Capítulo 8

Tinham passado cerca de duas semanas e as coisas na vila estavam tranquilas e toda aquela atmosfera rude se tornou normal. Infelizmente, Estefânia já não participava do grupo, agora dedicava o seu precioso tempo à filha.

Para Jul, esses dias foram os mais agradáveis, ela tinha estado mais próxima de Jane, ainda não podia acreditar que Jane a tivesse deixado ir a sua casa e, além disso, a deixou brincar no seu jardim e com a sua coleção de bonecas, —as quais pareciam valer uma fortuna—.

Jul divertia-se a brincar com os presentes que Jane lhe tinha dado, um peluche rosa e uma caixa de música, esses objetos eram o seu maior tesouro. Nisso, bateram várias vezes à porta.

—Mamã? —Jul abriu a porta, mas, ao ver o rosto do seu pai deformado e com queimaduras, fazendo-o parecer um monstro; forcejou para poder fechar a porta. No entanto, aquela coisa era dez vezes mais forte do que ela. —Não, por favor!

Os seus lamentos foram silenciados com brutalidade, o seu lábio partido e o seu rosto com nódoas negras. O seu corpo marcado com cicatrizes e manchas pecaminosas.

Um ato que durou cerca de uma hora, uma hora em que Jul se fechou e deixou de existir e quem começou a viver as dores foi Cristina. Que era uma rapariga mais corajosa e forte do que Jul e que, por cada toque doloroso, jurava vingar-se do monstro. Não lhe era permitido partir desta vida sem antes matar aquela merda.

Jul regressou à realidade e entrou na casa de banho para se lavar, tentou apagar e não conseguiu, visto que, não só o seu corpo tinha sido ferido, como também a sua alma. Depois desceu para o andar de baixo, Jul fê-lo em silêncio, e alegrou-se por ver que estava sozinha em casa. Bebeu um pouco de água e depois pegou na sua mala e foi para o covil de Jane, lugar que se tinha tornado no seu lugar seguro. Irónico.

O que é amar?

Jul entrou naquela casa improvisada que Jane tinha feito. Enquanto passava o tempo com os frascos cheios das coisas de Jane, imaginou-se a si e a Jane a remodelar o covil secreto e a transformá-lo num enorme castelo com muita fortaleza.

—Não quero que volte a acontecer, porque é que não tenho sorte? —As lágrimas escorreram pelo rosto de Jul—, Dói muito! —Soluçou como um bebé.

Abraçou-se a si mesma e depois cantou uma canção que tinha ouvido antes na rádio. E pouco depois adormeceu.

Jul acordou quando sentiu alguém a mexer nela com força, o que a alarmou e abriu os olhos depressa e tentou fugir.

—Porque esse olhar? Aquela coisa voltou a pôr as mãos em cima do que é meu? —Jul assentiu envergonhada, não queria que Jane a visse agora. Estava suja e não queria que Jane a visse quando estava tão feia. —Quero matar aquela merda. —Jane saiu irritada, mas Jul deteve-a.

—Não faças nada, somos fracas e eles são mais fortes, com um corpo pequeno não podemos fazer nada. —Jane refletiu um momento e viu razão nas palavras de Jul.

—Então, só faltam sete, e acredita que quando chegar esse momento, nenhum deles se atreverá a tocar nas minhas coisas. —Jane sentou-se irritada na neve e Jul sentou-se ao seu lado fazendo-lhe companhia.

—Posso fazer uma pergunta? —Jane assentiu e Jul voltou a perguntar. —E os teus irmãos, não és amiga deles?

—São iguais a eles, não quero falar com aquelas coisas.

—Eu quero ter irmãos, mas sou filha única. No entanto, é melhor que não haja mais, é melhor que ninguém sofra o que eu sofro. —Explicou Jul com alguma repugnância. —E depois das férias, vais para a escola na cidade ou aqui?

—Não sei.

—Tens alguma comida favorita? —Jul moveu as mãos e depois disse. —Desculpa, ultrapassei o meu limite.

—Gosto de ensopado de peixe com muito molho picante e limão. —Jul esboçou um sorriso terno e depois contou a Jane qual era a sua comida favorita.

—Gosto de massa.

—Gosto da cor dos teus olhos. —Jul corou com o elogio, no entanto, não sabia o que se passava na mente de Jane para dizer aquilo.

—Eu também gosto dos teus olhos, também do teu cabelo tão loiro que parece branco e as tuas sardas fazem-te parecer linda.

—Uau, pareces loucamente apaixonada por mim, estou a brincar. —Jane riu-se depois de dizer aquilo e Jul também, embora se sentisse envergonhada, visto que Jane quase tinha descoberto os seus sentimentos.

—Jane, quando vivias na cidade com os teus pais, os outros também te viam como a filha estranha dos Tesca?

—Hoje acordaste muito curiosa, não? Sim, de facto, acho que a razão de me trazerem para esta terra perdida foi essa. Contando a minha história com eles, acho que nunca me senti parte da «família» Tesca. Os meus irmãos, ugh, detesto chamar aquelas coisas assim, como dizia, aquelas coisas sempre me trataram mal, tal como os dois, eu apenas... nasci diferente. —Jul ouvia atentamente, era a primeira vez que ouvia Jane falar tanto. Na verdade, era a primeira vez que Jane não era curta com ela.

—Obrigada por me contares.

—Deixa de dizer coisas assim, causam-me repulsa. —A Jane de sempre estava de volta, com o mesmo olhar frio e indiferença.

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