Eu sempre odiei as manhãs de segunda-feira. Não só porque elas anunciavam mais uma semana de aulas, mas porque significavam começar o dia com o estômago vazio. Minha mãe tinha uma regra simples: "Se não quiser ser chamada de baleia na rua, então não coma como uma." Era o tipo de comentário que ela fazia como se fosse para o meu bem, mas que me feria profundamente.
Naquela manhã, saí de casa com uma maçã na mão – que eu nem tive coragem de comer, já que minha mãe ficava me observando com o olhar de reprovação. O dia parecia mais longo do que o normal, e tudo que eu conseguia pensar era no cheiro do almoço da cantina da escola, mesmo sabendo que eu nunca teria coragem de gastar o dinheiro que mal tinha para comprar comida ali.
Quando Davi me chamou para ir à casa dele depois da aula, eu hesitei. Nós tínhamos que fazer um trabalho de literatura juntos, e eu sabia que ele insistiria até eu aceitar. Era sempre assim. Davi sabia que minha casa não era o melhor lugar para estudar, e, para ser sincera, a ideia de fugir daquele ambiente por algumas horas era quase tentadora.
— Vamos, Isa! Você sabe que meu pai vai estar ocupado e nem vai notar que você está lá. Além disso, você ama aquele sofá gigante da sala, não é? – ele disse, com aquele sorriso que sempre me fazia ceder.
Concordei, mesmo sabendo que minha mãe não gostaria de me ver entrando em outra casa para "incomodar os outros", como ela dizia.
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Quando chegamos à casa de Davi, a diferença entre nossas vidas parecia gritar na minha cara, como sempre. O cheiro da comida vinha da cozinha, e, por um momento, meu estômago roncou tão alto que tive medo que Davi ouvisse. Mas, claro, ele ouviu.
— Isa, você comeu hoje? – ele perguntou, com o olhar preocupado que sempre me deixava desconfortável.
— Comi, sim. Só estou com fome de novo – menti, enfiando o rosto nos cadernos para não ter que encará-lo.
— Não minta para mim – ele rebateu, cruzando os braços.
Antes que eu pudesse responder, ouvi passos no corredor. Era Enrico. Ele estava de terno, provavelmente chegando de alguma reunião, e parecia tão impecável como sempre. Seu olhar cruzou com o meu, e, por um momento, eu quis desaparecer.
— Pai, a Isa não comeu nada hoje – Davi soltou, sem nem hesitar.
Quis gritar com ele, mas não consegui. Meu rosto queimava de vergonha enquanto Enrico me olhava com a testa levemente franzida.
— Não comeu? – ele perguntou, com a voz firme, mas sem soar rude.
— Eu comi, sim – menti de novo, agora para ele.
Ele não respondeu. Em vez disso, deu um suspiro curto, olhou para Davi e depois para mim.
— Davi, vá pegar alguma coisa para vocês comerem na cozinha. A comida está fresca.
Davi saiu sem questionar, deixando-me sozinha com Enrico. Meu coração estava batendo tão forte que eu achei que ele poderia ouvir. Ele se sentou na poltrona perto de mim, ajustando a gravata como se quisesse quebrar o silêncio.
— Você precisa comer, Isadora – ele disse, finalmente.
— Eu como quando tenho fome – respondi rápido, ainda olhando para os cadernos na minha frente.
— Então por que seu estômago estava roncando como se você não tivesse comido o dia inteiro?
Eu não sabia o que responder. Ninguém nunca me questionava assim, e, por um momento, me senti como uma criança que tinha sido pega em uma mentira. Mas ele não parecia bravo, só... sério.
Davi voltou antes que eu pudesse pensar em algo para dizer, trazendo um prato com pão, queijo e um copo de suco. Eu agradeci, ainda com vergonha, mas Enrico não tirou os olhos de mim até eu começar a comer.
— Não é vergonha precisar de ajuda, Isadora – ele disse, antes de sair do cômodo.
Essas palavras ficaram comigo pelo resto do dia, mesmo quando tentei ignorá-las.
-fim do capítulo 03
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Atualizado até capítulo 30
Comments
Joelma Oliveira
pra alguém que fechou seu coração ele tá bem preocupado com ela. tomara q a faça feliz mesmo que não fique com ela
2025-01-13
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Carla Santos
Pra quem está com o coração fechado kkkkkkkk está muito bem preocupado com ela
2025-01-14
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