Jimin e Soyuri

Jeon aguardou por ao menos alguns segundos depois da porta, na esperança de ser levado de volta para um diálogo que os colocaria sincronizados finalmente. Porém, se considerou estúpido de repente, pois Jimin não estava realmente inclinado àquilo naquele momento. Mas estaria, Jeon teve certeza porque o lobo do ômega chamava pelo seu sem que seu lado humano se desse conta. Ele o exigia urgentemente, como o lobo de Jeon o fazia com determinação. E não viria a demorar o dia em que Jimin reconhecesse a verdade.

De toda maneira, Jeon teria muito o que fazer naquele dia, embora seu mal estar voltasse a deixá-lo abatido e inexpressivo. Não havia tempo para tratar das frustrações e mágoas, tampouco da doença repentina dando fim ao seu pouco ânimo. Só lhe restava levar a frente o objetivo de não deixar que nada atingisse o outro mesmo assim.

O príncipe se preocupou em comprar o silêncio da serva Soyuri quando esta foi solicitada ao seu escritório, ainda em meio ao alvoroço do desjejum: um punhado de moedas e ameaça de despejá-la foram suficientes.

Soyuri sequer oscilou para aceitar o que lhe foi decretado, ainda que sua predisposição fosse mais inclinada à imagem de Jaehye. Tinha real interesse em agradá-la, mas não levar notícias recentes sobre seu convidado seria um empecilho e tanto.

— Renuncio ao caso - garantiu ela, confrontada pelo olhar negro e cortante que a fez recuar e, por fim, abaixar a cabeça. Uma postura fora do seu costume. — Eu não vi o Sr. Park na noite de ontem.

Entretanto, ao se retirar e respirar aliviada, ela guardou as moedas no bolso do avental e sorriu para si mesma, astuta. Soube que sua presença foi solicitada ao quarto do Sr. Park. Previu boas notícias, no fim das contas.

Jimin tratou de ajudá-la sem sequer ter ciência disso quando a chamou do seu próprio quarto, já vestido com roupas de frio. Ele colocou uma carta em suas mãos e lhe disse para levá-la até a princesa ainda pela manhã. Foi breve em dispensá-la, mas não se saiu bem sucedido.

— Desculpe ser invasiva - Soyuri se atreveu a encará-lo, e relaxou ao perceber que ele não a via com mágoas. — Ouvi histórias ao seu respeito na vila, antes mesmo de saber que o senhor estaria aqui algum dia. Devo dizer que sua figura é muito intrigante, mas não tenho ciúmes como as outras mulheres têm. Sua beleza e inclinação para alfas não me intimidam, entende?

— Oh, não, não... Eu estou tão cansado, por favor...

— Me d-desculpe outra vez, acredito que não sou boa em me expressar e acabo por soar rude - Soyuri se apressou em erguer as mãos e tomar uma linha de defesa ao ver o ômega murchar num semblante entristecido. Teve medo que ele se queixasse com o príncipe. — Não estou implicando com o senhor, apenas sendo o mais sincera possível.

Jimin assentiu em concordância, mas negou ser inclinado a alfas por medo do que ela poderia dizer ao seu respeito. Ambos tinham muito a perder e não confiavam de modo algum em suas próprias palavras.

Entretanto, Soyuri se mostrou inconsequente ao comentar, curiosa:

— Somos muitos olhos e ouvidos por este palácio, Sr. Park - segredou ela quando observou o rosto de perfil e braços cruzados. — Sabemos da serva presa nas masmorras por ter incomodado o senhor, e que ela está ali por ordem explícita do príncipe. Vossa alteza nunca se importou com ninguém realmente, e nenhuma das suas visitas são tratadas com tamanho zelo, é o que se diz por aí. Todavia, ontem mesmo o príncipe me encarou como se eu tivesse invadido seu território e tomado seu ômega. Pude ver pela primeira vez aquele olhar de fera, vermelho e assustador. E ele o marcou, como eu bem sei.

— Já lhe disse que foi um terrível incidente e que hoje mesmo eu voltarei a ser livre - respondeu ele, desviando o olhar para a porta porque estava ansioso para encerrar aquela conversa.

— Você não é o ômega da princesa e sabe disso.

— Oh, por favor...

— Você não... o senhor não pode insistir em uma aproximação a esta altura - exclamou Soyuri de repente, e o surpreendeu com sua agitação. — Se esta carta contém algo que possa tomar a atenção da princesa de modo equivocado eu poderia não vir a entregá-la.

— Por Deus, não é nada disso. Eu sequer penso nela como... oh, digo...

Soyuri não teve dúvidas ao notá-lo alheio às investidas da princesa antes, observando-os em seus passeios, tampouco naquele momento, ao vê-lo corado e nervoso por ter falado além da conta.

— Não pensa na princesa como a sua alfa, sequer cogita a possibilidade quando há outro que lhe agrada mais.

De súbito, Jimin se assustou e vociferou num estrondo:

— Eu a proíbo de pôr palavras em minha boca!

A repreensão gritada afetou pouco a serva, ou quase que nada. Desde muito menina foi tratada daquela maneira, não tinha medo, mas pena da face assustada diante dos seus olhos violeta. Ela observou Jimin levar as mãos à boca quando este exclamou surpreso com a própria atitude. Logo, Soyuri concluiu facilmente que o jovem não conhecia a si mesmo.

Quanto anos ele tinha, afinal? Oh, apenas dezoito anos. Um garoto perdido naquele lugar repleto de armadilhas, odiado por tantos que se perdia a conta. Porém, ele parecia estar se adequando aos costumes do palácio, até mesmo já andava dando ordens.

Soyuri pestanejou os cílios, curiosa:

— Percebo sua ingenuidade para com os homens. Custo a crer que reconheça a sensação, não quando provavelmente nunca foi cortejado ou admirou alguém em segredo. Estou certa, tenho certeza. Deixe-me lhe fazer uma gentileza para provar minha lealdade. Pessoas que sentem amor entre si gostam de sentir o toque, anseiam por isso, e se beijam com...

— Sei das paixões - irritado com a impertinência da mulher, Jimin se agitou pelo quarto. — Mas não me sinto dessa forma, logo, é insensato que faça suposições.

— Oh, certo - Soyuri soou irônica e sorriu. - E esta marca em seu pulso surgiu como mágica, um truque dos mais mirabolantes!

Sei que o senhor chama alfas em seu cio, e como veio para este lugar.

Então, Jimin lhe deu às costas e negou-se a acreditar em seu azar:

— Sim, vejo que você sabe muito ao meu respeito - murmurou inseguro ao ouvi-la rir.

— Não precisamos ser inimigos quando viemos do mesmo lugar, daquela maldita vila, onde aquela gente sequer hesita vender seus próprios filhos em troca de algumas moedas a mais. Sim, está enganado ao pensar que foi o único a ser vendido como um animal. Na verdade, ouso dizer que teve muita sorte por ser vendido para um palácio quando eu fui vendida para uma taberna de beberrões que não vêem diferença entre uma criança e uma mulher. Sinceramente, o senhor não tem não tem ideia da sorte que tem!

Subitamente, Jimin se virou estupefato e se surpreendeu com a declaração da mulher rígida à sua frente. Aquela era uma mulher bonita de rosto afilado e orgulhoso, com olhos milagrosamente violetas, mas fundos e tristes. Sim, ele a compreendeu inteiramente e acreditou ser verdadeiro seu relato pessoal, pois o queixo se encontrava erguido para um possível confronto contra o mundo, caso ela precisasse se defender.

E Jimin reconhecia em si mesmo aquele sentimento, embora não soubesse expressá-lo:

— Lamento que tenha passado pelo o que passou, não consigo expressar o quanto isto me comove. No entanto, discordo de sua visão no que se refere a quem nos vende: eles não são realmente o problema, mas sim quem os faz tão pobres que só lhes resta recorrer a quem tem o poder de compra. Quando fui vendido para este lugar, minha casa estava a ponto de desabar sobre toda a família, não havia mesa farta, nem mesmo fertilizante suficiente para fazer a terra nos dar alimento. Nós não tínhamos dinheiro para comprar animais, ou autorização para caçar na mata fechada, que está sob a guarda do palácio. Obviamente, aprendi a não relevar o fato dos meus pais terem me vendido. Acredite, ainda sinto grande mágoa pelo ocorrido, mas essa não é uma questão isolada. A falta de empatia com gente como nós, tão humanos como qualquer outro, nos trouxe até aqui.

— Você está rodeado por toda essa riqueza, faz parte disso agora e não pode negar que gosta do conforto que lhe foi oferecido - argumentou ela, os olhos lacrimejantes por asco e, ao mesmo tempo, inveja. — O que lhe ofereceram foi...

— Sou tão mercadoria quanto você, não se esqueça disso, Soyuri - Jimin a interrompeu, também ferido, mas determinado. — Temos histórias semelhantes e diferentes em diversos aspectos, ainda assim, não estamos onde queríamos estar. Este lugar sempre reluziu ouro e prata enquanto eu vivi a fome e a dor lá fora; meus olhos jamais se acostumaram com o brilho que cega as pessoas que nasceram do lado de dentro desses portões. Eu não aceito os termos, tampouco deixarei de condenar os responsáveis pela desgraça do povo da vila, ainda que não me aceitem como eu sou.

— Oh, é claro que não... - de repente, Soyuri teve raiva das coisas que ouviu e quis atingí-lo, vê-lo outra vez tremer diante de si. — No entanto, você está apaixonado por um príncipe! Sua hipocrisia não tem precedentes, pois não?

Como se sempre soubesse que venceria aquele confronto, Soyuri desatou a rir do modo hesitante a que Jimin se colocou, embora lágrimas de rancor caíssem dos olhos violeta furiosos.

— E ele o adora como um Deus, ou o Diabo!

Ela sequer sabia por que o odiava tanto, mas não se importou com aquilo naquele momento. Queria atacá-lo com os punhos, bater nele até arrancar-lhe sangue ao ponto de rachar sua cabeça contra o chão que pisava com seus sapatos velhos.

— Mas você é apenas um garoto, um maldito garoto que não sabe tanto quanto pensa. Não tem mais pena de mim do que eu mesma tenho de você, vestido com suas roupas caras e sapatos novos.

Jimin murmurou confuso:

— Não estou apaixonado, tampouco sou como eles. Todas as coisas que você diz, nada disso faz sentido. No entanto, sim, sinto muito por... quando criança você...

— Eu juro que o mato! - num instante, Soyuri agarrou Jimin pelo pescoço e encarou de cima o semblante sufocado e trêmulo. — Juro por Deus que o mato se voltar a citar meu nome e minha história para qualquer um, acabo com sua vida e privilégios que insiste em negar! Oh, e recomendo que tenha pavor ao sequer me imaginar nas masmorras, caso resolva contar o que houve aqui para o príncipe. Recomendo que não ouse tanto!

Por fim, com um movimento Jimin foi jogado contra a parede e caiu de joelhos no chão, a mão contra o pescoço e a boca escancarada numa crise de tosse. Aturdido, ele ouviu a porta bater e, por fim, se compreendeu sozinho.

...¥¥¥...

No desjejum, poucos tinham certeza da presença de Jeon quando estava no palácio. Porém, Park Jimin era esperado na mesa farta daquela manhã fria, e sua falta foi motivo para suposições pouco discretas dos servos aqui e ali. Seu sumiço ultrapassou as barreiras do comum, não se contava outra história. Alguns até mesmo riram dos guardas por não terem encontrado o rapaz, diziam que estes foram treinados para matar coelhos, e nem com um singelo animal seriam bem sucedidos. Em consequência dos burburinhos, os ânimos estavam exaltados.

Toda aquela conversa irritou Jaehye, que deixou as frutas de lado e ergueu o queixo imponente:

— Vocês acreditam que são discretos, ou pode-se dizer que são totalmente inconvenientes no fim das contas? Ah, basta, basta desta faladeira sussurrada pelos cantos! Desapareçam todos, quero falar sozinha com os Reis.

Logo que sua ordem foi cumprida, Jaehye deixou evidente sua frustração:

— Appa, sabe se ainda está aqui o desprezível do meu irmão? Quem sabe ele tomou uma carruagem logo ao nascer do dia.

— Tenho certeza de que seu irmão ainda está entre nós, querida.

— Pois sim, e aqui temos um paradoxo - retrucou ela, exasperada. — Jeon detesta se prolongar por aqui, mas tem feito isso numerosas vezes desde que Jimin chegou.

— Sabe que Jeon gosta de implicar com os seus engenhos - sua mãe comentou junto da xícara de chá quente. — Ele deixou claro que não aceitaria facilmente seu casamento com o homem ômega. Ademais, não vejo nada de irreal em sua estadia prolongada. Na verdade, fico contente ao estar próximo do meu querido filho, e de saber que ele está longe das tropas.

— Não seja tola, omma. O fato de Jeon estar no palácio é péssimo para todos nós – retrucou ela. — Tenho certeza de que ele está envolvido no desaparecimento de Jimin!

— Jaehye - Kyun chamou sua atenção com olhos surpreendentemente frios. — O que está insinuando? Lembre-se que Jeon é um alfa da mais alta linhagem. Não admito que invente histórias absurdas sobre ele. Está frustrada porque aquele homem ômega anda lhe evitando? Dê conta disso sozinha! O palácio é imenso, um lugar propício para que visitantes de honra se distraiam. O Sr. Park caminhou o bastante para cair no sono bem cedo. Quanto ao Jeon... é certo que esteja correspondendo às expectativas de alguma ômega por aí.

— Oh, não - a rainha comentou preocupada com o filho. — Um príncipe não deve se comportar como um homem medíocre, é algo que não posso aceitar. Ainda virá uma ômega que tome o coração do meu filho? Ele está em tempo de encontrar sua parceira.

— Não antes de mim - Jaehye se armou em defesas. — Devem se lembrar de que o trono é meu por direito e competência. Vou encontrar o meu parceiro antes de...

— Desculpe? - Kyun a interrompeu perplexo. — Por acaso, dispensou o ômega? Quando isto aconteceu, afinal? Custo a acreditar que tenha sido tão precipitada depois de tamanho investimento.

— Oh, por Deus - de repente, Jaehye se horrorizou com aquela dura verdade. — Eu estava errada, completamente errada.

— Mas o que fará agora?

Com óbvia insatisfação, Jaehye comunicou:

— Vou mandá-lo de volta para casa.

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Comments

Carmen Leniz Rivero

Carmen Leniz Rivero

Ahhhh...princesa de merda,uma hipócrita 🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️🌶️

2024-01-30

0

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