As Palavras do Imperador

Dhiogoh sentia-se risonho enquanto observava Alessa caminhar até o centro do salão ao lado de Liam, após ela dançar com ele duas músicas. O sorriso do arquiduque era genuíno e transbordava uma felicidade que o imperador nunca vira antes em seu filho. O enchia da mais pura alegria ver o quanto Alessa parecia fazer bem a ele 

Antes daquele baile, Dhiogoh sentia-se cada vez mais preocupado, ansioso. Desde que Liam completara seus vinte e três anos, não mostrara intenção alguma de se casar. Isso deixou o imperador inquieto. O medo de que seu filho acabasse solitário, tal qual o antigo arquiduque, o assombrava. Era terrível o que a solidão poderia fazer com as pessoas. Ele vira de perto.

Alguns acabavam se tornando amargos, ao ponto de fazer outros sofrerem apenas por um deleite vazio. Outros, como seu irmão, definhavam até a morte. Nenhum desses destinos era algo que Dhiogoh queria para seu amado filho, e tais pensamentos o fizeram quase cometer o mesmo erro que seu pai: forçar Liam a se casar com alguém que ele não queria.

Dhiogoh soltou um suspiro baixo ao pensar nisso, e agradeceu aos deuses por terem colocado Alessa no caminho de Liam antes daquela noite. Ele desviou os olhos para os outros nobres, procurando um rosto conhecido no meio deles. Mas não viu Caella, sua terceira concubina e mulher que amava. 

Ele ficou irritado por isso, afinal o fato dela não estar ali só poderia significar que Olena havia dado um ultimato e forçado sua mulher a não se aproximar dele.

Era normal que a imperatriz o fizesse. Sempre ameaçava Caella com promessas de retaliação crueis se caso ela não a ouvisse. E o pior disso tudo era o fato dele não poder fazer muito para conter Olena. Graças a família dela, que era muito influente e poderosa, ele se via amarrado, preso em um dilema e tradições que o faziam, muitas vezes, desejar não ser o imperador.

Um resmungo irritado saiu de seus lábios no exato momento em que viu alguém vindo em sua direção. Não precisou olhar por muito tempo para descobrir quem era. Os cabelos castanhos escuros e ralos, a barriga avantajada, além dos intensos olhos castanhos, deixavam claro que era o Conde Nayor, pai da antiga candidata a noiva de Liam, Juriã.

Ele observou o homem parar diante de si. Nayor esfregava um lenço na testa, enxugando o suor presente naquela região. Sua expressão era ansiosa, e ele evitava olhar nos olhos verdes de Dhiogoh a todo momento.

“Um covarde intimidado”, Dhiogoh pensou com desdém.

O homem à sua frente era patético, mesmo que fosse o mais rico de Astruna.

— Vossa Majestade, perdoe minha indelicadeza, mas precisamos conversar — murmurou ele, retirando o lenço da testa.

Dhiogoh ergueu uma sobrancelha, um misto de curiosidade e desinteresse em sua expressão.

— Seja breve.

Nayor apertou o lenço.

— É sobre… nosso acordo — começou, a voz baixa e trêmula. — Minha filha deveria ser anunciada como a… noiva do Príncipe Liam hoje. Era o combinado.

— E?

— Não pode… manter suas palavras?

Dhiogoh soltou uma risada alta, como se o conde tivesse contado a maior piada do mundo. Alguns nobres olharam para os dois, atraídos pela conversa como mariposas à chamas.

— Por acaso é cego? — A risada de Dhiogoh morreu, sua voz cheia de censura ao falar. — Não vê que meu filho já tem uma esposa? Uma incrível, inclusive.

O rosto de Nayor ganhou um tom rubro, mas não foi o suficiente para ele desistir. Respirando fundo, sugeriu:

— Então… que tal fazer da minha filha a concubina? Não é uma…

— Está louco, Conde Nayor? — Dhiogoh o interrompeu, a voz agora furiosa. — Meu filho é um recém-casado. E ele nem consumou o casamento ainda para você já querer oferecer sua filha como uma mera mercadoria. Não tem vergonha?

Nayor abriu a boca, sem saber o que falar. Dhiogoh não precisou olhar nos olhos dele para entender o quanto aquele homem vergonhoso estava sofrendo por ter cedido aos caprichos de sua filha. Porque, sim, aquela situação só poderia ter dedo de Juriã. Sempre tinha.

Pensar nisso deixou o imperador ainda mais furioso. Ele entendia muito bem a dor de não poder ter sua amada ao seu lado, ou ser forçado a ter concubinas. Seu pai fizera isso com ele. O obrigou a se casar com Olena e ter mais duas mulheres de famílias importantes para assim rebaixar o status de Caella para algo que a deixasse sem nenhum poder. À mercê das outras três.

Naquele palácio, quem mandava era a imperatriz. E a primeira concubina, que ficava no lugar dela em sua ausência, também tinha certa influência. Dhiogoh apenas restringia as ações das duas, mesmo que de um jeito limitado. Graças às suas famílias, não havia muito o que ele pudesse fazer, mesmo as odiando mais do que tudo.

Dhiogoh respirou fundo, apertando as pálpebras em busca de calma. Ele olhou para o code, que tremia, a pele dele tão vermelha quanto um pimentão. Os outros lordes que haviam sido atraídos pela conversa cochichavam sobre o conde como se ele não pudesse ouvir, o que todos sabiam ser mentira. Nayor conseguia, sim.

Por um segundo, o imperador até teve pena dele, principalmente ao ver Juriã e sua mãe ao longe, lançando olhares crueis para o homem. Ele não era uma pessoa ruim, só cedia facilmente a exigências das duas. E, novamente, Dhiogoh agradeceu por Alessa ter entrado na vida de seu filho.

Juriã não era uma mulher digna dele.

— Escute aqui, Conde Nayor — começou ele, a voz alta, um aviso para os outros lordes também. — Não importa o quanto ofereça para mim, o quão desesperado ou insano é, eu não irei forçar nenhuma concubina ao meu filho. A prioridade é ele, e nada vai mudar isso. E quem tentar passar por cima das minhas palavras… bem, vai se arrepender.

O corpo de Nayor estremeceu ao ver a determinação nos olhos do imperador. Ele apenas assentiu, virou-se e saiu dali a passos apressados como o covarde que era. Dhiogoh o observou se aproximar de Juriã e da mãe dela, e ser repreendido pelas duas mulheres, enquanto murmurava algo que ele supôs ser um pedido de desculpas. Depois voltou os olhos para os outros nobres, a expressão fria em seu rosto sendo a prova de que suas palavras também serviam para eles.

Sua determinação era clara como água, e se alguém tentasse intervir, ele daria um jeito de destruí-lo sem se importar com as consequências.

***

Depois que Alessa dançou mais uma música com Dhiogoh e outra com Liam, o imperador premiou os heróis de guerra, dando oficialmente a Liam um arquiducado para governar. As terras, que haviam ficado sem um lorde desde a morte do irmão de Dhiogoh, seriam repassadas ao arquiduque em quinze dias. Claro, Liam e Alessa poderiam permanecer no Palácio Imperial mesmo após isso, ou ocupar a mansão na capital que pertencia ao falecido assim que ela fosse restaurada.

Como estava exausta, Alessa se retirou para uma sacada com intuito de tomar um pouco de ar fresco, após longos momentos se apresentando para a nobreza de Astruna. 

Em sua mente, as reações dos nobres quando ouviram o antigo sobrenome dela voltavam a cada segundo. As caretas de desagrado e os olhares de desaprovação foram inegáveis. Não havia prestígio em ser uma Darnell fora de Avaris. Para eles, Alessa se tornara uma interesseira assim que ela revelou ser filha de um barão.

Ela não se importou com isso, é claro. Na verdade, o que mais a incomodou fora a forma como algumas ladies perguntaram descaradamente sobre a noite de núpcias dela com Liam. Elas pareciam ávidas para saber se eles já haviam consumado o casamento ou quando iriam fazê-lo. Muitas provavelmente pensavam em ofendê-la quando ouvisse um sim. Outras, mais esperançosas, pensavam ser possível tirar Alessa do caminho se caso fosse um não.

Alessa fez questão de afirmar que não haviam consumado ainda, mas que o fariam assim que um alto sacerdote viesse ao Palácio Imperial para dar as bênçãos de Astruna para o mais novo casal. Ela deixou claro que ele poderia já estar a caminho naquele exato momento, o que o faria chegar no dia seguinte, algo que frustrou os dois grupos de ladies.

A expressão delas foram um deleite para Alessa, que quase se livrou da sensação de incômodo que suas perguntas descaradas provocaram.

Ela soltou um suspiro baixo e encarou o céu noturno, onde a lua brilhava solene acompanhada das estrelas. Lembrou-se de Bia e Ragal, que ficaram na estalagem e só viriam para o palácio na manhã seguinte. Queria tê-los ali, afinal tinha se acostumado com a presença constante dos dois nos últimos dias. Porém eles não quiseram ir ao baile, e não seria ela que os forçaria.

Ela lançou a cabeça, desviando os olhos do céu. Daquela sacada, Alessa conseguia ver o jardim lá embaixo. Alguns casais passeavam por ali, enquanto amantes aproveitavam a escuridão para trocar carícias mais íntimas.

 Suas bochechas esquentaram, e ela desviou os olhos mais uma vez. E foi nesse momento que sentiu uma presença desconhecida adentrar silenciosamente a sacada para se aproximar dela.

— Você é mais inocente do que parece — uma voz feminina falou. Alessa se voltou para ela, vendo ali uma mulher muito parecida com Liam, mas sem perder os traços delicados e afiados da imperatriz também.

Não precisou de mais nada para ela perceber quem era.

— Vossa Alteza Charlotte, não é? — Alessa sorriu para a mulher, mas sem deixar a cautela de lado.

Os lábios da princesa se ergueram ao perceber isso, as íris verdes brilhando em divertimento.

— Pode me chamar apenas de Charlotte — disse, como se fosse a coisa mais simples do mundo. — Ou de irmã, se assim preferir.

Alessa franziu a testa.

— Irmã? Não acho que…

— Você não chamou meu pai de pai? — interrompeu Charlotte. Alessa até tentou lê-la, ver através de suas intenções, mas não conseguiu. — Nada mais justo do que me chamar de irmã também.

— Eu lhe ofendi com meu pedido?

— A mim, não. — Charlotte se aproximou mais dela. Em nenhum momento o sorriso deixou seus lábios. — Obviamente que minhas outras irmãs não irão gostar muito, e nem vamos falar da minha mãe. Tenho certeza que ela está arrancando o próprio cabelo agora. Ou algo pior.

Alessa conteve uma risada ao imaginar Olena fazendo isso. Charlotte percebeu, mas, ao invés de censurá-la, incentivou-a ao soltar um riso baixo que deixou a garota perplexa.

— Por que está me dizendo isso?

— Eu gostei de você, é só isso — respondeu ela, com uma sinceridade que deixou Alessa chocada. Não parecia possível que a única filha da imperatriz não tivesse segundas intenções para com ela. — Vamos ser amigas?

— Eu não sei — Alessa falou com  honestidade.

 Charlotte pareceu decepcionada com a resposta. Ela se aproximou mais e, ao ficar ao lado de Alessa, apoiou os braços no parapeito da sacada. Seus olhos verdes vagaram pelo jardim, parando nas rosas delicadas lá embaixo.

— Sabia que eu sou a melhor amiga do Liam? Nos damos muito bem — contou ela, em um tom confidente.

Alessa ficou curiosa. Ela se aproximou do parapeito e começou a encarar o mesmo ponto que Charlotte. Felizmente, não havia nenhum casal ali.

— De verdade?

Charlotte virou-se para Alessa, a brisa quente do verão balançando os cabelos das duas.

— Ele não contou a você? Somos quase gêmeos de tão próximos!

— Não houve tempo. — Alessa sorriu fraco. Não era uma mentira, afinal muitas coisas haviam acontecido desde que ela regressara. — Tinha muito o que ser dito.

Charlotte assentiu.

— Imagino. Liam viveu muito em suas quase três décadas de vida. Mais coisas ruins do que boas, infelizmente.

As duas ficaram em silêncio por algum tempo, digerindo as palavras da outra.

— Ele me falou que não tem uma boa relação com a sua mãe — começou Alessa, quase como se sondasse o território de um possível inimigo. Ela queria confirmar de algum jeito se as palavras da princesa eram genuínas ou não. — E você… ele sequer citou.

— Nós brigamos — contou em um suspiro aborrecido. — Da última vez que nos vimos, eu disse algo a ele que deve tê-lo ferido. Foi antes da guerra. Mais de um ano atrás.

Alessa ficou surpresa pela revelação, pois não esperava. Principalmente porque… bem, aquilo significava que os dois brigaram antes de Liam ter retornado ao passado.

“Ela discutiu com a versão mais jovem dele. Talvez Liam nem se lembre disso.”

— Por que brigaram? — A pergunta escapou sem que Alessa pudesse contê-la.

— Porque eu não queria perder mais alguém para uma guerra estúpida.

Havia uma tristeza profunda na voz de Charlotte que fez Alessa hesitar. Ela encarou a princesa por longos segundos, quase como se a visse pela primeira vez. Percebeu as olheiras escuras mal ocultadas pela maquiagem, a pele mais pálida do que o normal e como o sorriso dela parecia distante, frágil, agarrado a uma memória antiga e dolorosa.

Alessa se viu nela, reconheceu a si mesma. Viu seu eu da primeira vida, a guerreira abandonada para morrer.

Por isso, foi inevitável o que murmurou em seguida.

— Você deveria conversar com meu marido, irmã.

Charlotte piscou algumas vezes, os olhos marejados. O sorriso brilhante que ela esboçou em resposta pareceu iluminar a sacada, deixando Alessa mais certa de sua decisão.

— Sim, eu vou!

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Comments

Faby

Faby

kkkkkk quando ele falou barriga avantajada achei que fosse alguma mulher grávida 🤣🤣😂😂😂

2025-02-15

7

Faby

Faby

Credo que horror será que esse homem não tem nem um pingo de dignidade?🤢🤢🤮🤮

2025-02-15

3

Faby

Faby

verdade imperador o Lian pa louco pra consumar seu casamento e o povo atrapalhando kkkkkk agora um doido quer enfiar a filha onde não foi chamado, mete o pé no barrigão desse homem 🤭🤭🤩🤩

2025-02-15

3

Ver todos
Capítulos
1 Escolha-me
2 De Volta Ao Passado
3 É Chegado O Dia
4 Futura Esposa
5 Futuro Marido
6 Decisão
7 Insinuação
8 Coisas Inevitáveis
9 Casamento
10 Está me provocando, querida?
11 Lobo Em Pele de Cordeiro
12 A Primeira Vida de Liam
13 Lhe Convencendo
14 Assassinos
15 A Inteligência de Uma Darnell
16 O Baile de Condecoração
17 O Veneno da Inveja
18 As Palavras do Imperador
19 Rancores À Vista
20 O Alto Sacerdote
21 Consumando O Casamento (+18)
22 Situação Humilhante
23 Na Sala de Banho
24 Repreensão À Mesa
25 Encontro No Corredor
26 A Doença Misteriosa
27 Cômodo Secreto
28 A Pequena Cloé
29 Poder Em Mãos Impuras
30 O Fardo das Esposas Oficiais
31 Uma Tarefa Para O Arquiduque
32 A Dama Descartada
33 O Primeiro Embate Com A Imperatriz
34 A Arte de Destruir Sem Tocar
35 Risos Após A Humilhação
36 Pecados da Realeza
37 Um Corpo Que Cede, Uma Luta Que Começa
38 Um Símbolo de Proteção
39 Noite de Ira e Magia
40 O Plano da Arquiduquesa
41 Um Espetáculo Malicioso
42 Conspirações e Contrataques
43 O Jantar Começa
44 Prova do Próprio Veneno
45 Desejo Ardente (+18)
46 Quem Ri Por Último (Parte 1)
47 Quem Ri Por Último (Parte 2)
48 Orgulho Em Chamas
49 Boatos e Sussurros
50 Quando Alessa Decide
51 Cheirando Vergonha
52 No Quarto da Imperatriz
53 Os Duques e a Queda
54 Pais, Planos e Problemas
Capítulos

Atualizado até capítulo 54

1
Escolha-me
2
De Volta Ao Passado
3
É Chegado O Dia
4
Futura Esposa
5
Futuro Marido
6
Decisão
7
Insinuação
8
Coisas Inevitáveis
9
Casamento
10
Está me provocando, querida?
11
Lobo Em Pele de Cordeiro
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A Primeira Vida de Liam
13
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14
Assassinos
15
A Inteligência de Uma Darnell
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O Baile de Condecoração
17
O Veneno da Inveja
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As Palavras do Imperador
19
Rancores À Vista
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O Alto Sacerdote
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Situação Humilhante
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24
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A Pequena Cloé
29
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30
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31
Uma Tarefa Para O Arquiduque
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A Dama Descartada
33
O Primeiro Embate Com A Imperatriz
34
A Arte de Destruir Sem Tocar
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37
Um Corpo Que Cede, Uma Luta Que Começa
38
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Noite de Ira e Magia
40
O Plano da Arquiduquesa
41
Um Espetáculo Malicioso
42
Conspirações e Contrataques
43
O Jantar Começa
44
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45
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