Fiquei ali parada olhando para ele, aqueles olhos tão bonitos me olhando de volta de um jeito tão profundo. Eu estava hipnotizada, acho até que esqueci de fechar a boca. Mas acima de tudo, eu tinha uma forte sensação de conhecer o cara de algum lugar.Imagino a cara da Baby quando eu contar como fiquei chocada com a beleza do cara que me roubou.
— Pode levar o celular e o relógio, estou sem carteira.
— Eu não quero o seu celular, viemos buscá-la.
— É um sequestro? Vamos negociar. Eu pego um bom dinheiro e vocês me deixam ir.
— Corajosa como sempre, achei que você tentaria fugir, Momo.
— Você me conhece? Vai fazer charadinhas o dia todo?
— Bella cugina Morgana, não me reconheceu ainda?
— Você é meu primo? Meu italiano é péssimo.
— Sim.
— Vai dizer logo quem é você? Isso está ficando chato.
— O nosso avô vai explicar tudo. Ele está nos esperando. Queira me acompanhar, por favor. – Ele disse com um sorriso, apontando para o carro que estranhamente estacionou do nosso lado enquanto conversávamos.
— Quem você pensa que é? Aparece do nada dizendo que é meu primo e acha que vou entrar nesse carro? Sem chance.
— Meu nome é Salvatore, somos primos. O seu avô é meu tio. Satisfeita?
— Eu não vou sair daqui. Se ele quer tanto me ver, que venha me visitar.
— Você não nega o sangue quente dos Castellano. – Ele disse enquanto outros dois me puxavam pelos braços, me arrastando até o carro.
— Tirem as mãos de mim. Eu sei andar sozinha.
Eles me soltaram e eu entrei no carro, fingindo que não estava com medo.
“O que eu estava pensando? Estava cercada por homens altos, fortes e armados. Essa minha língua afiada vai acabar me matando.”
O percurso do condomínio até o hotel em que o meu avô está hospedado foi rápido. Tentei manter a calma e observei o trajeto todo, caso eu tenha que fugir.
O carro parou em frente a um hotel luxuoso, com um verdadeiro exército fazendo a segurança do lugar. Entramos e subimos pelo elevador sem ninguém perguntar nada, fomos direto para a cobertura. E, para a minha surpresa, meu avô estava mesmo aqui.
— Espero que esses jovens não tenham assustado você. ‐ Meu avô disse enquanto me abraçava.
— Não, imagina, arrastar alguém para dentro de um carro cheio de desconhecidos é normal hoje em dia. Vovô, por que não me ligou? Não precisava disso tudo.
— Vou dizer por que não liguei. Seu celular não é seguro, os telefones da sua casa também não.
— Você está me assustando, vovô.
— Assustado fiquei eu quando soube que uma raposa ardilosa estava cuidando do meu bem mais precioso.
— O tio Cláudio não assumiu a empresa. Ele estava me ajudando.
— Meu bem mais precioso é você, minha querida. Quero saber se ele cuidou bem de você.
— Se importa mesmo comigo?
— Nada é mais importante na minha vida. Você é meu sangue, a única digna de herdar tudo o que é meu.
— Mas, meu pai é seu filho. Ele não é digno?
— Seu pai teve sorte por ter administrado a empresa e os seus bens até você completar a maioridade. E o prazo que eu havia dado para ele dar a empresa para a verdadeira dona já estava terminando quando ele sofreu o tal “acidente”.
— Não foi acidente. O Bruno fez isso com ele.
— O Bruno não tem competência para isso. Estamos em guerra e seu pai não foi o alvo.
— Fale sem fazer rodeios, eu já estou confusa com tudo isso. Não precisa piorar as coisas.
— Eu vou explicar o que você precisa saber por enquanto, mas antes, quero que pense em tudo o que aconteceu na sua vida desde o acidente. E principalmente quero que você tente lembrar se assinou algum documento sem ler.
— Assinei alguns documentos quando decidi que não queria assumir a empresa.
— Você leu?
— Você já sabe que eu não li, não é?
— Eu desconfiava, mas depois você assumiu a empresa com tanto empenho que eu quis acreditar que você queria mesmo ser a sucessora desse velho aqui.
— Eu assumi por vingança, para não deixar o Bruno tomar o lugar do meu pai.
— Você é uma Castellano legítima, mas ainda é um diamante bruto.
— Por que diz isso?
Eu acompanhei a sua jornada, vi você ser forjada no fogo. Todo o desespero, angústia, medo e solidão. Você enfrentou tudo isso de frente, quando muitos homens experientes teriam fugido. Você honrou seu pai, mesmo ele não merecendo. Largou aquela vida de boêmia que não te levaria a lugar nenhum, porém você gostava.
Um nó se formou na minha garganta. Passei a vida toda achando que meu pai era um cara certinho, eu nunca suspeitei dele. O Felipe sempre teve medo do tio Cláudio, mas eu pensei que fosse coisa da cabeça dele, o Felipe sempre foi medroso. Meu avô pode estar errado. Sentei ao lado dele e relatei tudo o que aconteceu durante esse período, talvez ele visse que está tudo bem. Ele ouviu atentamente sem se surpreender com nada. Tudo isso é muito estranho.
Meu celular não para de tocar, meu avô pediu para atender.
— Morgana, você está bem? — perguntou tio Cláudio.
— Por que não estaria? — respondeu Luigi.
— Luigi, eu só estou preocupado com a Morgana. Não entenda mal.
— Afaste-se da minha neta, eu cuidarei dela. Cuide do Bruno. E diga para o meu amado filho que eu retornei.
— Senhor, eu estava cuidando bem da Morgana, eu…
— Vai desobedecer uma ordem direta? Sabemos que você não cuidou da minha neta, ela fez isso sozinha.
— Não, senhor.
— Vou pensar em alguma coisa para retribuir os joguinhos de vocês.
— Eu posso explicar.
— Certamente eu vou cobrar uma explicação para essa palhaçada. Arrume a bagunça do seu filho, eu não vou poder interceder por vocês novamente. O que ele fez foi muito grave.
— Já estou cuidando de tudo por aqui.
— Faça direito, dessa vez.
Meu avô simplesmente desligou na cara do tio Cláudio, e ele estava se desculpando? Eu nunca tinha visto nada parecido. O tio Cláudio faz as pessoas se desculparem e não o contrário. Preciso saber o que está rolando aqui.
— Vovô, o que está acontecendo? Por que você fala assim com o tio Cláudio? O que aconteceu com o Felipe?
— Hierarquia, meu tesouro. Por que você está tão preocupada com o Felipe?
“Anotação mental: ficar longe do radar do meu avô. Se ele tem poder para colocar o tio Cláudio no devido lugar, imagina eu.”
— Ele é meu amigo. O que houve com ele?
— O Felipe abandonou a organização para viver com uma mulher. Ele escolheu um péssimo momento para fazer uma besteira dessas, a falta de comando causou prejuízo para todos nós.
Reuni toda a minha coragem, loucura e todo o resto e perguntei:
— Vôzinho, você é mafioso?
— Eu não.
— Ufa! Desculpa, eu pensei que…
— Nós somos os líderes de todos eles, nossa família é a mais poderosa e você é o meu legado. O seu “tio Cláudio” é meu associado, por assim dizer.
Eu caí na poltrona que estava atrás de mim, o quarto girou e eu apaguei.
Acordei com o meu suposto primo passando álcool no meu rosto. Preciso saber o que está acontecendo aqui, nada faz sentido. Família mafiosa, tio Cláudio obedecendo alguém… Eu legado, esse velhinho fofo dono da pa#a toda… Nada disso faz sentido. Melhor socializar com esse cara e arrancar tudo o que ele sabe.
— Obrigada! Já acordei. Pode tirar esse negócio de perto de mim.
— Seu avô pediu para cuidar de você. Precisa de alguma coisa? — perguntou Salvatore.
— Estou bem. Então, priminho, você conhece o meu pai e o tio Cláudio?
— Pelo visto quem não conhece a família que tem é você.
— Nossa, você é sempre gentil assim?
— Desculpe, não quis ser rude. Seu idioma é diferente, não estou acostumado.
— Ainda não esqueci a parte do sequestro, mas estou disposta a te desculpar, se você me contar tudo o que sabe. Somos família, certo? Seja bonzinho. — Falei fazendo carinha de dó.
— Eu vou falar rápido, pois seu avô voltará em breve.
— Desembucha. — Ele sorriu.
Do nada, senti uma dor muito forte no peito e ouvi gritos: a voz distante de uma mulher chorando, parecia a voz da minha mãe.
— Morgana? Está tudo bem? — Salvatore perguntou acenando a mão no meu rosto.
— Estava pensando em umas coisas. Fala logo.
— Você é um doce, sabia? — disse Salvatore.
Apenas pisquei para ele como resposta.
— Quer me seduzir?
— Credo! Somos parentes.
— Primos distantes. Não tem problema — ele disse piscando também.
“Ele é seu primo, você está no meio de uma confusão. Definitivamente não é hora para isso”, meu subconsciente gritou me alertando.
— Não mude de assunto, se não for falar saia desse quarto.
— Ok. Senhor Luigi.
— Engraçadinho.
Depois de enrolar um pouco, Salvatore me contou que meu avô é o Don da máfia italiana. Só pode ser brincadeira.
— Você entendeu?
— Um pouco, desenha.
— Imagine a coisa toda como uma empresa. De empresas você entende, não é?
Acenei positivamente com a cabeça.
— Seu avô é o CEO (Don) de uma multinacional. Seu pai deveria ser o sucessor, mas fugiu do casamento que o seu avô havia planejado com a filha de outro Capo e, como punição, ele perdeu os direitos à herança. O Cláudio é subchefe (Sottocapo) de uma empresa parceira e o Felipe estava no caminho certo para seguir os passos do Cláudio. Se não fosse ela, Patrizia, os planos de aposentadoria do Cláudio teriam dado certo.
— E você?
— Eu serei o seu Conselheiro, braço direito (Consigliere) ou como você quiser chamar.
— Veremos.
Meu avô voltou como um furacão. O quarto do hotel é enorme, são dois quartos e uma sala no meio, mas algo me diz que ele estava atrás da porta ouvindo a conversa.
— Algum problema? Até parece que você não precisa de orientação. Você está completamente perdida, minha neta.
— Perdida não, vocês me manipularam todo esse tempo. A minha vida toda foi uma mentira. Você disse para o tio Cláudio dar um recado para o meu pai. Como ele fará isso, se meu pai está em coma?
— Morgana, seu pai se recuperou muito bem da cirurgia. Não teve coma nenhum. Eu tive acesso ao prontuário médico dele.
— Só falta você dizer que o caminhão não bateu no carro. Eu estava lá, vovô.
— Nem tudo o que parece é. Você viu o caminhão bater e nada mais.
— E você que não estava lá sabe mais do que eu?
— Não estava pessoalmente, mas nunca perdi você de vista. Acompanho cada passo seu.
— Muito bonito, seu Luigi. Sabia de tudo e não fez nada.
— Você está viva, logo eu fiz tudo por você. Nós estamos em guerra, eles sabiam que mexer com você seria mais do que suficiente para tirar esse velho da toca.
— E você saiu da toca só agora por quê?
— Porque eu já não consigo te proteger à distância e o Cláudio não tem mais nada de útil para te ensinar.
— Nossa família é muito estranha. Não seria mais fácil sentar e conversar? E que guerra é essa?
— Você deveria ter assumido o seu lugar quando assinou os papéis, porém, pelas circunstâncias, só assumiu a empresa. Essa demora criou certa instabilidade, pois nós temos leis e tradições que devem ser seguidas. Agora os outros acham que podem ser o próximo Don e estão brigando entre eles. O vencedor leva o título, mas para conseguir o cargo eles precisam passar por mim primeiro.
— Sinto muito, mas não quero me envolver em nada disso.
— Você não quer? Não prometeu se vingar dos seus inimigos? Não assumiu a empresa? Não fez tudo pela família?
— Sim, mas pensei que as coisas eram diferentes.
— Meu tesouro, você não pode simplesmente desistir e seguir a vida como se nada tivesse acontecido.
— E por que não?
— Quem assumir o meu lugar vai cortar as pontas soltas. Enquanto você estiver viva será uma ameaça, pois por direito tudo é seu.
— Vovô, olhe bem para mim. Veja se eu tenho cara de mafiosa — pela primeira vez eu tinha achado graça em alguma coisa.
— Não é hora para piadinhas. Eu deveria ter me aposentado quando seu pai tinha a sua idade, mas o desnaturado fugiu das responsabilidades e eu não aceitei esse desrespeito, na época, mas você nasceu e eu me apeguei muito a você. Sempre forte e decidida, tão parecida comigo em tudo. Por isso eu escolhi você para ter tudo o que é meu e deixei seu pai administrar os negócios por aqui, para você ter uma vida confortável. Respondendo a sua pergunta… Sim, você tem cara e o mais importante, isso está no seu sangue — disse Luigi.
— Resumindo… Eu sou a dona de tudo o que meu pai tem ou tinha?
— Quando você assinou os papéis que seu pai te deu, você aceitou receber parte dos bens que eu quis passar ainda em vida e assumiu a responsabilidade que deveria ser do seu pai no passado. Ele me disse que você precisava de um pouco mais de treinamento, mas seria o futuro da nossa dinastia. Não se apegue apenas nessa empresa, você está pensando pequeno.
— O que acontece se eu não quiser?
— Nem mesmo eu vou conseguir proteger você, os outros virão com tudo, pois você pode se arrepender no futuro e eles não deixam nada ao acaso. Já expliquei isso a você. De qualquer forma, já está feito.
— Você está dizendo que meu pai fez isso comigo?
— Eu não aprovo os métodos dele, por mim, você teria sido criada seguindo os nossos costumes, mas no fim ele corrigiu as falhas e você está pronta, ou quase.
— Você está entendendo a gravidade da situação? Sabe o que deve fazer? — perguntou Salvatore.
— Já tinha esquecido que você estava aqui — todos rimos, isso aliviou o clima de tensão.
— Vejo que o assunto não te abalou, está até fazendo piadinhas — disse Luigi.
— Vai adiantar sentar e chorar? Eu tenho escolha?
— Na verdade, tem escolha sim. Você pode escolher se vivemos ou morremos — disse Salvatore, olhando para o chão com um olhar perdido.
— Mas que belo conselheiro ou sei lá o que vocês foram me arranjar. Chorão.
— Eu não estou chorando, apenas aceitando o meu destino. Se você não aceitar, eu…
Minha paciência já está chegando ao fim, não sei por quanto tempo estou aqui, não tenho mais nada a perder, e aparentemente não tenho escolha, não vou mais deixar o meu destino nas mãos de ninguém.
— Chega de drama. Vovô, conto com você para me ensinar alguns truques antes de se aposentar.
— Tudo o que você precisar, meu tesouro.
— Quero que prometa que vão parar de jogar e manipular a minha vida. Isso não é negociável. Vinte e um anos de armações já é mais que suficiente, você não acha?
— Nessa vida, nós fazemos o que nascemos para fazer, agradeça por ter desfrutado de uma juventude tranquila. Agora, se não se importa, vou me retirar. Estou cansado, preciso me deitar.
Meu avô saiu da mesma forma como entrou, como um furacão. Será que eu sou desse jeito?
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Atualizado até capítulo 52
Comments
Kelly Sartorio
ela e maluquinha
2023-03-16
1
adri
estou igual ao avô dela quero saber dr todos os detalhes desa estória.
2023-01-12
0
Andreia Oliver
caramba a vida dela virou uma bagunça e o Filipe qual será o mistério
2022-11-23
0