Convivência

— E foi assim que paramos naquela seção de correria. 

Depois de ficarmos duas horas inteiras ouvindo o depoimento da irmã mais velha das bruxas, Susan, conseguimos compreender minimamente a situação estranha a qual viemos nos encontrar. 

— Esse foi o maior elefante na sala que já vi, Mordred. 

— Não sei o que significa essa frase, mas concordo. 

Estávamos ambos abismados com a história, principalmente com a parte de fugir em diferentes eras. Ao menos, essa Deusa as concedeu uma bela proteção. 

— Então, seu destino é a Terra dos Youkais, correto? 

— Exatamente. 

— Até conseguimos ir para esse lugar, mas vai demorar ao menos uma semana até que o teleporte fique pronto. — O vampiro ruia as unhas. — Ainda mais com aquela proteção idiota. Bem, enquanto isso não ocorre, minha casa é vossa casa, semhoritas. O humano aqui vai os apresentar pro lugar todo! 

— Ei! 

— Não se preocupem com as frases e o sotaque dele, no fundo, continua sendo um doce de pessoa! 

Fui calado com um elogio e uma bagunçada de cabelo. Ainda bem que deixei ele curto desde que vim parar nessa treta toda de esquadrão. Me levanto da mesa, pegando um dos pirulitos e fazendo a felicidade da Susie, a caçula das visitantes. Percebo o interesse da mais velha e então a entrego um também. 

— Só me acompanhem, vai ser bem longa essa viagem. 

Falo enquanto saio andando de forma descontraída pela casa, indo para os pontos mais interessantes primeiro, usando das portas entrelaçadas por magia espacial para ir as salas legais. Junto das crias da magia, aparecemos no aquário, com inúmeros seres aquáticos nadando sem problema no Grande oceano. Os olhos de Susie brilham como estrelas ao ver as criaturas, grudando sua cara no vidro.

— Essa é nossa sala de vidro no meio do mar. — Falo enquanto vejo um tubarão de dois pares de barbatanas comer uma baleia em miniatura. — Sempre gostei da água, e vocês? 

— Aqui é bem bonito mesmo. 

— MANA, UM PALHAÇO! 

Vejo ao longe um pequeno peixe palhaço com listras brilhantes, indicando seu alto nível mágico. Antes que possa ser usado de petisco, o puxo com meu controle elemental único, fazendo uma pequena bolha de água e a mantendo no ar enquanto pego um pequeno aquário circular para colocar o peixe, entregando-o com cuidado para a garota, que fica extremamente animada. 

— Toma cuidado pra ele não te matar de rir. 

— Que piada ruim. 

— Acontece, eu sou um palhaço pra essas coisas. 

— Hahaha! 

Abro a porta pra sala seguinte, as deixando entrar primeiro, indo atrás fechando a porta. Susan fica encantada, como fiquei ao ver a grande biblioteca universal dos Unelure, um lugar imenso com tanta informação que Alexandria fica com inveja. Empurro a escada enquanto me mantenho equilibrado, pegando um grimório antigo das linhagens bruxescas e alguns segredos mágicos, feito por um tal Álvaro. Chego perto de Susan e a entrego, junto da data para devolve-lo. 

— Isso é incrível… 

— Vou chamar você de… — Susie pensa bastante antes de falar. — Feddy! 

— Freddy? 

— Feddy! 

— Tudo bem, pequena. — Faço carinho em sua cabeça, tomando cuidado para não bagunçar seu cabelo. — Vamos ir pegar comida pro Feddy, então? 

— Por favor! 

Pego na sua mão e levo o peixe comigo, vendo Susan hipnotizada pelo conhecimento do seu próprio povo, algo arcaico que ficou escondido por muito tempo.

Depois da Biblioteca, passamos por muitas outras salas, desde o tesouro acumulado até os topos de montanhas ou vórtices de tornados intermináveis. Ao voltar para o salão principal, vou com as bruxas até a sala de jantar, onde o senhor Joann terminava de arrumar um grande banquete, como o de costume. Luke e Miriam já haviam furtado as asas do frango, e Harlot bebia vinho como se fosse água, junto de Mordred. Eles não ficam bêbados com isso, acho incrível. 

Nos sentamos a mesa para fazer mais uma pausa no nosso dia e conversar, mais que o normal, sobre nossos afazeres e gostos pessoais. Quem começa a conversa dessa vez é Harlot, que anuncia;

— Espero que todos estejam liberados no final desse mês, pois não irão perder a estreia de "Escarlate II: Fatal Blood"!. A participação do Reyrey me fez ficar bem relaxada nos ensaios, como pode um ser tão doce conviver num estúdio daqueles? 

— Igual a senhorita fica, de cabeça levantada e magnífica. — Respondo para aumentar um pouco seu ego, o que dá certo. 

— Bem, eu vou de qualquer forma. A floricultura tem andado meio parada, os jovens de hoje em dia preferem dar doces ou outras coisas de presente. 

— Por que não adiciona isso na sua loja, amor? — Indaga Miriam. 

— Pode ser uma boa oportunidade, mas não quero desfazer os comércios vizinhos. Qualquer coisa, eu fecho a loja e volto a ser aventureiro. 

— Que bom que você tocou no assunto, Luke! — Mordred fala com seus óculos de leitura analisando algumas fichas. — Foi uma semana de promoções, três aventureiros foram para a classe dois e quatro para a classe um, isso só na Guilda dos Toxic Rats! 

— Tá estourando tudo, tem que tomar cuidado ruivo, ou vão querer te jogar alho! 

— O máximo que acontece é uma pequena dor de barriga. — Brinca Mordred. — Aliás, Boris, tem certeza que não quer fazer sua carteirinha de aventureiro? 

— Na verdade, eu até faço, só não quero fazer as provas de caça aos monstros. 

— Por que? É a parte mais legal! 

— É como eu passar manteiga na manteiga, continua sendo sem graça se não fritar! Só tem bicho fracote ou dócil na lista. Ou eu mato numa porrada ou eu trago pra casa como um cãozinho. 

— Faz sentido… 

Antes de continuarmos nossa discussão, que se iniciou alguns dias depois que entrei na família, tiro o elefante do telhado colocando o assunto do momento em pauta:

— Beleza, como vamos lidar com as irmãs Addams ai? 

— Eh? — Susie faz um barulinho enquanto se delicia com um pão frito. 

— Tem um quarto grande lá em cima, só precisa de umas reformas antes delas poderem usar. 

— Já entendi o recado. — Harlot sai da mesa depois de virar uma garrafa de vinho. — Miriam, Boris, vocês me ajudam? 

— Podeixar! — Respondemos sincronizados. 

Subindo as escadas, rapidamente chegamos no local designado e vemos o estado deplorável do quarto, isso sequer pode ser chamado de quarto? 

— Eu vou pegar a vassoura… — Sai Harlot. 

— E eu, as tintas… — Sai Miriam. 

Vendo o estado daquele local, tiro as luvas que ando usando na minha mão, e tento algo novo, para deixar o trabalho mais fácil. Conectando-me com a própria essência da realidade, sinto tudo de uma forma diferente, isso fica ainda mais perceptível para mim, devido aos sentidos aumentados. Depois, começo a moldar o vazio através dos meus sentimentos e visão, formando algo sólido o suficiente para sentir na palma da minha mão, alterando completamente a percepção do mundo sobre o que estou enxergando, modificando seu cerne e por fim despertando, para ver o trabalho. 

Coloco a luva rapidamente, pego alguma coisa aleatória do chão e finjo estar cansado ao ouvir os passos das damas chegando. Ao verem o novo formato do quarto, já com camas e algumas decorações, ficam abismadas. 

— Foram apenas cinco minutos, como você fez isso?! 

— Tenho o dom pra reforma, eu acho. 

— Hehe, muito bem pequeno! — Miriam bagunça meu cabelo — Acho que é só passar uma vassoura e estará pronto para as bruxinhas. 

Elas me liberam depois do meu "árduo trabalho", então saio tranquilamente para meu quarto, que fica no sótão, onde montei minha pequena base de projetos e táticas, além do meu ambiente seguro onde posso ler ou escutar músicas de qualquer lugar do mundo. Ah, as obras que outros humanos deixaram pelo mundo, completas pelas minhas mãos, são incríveis. E ainda tem muita gente que nós subestima, tsk tsk. 

Estava apenas pegando uma outra blusa com capuz quando escuto o trancar do meu alçapão, junto de uma aura demoníaca e um perfume forte. Suspiro, viro tranquilamente, e vejo quem é minha visita… 

— A que devo a presença da filha do capeta? 

— Deixa de besteira, Luzinha. Você já fez o que devia, só vim pra ver como anda mesmo. 

A linda mulher de olhos rosas, pele bem morena, um cabelo claro e uma roupa branca é Lilim, a que deu nome a raça, filha de Lúcifer e Lillith. Quando era mais novo, ajudei a garota com seus problemas familiares e ganhei uma amiga pra vida e morte toda. Literalmente, condenado ao inferno, depois que Lúcifer conversou com seu pai e o convenceu de que um novo mensageiro entre os dois planos seria incrível… 

— Tudo bem por aqui. Consegui uma família e agora tô ajudando umas bruxas. — Jogo um chocolate amargo pra ela, seu preferido. — E tu? Como anda o inferno? 

— Mais bagunçado que nunca. Teve uma leva de gente chegando, e um monte de demônio expurgado e sendo resetado. Aliás, valeu por ter eliminado o Eligor. 

— De nada, ele só tava me irritando mesmo. 

— Ah, entendi. 

— Boris! Pode vir aqui, por favor?! 

Escuto a voz de Miriam, parecendo um pouco Urgente. 

— JÁ VOU! — Respondo saindo do canto do quarto e apontando para um baú. — Pode levar, tá cheio de doce que tu gosta. 

— Obrigado, Luzinha ~ღ

Recebo um beijinho na bochecha antes da demônio sair com meu baú de doces para o plano infernal, liberando o alçapão e assim podendo sair correndo até o salão, pulando do terceiro andar pro solo e sentindo um pequeno baque. Lembrei que não to num anime, ah, droga… 

— O que aconteceu? 

Chego perto da situação que está ocorrendo e vejo Susie transpirando com uma grande marca que percorre suas costas até a bochecha. Coloco minha mão sobre sua testa, enquanto lentamente deixo o plano material, transferindo meu espírito para dentro do plano imaginário de dentro da garota, vendo um grande "câncer" em seu cerne. Que merda, uma maldição específica, agora entendo o porque de terem de ir pro Reino dos Yokais. Volto para meu corpo, utilizando de meus dons divinos para amparar a garota e conter sua maldição, deixando-a num sono profundo com belos sonhos. 

— Mordred, a gente precisa acelerar essa visita até os Yokais, pra tipo, ontem. 

— Entendido. — Com entreolhares, todos se vão, para pegar o que precisarem. — Pegamos um caso bem raro, não é? 

— Nem me fala… — Lembro-me de uma pessoa que conheci Há anos atrás, uma senhorinha, com esse mesmo tipo de maldição. — Não se preocupa, bruxona, pode deixar que a nossa tropa vai desfazer essa maldição em duas pedaladas! 

— Obrigado… — Pega sua irmã no colo, vendo que está sorrindo, acaba deixando escapar uma pequena lágrima. — Eu confio completamente em vocês. Prometo que darei uma recompensa a altura! 

— Não é como se precisássemos. — Mordred, o dono de sei lá quantas guildas e uma mente brilhante em exatas, acaba deixando escapar. — Apenas seu bem é uma recompensa a altura. 

— Tá com tudo em carisma é?! — Falo indignado com o tanto de aura de protagonista saindo desse cara. — Vou pegar meu bebê lá em cima, podem ir saindo, chego em vocês logo. 

— Tudo bem. 

Os deixo, saindo correndo escadas a cima, ou melhor, parede a cima, usando minha metamorfose para ficar igual um bode da montanha para escalar até o sótão. Coloco uma roupa mais propensa para luta por baixo das roupas casuais, o meu escudo-tudo, e um saquinho de pirulito que deixo no armazém dimensional. Me estresso facilmente, então uso o açúcar como acalmante, junto de umas ervas que coloco nos doces. Isso eu não conto pro restante, vai que acham que sou o Zé Pequeno. 

— Vai ter uma aventura e tanto naquele lugar. 

Mais uma visita, que dia mais movimentado. Dessa vez, é exatamente do oposto da Lilim. Com um terno preto com camisa azul e gravata vermelha, cabelos negros e olhos laranjas com um leve tom branco e uma aura imponente de fogo do Éden, o Arcanjo que me guia, Uriel, acaba me ajudando a pegar meu colar que estava no alto. 

— Pra você sair da porta do Éden pra vir aqui, coisa boa não é. 

— Relaxa chocolate, não quero que você derreta de uma vez. 

— Não me arrependo de te fazer assistir as branquelas. 

— O que quero dizer, é apenas para ficar atento enquanto estiver naquele Reino. As movimentações da balança estão bem agitadas pela região, logo, terá um grande desafio surgindo naturalmente nos próximos meses. — Ele me faz um cafuné — Rezo para que o pai maior lhe permita sair antes dessa provação. 

— Obrigado Uri. Vou ficar de olhos abertos. 

— Boa sorte! 

Em uma brasa que some repentinamente, se vai meu anjo protetor, e começa uma missão contra o tempo. Um grande desafio, hã? 

— Borisss!

— TO INDO, JESUS! 

Desde que não envolva minha família, não teremos que sair na porrada na porta da escola, ou do Reino no caso. 

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Comments

artie_

artie_

Boris metaforando?

2023-06-21

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