capítulo 04

Depois que Davi trouxe o prato de pão com queijo e suco, eu comi devagar, tentando parecer o mais discreta possível. Não queria parecer desesperada, mesmo que meu estômago ainda estivesse pedindo mais. Cada pedaço que eu engolia parecia aliviar um pouco a dor que vinha carregando o dia inteiro.

Enrico já tinha saído da sala, provavelmente ocupado com alguma reunião ou algo importante, e Davi voltou a espalhar os cadernos e livros na mesa de centro.

— Viu? Comer não te matou, Isa – ele brincou, mas o tom era carinhoso.

Sorri de leve, mas não respondi. Ainda sentia vergonha de ter deixado meu desconforto ficar tão evidente. Quando terminei de comer, limpei as mãos com cuidado e forcei um sorriso.

— Vamos terminar a tarefa? – perguntei, tentando mudar o foco da conversa.

Davi deu de ombros e puxou o caderno para perto de mim. Ele sempre era o mais descontraído de nós dois, e parecia não se importar com o silêncio que eu carregava. Passamos a próxima hora discutindo o tema do trabalho, rabiscando ideias e, de vez em quando, rindo de algo idiota que Davi dizia. Por mais desconfortável que fosse pensar em Enrico ouvindo meu estômago roncando, estar ali me trazia uma sensação de calma que eu não encontrava em casa.

O tempo passou mais rápido do que eu esperava, e, quando percebi, o sol já tinha se posto. Eu me mexi no sofá, sentindo o corpo pesar.

— Tá tarde, Isa. Quer que eu te leve para casa? – Davi perguntou, ajeitando o cabelo bagunçado.

Eu balancei a cabeça. Minha casa ficava a apenas algumas ruas dali, e eu sabia que minha mãe não ficaria feliz se me visse chegando com ele.

— Não precisa. Eu vou a pé.

Davi franziu a testa, claramente preocupado, mas, antes que ele pudesse insistir, Enrico entrou na sala. Ele estava sem o paletó, apenas com a camisa social e a gravata solta, o que o fazia parecer menos intimidante, mas ainda imponente.

— Está tarde. Você deveria dormir aqui – ele disse, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

Olhei para ele, surpresa, e depois para Davi, que deu de ombros, como se dissesse “ele tem razão”.

— Eu não quero incomodar – murmurei.

— Não é um incômodo. Tem um quarto de hóspedes. Use-o – Enrico respondeu, com o mesmo tom sério e definitivo que ele sempre tinha.

Eu hesitei, mas a ideia de voltar para casa, enfrentar minha mãe e talvez não ter nada para comer novamente me fez aceitar.

— Tudo bem. Obrigada – murmurei, ainda sem olhar para ele.

---

Mais tarde, depois de jantar com Davi – algo simples, mas delicioso para mim – e passar algum tempo vendo TV com ele, fui para o quarto de hóspedes. Era maior que meu próprio quarto, com uma cama macia e lençóis que pareciam de hotel. Eu me deitei, mas o sono não vinha. Talvez fosse a estranheza de estar em um lugar tão confortável, tão diferente do que eu estava acostumada.

Por volta das duas da manhã, senti o desconforto de quem bebeu suco demais e me levantei para ir ao banheiro. Andei pelo corredor escuro, tentando fazer o mínimo de barulho possível, e finalmente encontrei a porta.

Enquanto voltava para o quarto, ouvi passos e congelei. Por um momento, pensei que fosse Davi, mas, ao virar a cabeça, vi Enrico parado na porta da cozinha, com um copo de água na mão. Ele estava sem camisa, e a luz fraca da geladeira iluminava seus ombros largos e o abdômen definido.

Ele olhou para mim, aparentemente tão surpreso quanto eu.

— Não consegue dormir? – ele perguntou, a voz baixa para não acordar ninguém.

— Não... não muito – respondi, envergonhada por estar ali, de camisola simples, com o cabelo bagunçado.

Ele assentiu, tomou mais um gole de água e colocou o copo na pia.

— É estranho no começo, mas você se acostuma. Boa noite, Isadora.

Eu só consegui acenar com a cabeça antes de voltar correndo para o quarto. Meu coração batia rápido, não porque ele tivesse feito algo errado, mas porque aquele momento, aquela proximidade, era diferente de tudo que eu já tinha vivido.

Deitei na cama e fechei os olhos, tentando ignorar a cena que parecia gravada na minha mente. Foi só muito tempo depois que finalmente consegui dormir.

-fim do capítulo 04

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Comments

Carla Santos

Carla Santos

Eita só observando adorooooo

2025-01-14

0

Joelma Oliveira

Joelma Oliveira

carência é tão ruim e tão perigoso... faz as pessoas se apegarem ao menor sinal de carinho... espero q ele não a machuque

2025-01-13

2

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