Capítulo 2

Estela

Abro meus olhos pela manhã, pegando meus óculos na mesa de centro, me dando conta de onde estou, ao ver

toda aquela bagunça a minha volta e me levanto do sofá, decidida a retribuir um pouco do que a Patrícia fez por mim na noite passada.

Fazendo o mínimo de barulho para não a acordar, começo juntando todas as embalagens vazias de comida e bebida, colocando-as no lixo. Junto suas roupas espalhadas, levando-as para a pequena área de serviço, onde encontro uma vassoura e materiais de limpeza.

Me aproximo da porta de seu quarto, que, provavelmente, está trancada e encosto minha orelha na madeira em busca de sinais de que possa estar acordada, mas não ouço nada e continuo com a arrumação. Varro a sala e a cozinha, lavo a louça, tiro a poeira dos móveis… e depois de tudo limpo e organizado, passo um café fresco para quando acordar, e pego minhas roupas no varal, que foram lavadas ontem à noite, e sigo para o banheiro, para tomar outro banho antes de me vestir e deixar sua casa.

— O que aconteceu aqui? Contratou os bichinhos da Cinderela? — Patrícia questiona quando abro a porta do banheiro, pronta para ir embora, enquanto olha espantada para sua casa.

— Desculpe se pareço intrometida, só queria retribuir de alguma forma o que fez por mim. — Digo ainda parada na porta do banheiro e ela me encara mordendo o canto da bochecha, ficando em silêncio por alguns segundos.

— Intrometida? Eu abri a porta do meu quarto com medo de não encontrar mais a minha televisão ou, sei lá, meu micro-ondas… mas o que encontrei foi minha casa limpa e arrumada, como nunca foi.

Gata, minha mãe me interditaria por isso… — Faz uma pausa dramática, coçando a cabeça. — Não sei nada sobre você… nem de qual cidade veio, nem, porque veio… não sei explicar, mas gostei da sua energia e, quer saber… fica por aqui até arrumar outro lugar. — Sua boa vontade e confiança, fazem lágrimas brotarem em meus olhos e tiro meus óculos para contê-las.

— Tem certeza? Não quero ser um incomodo ou uma preocupação. — Ela ri de canto.

— Tenho, e não é pela sua faxina. — Curvo meus lábios em um breve sorriso. — Como está vendo, não tenho luxo e nem conforto, terá que continuar dormindo no sofá, mas posso esvaziar umas gavetas no meu armário para guardar suas coisas, quando tiver, é claro. — Rimos juntas, pois, tudo que tenho está no meu corpo e no bolso da minha calça, como minha identidade e um cartão de débito, já quase sem utilidade.

— Nem sei como agradecer! — Me empolgo e a abraço. — Não tenho muito, mas pode me dizer onde fica o supermercado e posso fazer umas compras, ou qualquer outra coisa que precise. Tenho mesmo que sair para tentar conseguir um trabalho. — Falo com empolgação e ela sai de meu abraço, espalmando a mão a minha frente para que eu desacelere.

— Vamos fazer o seguinte… pega esse pouco que diz ter, e compra umas peças de roupas, vai precisar se conseguir um emprego. Ai, depois que começar a trabalhar, dividimos as contas e todo o resto, até poder pagar seu próprio aluguel ou voltar para casa, o que pretender. — Casa… não tenho uma casa para voltar. Respiro fundo para conter minha emoção e assinto, ainda sem acreditar em minha sorte de tê-la encontrado.

— Estou tendo uma ideia… não é o melhor emprego do mundo e paga pouco, mas… estamos precisando de uma atendente no bar em que trabalho. Se tiver alguma experiência com público, pode passar lá mais tarde e te apresento ao meu primo, ele é uma peste, mas é só ignorá-lo. — Claro que não era o que sonhava fazer depois de formada, mas não direito de escolha nesse momento, preciso sobreviver.

— É só me passar o endereço, estarei lá. — Respondo, com o coração esperançoso por dias melhores.

Sabia que em algum momento tomaria as rédeas da minha própria vida, só não esperava que fosse dessa forma, tão dolorosa. Vivi uma época pela minha mãe, depois pelo meu irmão, e agora viverei por mim.

                                                                                 ***********************

Após nossa conversa, a Paty me levou a uma loja de departamento, onde comprei peças íntimas e o básico, como um jeans, três camisetas e itens de uso pessoal, como escova de dente e de cabelo. Resumindo, tudo que tenho agora, cabe em uma mochila.

Depois, antes de ir para o ensaio de sua banda, ligou para o chefe e avisou que tinha uma candidata a vaga de atendente, e aqui estou eu, usando meu jeans novo e esperando no sinal de trânsito para atravessar a rua, enquanto penso nas respostas que terei que dar ao meu futuro empregador.

Vejo o sinal ficar amarelo, esfrego minhas mãos suadas, de nervoso, em meu jeans e ajeito meus óculos na ponte do nariz. A luz verde se acende e eu, e cerca de uma dúzia de pessoas recuamos, quando percebemos o

avanço de um carro pela faixa de pedestre. Levo a mão ao meu peito esquerdo pelo susto e sou surpreendida pelo som de uma freada brusca e do metal retorcido, seguidos do estilhaçar de vidros no chão.

Olho para a minha esquerda e me deparo com uma motocicleta caída no cruzamento e corro até um tumulto de pessoas do outro lado da pista. Sigo meu instinto e passo entre os curiosos, encontrando o motociclista caído do chão.

— Ninguém mexe nele. Liguem para a emergência. — Ordeno e me ajoelho próximo ao homem, que move os braços tentando tirar o capacete.

— Por favor, não faça isso. — Peço e ele deixa seus braços caírem novamente ao lado de seu corpo. Levanto apenas o visor, encontrando seus olhos verdes, e checo seu pulso. — Você pode ter quebrado alguma coisa, é melhor que não se mexa. — Explico.

— Quer que avise a alguém? — Pergunto e apalpo seus bolsos em busca de um aparelho celular.

— Não precisa, estou bem! Mas pode continuar me apalpando, está gostoso. — Recolho minha mão, percebendo a malícia em sua voz, e ouço sua risada por trás do capacete.

— O motorista fugiu! — Alguém diz no meio da multidão.

— Depois eu… — O acidentado diz com a voz arrastada e noto sua fisionomia de dor, ao tentar puxar o ar. Isso pode ser sinal de fratura na costela, penso.

— Ei, qual seu nome? — Tento distrai-lo da dor, até que a ambulância chegue e sua mão segura firmemente a minha.

— Rodrigo. E o seu, princesa? — Antes que responda, ouço a sirene e todos começam a se afastar para que os socorristas possam trabalhar. — Você é linda! — Pressiono os lábios em linha reta para conter meu sorriso, pois, chega a ser engraçado vê-lo flertando na situação em que se encontra. Vi apenas seus belos olhos, mas não posso negar que seja um homem interessante. Alto, mãos grandes, peito largo…

— Você vai ficar bem. — Ajeito meus óculos, tiro minha mão da sua e me levanto, quando os socorristas se aproximam.

— Meu celular, está no bolso da jaqueta, salva seu número. — Pede enquanto imobilizam, cuidadosamente, seu pescoço.

— Não tenho um número. — Informo e o observo sendo colocado em uma maca.

— Quer que eu acredite nisso? Como faço para te ver de novo? — Pergunta antes da ambulância se fechar, mas apenas dou de ombros e lembro que já estou atrasada para minha entrevista. Olho a minha volta para me localizar e aproveito o sinal fechado para atravessar a rua e seguir meu caminho. Espero, sinceramente, que ele fique bem.

Mais populares

Comments

Kelly Christinne

Kelly Christinne

comecei agora, hoje (01/02/24) estou amando... Obg Andressa por mais uma bela história , sei q vai ser... sempre é 🥰

2024-02-01

7

Nanda

Nanda

Andresa que Deus continue te abençoando sempre com muita saúde, amor e inspiração para suas obras.

2024-05-19

1

Silvana Pereira

Silvana Pereira

começando em 4 .4.24, vamos pra mais uma, já ansiosa

2024-05-05

1

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!