Não toque no nome dela

  POV's Selena.

29/10/2022

O ressentimento que sinto do passado, não vai mudar nada o que aconteceu. Ter perdido os movimentos das pernas por erro médico, segundo o "diagnóstico", me faz achar que aquele infeliz doutor fez na intenção de me deixar numa cadeira de rodas. Se bem que eu ameacei matá-lo, para me punir o velhinho quis castigar-me. Olha só que ironia.

Já se passaram tantos anos, mas é como se fosse ontem, porque ainda tenho aquela maldita cena grudada na minha cabeça cabeça; do Justin me virando as costas e levando Mabel com ele, nem para ficar ao meu lado, aquele cretino teve coragem de permanecer.

Fiz a cirurgia e quando despertei estava sozinha, anestesiada e em péssimo estado. Depois percebi que não estava sentindo as minhas pernas e veio uma ridícula enfermeira tentar me "acalmar". Mas nada foi suficiente, eu só queria mesmo na verdade, ter Justin comigo, assim como ele prometeu naquela barraca de que não sairia do meu lado independente se algo de ruim acontecesse. Mas ele não cumpriu a promessa .

Não me arrependo de ter ficado assim para salvar a vida dela. A minha loirinha é tão o oposto da Mabel, ela é meiga, tem um jeitinho de cuidar de mim como se eu fosse a sua favorita e fora que é bastante prestativa. Nunca me senti amada por ninguém, nem por Bieber. Ele sempre me tratou como se eu fosse uma cachorra. Na verdade eu era, mas precisava pelo menos de um pouco mais de "atenção" sem as brigas desnecessárias que tínhamos.

Foi até bom ter deixado ele de vez, não suportaria ter que passar anos ao seu lado, com ele procurando outras mulheres, já que eu não seria capaz de lhe dá o suficiente.

Halloween é o tipo de evento que todos aqueles babacas se reúnem e fazem o famoso ritual da fogueira, escolhendo um dos nossos para morrer. Estou convidada para festa que acontecerá daqui a dois dias, no entanto não sinto o menor prazer para comparecer. Não quero ser motivo de chacota para aqueles vermes, eles vão zombar da minha condição física e com certeza dirão que é bem feito para mim. Estou farta de viver trancada neste quartinho, não saio nem para ver a luz do dia. Quem vive pedindo esmola e dinheiro no meio da rua, é Annabelle, a única que permaneceu ao meu lado.

— Bom dia, mami! Feliz aniversário!– a primeira coisa que entrega-me assim que acorda, colocando a caixinha embrulhada de presente nas minhas pernas.

Sinto um beijo sendo depositado na minha bochecha, a agradeço me esforçando para abraçá-la; embora minha limitação não ajude muito. 

Meus olhos estão brilhando para saber o que é o presente. Annabelle sempre vêm com esses presentinhos decorados, em todas as ocasiões.  Essa menina tem o dom surreal de me deixar menos rabugenta, menos mau-humorada e até mais leve. Consigo ser uma Selena que ate então desconhecia que existia.

Eu consigo me comportar como alguém normal, o que é estranho.

Sinto falta daquela vida, confesso. Era bom demais matar, se esconder na floresta, viver mandando naqueles idiotas. Mas de um tempo, fui abrindo mão dessas coisas mínimas para me isolar de tudo e de todos, por causa desse anjinho precioso que veio para fazer diferença na minha vida.

Desde de quando ela era pequena me apeguei a ela, desde do primeiro momento que a coloquei em meus braços, eu sabia que aquela seria a minha garotinha preferida. Já com Mabel não, sempre houve um bloqueio, por achar que ela era filha daquele doente, eu não soube muito bem  separar as coisas.

— Não precisava  comprar presente  para mim, Annabelle.— vou rasgando a embalagem aos poucos, repreendendo o seu jeitinho fofo de querer a todo custo me agradar.— Não precisa ficar gastando dinheiro com besteira, esse dinheiro ia servir até para gente se alimentar. Você sabe muito bem o quanto é arriscado ficar pedindo dinheiro nos sinais. Pode ser perigosa, oh menina.

— Eu sei me defender, mami. Ninguém vai encostar em mim. Não vou deixar.— numa cara séria, parece até mesmo uma adulta falando.

Esse sua personalidade me lembra a alguém...

— Você falando assim, me lembra até a mim falando. Sabia?— observo o seu temperamento esquentado, ao mesmo que Annabelle se mostra frágil, ela é a garota mais forte que eu conheço.— A única diferença é que você é boa, mas não eu era tanto. Fiz tantas loucuras, você não tem noção.— gargalho, relembrando do quanto eu tinha  um péssimo histórico.  Eu infernizava a vida de todo mundo.

— E o papi gostava do seu jeito?— o cita; mudo o humor, fechando a cara.— Como era o papi, mami? Ele era igual a mim?— olhando assim.... Os dois têm olhares iguais. Annabelle é a cópia fiada de Justin, o que torna um pouco difícil de esquecê-lo.— Porque não tenho a cor de seus cabelos. Então eu devo ter puxado o meu papi nessa parte.

— Não fale desse homem.— a corto, carregada de mágoa.

Toda vez que ela tenta saber dele, eu busco encerrar o assunto. Não me sinto confortável para dizer que ele a largou lá, para que ela morresse, e preferiu Mabel. Ele fez uma escolha e escolheu nos deixar para trás.

— Por que tem raiva do meu papi, mami? O que ele fez de tão ruim para você não me deixar falar dele, hein mami?— sua desconfiança aumenta. Disfarço. Não quero estragar o meu aniversário e nem deixá-la chateada por causa do traste.

— É melhor nós não falarmos de defunto, é só isso.— murmuro, forçando um semblante razoável para tirar da sua cabeça que não é bom ficar lembrando. — Pra falar verdade, meu amor, eu não recordo de como ele era. Se era loiro ou moreno. Foi apenas uma vez, Annabelle. Não significou nada. Depois que você nasceu, cada um foi pro seu lado— a engano, soando com desdém ao menciono-ló.

— Mas... — sua voz se perde, franzindo a testa ao olhar-me confusa.— Quem era a outra menina da foto?

— Como assim menina da foto? — fico perdida, vendo um ponto de interrogação presente em seus olhos.

— Essa mami.— aponta, mostrando o porta-retrato. Onde essa garota achou essa fotografia? Faz tanto tempo que escondo esse retrato, foi a única lembrança que restou do Justin e de Mabel.

— Por acaso, você anda mexendo nas minhas coisas, Annabelle?— a repreendo, um pouco irritada. Não admito que ela me faça abrir o jogo na base da pressão. Nunca fui de ceder chantagem, principalmente chantagem    emocional.

Ela me deu este porta-retrato como presente de aniversário. Na intenção, de quê? De estragar o meu dia?

— Ela parece ser a sua filha também.— dá de ombros, meio encabulada, olhando-me de um jeito sapeca.

Annabelle é nata em manipular, acho que tenha puxado a mim nesse quesito.

Suspiro fundo.

— Sim, ela é a sua irmã.— confirmo a contragosto. — Porém, não fique feliz.— a peço, quando a vejo sorrir meigamente ansiosa em querer saber mais detalhes. — Ela também morreu junto com o seu pai. Essa história é muito triste e não gosto de ficar relembrando, porque ainda me abala muito.— invento na maior frieza do mundo.  Posso está sendo má e egoísta em inventar uma mentira tão  cruel, mas quero apenas protegê-la da verdade.

Todo sorriso se desfaz da cara da loirinha, que logo fica tristinha e cabisbaixa. Se dependesse da Annabelle, eu já teria arrumado um macho para me envolver. Porque ela quer muito ter uma família, ela é uma criança obcecada com essa ideia.  Com certeza se ela tivesse crescido com Justin, seria igual Mabel, ia ser a princesinha do papai.

Por onde será, que aqueles dois andam?

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Floresta.

POV's Justin Bieber.

— Bieber, mano, quanto tempo!— Ryan saúda-me e dou toque de mão. Faz um bom tenho que não apareço nesse hospício.

— Pois é cara, é falta de tempo!— sento-me na cadeira, colocando as pernas de cada lado. Meu amigo entrega uma garrafa de cerveja e começo a bebericar o álcool— Tô trabalhando, cara. Arrumei um emprego digno, sai dessa vida sabe. Comprei um caminhão, vivo viajando. Dificilmente passo por Nova York. Por incrível que pareça tô de folga e resolvi dá um pulo nas áreas.  Mas ficar mesmo, nunca mais.

Não tenho boas lembranças desse lugar, foi até um alivio ter ido embora e recomeçado em outro ambiente. Porque eu não ia conseguir suportar viver com o fantasma da Selena preso em minha cabeça.

Ainda sonho com ela.

— Mano, fico feliz por você. Torço muito por você, Bieber. Você sabe, mano. É bom te ver mudado, com outro astral, com outra vibe.— constata a minha mudança, na maior animação.

Sou um novo homem. Quero poder um dia apagar o passado de vez, passar uma borracha por cima. Mas ainda me sinto culpado.

— Cara, eu até parei de matar, acredita?

Meu amigo dá uma gargalhada alta, após a revelação que faço.

— Brother, você está mesmo mudado! — movimenta a cabeça em sinal de afirmação.— Onde está a Mabelzinha? Deve está enorme. Lembro que aquela menina era tão sinistra, eu tinha um medo danado dos olhos dela.—soa super exagerado, achando que a minha filha é o próprio capeta.— Ela tinha os olhos de uma boneca assassina. — é o quê? — Sério, mano!

Ryan fala cada asneira. Não mudou nada, continua o mesmo sem noção.

—   Cara, a  Mabel está no caminhão. Ela não quer descer.

— Deve ter puxado a marra da Gomez. — a menciona sem querer, acabo ficando sem jeito e desconfortável.

— Não toque no nome dela.

— Desculpa, brother. Não foi a minha intenção.— tenta consertar o que falou, mas é tarde. Levanto da cadeira; disposto a ir embora.— Peraí, Bieber. Você nunca a procurou. Hoje é o aniversário da Gomez, a galera quer fazer um aniversário surpresa. Você poderia vim pra ver como ela tá.

— Não quero, obrigado.—ando saindo da cabana. Quero sumir, para não ter que me deparar com aquela mulher outra vez.

— Você fica frio quanto o assunto é ela, cara. O que aconteceu? Fala, joga pra fora! Tô aqui. Somos amigos ou não somos?

— Claro que somos, Ryan.

— Então. — gesticula com os braços, querendo arrancar de mim o que se passou.

— Depois que voltei no hospital para levar a Mabel de volta, Selena não estava mais lá no corredor com o médico. Aí notei que a bebê também  não estava na incubadora.

— E aí?

— Aí, fiquei procurando por elas durante a madrugada inteira feito louco. Sabia que tinha feito uma grande merda errada, mas não ia sossegar até encontrar com Selena e me desculpar.

— E você conseguiu se desculpar?

— Quando eu soube que ela tinha feito a cirurgia no lugar da Mabel, na manhã seguinte  eu fui no quarto onde ela estava.

Respiro pesadamente. Dói, como dói.

— E o que a Gomez falou para você, cara? Pra ter te deixado desse jeito.

—Falou que tudo que tava acontecendo com ela era culpa minha, começou a me chamar de monstro e me  atacar de todas as formas. E ainda jogou na minha cara que a bebê tinha morrido por minha causa. Ela disse que me odiava, cara, e disse que se eu não sumisse da sua vida, acabaria matando a Mabel.  Quase perdi a cabeça com a frieza daquela mulher, quase parti pra cima dela.

— Você chegou a machucá-la, Bieber?

— Claro que não! Mas Selena sempre me tirou do sério, que depois daquele dia mandei um foda-se pro relacionamento que tínhamos. Hoje não  quero mais ver ela nem pintada de ouro. Para mim, essa mulher morreu.

— Parece que ela pensa o mesmo de você, irmão.— Ryan diz e levanto o olhar atentamente.  Me sinto magoado. — Ela teve uma outra filha.

— Filha com quem?— por mais que eu queira ignorar esse fato, acaba batendo um frio na espinha. Caralho, não vou me abalar com essa porra. Preciso fingir que não me importo.

— Não sei de quem foi, mas as garotas da floresta dizem que foi de um carinha que ela conheceu. Nunca a menina deu as caras por aqui. Gomez vive trancada na cidade, em um lugar no subúrbio.  Não sei se você sabe, irmão, mas a Gomez ficou paraplégica.

— Paraplégica?— indago perplexo, engolindo em seco.

Estou chocado e sem reação.

— Sim, pelo que parece a cirurgia não  deu tanto certo. Ela não te contou essa parte?

Nego com a cabeça, me sentindo um otário.

— Você sabe o endereço dela?— questiono, tomando a atitude precipitada  de cavar mais fundo o passado.

— Mano, eu até sei, mas não vou dá. — dá de ombros, se recusando.— Vai sujar pro meu lado. Não posso ser visto como X9.

— Preciso ver como ela está, cara. Pelo menos uma última vez.— alastro trêmulo, com o coração acelerado.

Tô tão nervoso. Selena sempre foi a minha ruína. O meu ponto fraco. É tão louco saber que mesmo depois desses anos, eu não consegui supera-lá. Não consegui me desamarrar definitivamente dessa mulher. Existem algumas pendências abertas no meu coração.

— Irmão, tu acabou de dizer que não quer ver ela nem pintada de ouro.— usa as minhas palavras, contra eu. Inspiro fundo, ao ser desmascarado.

— Mudei de ideia.

— Mano, não vai ser meter em problema, tu sabe que a Gomez é cilada.— alerta, mas o ignoro.

— Foda-se! Me passe o endereço.— estendo a mão. Acho que cometi um erro.

— Tu ainda ama essa mina, brother, tô vendo nos teus olhos.— admito que amo e não minto em esconder que a mãe da minha filha ainda mexe com a minha mente.

—Tome esse endereço e vai atrás da tua mulher.— mesmo meio relutando, meu melhor amigo no final acaba cedendo.

— Obrigado, cara,— o abraço eufórico e ansioso, despedindo-me.— Só não sei se ela vai me receber. — bate um desespero em pressentir que provavelmente vou ser rejeitado por Selena.

Talvez ela tenha me largado no passado por achar que eu jamais ficaria com ela no estado que se encontra. Eu posso ter a chance agora de provar o contrário.

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15:30 PM

— Vamos ver a sua mãe, Mabel.— a comunico, enquanto dirijo o caminhão em sentido a cidade.

— Que mãe, pai?— olha-me com indiferença, tratando-a com nenhum significado. Levemente, reviro os olhos, soltando um longo suspiro.

— Selena.— sussurro baixinho, meio desconfortável ao cita-lá.

— Essa mulher não é a minha mãe, pai. — a renega. A culpa é minha. Passei todo esse tempo jogando a nossa filha contra Gomez, menti até que ela foi embora com outro homem.— Não sei como o senhor consegue ir atrás de alguém que nos abandonou. Ela nunca nos quis, pai.

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