Capítulo extra

Quando Felicith Lins, filha do marquês de Hazenna, finalmente colocou os pés em Iliona, todos a olhavam de forma estranha, além da raridade em alguém de Hazenna aparecer ali, o ruivo dos Lins dava uma aparência particularmente medonha à Felicith devido ao tom escuro em contraste com sua pele extremamente branca. Além disso, Felicith aparecia sempre de cara fechada e nariz arrebitado. Mas, não foi uma surpresa para John quando, depois de seis meses do enterro de sua esposa Elizabeth, Robert, o rei, lhe convenceu de casar-se novamente em benefício do reino, apresentando-lhe Felicith e todos os benefícios de comércio que ele e o reino possuiriam com a união. A amizade, nunca havia e nunca iria ficar acima do povo, e ambos os homens sabiam disso, assim como Felicith sabia que ela possuía uma posição que devia manter ou elevar, independente do que precisasse fazer.

Ela não esperava, no entanto, que seu marido viesse a falecer alguns anos depois, deixando-a para administrar uma fortuna, e ainda, com uma enteada que a olhava como se ela tivesse matado o velho barão, perambulando pela casa como se precisasse se esconder da madrasta.

O que poucos sabem, é que, ainda que arranjado, o casamento deles deu a Felicith um amigo em quem podia confiar, algo com que John estava simplesmente contente em ser, afinal, seus interesses não eram pessoais, ele ainda amava a falecida mãe de Melissa.

No fim, a verdade é que Felicith não tinha intenção alguma de ser um pé no saco para Melissa, mas a forma com que a garota se manteve afastada após a morte do barão fez com que tudo se acomodasse assim: Felicith sendo a chefe da casa e Melissa, a filha chata de um amigo querido, que ela se via obrigada a criar.

Assim, em uma tarde chuvosa, enquanto Felicith retornava da casa de uma amiga por um atalho pela floresta, ela encontrou uma pequena cabana em meio às árvores, com suas paredes cobertas de vinhas secas; e parou, sentindo como se algo a atraísse até ali. Instintivamente, ela bateu três vezes e a porta de madeira escura abriu-se sozinha, revelando uma sala aconchegante. A lareira estava acesa, biscoitos de chocolate pareciam ainda quentes na mesa de centro, acompanhadas de um copo grande de leite, e o sofá vermelho com remendos coloridos parecia, de repente, o lugar mais confortável do mundo.

Felicith entrou, passando os olhos rapidamente sobre as estantes com diversos tipos de bonecas e artefatos, e foi diretamente ao sofá, onde imediatamente sentou-se, sentindo o tecido macio cuidando das necessidades de seu corpo, acomodando-a em um sono profundo. Por sua vez, quando acordou, estava em um lugar completamente diferente. O sofá era cinza, musgo crescia entre as almofadas, uma gosma escura saia dos remendos; nas paredes, furos e tábuas perdidas com o tempo; nas estantes, as bonecas soavam menos convidativas, com aranhas caminhando entre os buracos dos olhos ou partes do corpo faltando. Ela levantou-se, esfregando as mãos no vestido e olhando ao redor, espantada. Um calafrio percorreu seu corpo e a porta da entrada se fechou, assustando-a. Ao virar-se, Felicith enfim deu de cara com Magnólia, uma senhora de mais ou menos um metro e meio de altura, cujas roupas em trapos cobriam-na dos ombros aos pés.

“O-oi” disse Felicith, engolindo em seco.

Porém, Magnólia não respondeu, apenas a agarrou pela mão e em silêncio, levou-a até uma mesa velha com duas cadeiras dispostas, que ocupava boa parte um pequeno quarto atrelado à sala. Ambas se sentaram, Magnólia, parecendo aliviada, e Felicith, assustada, ansiosa e insegura.

Com um estalo de dedos, no entanto, Magnólia transformou a si e ao cômodo ao seu redor, dando lugar a uma moça em torno de seus 20 e poucos anos, a pele morena e os cabelos, também morenos, longos e sedosos. Ela apoiava a cabeça na mão e observava Felicith, como se esperasse por algo. As paredes, ganharam um tom de amarelo mostarda alegre, assim como a mesa de madeira, antes gasta, se tornara lisa e nova.

"O que f-foi?" Felicith perguntou, quase sussurrando, empurrando sua voz para fora, ainda encantada e assustada com a transformação repentina.

"Aceita um chá?" A figura retrucou, um sorriso gentil no rosto.

Felicith assentiu, então Magnólia levantou-se e saiu rapidamente do cômodo, retornando com duas xícaras cheias de chá preto.

"Já está doce, como você gosta" Magnólia falou, antes de sentar-se e cruzou as pernas. O olhar confuso no rosto de Felicith a fez bebericar e surpreender-se:

"Está perfeito" disse, sorrindo surpresa.

"Qual é o seu desejo?" Magnólia perguntou, apoiando a xícara na mesa e puxando a cadeira para aproximar-se de Felicith.

Respirando fundo, a única palavra que saiu da boca da mulher foi: "Poder". Magnólia sorriu, e estendeu a mão para Felicith, entregando-a um pequeno frasco transparente com conteúdo cintilante e azul, sussurrando em seguida: "Uma gota de sangue e baba em seguida, fazendo seu desejo".

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Ao chegar na mansão, Felicith foi direto para seu quarto, onde furou o dedo com uma agulha e adicionou algumas gotas ao líquido, bebendo-o em seguida. No dia seguinte, a notícia de que haviam encontrado o navio de Moumtez, junto à boa parte de sua mercadoria alegrou Felicith, dando-a um fio de esperança (e uma quantidade boa de dinheiro).

Olhando para o pequeno frasco vazio e os resultados esplendorosos, ela decidiu ir até a cabana novamente, afinal, precisava saber o que era possível fazer com mais, e como ela podia consegui-lo.

Magnólia ficou feliz em não apenas apresentar as artes místicas à Felicith, mas em fornecer mais de suas misteriosas e incríveis poções. No entanto, ela deixou de contar que toda magia e poder têm um preço, o que, logo, Felicith descobriria.

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