Entre Mentiras e Verdades

Quando a hora do jantar chegou, nada que Jaehye disse soava agradável aos Reis. Ela bem que tentou justificar suas atitudes mais recentes, desde se comprometer a enviar moedas para a família daquele que considerava seu ômega, até se preservar em primeiro lugar, quando deixou o jovem sufocando envenenado em sua sala. O que nenhum deles sabia era que o príncipe estava envolvido neste último acontecimento, até porque ele mesmo jamais se entregaria como presa fácil nas mãos da irmã.

— E onde o franguinho está? – ele perguntou ao bebericar um vinho.

— Isolado num aposento livre de Arsênico, é claro – sua mãe respondeu e lançou-lhe um olhar cortante. — Não consigo imaginar a razão pela qual as servas se atreveram a revirar roupas velhas e tóxicas para vestir o rapaz. E você, meu filho, tem alguma idéia do que pode ter acontecido?

— De modo algum – Jeon mentiu sem hesitar, apesar de Jaehye ter voltado sua atenção para ele. — É bem provável que o Sr. Park seja amargo depois das portas do seu quarto, o que poderia ocasionar a ira de quem presencia por horas sua personalidade intragável.

— Jimin é adorável – Jaehye o defendeu com afinco. — Tenho certeza de que só diz palavras gentis, como toda ômega faria.

— Oh, eu mesmo não encontrei gentileza alguma ao ouvi-lo reclamar quando salvei sua vida. É um ingrato.

— Que disparate.

Jaehye não acreditou no julgamento do irmão a respeito de Jimin. E ela estava certa sobre aquilo. Com receio de ser descoberto, mas também desejando fazer com que o ômega fosse embora, Jeon desatou a mentir desenfreadamente. Tinha que aproveitar a ausência daquele que acusava falsamente e, quem sabe, misturaria algumas verdades em meio ao seu teatro.

— Ele ousou cheirar-me como uma dama apaixonada. Oh, é isso mesmo, minha querida irmã. Fui agarrado por diversas vezes numa clara intenção de que ele me tem como um alfa mais apto a protegê-lo. Como se eu estivesse louco o bastante para desejar um peitoral reto ao invés de peitos fartos. Que desastre! Temo que, depois do episódio do celeiro, seria prudente eu me proteger de um homem ômega que costuma atrair outros homens para o seu cio.

— Omma – com fúria pelas palavras ardilosas do irmão, Jaehye chamou pela mãe, que fechou os olhos demoradamente, levou as mãos a cabeça e suspirou longamente. — Por que o seu filho ainda está entre nós, afinal? Mande-o para as tropas, para o raio que o parta! Todas estas mentiras, ofensas sobre o caráter de Jimin me enojam demasiadamente. Você não tem respeito por um jovem que sofreu uma terrível situação de abuso, Jeon. Sequer compreende o quão difícil é para Jimin estar aqui, depois de ser rejeitado e vendido por seus familiares. Afaste-se de nós, caso ainda seja humano e se preocupe ao menos um pouco com o que seu veneno pode fazer ao meu ômega!

A voz estridente de Jaehye se calou, mas seu eco no grande salão de jantar ainda permaneceu sombrio e cortante. Diante do seu semblante carregado, o príncipe não se moveu na cadeira, estava pela primeira vez irritado com a explosão daquelas palavras para si. Ou talvez estivesse apenas furioso com a mesma precipitação da irmã, que insistia em afirmar que Jimin era o seu parceiro. Ele realmente detestava aquele ponto da questão.

— Seu ômega? – seu maxilar firme pouco se moveu, a postura se encontrava projetada para frente, de forma desafiadora naquele momento. — Diga-me o porquê de não mover sequer um dedo em favor de defendê-lo quando ele estava morrendo sem ar aos seus pés? Vamos, mulher alfa, responda de uma vez! Ou apenas cale essa boca, se a usa para afirmar que vocês são parceiros quando, para mim, está claro que isso nunca acontecerá.

— Por favor… – o Rei Kyun tentou se fazer ouvir.

No entanto, Jaehye rebateu o irmão:

— Pouco me importa o que você acha que acontecerá entre Jimin e eu, ou se coloca em dúvida o meu sincero interesse afetivo. Você não tem boa reputação e isso é motivo suficiente para que suas ideias não sejam levadas a maior importância. É simplesmente ridículo cogitar tal possibilidade!

A mesa vibrou quando Jeon foi bruto ao espalmar as mãos nela e se ergueu transtornado:

— Eu sou um príncipe tão nobre quanto você.

— Irresponsável, medíocre e promíscuo! – Jaehye não voltou atrás. — Você é um tolo que passa a vida a me subestimar, a tentar me tornar um fracasso tal qual você sempre foi. Por Deus, somos gêmeos, mas lembre-se de que somos totalmente diferentes! Estive e sempre estarei à frente de você, mais precisamente, a uma Coroa de distância.

— Sua única ambição, é claro – ele retrucou zombeteiro.

— Oh, Jeon – Jaehye retribuiu o tom sarcástico, enfurecendo o irmão. — De repente, está preocupado com o homem ômega? Quem sabe você se apegou ao Sr. Park!

— O que está insinuando?!

— Jimin é o meu ômega, eu o escolhi por direito! E saiba disso, Jeon: não foi à toa que mandei Hoseok fazer guarda naquela casa todos os dias. Sei o bastante para anular todas as inverdades que você lançou sobre esta mesa, sei que Jimin é puro, gentil, respeitável...

Jeon rosnou rudemente:

— … e dócil agarrado ao meu pescoço!

— Vou matá-lo, Jeon!

E lá estavam os servos segurando Jaehye novamente, ao mesmo tempo que Jeon se retirava sob os protestos dos pais intrigados com suas atitudes maléficas.

Todo aquele alvoroço pouco importava para o príncipe, era fato, mas sua fúria era real e poderosa. As duras pisadas afastaram os mais precavidos soldados de guarda e servos que não ousaram respirar até que ele dobrasse no corredor, indo rapidamente rumo ao seu quarto de estudos. Nos últimos dias, aquele era o lugar onde Jeon passava a maior parte do seu tempo. Um caso raro, contrário ao seu frequente desagrado com o lugar. As coisas andavam mesmo estranhas.

Apesar de ser expulso praticamente todos os dias pela irmã, de repente, o interesse por estar fora do palácio diminuiu drasticamente. Se antes Jeon não passava uma semana em seu lar, agora lhe parecia esquisito buscar qualquer coisa lá fora. Nem para festas no hall Jeon tinha ânimo! E foi com tal pensamento que ele confrontou seu amigo de farra que o esperava animado em seu quarto.

— Nada de festas, não há razão!

— E precisa haver? – com estranheza, Kim Taehyung perguntou ao se sentar sobre a poltrona próximo à janela. — Acabo de chegar de viagem, mas não sou recebido com alguma diversão. O que diabos há com você, homem?

— Outro homem!

— Uh?!

— Oh, espere aí – tentando se acalmar, Jeon respirou fundo e relaxou a postura. — Jaehye trouxe o homem ômega do vilarejo para cá, aquele seu vizinho esquisito. E agora mesmo ela e eu estávamos presos numa discussão estúpida sobre ele. Uma perda de tempo! Um de…!

— …sastre, sim, estou entendendo a questão – paciente, Taehyung observou os próprios dedos entrelaçados e falou de modo faceiro. — De alguma maneira eu acreditei que você estava ciente de que algo assim aconteceria entre Jaehye e Jimin. Bem, as respostas para suas cartas foram claras; eu lhe afirmei que o rapaz é realmente um homem ômega. Lhe avisei antes mesmo do desastre no celeiro dos Park, a uns bons anos atrás.

— Você poderia estar errado, não? Era um moleque imaturo quando enfiou este nariz pontudo entre os cabelos dele – Jeon argumentou agitado. — Para mim, simplesmente não faz sentido, nem mesmo vendo-o diante dos meus olhos parece real.

— Nunca duvidei do meu faro.

— Jamais contamos nossas desconfianças a qualquer um, Taehyung. Desconfianças, sim, mas nenhuma certeza. Seria muita coincidência do destino colocar dois esquisitos numa mesma região. Mulher alfa, homem ômega… Quem acreditaria? E isto basta para que eles, que mal se conhecem, tenham a certeza de que são parceiros?

— A princesa o chamou aqui para conhecê-lo, suponho eu.

— Ela o comprou!

— Desculpe?! Oh, bem, então ouso dizer que Jimin ainda terá muitos dias de tormenta neste lugar. Imagino que não deverá ser fácil corresponder expectativas tão altas. Em todo caso, não é problema seu, amigo. Ter Jimin no palácio seria apenas uma questão de tempo, precisamente quando sua irmã descobrisse a verdade sobre o gene dele.

Chateado, Jeon retirou o blazer negro e desviou sua atenção para os próprios sapatos. Pensava que aquele dia não chegaria, pois ele nunca acreditou que o mais jovem dos Park fosse realmente um ômega.

— Pouco me importo com um moleque fraco e, acredite, impertinente. O que me enfurece é…

— Sim?

— O que… o que me enfurece é…! Está claro que o que me…!

De braços cruzados, Taehyung sentiu pena do seu amigo obviamente perdido no centro do quarto.

Por isso, sorriu de canto e resolveu ajudá-lo:

— O que lhe enfurece é… que haverá um Rei…

— Rei ômega! Eu já ia mencionar isso, mas você não é paciente comigo, meu caro.

Ofegante e cansado, Jeon se jogou sobre a cama e afrouxou de forma desajeitada o lenço vermelho envolta do seu pescoço. Seus músculos estavam tensionados e doloridos, tamanha era a carga de estresse em seu corpo. No entanto, ao livrar aquela área de qualquer cobertura, o cheiro de maçãs — fresco e doce — desabrochou por todo o quarto.

Por puro instinto os olhos negros misteriosos se fecharam e as narinas absorveram lentamente aquele perfume calmante. Jeon sentiu uma sede e calor repentinos, e seus dedos deslizaram sobre a camisa limpa e branca, curiosamente imitando toques delicados que não eram de seu costume. Um vislumbre da imagem da face úmida e corada do ômega surgiu da escuridão dos seus pensamentos, quando ambos estavam sentados na grama, o brilho da água refletindo a luz do sol iluminando a pele alva enquanto ele se lavava. O peitoral desnudo, as mãos bonitas unidas em concha, levando ao rosto de traços delicados a maior quantidade de água possível na tentativa de se livrar do Arsênico. Aquela foi a primeira vez em toda a sua existência que Jeon admitiu a beleza de outro; porque Park Jimin era, de fato, bonito aos olhos.

— Ugh – ele mordeu o lábio corado e úmido, inquieto de repente, inspirando com força o cheiro de maçã doce preso à própria pele e sentindo o sangue ferver nas veias. — Esse cheiro é realmente... Ugh, mil demônios...

— Ainda estou aqui – Taehyung comentou bem humorado e agitou os dedos no ar, despertando Jeon e seu mal jeito. — E posso sentir o quanto o ômega e você estiveram próximos nas últimas horas.

— Ele é completamente louco! – na defensiva, Jeon se apoiou sobre os cotovelos e encarou o amigo. — Se esfregou em mim pela manhã, tal qual os seus queridos amigos franceses costumam fazer com você, Taehyung. Esse cheiro de maçã, totalmente enjoativo, não saiu da minha pele no banho.

— O Sr. Park o marcou com seu cheiro; que tocante!

— Vou mesmo é fazê-lo engolir tais zombarias, homem – irritado com o amigo, Jeon segurou a bainha de sua espada enquanto o Sr. Kim ergueu as mãos, na defensiva. — Ora, francamente, qualquer outro homem que ousasse me tocar já estaria morto e enterrado. Mas estamos falando de um ômega, um homem protegido por seu gene. E este cheiro? Saiba que foi um incidente causado por outro, ambos extremamente desagradáveis.

— Oh, por favor, eu mesmo não hesitaria caso o Sr. Park resolvesse se acolher nos meus braços. Apesar de maltrapilho quando meu vizinho, seu cheiro natural de maçãs doces e frescas não passou despercebido por mim. É tão sensual e gostoso de sentir que...

Logo que interrompeu a sua sentença, o Sr. Kim deixou de lado a análise de suas unhas e encarou com espanto o semblante fechado do príncipe, não soube dizer em que momento de sua vida ele recebeu olhar mais maléfico e frio.

— Obviamente, devo ressaltar que o ômega jamais me interessou o bastante para uma investida, Jeon.

— Nada de festas hoje – em contrapartida, Jeon apontou para a porta com queixo rígido. — Logo, não se demore tanto, Kim.

— Oh, por favor! Não se irrite comigo também, amigo. O que lhe fiz para me expulsar descaradamente? Chego a pensar que devo criticar o Sr. Park apenas para agradá-lo nesta conversa. Inviável, é claro! E não finja que você não tem grande curiosidade sobre ele. São pelo menos vinte cartas a respeito do meu vizinho que, obviamente, não morreria por suas mãos, já que elas também o tocaram mais cedo. Estou errado?

— Tanto quanto poderia estar, Kim! Primeiramente, o toquei porque ele estava desmaiando como um franguinho abatido! – Jeon fechou os punhos. — Em segundo lugar, em minhas cartas eu pergunto tudo o que de novo acontece pelo vilarejo. Por acaso, um homem ômega rende uma conversa e tanto! Em terceiro lugar; o que está insinuando, Taehyung?! Não responda! Se é meu amigo, ajude-me a espantar o ômega deste palácio. Me dará muito mais serventia.

— Minha omma contou-me que a família não o quer de volta, Jeon.

— Malditos interesseiros – ele vociferou e voltou a se jogar com as costas nos lençóis. — Custo a acreditar que Hoseok se ofereceu para comprar alguém. Para você ver como tenho bom coração, afinal, e não julgo o Sr. Park como sua língua perversa assim o diz. Mesmo aquele ômega merece um pouco de dignidade! Oh, mas todos me parecem estar muito contentes que Jaehye o tenha comprado! Não pretendo me estender no assunto, mas você precisa ouvi-lo, até que ele não soa tão entediante como eu cheguei a pensar. Tem personalidade, mas pouco temor pela minha fama. Que atrevimento, pois não? Você não ouviu o bastante! Acredita que ele mencionou o meu mal caráter? Escute mais, aquele franguinho ligou os pontos, ficou muito quieto ao me ouvir resmungar sobre tê-lo envenenado sem querer.

— Jeon!

— Ele é cínico!

— Não creio que você tentou algo assim, Jeon! – espantado, Taehyung cruzou as pernas e braços, mas Jeon ainda não havia desviado sua atenção do teto alvo. — E saiba que não irei ajudá-lo a fazer coisas do tipo com Jimin. Você não o conhece muito, se for tomar base apenas por breves comentários nas minhas cartas.

— O que você quer dizer, afinal?

— Ele não tem boa saúde – Taehyung respondeu com pressa e má vontade, por fim, tendo os olhos negros presos aos seus. — Aquela família é realmente pobre. São bocas demais para comer, mas pouco alimento em suas tigelas. Meu appa sempre comprou caixas de cenouras para ajudá-los porque tinha pena do mais frágil dos filhos: Jimin.

— Ele é doente? – com receio, Jeon voltou a se sentar reto e ansioso.

— Sangue fraco por conta de anos de desnutrição, vertigens por tomar Sol ou carregar peso, e ossos finos como vidro, pelo que eu ouvi de minha omma.

— Eu… eu não poderia saber.

Taehyung assentiu contrariado:

— Imagine aquele ômega ser tratado como alfa, apesar de não ter físico para lidar com tamanho esforço e fome. Não sendo o bastante, ele passou todos os anos de sua vida sendo humilhado por ser diferente, foi duramente agredido pelo pai. Eu o… eu o ouvi implorar por perdão por tempo demais, enquanto o pai o açoitava naquela casa.

Horrorizado, por fim, Jeon reconheceu que se colocou numa posição monstruosa. "Estou acostumado à culpa de ser como sou" foi a frase que Jimin lhe disse mais cedo, quando voltou a receber ofensas terríveis. Imaginá-lo sendo agredido por um alfa deu-lhe uma guinada no peito, lhe parecia absurdo que o pai de Jimin tenha cometido tamanha atrocidade e por tanto tempo. Jeon já desejava fazê-lo pagar por tratar seu próprio filho assim.

— Jeon, me escute – Taehyung pediu sua atenção outra vez. — Vejo que você compreende o quanto a situação de Jimin é delicada, ao menos agora você percebe. Sei que não estou em posição de exigir nada de um príncipe, mas faço este pedido ao meu grande amigo: Por favor, Jimin já sofreu mais que qualquer outro nesta vida, foi humilhado de todas as formas possíveis dentro e fora de seu lar. Então, meu príncipe, deixe-o em paz.

Mais populares

Comments

Perla_Rose384

Perla_Rose384

Tem meu coração.

2023-12-20

5

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!