Na manhã seguinte, Yol acordou tarde, com uma leve dor de cabeça e desconforto nos olhos. Ele piscou algumas vezes, tentando se ajustar à luz que entrava pelas cortinas entreabertas, e levantou-se devagar. Caminhou lentamente até o banheiro, abriu a gaveta no box e procurou o frasco de comprimidos. Quando percebeu que havia acabado, soltou um suspiro frustrado.
— Ótimo... — murmurou para si mesmo, esfregando os olhos. — Vou ter que descer.
Com passos lentos e cuidadosos, Yol começou a descer as escadas, segurando-se no corrimão para manter o equilíbrio. Ao chegar no meio do caminho, ouviu a voz de Niel vindo da sala, falando ao telefone. Ele hesitou, mas chamou suavemente.
— Papai?
Niel virou-se rapidamente, colocando um dedo sobre os lábios e apontando para o telefone, pedindo silêncio.
— Só um minuto, Yol. Estou no telefone — disse ele, voltando a se concentrar na ligação.
Yol mordeu o lábio, frustrado, mas continuou descendo até o sofá, onde se sentou em silêncio. Enquanto esperava, ouviu passos descendo a escada. Era Gusta, ajustando o terno com cuidado. Ele viu Yol e abriu um sorriso caloroso, caminhando em sua direção.
— Ei, meu garotão! — exclamou Gusta, inclinando-se para dar um beijo na testa de Yol. — Como você está hoje?
Yol abriu a boca para responder, mas antes que pudesse dizer qualquer coisa, Niel desligou o telefone e chamou a atenção de Gusta.
— Amor — disse Niel, com um tom sério e uma expressão ansiosa.
Gusta virou-se para ele, curioso.
— O que foi, querido? Aconteceu alguma coisa?
Niel respirou fundo, como se estivesse reunindo coragem.
— Tenho algo para lhe contar.
Yol, sentado no sofá, sentiu o coração acelerar. Finalmente, pensou, eles vão lembrar do meu aniversário. Talvez até tenham um presente para mim. Ele esperou ansiosamente pelas próximas palavras de Niel.
Mas, em vez disso, o que ouviu o deixou completamente sem chão.
— Eu estou grávido — anunciou Niel, com um leve sorriso.
Gusta arregalou os olhos, completamente surpreso.
— Sério mesmo? — perguntou, a voz repleta de entusiasmo.
— Sim! — respondeu Niel, sorrindo um pouco mais. — Eu estava me sentindo mal ultimamente, então fui ao médico. Fizeram alguns exames, e descobriram que estou grávido.
Gusta ficou imóvel por um segundo antes de correr até Niel e envolvê-lo em um abraço apertado.
— Isso é incrível! — exclamou Gusta, rindo. — Eu não acredito. Vamos ter outro filho!
Niel retribuiu o abraço, emocionado.
Para Yol, porém, aquilo foi um choque. Ele sentiu um nó se formar em sua garganta e tentou falar, mas sua voz saiu baixa e fraca.
— Papai... hoje é... — começou ele, mas a frase ficou no ar.
O celular de Gusta começou a tocar, interrompendo qualquer chance de conversa. Ele olhou para a tela e franziu o cenho.
— Yol, depois você me conta, tá bom? Estou atrasado para uma reunião importante — disse Gusta, já atendendo o telefone.
Niel pegou sua pasta e chamou Gusta.
— Espera, amor! Me dá uma carona. Vai ser mais rápido assim.
— Claro, querido. Vamos — respondeu Gusta, segurando a porta para Niel.
Os dois saíram apressados, deixando Yol sozinho na sala. Ele ficou parado no sofá, sem saber como reagir. O aperto em seu peito era insuportável, e seus olhos começaram a se encher de lágrimas.
De longe, Ju, que observava tudo, aproximou-se lentamente, sentando-se ao lado dele. Ela colocou a mão gentilmente em seu ombro.
— Feliz aniversário, meu querido — disse Ju, com um tom suave.
Yol levantou o olhar para ela, e as lágrimas começaram a rolar por seu rosto.
— Eles... eles nem lembraram, Ju. — Sua voz saiu tremida. — Nem um "feliz aniversário". Nem um abraço. Nada...
Ju suspirou, puxando Yol para um abraço reconfortante.
— Eu sei, meu menino. Eu sei que dói. Mas escute... você é especial. Não é porque eles estão distraídos que você não é importante. Eles só não sabem demonstrar, mas eu sei que te amam.
Yol balançou a cabeça, chorando no ombro de Ju.
— Não parece, Ju... Não parece. Eles têm mais um bebê agora. Mais uma razão para me esquecerem.
Ju apertou o abraço, tentando conter as próprias lágrimas ao ver o sofrimento de Yol.
— Você nunca será esquecido, Yol. Eu estou aqui, sempre estarei. Você não está sozinho, meu querido.
Yol soluçou, deixando todo o peso da dor e da solidão sair em lágrimas. O abraço de Ju era tudo o que ele precisava naquele momento, enquanto o vazio deixado por seus pais parecia maior do que nunca.
Yol enxugou os olhos após chorar no ombro de Ju. Ele respirou fundo, tentando recuperar alguma força, mas ainda se sentia perdido. Olhou para Ju, hesitante, e disse com a voz baixa:
— Ju, será que você pode ligar para o Fery? Eu... eu só queria falar com ele.
Ju franziu o cenho, parecendo incerta. Ela sabia que Fery era importante para Yol, mas hesitava em intervir, principalmente por não querer que o garoto se machucasse ainda mais.
— Tem certeza, Yol? — perguntou ela, suavemente. — Você está se sentindo bem para falar com ele?
Yol assentiu, forçando um sorriso fraco.
— Eu só... só quero ouvir a voz dele. Por favor.
Com um suspiro, Ju pegou o telefone e discou o número de Fery. Ela esperou alguns segundos enquanto o celular chamava, antes de entregá-lo para Yol. Ele colocou o aparelho no ouvido, ansioso, enquanto o som do toque continuava. Finalmente, a voz familiar de Fery atendeu.
— Sim, Yol? Aconteceu alguma coisa? — perguntou Fery, com um tom de preocupação.
Yol tentou soar casual, apesar do nó em sua garganta.
— Não, nada aconteceu... Eu só queria saber se você está livre hoje. Pensei em fazer algo diferente. Tipo... cantar, contar histórias, ler livros, sabe?
Houve um breve silêncio do outro lado da linha antes de Fery responder.
— Ah, Yol... Me desculpa, mas não posso hoje. Minha namorada quer ir ao cinema assistir a um filme que acabou de lançar, e eu também estou louco para ver.
Yol sentiu um aperto no peito, mas tentou disfarçar.
— Tá bom, então — respondeu ele, com um tom quase neutro.
— Sério, me desculpa mesmo — insistiu Fery, parecendo desconfortável.
Yol franziu levemente o cenho, intrigado.
— Por que você está pedindo desculpas, Fery?
Fery hesitou antes de responder.
— É que, você sabe... Você tem problema de vista, e... é meio estranho eu falar sobre assistir a um filme bom para você. Você não deve saber como é, né? Mas não tem problema! Depois eu te levo ao cinema comigo. Assim, você deve saber como é massa.
Yol ficou em silêncio por alguns segundos, sentindo as palavras de Fery ecoarem dolorosamente. Ele mordeu o lábio para conter as lágrimas.
— Tá bom, Fery. Eu... preciso desligar agora. — E, sem esperar uma resposta, Yol encerrou a ligação.
Ele ficou parado, segurando o celular, enquanto um silêncio desconfortável tomava conta da sala. Ju, que havia observado de longe, aproximou-se e colocou a mão suavemente em seu ombro.
— Yol, vamos para minha casa. Você sempre quis ir, não é? — perguntou ela, com um sorriso reconfortante.
Yol ergueu os olhos para ela, surpreso.
— Sério mesmo? — perguntou ele, com um brilho de esperança surgindo em seu rosto.
Ju assentiu, apertando o ombro dele de forma encorajadora.
— Sabe meu filho, aquele que eu te contei? Ele é muito inteligente e trabalha em uma empresa grande. Hoje ele está em casa, de folga. Ele é muito educado, tenho certeza de que você vai gostar de conhecê-lo. Vamos?
Por um momento, Yol hesitou, mas logo sentiu seu coração se aquecer com a ideia. Ele sorriu levemente.
— Vamos. Quero conhecer sua casa.
Ju retribuiu o sorriso e deu um leve tapinha no ombro dele antes de ajudá-lo a levantar. Ela sabia que, embora o dia tivesse começado difícil, essa mudança de ambiente poderia trazer um pouco de conforto para Yol.
Ju e Yol começaram a subir as escadas da favela, os passos cuidadosos devido ao terreno irregular. Yol segurava no corrimão enferrujado, sentindo o cheiro característico do lugar — uma mistura de comida, poeira e fumaça. Ele ouvia vozes ao longe, música alta e risadas ocasionais, mas mantinha-se próximo de Ju, confiando nela para guiá-lo.
Quando chegaram a um trecho mais estreito da escadaria, três homens apareceram na frente deles. Um deles, com um boné virado para trás e tatuagens pelo braço, olhou diretamente para Yol, arqueando as sobrancelhas.
— E aí, tia? Quem é esse playboy aí? — perguntou o homem, com um tom desafiador. Ele deu um passo para mais perto, analisando Yol dos pés à cabeça. — Tem cara de quem tem grana.
Antes que Yol pudesse reagir, o homem estendeu a mão, tocando o rosto dele com um dedo.
— Qual foi? — disse Yol, tentando recuar, mas visivelmente desconfortável.
Ju, que mantinha um olhar firme, rapidamente interveio.
— Não coloca a mão nele, não! — disse ela, com uma autoridade que fez o homem pausar.
O bandido riu, levantando as mãos como se estivesse se defendendo.
— Calma, tia! Qual foi a ideia? Quem é você, hein? Qual seu nome? — perguntou ele, com um tom mais leve, mas ainda provocativo.
Ju respirou fundo, mantendo a postura firme.
— Eu sou a Ju. Mãe do Kai.
O nome parecia ter um efeito imediato. O homem deu um passo para trás, olhando para ela com surpresa.
— O quê? Kai? O filho da Ju? — Ele riu, balançando a cabeça. — Pô, tia, não sabia que era você! Seu filho é muito gente boa, sabia? Ajuda muita gente aqui. Pode passar, tá tranquilo. Mas ó... — Ele olhou para Yol novamente. — Cuidado na subida. Aqui não é lugar pra playboy, hein?
— Obrigada — respondeu Ju, com um tom firme, segurando o braço de Yol e continuando a subida.
Yol, ainda assustado, murmurou para Ju enquanto subiam.
— Quem é esse Kai? E por que ele te respeita tanto?
Ju sorriu levemente, sem olhar para ele.
— Meu filho conhece muita gente por aqui. Ele é respeitado porque ajuda as pessoas. E, graças a ele, conseguimos passar por situações assim. Mas você está comigo, então não precisa se preocupar.
Enquanto continuavam subindo, Yol começou a perceber que o ambiente, embora hostil em aparência, era vivo e cheio de energia. As crianças brincavam ao longe, e as conversas animadas ecoavam pelas vielas. Ele sentia que estava entrando em um mundo completamente diferente do que conhecia.
Quando chegaram ao topo, Ju parou diante de uma casa simples, mas bem cuidada, com um portão de madeira pintado de azul. Ela olhou para Yol com um sorriso caloroso.
— Bem-vindo à minha casa, Yol. Vamos entrar. Meu filho Kai está lá dentro. Tenho certeza de que vocês vão se dar bem.
Yol assentiu, sentindo um misto de curiosidade e alívio por finalmente chegar ao destino.
CONTINUA....
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Atualizado até capítulo 99
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