Intrometido

As coisas estão começando a ficar perigosas. 

Não sei o motivo, mas esse pensamento percorreu o raciocínio enquanto observava o exército inimigo chegando cada vez mais perto, seus gritos de guerra, extermínio iminente, aura assassina com sorrisos maliciosos. Consigo entender sua maldade, ao mesmo tempo que a repudio. Minha mente se perde nesse conceito tão amplo quanto bem e mal, certo e errado. 

O que eu faço? 

A vila inteira, depois da festa que tivemos hoje, está correndo contra o tempo para mover os não guerreiros e crianças para longe, enquanto os demais se organizam para priorizar a morte dos mais velhos. A movimentação deles é rápida e organizada, montando a tática em segundos. Quando montada, os líderes começam seus discursos motivacionais e brindam junto de todos antes de começarem a contenção das forças inimigas. 

Magia percorre o campo de batalha, com mana e sangue escorrendo, sangue esse que são do mesmo povo, independentemente de serem separados. Outra coisa que entendo, mas repudio… 

Não há nada que posso fazer? 

Junto de Mordred e os demais, vamos terminando o círculo de teleporte para perto da jurisdição do vampiro. Conforme famílias se despediam aos sons da guerra, vía a aura começando a tomar o lugar e percebia a ausência de certas figuras. 

Noemi, Ryou, Susie, Susan, Avery. Onde estão? 

— Mordred, cadê os outros? 

— Vão ficar, proteger este lugar até o fim. 

— E nós? 

— Estamos fazendo o que o contrato permite. 

— Por que só não… 

— Boris, essa é uma das cinco regras principais dos Unelure, decretadas pelo meu pai; não podemos interferir sem um contrato. 

Meu silêncio denúncia meu desgosto pelas correntes impostas sobre nós. Que tipo de tirano é o pai de Mordred? Ainda mais se carregar o nome do rei dos cavaleiros, ele realmente mudou depois de tanto tempo como Avery afirma? 

— Pode me emprestar aquele pergaminho, rapidinho morcegote? 

— Toma aqui. 

Jogava pra mim enquanto terminava de concentrar sua mana no feitiço. Se os planos se realizarem como esperamos, o lorde fica exausto, mas conseguimos garantir a segurança de todos que estiverem no círculo. Uso minha técnica restritiva, lendo todo o conteúdo e o gravando em minha mente em questão de poucos minutos. 

Eu sei o que devo fazer. 

— Pensa rápido! 

Antes de conseguir pegar, Mordred é acertado na cabeça pelo pergaminho lacrado naquele tubo de metal com símbolos estranhos, ficando um pouco tonto, dando tempo para que eu saia do círculo. 

— Onde você tá indo? 

Luke, percebendo meus movimentos, parava na minha frente, segurando sua lança firmemente enquanto criava uma grande barreira de vinhas. Atrás, chegava Miriam que agarrava firmemente meus ombros. 

— Não pode ficar fora do círculo, ou vai ter que voltar a pé, Boriszinho! 

— Vai ser bom pra fortalecer as batatas, estão um tanto quanto moles ultimamente. 

— Sabia que palhaços recebem salário? Que tal ir pro circo ao invés de ficar fazendo piada de graça? 

— Não estou brincando, eu vou sair desse círculo vocês querendo ou não tá ligado. — Apenas faço meus ombros sumirem e começo a andar pra frente. — Tipo, não sou muito de ficar parado nesses barracos, adoro participar quebrando a 51 em alguém. 

— Nosso contrato não permite. — Luke parecia bem nervoso com minha atitude — Quer realmente tentar a sorte com o julgamento do pergaminho? 

— Deixa disso Lukão, o idiota que fez o pergaminho e detalhou cada parte deixou um monte de brecha, vou usar uma agora mesmo, quer ver? 

— Te desafio. 

— O que ganho? 

— Dispensa do treino por um mês. E eu ganho seu treino dobrado. 

— Fechado! 

Em apenas um segundo, conecto todas as criaturas com seus respectivos dentro da minha habilidade de polimorfose, fazendo com que fiquemos conectados. No segundo seguinte, vários ataques ocorrem por todo meu corpo, destruindo completamente minha roupa e fazendo meu sangue sair para todos os lados, fazendo com que ambos meus amigos fiquem desesperados. Regenero os danos depois de alguns segundos e ando pra frente. 

— Segundo a regra 3.2.11 do pergaminho, qualquer integrante pode agir em legítima defesa contra agressores. — Ataco e mato um soldado que avançava de forma indolor. — E como pode ver, ela está em vigor no momento. Poxa, seria uma falta de respeito eles atacarem um integrante dos Unelure e nem sequer pagarem o preço, né? 

Luke e Miriam ficam mudos, enquanto Mordred gargalha, saindo de sua invisibilidade e dando um tapinha nas minhas costas molhadas de sangue. 

— Você é maluco! Eu usei essa desculpa algumas vezes, mas não nesse nível! 

— E então, tá liberado a baguncinha? 

— Não se esqueça que o sangue de pais e mães estarão em suas mãos. 

— Vou me conter, não vai ser todo mundo. Só quero os fazer recuar e evitar mais desgraça. 

— Nunca te vi tão proativo. — Joann vinha cuidando de uma bebê, balançando-a gentilmente. — Não era você que não se envolvia nesses assuntos? 

— Pois é, pensei que você iria ser o primeiro a sair daqui! — Harlot vinha, usando suas cobras para distrair duas crianças que estavam sendo levitadas com sua magia — Tá com febre ou coisa do tipo? 

— Nah, só tô lembrando das vezes que não meti minha cara e fiquei arrependido por muito tempo. Além do mais, gostei desses caras, fazem meu tipo de gente. Baderneira, diversificada e maluca. Que nem vocês. 

Eles acabam rindo junto comigo. Logo depois, cada um dá um tapinha nas minhas costas e vão para seus lugares proteger as pessoas. Mordred, antes de partir, me avisa:

— Quanto a Calamidade, apenas a segure por tempo suficiente até que voltemos, beleza? 

— Pode deixar, chefia! 

Colocava a mão em meu ombro e encarava com seus olhos Escarlate:

— Sei que está preocupado com a vida deles, mas saiba que sua vida importa tanto quanto. Principalmente pra gente. 

O tranquilizo ao responder:

— Eu aproveito cada experiência que ela proporciona, mas não sou de joga-la fora facilmente. 

— Assim que gosto, meu nego! 

— Leu meu compilado de gírias? 

— Achei umas interessantes. Depois pode me explicar o que significa “Tá chamando Urubu de meu Louro”? 

— Pode deixar! 

Com o último tapinha vindo do lorde, o círculo de teleporte completava seu ciclo e uma enorme luz abria os céus enquanto todos ali presentes sumiam. Quando solitário, surgem duas presenças, uma divina e outra demoníaca, que ficam bem perto de mim. Lilim já agarra meu braço, dando pitaco:

— Que tal explodir a cabeça dos superiores e depois exterminar o comandante no meio do ar? 

Por outro lado, Uriel andava junto, fazendo o tempo correr diferente para que não se desperdice mais vidas. 

— Na verdade, só a imobilização da figura mais forte ou representativa faz com que os corações sem fé se percam. 

— Mas isso é muito chato, Tio! Não participamos em guerras para serem chatas, sabe! 

— Sua adolescência é idêntica à do seu pai, rebelde e niilista como ninguém! — Uriel então parava no meio das tropas inimigas. — Bem, siga assim como sua vontade e consciência desejar, luzinha. O Senhor concedeu o livre arbítrio para ser utilizado, no final das contas. 

— Vou seguir sua dica, com um pouco do exagero da Lilim. 

— Equilíbrio acima de tudo? Caramba, mudou muito, seu pirralho. — A demônio beijava minha bochecha — Pra dar boa sorte. Vai precisar. Tchau, vou ver o que consigo arrumar nesse caos! 

— E eu preciso voltar a guarda do Éden. 

— Valeu pelos conselhos, gente. 

Conforme o tempo começava a voltar ao normal, minhas lembranças sobre aquele ser brilhante percorrem todo meu corpo, lembrando me do seu sorriso qual não pude proteger, apenas por querer “ficar na minha”. Beijo meu colar, que fica bem preso ao meu corpo, seu último presente. 

— Eu não vou falhar de novo, pode confiar.

Encosto no chão e faço o solo se alterar subitamente, fazendo árvores de diferentes tipos e tamanhos surgissem ao redor e prendessem os inimigos dentro de seus troncos, incapacitando aqueles que não tiveram tempo de sentir o desespero. Para aqueles que ficaram fora do aprisionamento, fiz com que recuassem devido a situação. 

Na frente de alguns mortos, estavam os Onis com seus konibos e odachis, estranhando meu envolvimento. Ainda não achei quem quero, então vou avançando enquanto os procuro com os instintos a um milhão e meio, isso ainda é pouco para falar a verdade. Antes de continuar completamente, lembro-me da Shinigami e grito bem longe para escutar:

— Melhor tomar cuidado com os arredores, esses daí são uns covardes de irem chorar pra mamãe na beira da parede! 

— De mim não passa mais nada! 

Deixando o restante pros habitantes, consigo sorrir em meio ao caos ali presente, sabendo que agora a única morte que ocorrer será nas forças opostas. 

Saio correndo, transformado numa mistura de puma com onça, percorrendo a grande montanha com as patas ásperas até onde podia sentir a força vital dos meus amigos desaparecidos. Sentindo o cheiro de sangue, me apresso em níveis astronômicos, até finalmente os achar. 

Sabia que estava esquecendo algo, que merda. 

O grande Machado rasgava a terra, contendo em sua lâmina uma essência da própria tempestade, lançando-a no final do corte como um mero bônus para aqueles que ficavam atrás dos corpos decepados. A eletrocutação era o suficiente para apagar um Jubilo, o que fazia com aqueles tão menores seres era os dizimar a base de pura energia. 

Em meio a legião de corajosos Yokais, estavam meus queridinhos, já machucados contra a grande besta que estava ali. Em meio a uma ilha que não possui sabedoria para lidar com tal predador, este realmente se torna uma calamidade. 

Vestindo pedaços cortados de túnica vermelha, com pequenas partes metálicas como armadura, uma sandália espartana e alguns adornos dourados, estava ali o oponente mais formidável que já havia visto, pela segunda vez. Seus chifres, avermelhados na ponta e negros na base, para combinar com sua pelagem cheia, eram o que denunciavam sua classe especial em meio a raça dos Minotauros, pois nenhum outro tinha um corpo tão humano, muito menos a face. 

Uma calamidade é o espírito retornado de algum herói ou monstro, atormentado pelos arrependimentos de sua vida. Se concluírem o objetivo que lhes foi dado, estarão livres para uma segunda vida. Mas por que de todos que poderiam surgir, veio logo você?! 

— Vrontí!

Uma grande nuvem carregada surgia acima de todos, logo após a convocação do minotauro, os raios caiam em sincronia, um após o outro, e para a surpresa de muitos, a filha mais nova do general vinha aparando cada um deles com suas lâminas junto da maestria na técnica de domar o relâmpago, um presente de seu avô, Susanoo, Deus das tempestades. 

A Oni, um tanto nova para ser uma combatente, avançava em meio aos homens como uma verdadeira tempestade, lançando seus cortes ampliados com energia e fogo na grande calamidade, que ficava atordoado com o impacto, cuspindo sangue antes de ser alvejado por bolas de fogo azuis que carregavam espíritos vingativos, vindo de uma Híbrida kitsune. 

Yakko, em meio a batalha, havia despertado seu potencial ao utilizar a forma Híbrida entre sua forma humanoide e real de raposa, ganhando mais uma cauda, consequentemente, mais força. Os ataques não paravam, com um pequeno dragão rondando o Minotauro e usando suas forças para criar verdadeiros tsunamis para atacar, além de morder firmemente e enrolar o inimigo, dando espaço para que ambas as bruxas fizessem sua rituais para atacar, criando cordas para controlar os movimentos de Asterius, enforcando com as outras cordas ainda mais fortes. 

Por fim, Avery utilizava seu gelo e magia primordial para apagar quem tentasse chegar perto, protegendo todos ali com barreiras e auras fortificantes. 

Um trabalho em conjunto digno de filmes de ação, mas sei que isso não vai ser suficiente para conter esse furry raivoso, então já me jogo da parte onde estava para resgatar Ryou, o mudando para a forma Híbrida, e Noemi, a fazendo ficar um pouco mais musculosa, e saindo para longe. Afinal de contas, diferente da guerra entre dois lados, não preciso fazer um show de bolice pra lidar com calamidades, esse é meu trabalho afinal! 

— Sensei! 

— Gēge! 

O Minotauro faz uma descarga elétrica e mágica, derretendo quem estava muito próximo e curando seus ferimentos, bufando enquanto me encarava. Coloco ambas as crianças no chão e fico pronto para atacar, imbuindo meu corpo com a técnica que aprendi no clã, algo exclusivo da humanidade. 

— Há quanto tempo, não é? 

— Você, como?! 

Faço com que todos saiam dali usando algumas runas para os teleportar, salvando alguns feridos no processo. Queria fazer com que esses meninos também fugissem, mas a chance de que voltem é muito alta. Ao menos, vou garantir sua segurança aqui, nem que isso custe minha vida. 

— Os quatro gringo aí, fiquem com a minha prima e procurem por oportunidades, entendido?!

Parando pra pensar agora, eu que sou o gringo aqui, afinal tem tipo, quatro asiáticos, duas europeias e a minha prima que agora é inglesa. É, acontece.

Me preparo para o primeiro ataque, correndo bravamente enquanto esquivo dos ataques do machado eletrificado do minotauro, visando acertar seu torso após conseguir subir em seu braço.

— RECEBA!

Quando meu punho encosta na pele do meu inimigo, imediatamente ativo meu acerto crítico, fazendo com que uma pequena estrela fique marcada em minha visão. Acerto-a de imediato com um segundo soco, fazendo todo o ar do lugar se dissipar, deixando-nos num momento silencioso antes que o baque do golpe o atinja, causando uma repulsão extrema qual faz o chifrudo sair voando e parte de seu sangue saia junto, além de um dos machados ficar quebrado no processo enquanto se agarrava para ficar na montanha. Um pouco de fumaça saia dos meus punhos, junto de um pouco de sangue caindo. Caramba, tô enferrujado mesmo...

— Boris!

— A nossa missão aqui é segurar esse boi brabo até o Mordred e os outros voltarem!

— Entendido!

Avery entra em sintonia com a natureza a volta, deu pra perceber devido a troca da cor de seus olhos e cabelo para o verde bem vivo. Depois, uma onda de cura é realizada ao redor deles, restaurando todas suas energias enquanto a mana voltava a seu estado normal, fazendo o núcleo de cada um se estabilizar depois dos minutos exaustivos que estavam aqui.

— Vocês ouviram aquele pintor de rodapé, então, façam o favor de ficarem vivos até os superiores chegarem!

— QUEM VOCÊ CHAMOU DE PINTOR DE RODAPÉ?! — Volto um pouco do caminho para chacoalhar Avery pela gola de seu quimono — TÁ ACHANDO QUE SÓ PORQUE É DOIS CENTÍMETROS MAIS ALTA QUE EU TÁ PODENDO TUDO NÉ?!

— Eu não tenho culpa se você tem 1,69 primo, culpe a genética!

— AH SUA PI...

— Ele tá voltando! 

O aviso de Susan nos separa, ficando prontos no instante que o machucado corninho retorna, seu peito ainda sangrando e seus olhos vermelhos encarando-nos como sua próxima presa, com baba escorrendo de seu rosto e uma feição que, quando vivo, nunca havia feito.

Tomo a frente, ficando como o escudo dos novatos, mas principalmente, como quem vai livrar um amigo do estado deplorável que está.

— ASTERIUS! — Faço minha voz ecoar como um rugido jurássico — É MELHOR QUE ESTEJA SENDO CONTROLADO, POIS SE ESTIVER FAZENDO TUDO ISSO POR CONTA PRÓPRIA, EU FAÇO QUESTÃO DE TE REVIVER PRA DEPOIS TE MATAR DENOVO!

Em resposta, o ensandecido herói meio-monstro usa um grito de guerra que amplia seus já excêntricos e incríveis níveis físicos, ao mesmo tempo que uma marca surge em seu peito por alguns instantes. Seja lá quem foi que fez isso com você, vai pagar caro, eu lhe prometo.

— Beleza gurizada, é o seguinte, sempre que atacarem, recuem logo em seguida. E quando eu mandar sair, É PRA SAIR, beleza?

— ENTENDIDO!

Abro um leve sorrisinho, mesmo com a situação sendo um tanto quanto fodastica pro meu lado.

— Então, vamos à luta!

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