Liana olhou para a camisola de cetim preto que havia escolhido antes, mas algo dentro dela rejeitou a ideia de usá-la. Não queria se expor, não queria que Artur sequer visse a pele dos seus braços ou pernas. Seu corpo ainda parecia um campo de batalha depois do que aconteceu mais cedo, e não fazia sentido se vestir de uma forma que a deixasse vulnerável. Soltando um suspiro longo, devolveu a camisola para o cabide e puxou um pijama de mangas compridas, algo simples e confortável que cobria cada centímetro do seu corpo.
Ela se vestiu rapidamente e, ao sair do closet, encontrou Artur já deitado na cama, a luz do abajur iluminando parcialmente seu rosto. Ele vestia um pijama escuro de seda e estava recostado contra a cabeceira, os olhos fixos nela com uma expressão indecifrável. Liana ignorou o olhar dele e caminhou até o outro lado da cama, o lado esquerdo, e se acomodou.
— O que pensa que está fazendo? — A voz dele soou firme, com um toque de surpresa.
Ela ergueu os olhos para ele, sem paciência para discussões. — Estou deitando. Algum problema?
— No lado errado — ele rebateu, franzindo o cenho.
Liana suspirou pesadamente. — Errado para quem? Eu prefiro esse lado.
— Camille... você sempre dormiu do lado direito — Artur disse sem pensar, sua voz carregada de lembranças.
Ela franziu a testa, cruzando os braços. — Pois agora vou dormir do lado esquerdo.
Artur a observou por alguns segundos, como se analisasse sua resposta. Sua mente trabalhava em ritmo acelerado. Camille nunca levantava a voz, nunca discutia, nunca impunha suas vontades. Ela era submissa, quase uma sombra na casa, sempre acatando o que lhe era ordenado. Mas essa mulher, essa versão diante dele, era diferente em tudo. Ela brigava, gritava, o expulsava e agora discutia por um lado da cama. Ele sentiu uma pontada de dor de cabeça. Nada fazia sentido.
Mas uma coisa chamou sua atenção. O pijama. Camille usou um pijama idêntico na primeira noite deles como casal. Ele se lembrou dela recuada na cama, os olhos evitavam os seus, e o corpo pequeno parecia se encolher sob o tecido grosso do pijama. Agora, vendo Liana vestida da mesma forma, uma dúvida inquietante o assaltou. Por que, depois de agir de maneira tão diferente o dia todo, ela escolheria algo tão característico de Camille? Esse detalhe o fez hesitar.
— Tanto faz. Fique com o lado esquerdo, então — ele disse, cansado da discussão.
Liana sorriu de canto, satisfeita com a pequena vitória. Mas dormir era outra questão. Ela se deitou, mas seu corpo permaneceu rígido. Sabia que Artur estava ao seu lado, podia sentir sua presença, o calor que emanava dele, sua respiração. Cada pequeno movimento que ele fazia a deixava mais alerta. Ela não confiava nele. Não queria dormir ao lado dele. E, mesmo assim, foi Artur quem adormeceu primeiro. Foi a primeira vez em seis meses que ele finalmente conseguiu dormir profundamente, finalmente a culpa que o atormentava desapareceu e podia dormir tranquilamente.
A madrugada avançava e o silêncio do quarto foi quebrado por um grito sufocado.
— Mãe! — Artur acordou com um sobressalto, o rosto pálido e suado.
Liana se levantou no mesmo instante, assustada. Viu Artur sentado na cama, respirando de forma errática, os olhos arregalados, perdidos no escuro. Nunca o tinha visto assim. Ele parecia assustado, frágil de uma forma que ela não imaginava ser possível. O coração dela apertou um pouco, mas não soube dizer o motivo.
— Artur? — Ela chamou baixinho, hesitante.
Ele não respondeu. Continuava preso no pesadelo, revivendo algo doloroso. Liana hesitou por um momento antes de se aproximar e tocar o braço dele. O contato fez com que ele piscasse algumas vezes, voltando à realidade. Ele olhou para ela, ainda ofegante, e por um momento algo se quebrou entre os dois.
— Foi só um sonho — Liana disse suavemente, como se tentasse acalmá-lo.
Artur não disse nada. Apenas a observou, os olhos escuros presos nos dela. O silêncio se tornou pesado, denso, carregado de algo que nenhum dos dois queria nomear. Liana sentiu sua respiração acelerar quando percebeu a proximidade entre eles. O rosto dele estava a poucos centímetros do seu. Os olhos dele desceram para os lábios dela, e o ar ao redor pareceu ficar rarefeito. Por um breve momento, parecia que algo aconteceria, algo que nenhum dos dois teria como evitar.
Mas então, uma batida forte na porta os fez se afastar bruscamente.
— Senhor Sherman? Senhora? — A voz da criada ecoou do outro lado.
Artur se afastou imediatamente, limpando a garganta e passando a mão pelos cabelos bagunçados. Liana, por sua vez, piscou algumas vezes, tentando entender o que acabara de acontecer.
— O que foi? — A voz de Artur soou rouca, ainda afetada pelo momento anterior.
— A senhora Mirna pediu para avisar que o café já está pronto. Ela deseja que os senhores se arrumem para o pequeno-almoço em família.
Por um instante, nenhum dos dois falou nada. O peso do que quase aconteceu ainda pairava no ar. Então, Artur soltou um longo suspiro e levantou-se da cama.
— Vamos nos arrumar — disse simplesmente antes de caminhar até o banheiro.
Liana observou ele se afastar e, quando a porta do banheiro se fechou, soltou a respiração que nem percebeu que estava prendendo. Levaria um tempo para entender o que diabos estava acontecendo ali. Mas uma coisa era certa: precisava manter seu plano intacto. Não podia deixar que pequenos momentos de fraqueza a desviassem do que realmente importava.
Mas, por algum motivo, a imagem dos olhos assustados de Artur, chamando pela mãe no meio da noite, não saía de sua cabeça.
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Atualizado até capítulo 38
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