Capítulo 20. Sofrimento

A Luna estava subindo pelas paredes, na Alcateia Black. Ninguém tomava uma atitude e nem tinha notícias. Viviam a vida como se nada estivesse acontecendo. Então, ela abriu sua comunicação mental com seu pai e ficou sabendo que já havia terminado tudo por lá. Todos os guerreiros da Alcateia Black estavam mortos, o Alfa Túlio havia fugido e provavelmente não demoraria a chegar na Alcateia Black.

— H E N R I Q U E E E!!!!!

Henrique ouviu o grito da Luna e correu até ela, com medo de ter acontecido alguma coisa ruim. Chegou rapidamente onde sua mãe estava e a viu  desesperada.

— O que foi, mãe?

— Estão todos mortos, filho! Estão todos mortos…

— Como assim, mãe? Quem está morto? Meu pai?

— Teu pai foi o único que sobreviveu e fugiu, meu pai disse que todos os lobos da nossa Alcateia, que foram para a guerra, morreram.

— Como?

— Ele atacou a Alateia do seu avô e houve represália, estavam lutando quando Luana chegou com seu bando e atacaram seu pai, mas seu pai não morreu, então atacaram os guerreiros e mataram todos eles.

Henrique ficou desolado, olhou em volta de si para toda a Alcateia, não sabia quantos guerreiros haviam ido, mas com certeza, agora estavam muito desfalcados de machos. Haviam ficados muitas viuvas, filhotes e idosos, que não viveriam muito sem os guerreiros.

— Como isso foi acontecer? Meu pai nunca perdeu, como será daqui para a frente? — disse Henrique, desnorteado.

Ele não entendia o que estava acontecendo em sua vida, pois tudo estava uma bagunça. Era a vida violenta com seu pai, aquela fêmea estranha, fantasmas do passado, acasalamento que não deu certo e agora, não tinham mais guerreiros.

— O que está acontecendo conosco, filho? Parece que estamos amaldiçoados.

— Sim, parece. Por quê a senhora não vai para a Alcateia Branca e fica lá por um tempo?

Henrique estava preocupado com o retorno do seu pai, se ele perdeu a guerra, voltaria furioso e descontaria em sua mãe, com toda a violência que era capaz de praticar.

— Não se preocupe, eu sei o que fazer, vou sumir e ele não vai me achar, pensará que eu fui embora, mas estarei aqui, vigiando ele de perto. Não vou deixar a minha Alcateia na mão de um louco.

*

A terra parecia chorar pelo sangue de tantas vidas, derramado. Alfa Julio olhou tudo com pesar e mandou que seu povo envolvesse cada corpo e enviasse para a Alcateia Black, para a devida cerimônia. Avisou sua filha e Dimas foi acompanhando os corpos. Denise queria acompanhar seu companheiro, mas ele achou melhor ela ficar e no dia seguinte, partiu.

A flora e a fauna estavam silenciosas, temerosas com algo que podia matar, mas não podia morrer. Aquela coisa em forma de lobo, corria como um louco, perseguida pelo que pareciam labaredas azuis. Ultrapassou terras de outras Alcateias e conforme pisava, queimava e marcava o solo com suas pegadas.

Chegou às terras da Alcateia Black, correu para o lago e pulou dentro, para esfriar o seu corpo superaquecido. As labaredas azuis foram embora e quase secou o lugar onde ele pulou, até voltar ao seu curso normal.

Voltou à forma humana e se retirou, exausto, das águas do rio. Deitou-se na margem e ali ficou, quase desfalecido. A Luna sentiu a presença dele e na forma de sua loba branca, correu até as proximidades. Viu o corpo jogado na margem, mas não se aproximou, deixou ele lá e voltou para casa.

Ela voltou para casa, desceu ao porão, onde mantinha suas poções e pegou as que precisaria. Subiu ao seu quarto, fez duas malas de roupa e transportou para um quarto secreto, no último andar. Ficaria escondida naquele quarto e vigiaria de perto o alfa. Utilizando suas poções para ocultar o seu cheiro e a sua presença não seria percebida.

*

Luana esperava a resposta da xamã, quando sentiu a presença de Henrique e liberou sua entrada, apesar de não querer ele por perto, mas queria saber como estava a Alcateia.

Ele entrou rapidamente na sala, foi até ela e a abraçou apertado cheirando o seu pescoço. Foi algo que a pegou de surpresa e não sabia o que fazer. Então, deixou ele ficar ali, sentindo seu corpo e cheiro, até se acalmar.

— Morreram quase todos…

— Sim, era previsível, é a lei do retorno. — disse a xamã.

Henrique se afastou de sua Luna, para olhar a xamã. Sabia do que ela estava falando, entendia, mas o sofrimento era atroz. Sempre ouviu que mataram todos, agora foram eles os exterminados. Parecia que voltou a ser um menino e não tinha esperança.

— Dói, não é? Imagina os remanescentes das Alcateias dizimadas por seu pai? — disse Luana, segurando seu rosto em frente ao dela, para fitar seus olhos.

— Eu já estou sentindo isso, você está pisando na ferida. Não sente também? Você cresceu com eles.

Ela parou, ficou olhando para ele e lembrou de todos aqueles homens fortes que treinavam para a guerra, como se fosse uma guerra justa, como se fossem lutar para ter uma vitória decente, mas era tudo um engodo do Alfa Túlio, por algo que eles nem desconfiavam.

— Sim, sinto por eles, mas seria pior se continuassem a matança. Entende?

— Não, não entendo, nenhuma vida merece morrer assim.

Se afastou dela e olhou a xamã, perguntando:

— Pode explicar ou dar um consolo?

— Não tem consolo, é o que é, vaidade, ganância, arrogância, um pacote de anseios egoístas que pervertem o que deveria ser bom, em algo ruim.

— E o que isso significa? — insistiu ele.

— O Alfa Túlio quer ser soberano, o supremo de todos e viver para sempre. Para isso, fez um pacto de sangue, que o protege da morte, mas o está deixando louco.

— E o que podemos fazer?

— Descobrir com quem foi feito o pacto e onde está, para acabar com ele.

— Um pacto assim só pode ser feito com alguém muito poderoso, você sabe com quem foi? — perguntou Elias, se pronunciando pela primeira vez.

— A questão não é essa, é onde o Alfa Túlio a escondeu.

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