18 - Sombras da Verdade?

O quarto do hospital estava mergulhado em um silêncio denso, entrecortado apenas pelo som contínuo do monitor cardíaco. A luz suave das primeiras horas da manhã entrava pelas persianas parcialmente abertas, banhando de dourado o rosto pálido de Liana. Seus olhos começaram a se abrir devagar, como se lutassem contra um peso invisível. Ela piscou algumas vezes, tentando ajustar a visão, até que finalmente conseguiu distinguir as formas ao seu redor.

Sentado numa poltrona ao lado da cama, com a cabeça encostada no braço e os olhos semicerrados de cansaço, Artur mantinha uma vigília silenciosa. Sua aparência deixava transparecer a preocupação que o corroía por dentro. Desde o momento em que ela havia desmaiado nos seus braços, um medo indescritível tomou conta dele. Ver Camille – ou ao menos quem ele acreditava ser Camille – naquela condição, vulnerável, indefesa, o fazia se sentir impotente.

Quando Liana finalmente se moveu, um leve gemido escapou de seus lábios. Artur levantou o rosto imediatamente, seus olhos se arregalando de alívio e surpresa.

— Camille! — Ele segurou sua mão com delicadeza, como se ela fosse feita de vidro. — Graças a Deus, você acordou...

Ela tentou sorrir, mas sua testa ainda estava franzida de dor. Olhou ao redor confusa, respirando com dificuldade.

— Onde... onde eu estou?

— No hospital — respondeu ele, aliviado. — Você desmaiou em casa, e... não conseguia acordar. Liguei para o Rodolfo e corremos para cá. Os médicos disseram que foi uma crise provocada por esforço mental... disseram que pode estar relacionado à sua memória.

Liana apertou levemente os olhos, como se tentasse puxar algo de dentro de si.

— Eu vi algumas imagens... coisas soltas. Nada claro... depois tudo ficou escuro.

Artur sentiu uma pontada no peito. Ele queria tanto acreditar que aquilo era o começo da recuperação da mulher que ele amava. Mas também sabia que não podia forçar nada.

— Isso já é um bom sinal. Mas a médica recomendou que não se esforce. Não precisa tentar lembrar agora. Vai acontecer naturalmente. Eu tô aqui, tá? — disse, com a voz embargada.

Ela o encarou por um momento mais longo. Era difícil olhar nos olhos dele sem se sentir invadida por um misto de culpa e dor. Ele parecia ser bom demais, mesmo desconfiando dele. E estava sendo enganado.

Mas Liana precisava continuar. Precisava manter o disfarce até descobrir toda a verdade. Até fazer justiça pela irmã que todos haviam destruído.

— Artur... posso te fazer uma pergunta?

— Claro — respondeu ele, se ajeitando na poltrona.

— Como foi o acidente? — Ela manteve o tom calmo. — Você estava comigo? Quem estava dirigindo? Alguém foi responsabilizado?

Artur pareceu desconcertado. Respirou fundo antes de responder.

— A médica disse que você não devia ficar pensando nisso agora. Essas lembranças... vão voltar. E eu vou estar aqui quando isso acontecer. O importante agora é descansar.

Liana assentiu, fingindo aceitar. Mas por dentro, ela sabia que havia algo estranho naquela resposta. Ele estava escondendo algo.

Decidida a despistar, mudou de assunto com um leve sorriso.

— Sabe o que me deu vontade agora? De comer um doce. Chocolate com caramelo... daqueles bem doces que a nutricionista nunca deixaria eu comer.

Artur riu baixo, surpreso.

— Você pedindo doce? Isso é novo.

Ela deu de ombros, ainda sorrindo.

— Acho que essa pancada na cabeça mexeu comigo. Vai saber, né?

Ele levantou-se, animado com o pedido.

— Eu vou buscar pra você. Conheço um lugar perto daqui. Fico feliz que esteja com apetite.

Enquanto ele saía, ainda com um sorriso no rosto, Liana observou-o sumir no corredor. Aquele homem era tudo que Camille merecia ter tido... mas o destino havia feito com que a irmã fosse usada, machucada e descartada, talvez ela pudesse ter tido um destino feliz ao lado dele.

Assim que a porta se fechou, a maçaneta girou novamente. Rodolfo entrou com passos firmes, mas o rosto denunciava a preocupação.

— Finalmente acordada...

— Rodolfo — disse ela, tentando se recompor. — Ele acabou de sair.

— Eu sei. Esperei. Precisamos conversar. Urgente. O que aconteceu com você naquela casa? Você desmaiou, você é uma pessoa saudável, eles tentaram te envenenar é isso e você fingiu que estava lembrado de alguma coisa? Isso está indo longe demais.

Liana sentou-se devagar na cama, ainda sentindo tontura.

— Estou mais próxima do que nunca de descobrir tudo. A Helena, a Susan, o próprio Estevan... todos escondem algo. E vou descobrir o que é.

Rodolfo se aproximou, cruzando os braços.

— Você precisa parar. Esse plano é perigoso. E você... não é Camille. Está arriscando sua vida por pessoas que não se importaram com vocês.

Quando Liana contava o que ouve de verdade com ela, Artur voltava silenciosamente pelo corredor. Ao se aproximar da porta, ouviu aquelas palavras e parou, em choque.

— Não é só por ela — confessou Liana. — Hoje... eu lembrei de algo. Pequenos borrões. Sons. Uma cantiga de ninar... o cheiro de lavanda... uma mulher com as mãos calejadas me acariciando. Eu... acho que eram memórias da minha infância.

Memórias da infância? Mas... ela não me disse nada disso. Por que mentiria?

Ele não entrou como da última vez, Artur se afastou devagar, o coração apertado. Em silêncio, ligou para seu assistente:

— Preciso que entregue um doce para senhora Camille. Chocolate com caramelo. Entregue direto pra ela, se ela perguntar por mim diz que tive que voltar para mansão e tomar um banho.

Desligou. Algo não estava certo. Mas, por ora, ele escolheu não confrontar. Ainda não.

Se ela não confia nele, tudo bem. Ele esperaria. Mas não deixaria de protegê-la.

Mas só não entende o porquê dela confiar tanto nesse médico que acabou de conhecer, mas do que no seu próprio marido.

— Eu não vou parar, Rodolfo. Não agora. Eles vão pagar por tudo. Pela Camille... por cada lágrima que fizeram ela derramar.

Rodolfo balançou a cabeça.

— Só me prometa que vai se cuidar. Eu fico do seu lado... mas você precisa sair viva disso.

— Eu prometo — respondeu ela, determinada.

Rodolfo a olhou nos olhos uma última vez antes de ir. Mas hesitou na porta:

— Você quer que o Scott saiba do que aconteceu aqui?

Ela pensou por um instante. O primo sempre foi muito protetor, ele estar por cá não será bom.

— Melhor não. Ele vai querer vir pra cá. E meus pais vão pensar que algo pior aconteceu. Melhor deixá-los em paz por enquanto.

Rodolfo assentiu, compreendendo, e deixou o quarto em silêncio. Mas seu coração ficou no quarto junto de Liana, como ele diria para a mulher que sempre amou para desistir de tudo sem confessar seus sentimentos.

Liana deitou-se novamente, encarando o teto. Não sabia o que a esperava quando saísse dali... mas uma coisa era certa.

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