Rancores À Vista

Liam aguardava Alessa perto da entrada de uma das várias sacadas do salão de baile. Ao seu lado, Caella parecia um pouco nervosa — em parte pelo fato de estar tão próxima do centro do salão, no meio dos nobres que a olhavam torto. Parte por causa de Olena, que lançava olhares rancorosos a ela a cada instante possível.

Caella era uma plebeia que encantou Dhiogoh após conhecê-lo em uma guerra — onde ela trabalhava como curandeira. Graças a isso, prestígio era umas das muitas coisas que não tinha. Claro, Dhiogoh jamais se importou com seu baixo status, ele lutou bravamente para tê-la. No entanto, sua luta o forçou a se casar com quem não queria. O fez ter que se deitar com mulheres das quais odiava.

Dividir o homem que amava sempre fora amargo para Caella, principalmente sabendo que ele repudiava isso tanto quanto ela. Mas não havia outro jeito. Era o acordo com o antigo imperador e a influência das famílias das outras duas concubinas e a de Olena que obrigavam os dois a manter aquela situação inaceitável. Mesmo quando sabiam das tentativas de assassinato que sempre caíam sobre Liam, seu filho tão amado e querido.

Pensar nisso deixou Caella enfurecida. Ela lembrou-se das vezes que estava grávida e perdeu o bebê após ingerir alguma erva estranha posta internacionalmente em sua comida. Tudo armação da imperatriz, tinha certeza, apesar de nunca terem encontrado provas que a incriminasse. Caella quase morrera em inúmeras dessas vezes também.

Mas, como um milagre, um dia esses ataques não levaram seu bebê ou ela. Liam nascera prematuro, era um fato, mas a força que tinha nas pequenas mãozinhas e o poder que corria por suas veias, eram inegáveis. Tão parecido com o imperador, herdera todos os seus traços, seus poderes. Era evidente quem era seu pai, então nem mesmo uma acusação feita por Olena fizera a corte duvidar de sua fidelidade.

Caella sorriu ao lembrar-se da expressão amarga e enfurecida da imperatriz quando viu Liam pela primeira vez. Como, até então, somente Olena tinha dado filhos homens para Dhiogoh, ela achava-se única, abençoada, superior. Mas, pouco antes de Liam nascer, Olena dera à luz a uma menina. Liam fora um golpe final em seu ego, que ela tentou de muitas formas apagar, e ainda tentava.

Um toque em seu ombro tirou Caella de seus devaneios. Ela olhou para cima, vendo seu filho a olhar com preocupação. Sorriu para ele, numa fraca tentativa de acalmá-lo. Porém, isso só fez Liam suspirar, inconformado. Ele abriu a boca para dizer algo, talvez questioná-la, mas parou quando viu Alessa saindo da sacada ao lado de Charlotte. O sorriso no rosto dela, tão brilhante quanto a lua, parecia fazê-lo perder a noção do tempo, a noção de tudo.

Os lábios dele se ergueram em um sorriso apaixonado e ele deu alguns passos em direção a ela, surpreendendo-a ao tocar em sua mão. Alessa piscou, olhando para seu marido por alguns instantes que pareceram uma eternidade antes de sorrir também.

— Parem de se olharem assim, vão me deixar com inveja — Charlotte brincou, tirando os dois do transe que os envolvia.

Liam encarou ela, percebendo como a única irmã que se dava bem parecia frágil, tão frágil que fez seu peito apertar.

— Lotte — Liam murmurou, pronunciando o apelido que a chamava em sua infância sem se importar com o que os outros ao redor iriam pensar. — Senti sua falta.

Charlotte abriu um largo sorriso para ele, e depois virou-se para Alessa, quase como se dissesse: 

“Viu, eu não falei?”

Liam quis rir. Conseguia muito bem imaginar o que sua irmã falara para Alessa. Ela provavelmente havia se gabado da relação próxima dos dois, algo que não era raro dela fazê-lo.

— Eu também senti sua falta, irmão — Charlotte disse por fim. O sorriso em seu rosto não desapareceu, mas um lampejo em seus olhos fez Liam imaginar que ela queria dizer algo a mais.

— Então são mesmo próximos — Alessa murmurou, atraindo a atenção dos dois para ela. — Que interessante.

Liam sentiu um arrepio cruzar sua espinha ao ouvir sua esposa falar. Ele até tentou abrir a boca para explicar, mas desistiu no último segundo. Não tinha escondido aquele fato por maldade, apenas se esquecera de mencionar Lotte. Parte pela felicidade de estar finalmente ao lado de Alessa. Ele só conseguia pensar nela ou, vez ou outra, nas pessoas que queria matar.

Sentia se mal em admitir isso; que Charlotte, embora sua amada irmã, não ocupava quase nada em seus pensamentos mais recentes. Até onde ele sabia, ela não tivera um fim trágico como Caella e Dhiogoh, Ragal ou Alessa, em sua primeira vida. Apenas se manteve solitária até o fim. Tentou até ajudar Liam, mas sua influência, como uma princesa que se recusava a se casar, era quase nula. Não havia muito o que se fazer quanto a isso.

— Ainda estava duvidando? — Charlotte resmungou, quase ofendida, o que fez Alessa soltar um riso baixo.

— Não me leve a mal, irmã.

Charlotte sorriu.

— Vou te perdoar dessa vez, mas só dessa vez.

Liam observou as duas, percebendo como pareciam amigas de longa data. Isso o deixou feliz, muito feliz. Ele sorriu e virou-se para Caella, que observava a interação com curiosidade.

— Mãe, acho que chegou o momento de apresentar minha esposa a senhora — começou Liam, atraindo a atenção das três mulheres para ele. — Essa é Alessa, minha esposa. Alessa, essa é Caella, a terceira concubina do imperador e minha mãe.

Alessa piscou ao ouvi-lo, finalmente notando a mulher de baixa estatura atrás dele. Ela não parecia nada com Liam. Desde o tom moreno claro da pele aos traços; eram tão distintos como a água do vinho. Isso a faz franzir a testa, perplexa.

Liam parecia uma cópia de Dhiogoh, era verdade. Mas Alessa imaginara que ele havia herdado algum traço da mãe também, como ela, que possuía os olhos prateados da sua. Porém, ao olhar sua sogra bem, percebeu que talvez ele herdera a aura hipnotizante, aquele ar que pulsava coisas estranhas mas viciantes. Caella parecia uma sereia, encantando-a só com um olhar.

— É um prazer conhecê-la, querida — Caella falou, a voz suave e gentil.

Os lábios de Alessa se erguerem em um sorriso, aproximando-se da mulher com delicadeza. Sem esperar uma reação, a envolveu em um abraço apertado.

— O prazer é meu, mãe Caella — sussurrou, afastando-se. — Meu marido falou que a senhora é a melhor mãe desse império, e agora vejo o quanto é verdade.

Caella piscou, surpresa. Talvez não esperasse que Alessa a chamasse assim, ou dissesse aquelas palavras, e isso quase fez a garota arrepender-se. No entanto, a forma como os olhos violetas brilharam em felicidade, a vez respirar aliviada. Caella havia gostado, e muito.

— Minha mãe sempre quis ter uma filha — murmurou Liam, inclinando-se para perto de Alessa. Foi baixo, então só ela ouviu.

— Acho que eu deveria deixar vocês três a sós — Charlotte murmurou, quase como se falasse consigo mesma. 

Caella voltou-se para ela e sorriu, nenhum pouco incomoda com a presença da princesa.

— Você também é da família, Charlotte. Fique.

Charlotte sorriu ao ouvi-la, balançando a cabeça em concordância. Alessa ficou curiosa ao encarar as duas, afinal uma era a amada do Imperador enquanto a outra era a filha mais nova da imperatriz. Não parecia ter como sair uma boa relação disso. 

O que se mostrava, a cada sorriso, uma constatação cada vez mais falha.

— Olá, querida. — Uma voz delicada e ácida ecoou perto de Alessa, fazendo-a olhar para a esquerda.

Uma mulher de longos cabelos loiros e olhos dourados a encarou com um sorriso venenoso. A pele clara estava levemente rubra, quase como se tivesse ouvido algo que a ofendera muito. Alessa percebeu, com desgosto, que era a imperatriz. E não só isso: ela estava ali todo esse tempo, observando e ouvindo os quatro.

Ao vê-la, as expressões de todos se tornaram amargas, até mesmo a de Charlotte. Isso só fez o sorriso venenoso da imperatriz aumentar.

— Bem-vinda a família, querida — falou Olena, a voz bem alta para atrair a atenção de todos ao redor para ela.

Ignorando totalmente a presença de Caella, ela envolveu Alessa em um abraço. A garota sentiu seu corpo estremecer em repulsa, mas não a afastou.

— Obrigada — sussurrou, tentando manter a voz o mais controlada possível.

Olena aproveitou a aproximade para sussurrar no ouvido de Alessa:

— Não agradeça, seu serzinho inferior. — Ela aumentou o aperto de seu abraço, com o intuito de machucar. — Você não faz ideia do inferno que te espera, sua infeliz.

Alessa sorriu ao ouvi-la, afinal algo assim era o esperado da imperatriz. Ela não deixaria isso barato, de forma alguma.

— Nem você, mal amada — sussurrou baixinho, quase inaudível, a voz tão doce que quase não parecia ser uma ofensa, mas era. Olena piscou, pega de surpresa. — Não se esqueça disso, odiosa madrasta. Porque, se esquecer, vou fazer questão de lembrá-la.

Olena recuou, como se não acreditasse em seus ouvidos. Ela encarou o rosto gentil e belo, os olhos que emanavam uma inocência que não parecia à altura do que fora dito. Seu rosto esquentou, a pele vermelha, não entendendo se tinha alucinado ou escutado errado.

Ela dissera aquilo mesmo?

— Imperatriz Olena — murmurou Liam, com um claro divertimento na voz ao notar a reação da imperatriz. 

Ele não ouvira o que sua esposa havia dito, mas com certeza tinha sido algo forte o suficiente para desestabilizar Olena completamente.

— Está passando mal? — Liam aumentou a voz, tal qual a imperatriz havia feito antes, forçando uma quê de preocupação fingida que não passaria despercebido por ninguém. — Você está vermelha. Não me diga… Bebeu muito de novo? Sabe que, como imperatriz, não se deve deixar o vício no álcool falar mais alto, não sabe?

Olena cerrou os punhos, não sabendo o que falar ou como reagir. Sua pele avermelhou mais, principalmente quando cochichos maliciosos ao redor tiveram apenas ela como alvo.

— Por favor, Liam, seja complacente com minha mãe — falou Charlotte, com a voz doce e o olhar afiado. — Ela exagera, às vezes, mas não é por mal. Mesmo sendo imperatriz, ainda tem um longo caminho a percorrer.

Olena abriu a boca para repreender sua filha, mas calou-se quando viu uma movimentação estranha na entrada principal do salão. Todos se voltaram para lá, atraídos também, principalmente quando o arauto gritou:

— Anuncio a chegada do Alto Sacerdote, Clarín de Del!

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Comments

Faby

Faby

kkkkkk Alessa ja começou a fazer a imperatriz a duvidar de suas faculdades mentais 😂😂😂🤣🤣🤣

2025-02-16

3

Faby

Faby

Olena é rancorosa de qualquer jeito e os nobres estão com inveja de você então ignora eles

2025-02-16

3

sem nome

sem nome

caramba, vc é muito talentosa, tô adorando a história/Heart/

2025-02-24

5

Ver todos
Capítulos
1 Escolha-me
2 De Volta Ao Passado
3 É Chegado O Dia
4 Futura Esposa
5 Futuro Marido
6 Decisão
7 Insinuação
8 Coisas Inevitáveis
9 Casamento
10 Está me provocando, querida?
11 Lobo Em Pele de Cordeiro
12 A Primeira Vida de Liam
13 Lhe Convencendo
14 Assassinos
15 A Inteligência de Uma Darnell
16 O Baile de Condecoração
17 O Veneno da Inveja
18 As Palavras do Imperador
19 Rancores À Vista
20 O Alto Sacerdote
21 Consumando O Casamento (+18)
22 Situação Humilhante
23 Na Sala de Banho
24 Repreensão À Mesa
25 Encontro No Corredor
26 A Doença Misteriosa
27 Cômodo Secreto
28 A Pequena Cloé
29 Poder Em Mãos Impuras
30 O Fardo das Esposas Oficiais
31 Uma Tarefa Para O Arquiduque
32 A Dama Descartada
33 O Primeiro Embate Com A Imperatriz
34 A Arte de Destruir Sem Tocar
35 Risos Após A Humilhação
36 Pecados da Realeza
37 Um Corpo Que Cede, Uma Luta Que Começa
38 Um Símbolo de Proteção
39 Noite de Ira e Magia
40 O Plano da Arquiduquesa
41 Um Espetáculo Malicioso
42 Conspirações e Contrataques
43 O Jantar Começa
44 Prova do Próprio Veneno
45 Desejo Ardente (+18)
46 Quem Ri Por Último (Parte 1)
47 Quem Ri Por Último (Parte 2)
48 Orgulho Em Chamas
49 Boatos e Sussurros
50 Quando Alessa Decide
51 Cheirando Vergonha
52 No Quarto da Imperatriz
53 Os Duques e a Queda
54 Pais, Planos e Problemas
Capítulos

Atualizado até capítulo 54

1
Escolha-me
2
De Volta Ao Passado
3
É Chegado O Dia
4
Futura Esposa
5
Futuro Marido
6
Decisão
7
Insinuação
8
Coisas Inevitáveis
9
Casamento
10
Está me provocando, querida?
11
Lobo Em Pele de Cordeiro
12
A Primeira Vida de Liam
13
Lhe Convencendo
14
Assassinos
15
A Inteligência de Uma Darnell
16
O Baile de Condecoração
17
O Veneno da Inveja
18
As Palavras do Imperador
19
Rancores À Vista
20
O Alto Sacerdote
21
Consumando O Casamento (+18)
22
Situação Humilhante
23
Na Sala de Banho
24
Repreensão À Mesa
25
Encontro No Corredor
26
A Doença Misteriosa
27
Cômodo Secreto
28
A Pequena Cloé
29
Poder Em Mãos Impuras
30
O Fardo das Esposas Oficiais
31
Uma Tarefa Para O Arquiduque
32
A Dama Descartada
33
O Primeiro Embate Com A Imperatriz
34
A Arte de Destruir Sem Tocar
35
Risos Após A Humilhação
36
Pecados da Realeza
37
Um Corpo Que Cede, Uma Luta Que Começa
38
Um Símbolo de Proteção
39
Noite de Ira e Magia
40
O Plano da Arquiduquesa
41
Um Espetáculo Malicioso
42
Conspirações e Contrataques
43
O Jantar Começa
44
Prova do Próprio Veneno
45
Desejo Ardente (+18)
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Quem Ri Por Último (Parte 1)
47
Quem Ri Por Último (Parte 2)
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Orgulho Em Chamas
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Boatos e Sussurros
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Quando Alessa Decide
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Cheirando Vergonha
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No Quarto da Imperatriz
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Os Duques e a Queda
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