Caminhar

O sol acabava de raiar, demonstrando todo seu esplendor num céu aberto á mil maravilhas, fazendo com que a flora reagisse e a fauna começasse seu ciclo diário. Em meio ao caminho que sigo, de pés descalços, escuto as risadas de pequenos seres que se escondem em meio as árvores, debochando de minha aparência. Pouco me importa, apenas prossigo meu caminho, indo até o começo daquela enorme montanha da qual vi nas fotos que achei no diário da última pessoa que me deparei. Observando melhor, vejo os galhos e alguns ótimos pontos para escalar. Seria um problema e tanto ficar preso em algum lugar no meio dessa escalada, entretanto, possuo algumas habilidades físicas impressionantes, logo, não me é um problema essa pequena aventura.

Um salto para começar uma disparada até o topo, fazendo a matéria que é meu corpo se modificar, transformando-me em outro ser, um animal que pode facilmente passar da dificuldade de subir essa montanha, até chegar ao topo dela. No pico, onde um frio intenso aguardava, volto a ser humano. Fico encantado com a belíssima vista do sol se erguendo em meio aos céus, além do gramado que de forma bela e divina se estabelecia num ambiente tão gélido. Chego perto da ponta da montanha, tiro de meu armazém mágico um pequeno saco com cinzas dentro, o abro com pouco esforço e por fim jogo as cinzas de um velho amigo aos ventos daquele pico.

— Espero que no fim tenha gostado, ou juro que na próxima vida irei lhe esganar por ter me feito andar tanto, Samuel.

Fico mais um tempo naquelas condições, observando as cinzas lentamente serem consumidas pelo mundo enquanto vagavam sem rumo pelas linhas do vento. Sento-me em meio ao gramado e puxo um pequeno bloco de notas, onde risco a última das minhas promessas com esse amigo, assim ficando livre para poder seguir meu caminho sem nenhuma dor de cabeça.

Começo a descer a montanha de pouco em pouco, ajudando alguns seres naturais dali a reencontrarem seu caminho ou colocando os pássaros de volta em seus ninhos, até chegar em uma altura razoável para pular e cair em meio as árvores, escorregando até o solo, onde posso mais uma vez fazer minha caminhada.

Mesmo sem um objetivo em mente ou algum lugar para ir, apenas prossigo com minha jornada, querendo entender melhor o que desejo ou o que preciso fazer pra ser relevante neste mundo. Seria eu uma peça do destino, ou algo a mais? É exatamente isso que quero entender, e que jeito melhor se não andar sem rumo e descobrir os prazeres da vida apenas se deparando com eles ao acaso?

Passo um tempo na floresta, sentindo o ar puro passar por mim, enquanto criaturas seguem seu ciclo instintivo. Vez ou outra, consigo ver ao longe alguns seres pensantes em tribos, como centauros ou gigantes, mas decido não chegar perto deles. Da última vez que tentei me atribuir a uma sociedade, os resultados não foram agradáveis. Logo, é quase que obrigatório que eu fique sozinho, para não ter problemas.

Passo por uma ponte de madeira, vendo o rio que percorre seu fluxo, levando consigo outras vidas, como peixes ou o povo axolote. Adentrando um campo mais inóspito, vejo ruinas do que poderia ser um grande castelo. Minha curiosidade é maior que meu bom senso, então, decido que irei investigar um pouco desse lugar e tentar entender sua história.

Os constructos dessa arquitetura antiga são feitos, principalmente, de tijolos e argila mágica, contidos em pequenas formulas de grandes arquitetos, principalmente do império romano. É estranho, pois a ilha que abriga tal império é, ao menos, um oceano de distância. Quem quer que foi o detentor de tal posse, era alguém de grande importância e poderoso, um rei, talvez?

Adentro mais profundamente as ruinas, achando uma entrada que estava escondida pelos destroços, os quais tirei transformando meus braços em grandes e musculosos braços de primatas gigantes. Dentro da parte subterrânea, existe um laboratório abandonado, com alguns fetos caídos, provavelmente advindos de experiencias que foram paradas nos últimos tempos desse castelo. Acho alguns livros com anotações de uma doutora “Tepes”. O mesmo sobrenome do Conde Drácula, não? Vladmir Von Tepes, ou Vlad Dracul III. Faz sentido toda a arquitetura romena e o grande poder, acertei, como sempre.

— Largue esse livro e vire-se lentamente.

Uma voz jovem, um tanto ameaçadora, vem detrás. Viro-me lentamente, como pedido, e vejo a face de um vampiro. Cabelos na faixa do pescoço, ruivos, combinando com os olhos vinho. Sua armadura, branca com detalhes em preto, realçava a cor negra de sua espada e sua pele pálida.

Conforme chegava perto, ficava menos tenso, pegando e tirando meu capuz, para poder ver minhas características físicas. Meus cabelos cacheados caiam na frente dos meus olhos, então tive que me guiar por outros sentidos, e foi uma ótima escolha, pois escutei o embanhar da espada.

— Oh, é somente um moleque. Qual seu nome, rapaz?

— Boris. E tu, quem serias?

— Mordred. — Abria um grande sorriso. — O que faz aqui, neste lugar de ninguém?

— Apenas passeando, fiquei curioso com a estranha tecnologia desse lugar e quis investigar. Quanto a ti...

— Vim pegar algumas coisas que pertenciam a minha mãe. Um destes pertences está em sua mão.

Lhe entrego o livro de bom grado, além de aproveitar e prender meu cabelo, podendo voltar a ver normalmente. Apesar de ter quinze anos, ainda sou um mero pirralho comparado com os séculos de existência que esse vampiro deve ter, por isso “moleque”.

Um mero segundo, estava em seu ombro no meio do ar, fora daquele laboratório. Caindo suavemente até o solo, o vampiro me colocava ao chão, enquanto ficava olhando de um lado para o outro, tentando pressentir algo. Uso de minhas capacidades físicas melhoradas para identificar onde está esse perigo do qual ele está tão alerta. Ao perceber um pouco de Konte, a energia demoníaca, me preparo para um impacto, antes de ser protegido pelo vampiro, que sai voando e bate as costas numa pilastra, caindo no chão com um buraco em sua armadura. A súbita defesa de um desconhecido havia me dado um pequeno choque de realidade.

— HAHAHA! DO JEITO QUE EU PLANEJEI!

Ouço os passos de uma bota de couro chegando mais próximo. Ao olhar para frente, um demônio ígneo, com traços de um velho oeste que nunca veio a esse mundo, chega abruptamente e passa por mim, indo diretamente a Mordred e mirando suas pistolas em sua cabeça.

— ADIOS, MUCHACHO!

Antes que possa disparar, transformo minha mão em diversos selos, que ao encostar no demônio, o deixa enfraquecido. Puxo-o com força e lhe soco para longe, ficando à frente daquele estranho que me protegeu, apenas para devolver o favor. Fico em posição de combate, me preparando para o que vier a seguir.

— Desgraça, sabia que deveria ter te matado primeiro, pivete. Que seja, mato os dois e depois pego minha recompensa, o caos nessa ilha! HAHAHA!

— Saia daqui garoto!

— Se tem energia para falar, presumo que ainda possa lutar. Não me parece o tipo de pessoa que cai facilmente. Então que tal levantar e me ajudar a exorcizar esse demônio?

No mesmo instante, dois disparos vêm em minha direção, os quais consigo desviar com as mãos nuas, mas fica uma pequena queimadura, a qual regenero sem problema. Depois, revido contra aquele demônio, formando água através do “nada”, e assim fazendo dois projeteis de alta velocidade que acertam e fazem a chama do capeta abalar. Um pouco depois, perdendo a paciência, o cabrunco lança duas enormes bolas de fogo, que são cortadas ao meio pela espada negra do morcegão, que está de pé e pronto para a luta que está prestes a iniciar.

— Para um moleque, tem uma língua afiada como a de um velhote de setenta anos.

— Para um vampiro, possui bom controle. Pensei que iria me atacar para se curar, até perceber que estava se curando com hemomancia.

— E para alvos, vocês falam demais!

Nos separamos quando somos alvejados por rajadas de fogo e energia demoníaca. Utilizo de minha agilidade para ficar pulando, até mesmo com as mãos, e dando algumas piruetas para poder se reposicionar. Por outro lado, meu companheiro começou a voar para poder ganhar mais velocidade. É verdade, vampiros são mais rápidos em ar do que em terra. 

Conforme aquele esquentadinho foca em se afastar de nós, combatentes corpo-a-corpo, enquanto atira sem se preocupar com a própria mana, consigo identificar seus ataques, me adaptar a eles, ganhando mais vantagem e conseguindo chegar próximo o suficiente para poder socar. Consigo dar alguns socos, misturados com a força de outros seres vivos, para amplificar a minha própria, e causar efeitos adicionais, como o dilaceramento das garras de um tigre ou o envenenamento das presas de uma serpente. Apesar disso, o demônio não cai, e me afasta com uma grande barreira de fogo. 

Enquanto limpo meu sangue, vejo o Morcego pegar o demônio e o arrastar no chão, o jogando para longe enquanto faz uma magia forte, criando vários cortes em formato de lua minguante que destroem tudo em seu caminho. De pouco em pouco, conseguimos sobrepujar o nosso oponente, ao ponto de atacarmos juntos e chegar ao ponto de conseguir finalizar a luta.

Entretanto...

Uma explosão de chamas vinda de seu corpo nos joga para longe, junto de uma grande energia demoníaca crescente vindo dele. Com uma nova forma, suas chamas tomam uma cor negra com relapsos vermelhos, tendo quatro olhos e um grande sorriso depravado. Além das pistolas, agora possuía facões e um braço para poder conjurar magias. 

— O QUE FOI, PIVETES? NUNCA VIRAM A FORMA REAL DE UM DEMÔNIO?! HAHAHAHA! — Um único disparo destrói completamente a pilastra ao seu lado. — Contra mim, Fuegoso, vocês não são nada!

Percebo o quão fracos somos nesse momento, e para piorar, o quão desgastado está meu companheiro de luta. Nesse caso, terei de tomar decisões drásticas, e para isso, nada melhor que usar minhas próprias magias...

Mesmo que não possa usar o Mana, posso usar outras fontes para a magia, e quando as uso...

Uma gravidade acima do normal faz com que tudo ao redor comece a desabar, fazendo destroços caírem em cima do demônio, que também é forçado a deitar no chão devido a grande pressão do controle gravitacional. Seguro Mordred por sua capa e nos deixo leves como se estivéssemos na lua, como os Lunae, e então fujo para muito longe, ganhando tempo para que meu plano dê certo. E para isso, precisarei usar esse moleque em prol de nossa sobrevivência.

— Não achei que você tinha essa variedade de poder! Controle elemental máximo, controle gravitacional, o que mais você tem?

— Se essa batalha se prolongar, você verá, meu caro Dracula pirateado.

— Ei!

— Haha, você é engraçado. Venha, rápido, até aquela caverna!

Ao chegar dentro da caverna a qual tinha visto na minha caminhada até o pico da montanha, fecho a entrada com uma enorme pedra que crio e a fortaleço, assim a transformando em metal. Vou até o vampiro, que está com algumas marcas de queimadura em seu corpo, essas que trato a partir de uma técnica divina, o restaurando quase totalmente. Olho para suas pupilas, e sinto um chamado, algo que apenas eu, como um oráculo sem Deus, posso sentir. E parte do meu plano é completada no momento em que senti esse chamado. Toco nas mãos do ruivo, e num instante, ambas nossas consciências são transportadas para um lugar não material, onde um jardim com todas as flores e uma enorme estrutura que leva para inúmeros destinos fica. A minha realidade alternativa, meu cerne como ser, alguém livre. Lá dentro, uma energia divina, o Ether, se manifesta numa linda mulher com roupas celtas, carregando consigo um cajado e uma caveira, com um corvo pousado em seus ombros. Cumprimento a Deusa a minha frente, volto para meu corpo material, onde posso visualizar o vampiro com as pupilas contemplando o infinito, ou seja, completamente estreladas. Escuto os tiros na pedra e vejo o demônio chegando perto, fazendo um cântico enquanto dispara um tornado de chamas, as quais seguro com meu corpo e uma barreira feita em improviso. Minhas roupas são completamente queimadas, sobrando apenas uma pequena parte da calça para não ficar do jeito que vim ao mundo.

— Bem que eu estranhei ter um pivete tão forte que aguentasse meus ataques. — Gargalhava enquanto recarregava a arma. — Você é o Oráculo da Destruição, não é?

— Que apelido ridículo. Quem foi o jegue que te falou isso? — Me preparo para aguentar mais um tempo. — Eu sou Boris, o Polimorfo, ou o Rei. Apenas isso que você precisa saber, Fuegoso.

— Entendido, senhor Polimorfo. Agora, queime no inferno!

Antes que mais rajadas efervescentes pudessem me atingir, um manto da noite me protege, cegando o oponente e abrindo um leque de possibilidades para contar ataques, as quais acontecem em segundos graças ao manejo da espada do Vampiro. Uma mecha prateada em seu cabelo confirmava o seu trato com a Deusa. Queria disfarçar minha felicidade ao ver que meu plano deu certo, mas não consegui, pois um enorme sorriso cresceu em meus lábios antes que pudesse perceber. 

— Hora da retribuição, esquentadinho! 

— Você vai pro inferno, Morcego! 

E no final, eu ainda saio vivo, pois ambos podem morrer e eu conseguirei sair desse lugar antes que isso ocorra. Mas, sinceramente, eu quero muito ver como aquela deusa ajudou o Mordred a se fortalecer. Logo, irei participar dessa luta, pelo meu próprio prazer. 

Isso vai ser divertido. 

Em meio ao caos que é a luta entre esses dois, fico observando o quão rápido está o morcego, que parece alcançar uma velocidade comparada a de um raio. Fico apenas vendo os fortes rápidos do Alucard feito no Paraguai e o Demônio Gaúcho, até que um resultado aparente acontece. Após inúmeros cortes, o demônio chega ao seu limite, e o vampiro corta sua cabeça. Com a vitória em suas mãos, ele faz um joinha pra mim, que estou bem longe, a qual cumprimento da mesma forma. Estava prestes a prosseguir caminho, querendo anotar esse fato incomum que aconteceu no meu diário, quando uma luz seguida de uma enorme explosão acontece. Consigo me proteger, sacrificando um espírito invocável no processo. 

Eu poderia ter ido embora, mas minha preocupação com aquele morcego foi muita, então voltei e o achei cheio de ferimentos e desacordado. Usei o resto de força que tinha para o curar, mas ele não acordava não importava o quanto batia em seu rosto. Para que eu sentisse que minha dívida estava paga, o peguei e coloquei nas minhas costas, modificando meu corpo para ficar mais resistente. 

— Bussoulo! 

Uma pequena criatura, parecido com um gato esquelético com asas aparece. Coloco uma gota de sangue do vampiro e falo "casa", dessa forma, ativando o meu Shikigami que lentamente prossegue caminho até a casa do moleque. Dessa forma, meu dia iria durar um pouco mais, de uma fOrma bem divertida. 

No final, não parei de caminhar… 

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