Chuva de Incertezas

Na segunda-feira, a cidade estava envolta por uma espessa camada de nuvens cinzentas, e a chuva começou a cair pesada, como se o céu estivesse desabafando uma antiga tristeza. Lara não se incomodava com o tempo; na verdade, ela sempre achou a chuva reconfortante, como se cada gota que batia contra a janela de seu apartamento ajudasse a acalmar sua mente sobrecarregada. Mas, naquele dia, a chuva parecia um reflexo das incertezas que ela carregava por dentro.

O final de semana foi um breve alívio, um momento para se distanciar de tudo e tentar colocar seus pensamentos em ordem. No entanto, ao retornar ao escritório naquela manhã, a realidade se impôs novamente. O caso Vertax estava em sua fase decisiva, e isso significava que cada detalhe importava. Lara sabia que não havia espaço para distrações, e, ainda assim, sua mente continuava vagando para as palavras de Ethan, para a noite que passaram conversando no restaurante.

Enquanto Lara se preparava para o dia, revisando os documentos em sua mesa, Ethan entrou na sala de reuniões onde ela estava. Seus olhares se encontraram por um breve segundo, mas havia algo diferente naquela troca silenciosa. Uma compreensão mútua, talvez? Ou, quem sabe, apenas uma resignação ao fato de que os sentimentos estavam ali, por mais que tentassem ignorá-los.

“Lara, temos uma reunião com o conselho em 30 minutos,” ele disse, a voz firme, mas com um leve tom de cansaço que Lara não pôde deixar de notar. “Precisamos revisar os pontos principais antes de entrarmos.”

“Claro,” ela respondeu, focando-se nos papéis à sua frente. “Vamos passar por tudo para garantir que estamos preparados.”

Eles se sentaram juntos, lado a lado, com a pasta de documentos entre eles. A proximidade, que antes era algo que Lara evitava, agora parecia natural, embora ainda carregada de uma tensão silenciosa. À medida que discutiam as estratégias e os pontos críticos que precisavam abordar, Lara percebeu que, apesar de todas as complicações emocionais, ela e Ethan formavam uma excelente equipe. Suas ideias se complementavam de uma forma que não havia experimentado com nenhum outro colega.

Enquanto revisavam um ponto particularmente complicado, Ethan fez uma pausa e olhou para Lara com uma expressão que misturava seriedade e algo mais suave. “Eu estava pensando… no que discutimos na semana passada. Acho que encontramos um equilíbrio, você não acha?”

Lara parou por um momento, processando as palavras dele. Ela sabia que ele não estava se referindo apenas ao trabalho. Havia um subtexto ali, algo que ambos entenderam sem a necessidade de ser explicitamente dito. Ela respirou fundo, escolhendo suas palavras com cuidado. “Eu acho que estamos fazendo o melhor que podemos, considerando as circunstâncias.”

Ethan assentiu, parecendo aceitar a resposta dela. “Sim, é o que parece. Eu só queria ter certeza de que estamos na mesma página.”

“Estamos,” Lara confirmou, com um pequeno sorriso que ela esperava que fosse tranquilizador. “Vamos focar no que precisa ser feito agora. Temos um caso para vencer.”

Eles voltaram ao trabalho, mas a conversa permaneceu na mente de Lara. Era estranho como eles podiam discutir algo tão pesado com tanta leveza. Havia uma maturidade no relacionamento que estava começando a se formar, algo que Lara ainda estava tentando entender completamente.

A reunião com o conselho foi intensa, mas Lara e Ethan estavam em sintonia. Cada ponto que levantaram foi recebido com aprovação cautelosa, e embora houvesse momentos de discordância, conseguiram navegar pelas dificuldades juntos. Quando a reunião terminou, havia uma sensação palpável de alívio na sala. O caso Vertax estava em boas mãos, e todos sabiam disso.

Após a reunião, enquanto todos começavam a se dispersar, Lara estava organizando seus documentos quando Ethan se aproximou novamente. “Eu acho que podemos dizer que estamos em uma boa posição agora. O conselho pareceu bastante confiante nas nossas estratégias.”

“Sim, acho que fizemos um bom trabalho,” Lara respondeu, sem levantar os olhos dos papéis. Ela sentiu a presença de Ethan ao seu lado e, por um momento, sentiu a tentação de falar sobre algo além do trabalho, mas decidiu contra isso.

“Eu estava pensando em sair para tomar um café,” Ethan sugeriu, tentando soar casual, mas Lara podia ouvir a hesitação em sua voz. “Você quer vir?”

Lara olhou para ele, avaliando a oferta. Ela sabia que, por mais que ambos tentassem manter as coisas profissionais, havia uma conexão que continuava a crescer, lenta mas seguramente. Aceitar a oferta poderia ser um passo em direção a algo que ela ainda não estava pronta para explorar, mas ao mesmo tempo, recusá-la poderia parecer que ela estava evitando-o de propósito.

“Claro, um café seria bom,” ela disse finalmente, optando por manter as coisas simples.

Eles saíram juntos do prédio, e a chuva que caía antes havia se transformado em um leve chuvisco, o tipo que não requer um guarda-chuva, mas que ainda refresca o ar. Caminharam em silêncio por alguns minutos, até chegarem a uma pequena cafeteria a poucos quarteirões do escritório.

Sentados com suas xícaras de café, o ambiente parecia mais descontraído do que no restaurante da semana anterior. Talvez fosse a familiaridade do lugar, ou talvez o fato de que, depois de uma reunião bem-sucedida, ambos estivessem mais relaxados. A conversa fluiu novamente, sem a necessidade de abordar o que estava acontecendo entre eles.

“Eu costumava vir aqui quando comecei a trabalhar na cidade,” Ethan comentou, olhando ao redor. “Era o meu lugar para fugir quando as coisas ficavam muito complicadas no escritório.”

“Eu entendo,” Lara respondeu, soprando suavemente seu café para esfriá-lo. “Todos nós precisamos de um lugar assim, para escapar.”

Eles continuaram conversando, explorando memórias de trabalho e momentos difíceis de suas carreiras. Para Lara, era revigorante ouvir mais sobre o lado pessoal de Ethan, sem a pressão do escritório ou do caso Vertax pairando sobre eles.

Quando finalmente decidiram voltar ao trabalho, Lara sentiu que algo havia mudado entre eles. Não era uma mudança drástica, mas uma pequena abertura, uma fissura na muralha que ambos tinham erguido para manter os sentimentos sob controle. Ela sabia que ainda havia muito a ser resolvido, mas pelo menos por enquanto, estava satisfeita em deixar as coisas como estavam.

No caminho de volta ao escritório, enquanto caminhavam lado a lado sob o céu nublado, Lara se perguntou até onde essa nova dinâmica os levaria. Havia algo confortável na ideia de explorar isso lentamente, de deixar o tempo e as circunstâncias ditarem o ritmo. Talvez, pensou ela, nem sempre era necessário ter todas as respostas imediatamente.

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