e industrias, onde faremos compras? - questionou, ainda espantada com a beleza congelada no tempo de Katrina.

-Bom, parece que você não viu muito além das redondezas do porto – respondeu, um tom de desapontamento em sua voz – Você ainda mora em Iliona?

-Sim, é a primeira vez que saio da cidade– responde, enquanto Katrina se aproxima de um homem gordo e aluga sua carruagem para o dia todo.

-E sua família? – pergunta, virando-se para Melissa.

-Somos só eu, minha madrasta e seus dois filhos, Louise e Marcos– Diz, imediatamente, olhando para o chão de paralelepípedos molhados, a cara fechada da madrasta invadindo sua mente, lembrando-a do baú na sua cabine.

Melissa odiava a expressão das pessoas quando descobriam que ela era órfã, essa mistura de pena e desprezo não caía bem nela, desviar o olhar se tornou, com o tempo, a melhor das opções.

-Não desvie o olhar – Katrina disse – Não é algo pelo qual você deve se envergonhar. Hoje em dia, seguir em frente não é pra todo mundo. – Finalizou, entrando na carruagem.

--

Quando Katrina tinha 18 anos, o mundo perseguia a magia como se doesse conviver com ela. Então a garota corria entre as árvores, desesperada, descalça sobre galhos e pedras, que a cortavam e arranhavam o tempo inteiro. Apenas algumas horas atrás, ela estava tomando chá com o xerife e outros comandantes da cidade, agora fugia deles como uma bandida. Pessoas que conviveram com ela por anos, agora rejeitavam-na como se uma doença fatal escorresse dela, cega por mais vítimas.

A gravidez completamente mágica havia surgido da noite para o dia. Alguns, poucos fazendeiros noturnos que trabalhavam pela região disseram ver uma luz azul sobre sua casa, exatamente naquela noite, mas ninguém acreditou quando ela disse não saber o que estava acontecendo, então ali ia ela, o tecido fino do pijama fazendo-a sentir cada vez mais frio enquanto andava, mesmo que sem parar, os braços em torno de si, com medo de que eles pudessem machucá-los.

Quando seus pés estavam prestes a vacilar, Katrina se depara com uma pequena cabana, caindo aos pedaços, com um amontoado de lenha recém cortada ao lado da porta de entrada. Ela põe a mão sobre a barriga e continua em direção à porta, onde ela bate incessantemente, até que uma senhora por volta dos 60 anos abre, as vestes simples e o cabelo grisalho amarrado em um coque bem feito, que imediatamente a puxa para dentro pelo braço e a ajuda a deitar no sofá.

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Comments

nimorango

nimorango

eita 🤯 será a bruxa destinos interligados 😵

2022-11-08

1

nimorango

nimorango

aí que cruel 😢, essa mania dos humanos ter medo do que não conhece

2022-11-08

1

nimorango

nimorango

ela não está te olhando assim,veja por si só

2022-11-08

1

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