Você quer suco de laranja?

Da minha sala, vi ele chegando e sentando na mesa dele com um copo de água nas mãos. Uma hora depois, veio até minha sala e bateu na porta.

— Pode entrar.

Guilherme entrou todo profissional, me entregou o resumo da investigação que ele fez.

— A senhora Bárbara esteve na cavalgada até às 16:00 de ontem e depois disso não foi vista mais.

O namorado dela também está desaparecido, acho bom pedirmos uma ordem de prisão para ele, tudo leva a crer que ele tem algo a ver com o sumiço dela.

— Eu já expedi a ordem de prisão, ele já está sendo procurado para dar esclarecimentos.

Vi Guilherme ficar nervoso, mas não falou uma palavra sobre o assunto, continuou a falar.

— Devemos dar uma olhada na casa da vítima para ver se tem alguma evidência, talvez uma justificativa para o sumiço.

— Só um minuto.

Vi ele ficar mais nervoso ainda porque deve estar achando que estou fazendo pouco caso do trabalho dele, e agora vai ficar mais bravo ainda.

Peguei o telefone e chamei Marcos Vasques.

Vasques é um ruivo sorridente e de bem com a vida, está quase aposentado, mas diz que só sai daqui se eu o expulsar, coisa que não vou fazer porque ele está comigo desde o começo, me conhece e sentiu o clima tenso, não falou nada.

— Estou aqui delegada.

— Por favor, detetive Vasques atualiza o detetive Mendonça de suas descobertas sobre o caso Bárbara.

— Fizemos uma diligência até a casa da senhora Bárbara e encontramos várias manchas de sangue, dando a impressão de uma luta. Conversamos com os vizinhos e D. Maria. A vizinha do lado esquerdo disse que eles tinham brigas feias, que o namorado tinha muito ciúmes dela e por isso brigavam, mas que ontem à noite ela havia ido à igreja e não escutou nada.

— Obrigado, detetive, Mendonça quer perguntar algo ao detetive?

Guilherme virou para o outro e disse que não. Vasques deu um tapa no ombro de Guilherme e saiu.

— Você mandou outro detetive investigar no meu lugar?

— Eu não podia deixar o caso parado enquanto o senhor sofria sua punição.

— O caso é meu, e você não pode simplesmente colocar outro investigador no caso sem me avisar antes.

— Se acalme Mendonça, eu não coloquei outro investigador no seu caso, só dei andamento no caso da delegacia enquanto você sofria sua punição por insubordinação, mas parece que não aprendeu nada, já está fazendo de novo.

Vi Guilherme passar a mão nos cabelos e respirar tentando controlar o nervoso.

— Desculpa, delegada, não vai acontecer mais, eu me alterei, mas já voltei ao normal.

— Ótimo, pode ir descansar, está dispensado por hoje.

— Você não vai?

Dei um olhar de advertência para ele.

— Desculpa, já entendi, já estou indo.

“Guilherme”

Ela manda me prender, manda outro detetive fazer o meu serviço e eu não tenho direito nem de reclamar.

Mulher mandona, irritante, tenho que me manter longe, eu consigo mesmo meu corpo querendo pegar ela de jeito e quebrar aquela camada de gelo que ela criou em volta de si.

Cada vez que me chama de Mendonça, meu cérebro entende outra coisa e manda um sinal para meu amigo no meio das minhas pernas, que reage e tenho que me controlar para não ter uma ereção.

Até que horas ela vai ficar aqui? Vou perguntar para Melissa.

— Detetive, posso falar com você um momento?

— Gostei de ver que está aprendendo a respeitar as ordens da delegada.

— Não quero ser preso de novo, ela fica aí até que horas?

— Normalmente, até o pessoal que vai ficar de plantão ocupar seus lugares e ela ver que estão todos aqui. Mas hoje, com a amiga dela desaparecida e nosso pessoal investigando, não sei se ela vai conseguir ir para casa.

— Ela trabalhou tanto quanto todos nós e não vai descansar?

— Não se mete, detetive, ou você vai amanhecer no xilindró, me escutou? Vai para sua casa e deixa a delegada que ela sabe se cuidar.

— Já vou indo.

“Guilherme”

Fiquei parado pensando de onde ela tira tanta energia, será que não vai mesmo embora?

E se alimentar? Será que ela pede alguma coisa para comer? Para Guilherme, você não tem nada com isso e ela não te quer por perto, vai para casa descansar, ela sabe se cuidar.

Saí e fui para casa, mas minha cabeça não foi comigo, tomei um banho e fui preparando alguns lanches e resmungando comigo: como sou idiota, ela vai me esculachar de novo e vai me colocar na prisão, vou levar alguns lanches a mais e, como desculpas, digo que fiz para todos, que não foi só para ela. Ficaram em três detetives, fiz 15 lanches e dois litros de suco de laranja, voltei na delegacia.

Cheguei e estava um silêncio, nem parecia o mesmo lugar super agitado do dia, logo vi a luz da sala dela acesa e Marcos Vasques veio de encontro comigo. Ele é o detetive mais antigo daqui, deve estar para se aposentar.

— Mendonça, o que você faz aqui?

— Vim trazer alguns lanches, sei que o plantão da noite é difícil.

Mas eu não consigo parar de olhar na sala da delegada e Marcos percebe.

— Guilherme, ela só sabe trabalhar, lutou muito para estar na posição que está hoje e se você está fazendo tudo isso só de pirraça porque ela te enfrentou, vai embora daqui e fica longe dela.

Agora, se você for cuidar dela como ela merece ser cuidada, eu vou te auxiliar a se aproximar porque ela precisa de cuidados, só não aceita isso.

Por um momento, pensei em voltar para trás, mas Marcos falou dela com tanto carinho que resolvi ficar e ver o que vai dar.

— Marcos, agora eu só quero dar um lanche para ela como amigo.

— Certo, Mendonça, vai lá e fica tranquilo que os meninos não vão incomodar vocês.

— Esta é sua ajuda? Segurar os outros detetives longe?

— Isso é muito importante, se ela não tiver que usar a autoridade com você para provar para os outros que não faz distinção entre nós, talvez te deixe ficar.

— Tudo bem, segura os detetives longe do radar. Leva esses lanches para eles.

— Você é um cara legal.

Marcos foi fazer a parte dele e eu fui encarar a fera, achei que ele ia me dar alguma dica de como acalmá-la, mas só vai tirar os rapazes.

Cheguei na sala dela, bati na porta e ela me mandou entrar.

Com a cabeça baixa, estudando alguns papéis, me disse:

— Vasques, vamos ter que refazer os horários da investigação do tarado da rodoviária porque não está batendo com os depoimentos.

Fiquei parado esperando ela levantar a cabeça, quando fez, demorou um pouco para me reconhecer.

— Guilherme?

Balançou a cabeça e passou a mão, colocando uma mecha do cabelo atrás da orelha, torceu o nariz, que já sei que quer dizer que ela está desconfortável.

— Mendonça, o que faz aqui?

— Boa noite para você, também delegada.

— Não é seu plantão, pode ir descansar e volte amanhã fardado, por favor.

— Me disseram ser bem capaz de você não ir em casa, então fiz alguns lanches e vim trazer para você e para os rapazes.

Ergui minha térmica e disse:

— Suco de laranja?

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