|•Capítulo 6•|

Ela entrou no quarto. Sei que é Maggie pois é somente ela quem entra aqui. Mal nos falamos depois daquela conversa, e é melhor assim. Quem dera que ela — uma garota de apenas dezoito anos — fosse capaz de articular planos tão meticulosos para fugir de um casamento. Devo dizer isso porque acredito que com meus vinte e quatro não tenho essa fabulosa capacidade. Bem, eu não tenho capacidade para nada.

— Bella nós iremos para Florença.

— Chegou a hora não é? — solto uma risada amarga. — A hora de entrar em uma igreja com um vestido branco todo babado e rendado…

— Não vai ter casamento nenhum em igreja alguma Bel. É apenas no civil. O CEO não quer nenhum tipo de festa ou algo em que ele tenha que se manter no meio de um aglomerado de pessoas.

— Graças aos céus! — murmuro.

— O vestido permanece.

— Retiro o que eu disse — desanimada. — O CEO sabe que a ex-noiva dele será substituída por mim?

— Saberá no exato momento em que você entrar no cartório com um dos seguranças e minha mãe.

Pisco várias vezes antes de questionar:

— Como assim?

— Minha mãe me ajudou a fugir. Acha que se eu não tivesse ajuda meu pai já não teria me encontrado?

Calo-me. Ela prossegue:

— Em hipótese alguma diga seu verdadeiro sobrenome Bella. Agora, você é Bella Bianchi. Minha irmã mais velha. Nunca foi revelada por nossa família por causa da deficiência — me desculpe por isso Bel, foi o que mamãe mandou-me lhe falar. Viveu nos EUA tentando recuperar a visão com tratamentos mas nada foi possível e vai se casar em meu lugar. O casamento é daqui dois dias. Minha mãe irá contar tudo ao meu pai e irei levar você para eles conhecerem. Esse será o motivo pelo qual não tem sotaque italiano como eu e minha família. Por ter crescido nos Estados Unidos sendo criada por uma babá e serva de minha família. Os documentos falsificados ficaram prontos amanhã de manhã.

Quem eu vou ser a partir de agora? Quem diabøs eu fui? Quem eu sou neste exato momento? Há uma diferença muito grande entre estes três tempos. Futuro. Passado. Presente. Ou será: esquecimento, conhecido e desconhecido? Passado que foi esquecido. Presente que conheço. Futuro que desconheço. Imprevisível. A minha vida não passa de uma história falsa. Um jogo perdido por mim, vencido por meus inimigos.

— Bella! Bella! Você está no mundo da lua? — ouço a voz de Maggie e saio de meus vagos pensamentos.

— Desculpe, estava apenas pensando em algo.

— Tudo bem. Devo ter lhe dito coisas demais de uma só vez. Não peça desculpas por isso, me desculpe na verdade.

Apenas assinto com um aceno de cabeça. Espero que ela tenha visto.

— Certo, então eu irei acabar de organizar as coisas para irmos. Mais tarde lhe explico as coisas com mais calma.

— Não é necessário repetir tudo o que disse — a corto. — Já entendi essa parte. Apenas acrescente o que for necessário.

— Ok.

Passos. A porta se abre, se fecha. Estou só outra vez e com um futuro incerto nas mãos. Pesado, tenso e pura neblina. E também, sem luz. Escuridão. Onde eu vivo.

[ … ]

Horas depois Maggie me ajudou no banho e a me vestir. Nunca havia outra pessoa no lugar dela. Sempre Maggie que me trazia tudo, que falava comigo. Talvez não tivesse ninguém ali para fazer isso e ela tomara para si o cargo. Mas de qualquer forma eu me senti confortável com ela. Não era uma qualquer olhando para meu corpo. Ela me guiou pela casa até o carro. Não houve conversa com seguranças desta vez. Sequer ouvi a voz deles. Somente passos, movimento. Maggie fez todo o trajeto ao meu lado. Todos em silêncio.

— Bella, estamos chegando. Um conselho: tenha um pouco de paciência com meu pai. Ele às vezes é problemático.

— Já convivi por tempo demais com minha mãe para saber lidar com isso.

Ela desce do carro e segundos depois a porta ao meu lado se abre.

— Vamos — ela pega minha mão. — Não a solte e tome cuidado.

Desço do carro com sua ajuda. A filhinha de família é gentil até demais para meu gosto e desconfio que não passe de uma armação para me convencer a concordar com seu plano. Na verdade, já estou tão envolvida nisso que não há como mais escapar. Nem se eu quisesse escaparia. Ela me guia para não se sabe onde, mas não me faz sentir como quando é Amélia. Amélia tem mais leveza com os passos, mais calma. O sol da tarde que morna a minha pele se vai, sendo substituído por uma sombra fria que se torna menos confortável ao passo que adentramos o que me parece ser a casa dos pais de Maggie. Talvez o frio súbito não me incomode tanto, o meu nervosismo faz esse papel com uma perfeição maior.

Minha garganta está seca e me sinto a cada passo mais desconfortável com o ambiente. Não me causa a sensação de ser um lugar acolhedor apesar do canto de pássaros distantes. Parece-me apenas parte da formalidade. A forma que uma família rica tem de se expor para mostrar seu poder impregnado no ar que respiro e me faz sentir rebaixada ao ser humano mais maltrapilho do mundo. A ótica das pessoas inundadas de riqueza é totalmente diferente. Chega a ser estranha e ridícula.

— Bel estamos chegando no escritório do papai. Se prepare!

Solto uma risada nasal.

— Quase sempre estou pronta Maggie e quando não estou enfrento o que é preciso mesmo assim. Como agora, quando não há alternativa.

Foi a vez dela de rir baixo.

— Certo Bella.

Mais caminhada. Mais silêncio. A cada passo o clima fica mais frio, irrefreável. Uma porta de ar pesado se abre num sibilo silencioso. Esperado. Mais passos à frente.

— Maggie, minha filha! — uma voz feminina, preocupada. Saltos altos em passos ansiosos vem em nossa direção. Na direção de Maggie, que solta minha mão para possivelmente abraçar a mãe.

— Mãe! — emoção, saudade. Um carregamento incontestável de sentimentos.

Vou arrastar de uma cadeira, alguém de pé — possivelmente o pai de Maggie.

— Maggie Bianchi — uma voz grossa, superior.

— Pai — passos hesitantes.

— Maggie Bianchi — ele repete, mais afiado. Passos determinados do homem.

— Me desculpe, mas eu não queria…eu não queria me casar com aquele homem… — voz chorosa.

Plaft. Um tapa. Do homem em Maggie.

— Ernest! — a mãe de Maggie exclama, perplexidade na voz.

— Você foi trouxa o suficiente para fugir do casamento bem debaixo do nariz daquele homem! Você só não foi encontrada porque ele não quis, porque sequer ele se importou em mandar procurá-la. Se quisesse, se importasse, ele iria até no infernø para te buscar se fosse preciso Maggie, sua idiøta! Por que não me contou o que ia fazer? Eu poderia ter bolado algo mil vezes melhor!

— Ele sabe que temos que casar nossa filha para manter os negócios de pé e não irmos à falência…

— Não tenho que me casar com mais ninguém — Maggie protesta. O rosto dela deve estar ardendo, pois ela sibilou entre dentes. — Grace, não está vendo Bella?

— Ah — confusão. — Bella me desculpe! — passos em minha direção. — Por favor — ela pega em meu braço, me guiando. — Sente-se.

Me acomodo em algo confortável. Um estofado.

— Sou Grace, mãe de Maggie. É um prazer conhecê-la.

— O prazer é meu — digo sendo educada.

— Pai, se apresente! — Maggie insiste.

O homem se aproxima, nota pelo barulho dos passos determinados.

— Sou Ernest Bianchi. É um prazer conhecê-la Bella?

— Bella Monroe, porém não uso o meu sobrenome.

— Por que uma garota tão jovem não usaria o sobrenome da família? — Ernest pergunta com certa curiosidade.

— Apenas odeio a pessoa de quem o herdei.

— Odeio seu pai?

— Meu pai está morto — corto-o de uma só vez.

— Querido já é o bastante, não acha? Deixe a garota em paz.

— Me desculpe Grace.

— Acredito que mamãe já tenha lhe contado tudo o que precisa saber, não acha papai? — Maggie de certa forma o repreende.

— Tudo bem, já entendi. Chega vocês duas, sem mais perguntas. Satisfeitas?

— Muito — as duas respondem em uníssono.

— Sinta-se à vontade Bella — ele se dirige a mim outra vez. — Agora se me dão licença preciso sair para uma reunião.

Os passos extremamente determinados se afastam até não mais serem ouvidos.

— Você realmente está acostumado com pessoas de temperamento ruim Bella — Maggie diz e desmorona no sofá ao meu lado.

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Comments

Larissa Barbosa

Larissa Barbosa

duvido muito ainda dos planos do irmão e acredito que a raiva que a mãe dela nutri por ela possa ter algo relacionado ao passado dela claro além daquele acidente

2023-04-28

3

Rosângela Amorim Rezende

Rosângela Amorim Rezende

Maggie não sabe o bem que estar fazendo pela Bela

2023-04-09

1

Rosângela Amorim Rezende

Rosângela Amorim Rezende

bela vai ser feliz

2023-04-09

1

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