Está me provocando, querida?

— Algo a preocupa? — A voz de Liam ecoou no quarto iluminado apenas pelas chamas crepitantes de uma lareira, deixando Alessa nervosa.

Eles estavam sentados um ao lado do outro, na cama dela. Já era noite lá fora, a lua se erguendo majestosa no céu estrelado.

Fazia pouco tempo que a festa de casamento havia chegado ao fim. Após horas conversando com Miguel e finalizando os preparativos para a viagem que aconteceria no dia seguinte, os dois se retiraram para o quarto dela com o intuito de ter uma conversa particular.

O assunto, no começo, girava em torno da vida passada de Alessa; Liam pouco falava da dele. Ela não sabia o porquê, mas sentia que havia algo sombrio ali, como se ele quisesse adiar essa conversa o máximo possível, algo que ela iria aceitar por enquanto, como uma forma de honrar a nova relação que os dois tinham. Agora eram marido e mulher, então nada mais justo do que ela respeitar o tempo dele, apesar disso incomodá-la bastante.

Alessa mordeu o lábio e o encarou.

Ele ainda vestia os trajes da cerimônia de casamento, igual a ela.

— Não exatamente. Só estou pensando no que acontecerá daqui em diante.

Ele a olhou com ternura, envolvendo a mão dela com a sua. Alessa observou as duas juntas, como a dele era tão maior que a dela.

— É bem simples — começou ele, fazendo um carinho na pele clara. — Vamos partir amanhã ao amanhecer para Astruna. A viagem durará alguns dias, e, lá, vou te apresentar para toda a corte durante o baile de condecoração.

Ela soltou um suspiro.

— Não é isso que me incomoda.

Liam ergueu uma sobrancelha.

— O barão? — ele supôs.

Alessa assentiu.

— Ele não virá para Astruna, e eu só tenho alguns meses para achar a cura. Como poderei salvá-lo?

— Vamos pensar nisso juntos, Alessa. Descobriremos tudo sobre essa doença, seja lá qual for sua origem, e vamos salvar seu pai e você. Não se preocupe.

Ela mordeu o lábio, frustrada.

— É difícil não me preocupar quando ele é tão cabeça dura que não quer ir para onde a chance de salvá-lo é maior.

— Você não pode forçá-lo.

— Eu sei — admitiu, baixinho. — Mas queria poder. Queria levá-lo à força, obrigá-lo a deixar essa miséria para trás.

— Ele não ficará na miséria — Liam afirmou, convicto. Alessa quis sorrir ao ouvi-lo. — Dei uma grande fortuna como seu dote, e, se mesmo assim a doença a esgotar, eu mandarei mais.

— Acha que ele aceitaria?

— Fizemos um acordo. É uma condição pré-estabelecida. Ele não pode negar, e não vai.

As palavras de Liam trouxeram um alívio para Alessa, sufocando aquela parte que ainda se ressentia pela negação do pai.

Ela observou a luz da lareira dançar no rosto dele, a forma como os olhos verdes brilhavam em determinação. Ela conteve um sorriso, aproximando-se mais do arquiduque para falar:

— Você é muito confiante, sabia? Não, acho que devo te chamar de presunçoso.

Liam ergueu uma sobrancelha, divertido.

— Está me provocando, querida?

— Estou. — Ela estendeu a mão até alcançar o peitoral dele, pressionando-o para baixo. — Aquele beijo que você me deu na cerimônia foi muito breve. Não pareceu fazer jus às besteiras que me fez imaginar contra aquela coluna.

Ele riu, rouco, deixando ser guiado em direção a cama. Alessa aproveitou e se sentou sobre ele, com as pernas dobradas.

— Eu te fiz imaginar besteiras? — Liam perguntou, forçando uma inocência pouco convincente na voz. — Que calúnia.

Alessa abriu um sorriso malicioso e se inclinou mais, aproximando os lábios do ouvido dele para sussurrar:

— Calúnia vai ser o que vou fazer com você, querido. Lembra que você ainda não recebeu uma punição?

— E como pretende me punir, raio de lua? — sussurrou ele, aproveitando a oportunidade para mordiscar a orelha dela. Um arrepio atravessou o corpo de Alessa e ela sentiu a pele queimar. — Lembre-se que, apesar de agora eu ser oficialmente seu, não muda o fato de estarmos a apenas um quarto de distância do de seu pai.

— Hum… Isso é realmente um problema — murmurou ela, tentando conter um gemido quando ele deslizou os lábios até alcançar a pele macia de seu pescoço e depositou vários beijos lentos ali.

— Além disso, não devemos consumar o casamento antes de chegar à Astruna — lembrou ele, mas sem parar de beijar e mordiscar a pele dela. Ele parecia incapaz de fazê-lo.

Alessa arfou, enfiando os dedos nos fios dourados do cabelo dele.

— Então é melhor nos afastarmos.

— Sim, vamos fazer isso.

Mas eles não fizeram. 

Liam levou as mãos até o quadril de Alessa, a pressionando mais contra ele, enquanto subia com os beijos pelo queixo dela. Alessa gemeu, os lábios entreabertos e a respiração entrecortada. Seu corpo parecia em chamas, e cada toque de Liam parecia aumentar um desejo crescente em seu âmago.

Mas, quando os lábios de Liam estavam novamente a um fio de encontrar os de Alessa, uma batida na porta explodiu pelo quarto, tirando os dois do transe que os envolvia. Alessa saiu de cima de Liam em um pulo, o peito subindo e descendo em um ritmo acelerado. Ela olhou para a porta, tentando entender quem poderia ser, e depois voltou-se para Liam.

O arquiduque estava furioso. Uma veia pulsava em seu pescoço e seus olhos verdes pareciam mais profundos e escuros, como se só com um olhar pudesse matar quem estivesse do outro lado da porta.

Alessa teve pena de quem quer que fosse. Mesmo assim, ela ajeitou seu vestido e seu cabelo, e murmurou com a voz mais controlada que conseguiu:

— Entre.

A porta se abriu e Ragal apareceu na soleira, a cabeça baixa enquanto mexia em alguns papeis em sua mão.

— Liam, os preparativos estão prontos para a viagem de amanhã — avisou, sem erguer a cabeça. Quando o fez, suas sobrancelhas franziram. Ele olhou de Alessa para Liam, notando como as roupas e os cabelos deles estavam desalinhados. — Eu… interrompi algo?

— O que você acha? — Liam vociferou, pondo-se de pé. Sua pele clara ganhava um tom vermelho ameaçador a cada passo que dava em direção ao amigo.

Ragal recuou, suor escorrendo pela testa. Em seus olhos, podia ver um vislumbre de um sentimento conhecido por ele se formar.

— Mas foi você que disse que quando tudo estivesse pronto era pra te avisar imediatamente…

A mandíbula de Liam estalou, e ele lançou um olhar assassino à Ragal.

— Eu não pensei que seria tão imediato assim!

Ragal olhou para Alessa, quase como se pedisse ajuda. Ela apenas deu de ombros, como se não ligasse, o que fez o pobre homem tremer. Ele encarou Liam, parecendo não saber se falava algo ou se simplesmente saía correndo.

— Que balbúrdia é essa?! — esbravejou Miguel, vindo do corredor. Ele parou na porta, olhando para a cena.

Liam vermelho de raiva, Alessa com cara de tédio e Ragal tremendo como se estivesse a um passo de encarar a própria morte.

Miguel cruzou os braços e ergueu uma sobrancelha.

— Espero que isso tudo não seja pelo motivo que eu estou pensando.

— Talvez? — respondeu Alessa, com um sorriso sem graça.

Liam respirou fundo. Passou as mãos pelos cabelos loiros, deixando-os ainda mais desordenados. Ele lançou um olhar à Alessa, depois para Ragal, e, por fim, resmungou:

— É melhor eu voltar para meu quarto.

E então saiu, passando a passadas pesadas pelos dois homens e deixando Alessa com uma expressão que ia de confusão a riso em segundos.

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