De algum jeito, hoje devo me sentar à mesa com aquelas pessoas, ou devo dizer, “família”? Os olhares de desprezo endereçados a mim já nem me afetam tanto. Posso ver claramente o que se passa na cabeça de todos aqui.
-Como está, Mirai? -Holland pergunta o óbvio.
-Estou bem, pai. -Nem ao menos olho nos seus olhos.
A atmosfera é tão sufocante que me faz sentir enjoo, já que não consigo me acostumar a estar perto deles.
-Papai, por que essa coisa está aqui? Já estou perdendo o apetite só de olhar para ela. -Alice me olha com nojo, como se nem ao menos me considerasse humana.
-Lice, por favor, não é o momento! -Holland não está fazendo isso para me defender, mas por que tem algo importante para falar. -Momentaneamente, Mirai voltará para a escola com vocês.
-Pai, qual o motivo dessa decisão repentina? Mirai não pode voltar para lá, o senhor sabe que ela sofreria bullying outra vez. -Alexander bate na mesa com toda a força, mostrando claramente seu descontentamento.
(Mentiroso, era por sua causa que todos me tratavam mal).
-É verdade pai, ela só envergonha o nome da nossa família. -Estella me olha com desdém.
-Se acalmem, como vocês já sabem, Mirai estará completando dezessete anos no próximo mês, e eventualmente se tornará maior de idade no ano que vem. Tem exatamente três anos que ela nem mesmo saiu dessa casa, vejam só como ela está pálida. -Ele aponta para mim e todos os olhares ruins voltam a mim. -Acredito que ela deva pelo menos fazer amigos, e aproveitar esse último ano na escola.
Se alguém olhasse de fora, acreditaria que é somente um pai que se preocupa com a saúde da sua filha, mas por trás daquelas palavras havia algo oculto.
-Querido, acha mesmo que essa garota arrogante merece viver uma vida nor… -Holland interrompe Josephina.
-Estella se tornará a noiva de Mauro em breve, e Alexander já está noivo da filha do prefeito. Não acham que está na hora de Mirai se tornar útil para alguma coisa? Acham mesmo que eu adotaria a filha de dois desconhecidos sem que ela tivesse alguma utilidade? -Ele me olha como se soubesse o meu segredo.
Holland apenas se retira, me deixando à mercê de sua família.
-Não sei o que o papai está planejando, mas espero que seja uma maneira dolorosa de se livrar de uma praga igual a você. -Estella joga suco em mim. -É melhor você não aparecer no meu campo de visão.
Estella, Josephina e Alice saem me olhando feio, agora só resta Alexander.
-O que você está olhando? Achou mesmo que eu ia te defender? Estou com muita raiva agora por sua culpa! É melhor você não se aproximar de nenhum homem, caso o contrário, esqueça a sua liberdade, pois eu vou te levar para bem longe. -Ele saiu pisando alto.
Esse foi o começo da dos piores dias da minha vida.
Voltar para a escola poderia parecer um sonho para alguém que ficou presa em casa por tanto tempo, mas quando eu sei que o mesmo vai se repetir, me parece mais ser um pesadelo.
-Não esqueça do que eu te disse, esse será meu último aviso, Mirai, não ouse me trair. Se você olhar para outro homem, não irei me segurar. -Ele acaricia minha bochecha enquanto fala essas palavras horríveis.
Ele nem mesmo se importou que havia pessoas nos observando nos corredores da escola.
-Vejo você mais tarde, minha linda Mirai. -Alexander sai, me deixando atordoada.
Assim que Alexander saiu, vi uma silhueta escondida perto dos armários da escola, não consegui ver seu rosto.
Seguindo até a sala, meu maior medo era estar na mesma turma que Alexander, já que eu seria vigiada a cada segundo por ele.
-Turma, essa é a nova aluna, Mirai Amber. Ela é a filha do meio da família Amber, que são uma das famílias investidoras da escola, por isso, sejam gentis com ela.
(Como se isso fosse resolver alguma coisa).
-Mirai, só temos um lugar disponível na sala, então espero que se dê bem com seu colega de carteira.
(Isso é ruim, se Alexander vir que eu estou sentando perto de um garoto, ele pode me matar).
-Senhorita Amber?
-Eu poderia… Trocar de lugar? -Minha voz está trêmula.
-Tem algum problema com seu colega?
-Não, não é isso…
-Então por favor, se sente.
Eu não respondi mais nada e apenas fui até lá.
(O que devo fazer? Preciso dar um jeito antes que Alexander veja).
-Por acaso minha companhia dá medo? -Eu tremo, com medo de respondê-lo.
Ele me passa um papel.
“Evitar falar com as pessoas não vai resolver seu problema.”
Eu o ignoro até o final da aula.
Eu não percebi em que momento Alexander nos viu, mesmo eu não tendo culpa, acabei sendo agredida.
No dia seguinte, eu já previa que aconteceria, todos os olhares estavam em mim. E eu sabia que era culpa de Estella, já que repetidas vezes, ela colocou todos contra mim.
-Saí da frente, sua esquisita. -Uma garota esbarra propositalmente em mim.
-Eu sinto muito… -Mesmo eu sabendo que me desculpar não iria adiantar nada.
-Acha que só desculpas resolvem? Quem você pensa que é para ao menos encostar em mim. Não adianta tentar nos enganar, todos aqui já sabem que você é adotada, ninguém sabe quem foram as bestas que te deram a vida. -Ela começa a me empurrar.
(Por que? Por que isso acontece comigo? Eu tenho mesmo que sofrer tanto?).
Minhas lágrimas começaram a rolar.
"Tudo sempre é igual, sou eu contra o mundo, tenho que viver sozinha para sempre?”.
Foi isso que eu pensei naquele momento.
Meu olhar cruzou com o de alguém, ele não me olhava feio, nem mesmo tinha nojo.
-Você deveria tomar mais cuidado. -Eu ia cair, mas ele me segurou.
Algo inesperado aconteceu, a atenção se foi para ele, que dizia algo no ouvido da garota. O rosto dela mudou completamente de expressão, ela correu apavorada.
-Obriga… -Eu nem pude agradecer, já que Alexander simplesmente apareceu e começou a me arrastar.
Ele me leva até uma sala vazia.
-O que você pensou que ia fazer? Por que deixou ele te tocar? -Alexander me sacode.
Nesse momento, eu explodo.
-Sério, você queria que eu fizesse o que? Eu deveria ter caído e me machucado somente por que você quer?
Ele me dá um tapa.
-Mirai, eu te avisei. Você vai pagar pela raiva que me fez passar.
Ele coloca a mão no meu rosto e começa a se aproximar. Eu viro para evitar, mas ele me obriga a olhar diretamente nos seus olhos. Então ele me beija, eu sinto a repulsa subindo e a vontade de fugir, sinto meu sangue gelar de medo. Aquilo nem deve ser considerado um beijo, mas sim um ato horrendo.
-Mirai, entenda que você é minha! -Assim que ele terminou de falar, de repente ele desmaiou.
Eu desabo de alívio. Um som de folhas mexendo soa claramente para mim pela janela.
-Que estranho, nem está ventando forte. Ah, que seja, preciso sair daqui antes que ele acorde.
E foi assim que começou, depois daquilo, parecia ter algo, ou alguém me salvando sempre que eu precisava. Só não esperava que a verdade fosse mais complicada do que pensei.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 39
Comments
Eliana Aguiar
À partir daí seria o momento certo dela fugir para o mais distante que pudesse, sem olhar ora trás
2022-09-07
3