Capítulo 8 - Ice

Ele acelera a moto fazendo o ronco do motor ressoar pela pista. Fazia as curvas com uma facilidade, parecia que estávamos flutuando na estrada. Me agarro mais em sua cintura, quase atravessando suas costas com medo, mas não posso negar que a adrenalina que me dava era deliciosa. Após uns minutos chegamos na entrada da cidade, ele diminui a velocidade e eu consigo afrouxar os braços. Paramos em frente a uma galeria de lojas, desço da moto sentindo minha bunda dolorida, olho para cima e vejo o letreiro da sorveteria “Ice Rainbow”.

Calab desce da moto, anda pela curta distância da sarjeta até a porta, abre e faz sinal para eu entrar. A loja parecia ter saído direto dos anos 60 com suas cores e decoração alegre. Estava bem movimentada, com quase todas as mesas cheias e atendentes ocupados.

— Calab, meu brother!

— Luís, seu cachorrão safado!

— Vou te mostrar o cachorrão. - Fala um rapaz com o uniforme da sorveteria dando um tapa no saco de Calab.

— Filho da mãe.-Calab o puxa agarrando seu pescoço.

Ignoro as atitudes das duas crianças, vou até o balcão e procuro no cardápio as opções de sorvete que pediram para a gente buscar. Me viro para falar com Calab, mas ele já estava do lado de fora conversando com o tal Luís e os dois fumando. Uma atendente com cabelo verde-fluorescente vem até mim sorrindo alegremente.

— Boa noite, bem-vinda ao Ice Rainbow, me chamo Davina, posso anotar o seu pedido?

— Oi Davina, quero um pote individual de menta com chocolate, um de morango com cookie e para mim chocolate com gotas.-Olho para a janela, dou um suspiro e volto a falar com a atendente.-Creio ser só isso.

— Está com Calab?

— Sim.

— Então é mais um pote de flocos.

Ela se vira, sai pegando os potes para montar o meu pedido. Me sento em um dos bancos altos da bancada aguardando o meu pedido e observando as pessoas à minha volta. Alguns segundos depois, Calab se senta ao meu lado, seu amigo volta para trás da bancada e se inclina me olhando nos olhos sorrindo para mim.

— Olá princesa, bem-vinda ao Ice Rainbow, me chamo Luis e estou aqui para fazer o que você quiser comigo.

— Ela está comigo palhaço.-Calab fecha a cara para o amigo.

— Uou, outra namoradinha?-Luis sussurra para Calab, mas ainda me permitindo ouvir.

— Eu não sou namorada dele, não temos nada um com o outro.

— Ela não quer rotular nosso relacionamento cara.

— Que relacionamento seu maluco?-Viro meu corpo no banco, ficando de frente para Calab.-O de patroa e funcionário?

— HA HA, está saindo com uma Gilliand, Calab?-Luis ria gostosamente até Calab balançar negativamente a cabeça em sinal para o amigo parar e fazendo o sorriso sumir lentamente.-Ela é a neta do Gilliand?

— Sim, ela é, cara.

— Aqui o seu pedido, tudo ficou 40 dólares.-Davina me entrega o pedido sorridente.

— Ele vai pagar. — Aponto para Calab, me levanto de meu banco pegando a sacola, me viro para Luis antes de sair. — E não somos nada, mas se você quiser podemos sair sábado.

Saio sorrindo ouvindo Calab bufando, Luis rindo e a jovem Davina perguntando quem eu era para os dois. Fico do lado de fora olhando o movimento da rua, as pessoas andavam alegres para de uma lado para o outro entre as lojas que ainda estavam abertas. Dou alguns passos para o meu lado esquerdo, parando de frente a loja e percebo ser uma pequena galeria de arte. 

Entro na pequena loja, ouvindo o sino no alto da porta indicando minha chegada no local. Dos fundos sai uma mulher, que aparentava estar na casa dos 30 anos, com semblante cansado e frágil. Ao me ver, sorri de forma tímida, vindo para perto de mim, no meio da loja.

— Bem-vinda a Erato galeria e antiquário.-Fala ajeitando os óculos.

— Erato, uma das nove musa e representação do erótico?-Pergunto segurando o riso.

— Uma irmã da arte. É raro ver por aqui.-Ela ri se permitindo soltar um pouco.

— Sou formada em Artes, queria fazer uma especialização em histórias europeias.-Suspiro pesadamente, lembrando o que me prende aqui.-Mas infelizmente não tenho condições para isso.

— Sinto muito, mas se quiser vir me visitar, podemos discutir sobre arte, tomar café e ver os meninos do corpo de bombeiro correndo aqui na frente todas as quintas.-Ela ri timidamente, ficando vermelha com o que havia acabado de falar.

— Me conquistou com tomar café, mas a possível visão nos dias de quinta…-Dou uma pausa, sinalizando a barriga e a associando aos tanquinhos.-Ganhou uma amiga.

— Me chamo Olivia Sanchez. — Ela me estica mão sorrindo.

— Anne Gilliand.-Seguro sua mão

— Você é a neta do Sr. Gilliand?.-Me pergunta surpresa, mas respondendo a si mesma — Ele comprou aqui parte dos móveis para casa.

Antes que pudesse falar algo, a porta se abre, e o sino toca novamente anunciando uma nova pessoa no local. Nos viramos para a porta, as duas, para ver quem era o possível cliente e lá estava ele serio me olhando. Olivia perde seu sorriso, fechando a cara de imediato, Calab evita olhar para a mulher ao meu lado, focando apenas em mim. Era possível sentir a tensão no ar, começa a pensar que, provavelmente, Calab e Olivia tinha um assunto amoroso mal resolvido.

— Estava te procurando.

— Eu vi a loja e me interessei…

— Ela está bem aqui Manccini. - Olivia o responde entre dentes me cortando.

— Falei com ela, Sanchez. Por que não cuida da sua vida? - Ele finalmente a olha nos olhos, mas como alguém que estava pronto para bater nela.

Assustada com a reação dos dois, começo a empurrar o moreno, o dobro do meu tamanho, para fora do local com certa dificuldade. Me viro para a Olivia, pedindo desculpa pela situação constrangedora, ela ainda olhava com ódio para Calab, que já estava montado em sua moto. Como se seu espirito tivesse voltado ao corpo, ela se vira para mim, espantada, compreendendo que eu era uma telespectadora de toda a situação, balança a cabeça e foca em mim.

— Mil perdões por isso, não quero que pense… — ela pausa sem conseguir verbalizar o que queria.

— Tudo bem, depois você me conte sua história. Preciso ir, minha carona está na moto e o sorvete vai derreter.-Levanto a sacola e dou um sorriso o mais simpático que podia.

Olivia sorri de volta para mim, dando um tchau tímido e desajeitado. Acelero os passos para fora da loja, pulo na traseira da moto de Calab. O mesmo estava tenso, no qual fez o silêncio reinar todo caminho de volta, deixando se ouvir apenas o ronco do motor. Ele estaciona na entrada da casa, sua mãe, Elisabeth vem rindo com Paolo, mas antes que ela possa chegar mais perto, eu desso de sua moto e o mesmo arranca sumindo na estrada. Ficamos nos entre olhando em silêncio e ouvindo o som da moto sumir. 

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