Já fazia alguns dias que eu estava na mansão com Zeus, e, por mais que tentasse, era difícil decifrá-lo. Ele era como um quebra-cabeça incompleto, peças espalhadas que eu não conseguia encaixar. Apesar disso, resolvi tentar algo simples: um gesto que talvez quebrasse o gelo entre nós.
Naquela manhã, levantei cedo e preparei um café da manhã para ele. Estava tudo pronto — ovos, torradas, suco fresco — e o aroma do café recém-passado enchia o ambiente. Esperei por ele na cozinha, imaginando o que diria ao ver meu esforço. Contudo, ele não apareceu. Quando fui até o balcão, encontrei um bilhete escrito em letras firmes:
"Ficarei fora por cinco dias. Ligarei assim que possível."
Eram poucas palavras, diretas e secas, como se quisessem me lembrar de que, para ele, eu ainda era uma intrusa. Segurei o bilhete por um instante, sentindo meu peito apertar. Qualquer esperança de conexão parecia evaporar ali mesmo, naquelas linhas curtas.
Mais tarde naquele dia, o telefone tocou, e era Marena. Sua voz amigável foi um alívio.
— Como está a menina dos olhos de Zeus? — ela brincou.
— Bem… eu acho — respondi, hesitante.
— O que houve, Anna? Você parece abatida.
— Marena, eu não sei como me aproximar de Zeus. Ele é um enigma, e toda vez que tento me conectar, ele levanta barreiras ainda maiores.
— Paciência, querida! Eu te avisei, lembra? A condição dele não é algo simples. Zeus carrega muito mais do que você imagina.
Sua voz suavizou, mas havia algo nas entrelinhas que me deixou inquieta.
— Marena, por que ele me mantém aqui? Ele mal fala comigo, e, quando fala, é grosso e distante.
— Porque, mesmo que ele não admita, você é importante para ele.
— Importante? Como posso ser, se ele parece querer me manter longe?
Houve um silêncio do outro lado da linha, e, então, ela continuou:
— Anna, Zeus não é como os outros. Ele luta contra si mesmo todos os dias. Há momentos em que ele vai parecer mais aberto, mas em outros, ele vai se fechar completamente. Você precisa entender isso.
Resolvi mudar de assunto, mas minha curiosidade me impediu de seguir em frente sem fazer uma pergunta que me assombrava há algum tempo:
— Marena, o que exatamente seu marido faz? E o que Zeus tem a ver com isso?
— Anna… — ela hesitou, sua voz mais baixa. — Não posso falar muito, mas digamos que a função deles, é colocar ordem no caos.
Essas palavras ficaram ecoando na minha mente.
— Ordem no caos? O que isso significa?
— Por favor, não insista. Eu já disse mais do que deveria. Amanhã te ligo para saber como você está, tudo bem?
— Tudo bem. Até logo.
— Beijos, Anna. Cuide-se.
Quando a ligação terminou, senti-me ainda mais perdida. Colocar ordem no caos. Que tipo de trabalho envolvia algo tão abstrato? Zeus nunca compartilhava nada comigo, e isso só aumentava minha ansiedade.
No dia seguinte, a mansão parecia ainda maior e mais vazia do que antes. Era impressionante como tudo estava impecavelmente limpo, mesmo sem eu nunca ver uma alma viva cuidando da casa. Isso me deixou inquieta. Havia algo muito estranho naquele lugar.
Minha mente começou a viajar. E se eu explorasse um pouco mais? Talvez encontrasse algo no quarto de Zeus que me ajudasse a entender o que estava acontecendo.
Subi as escadas com passos cuidadosos, meu coração batendo mais rápido a cada degrau. O quarto de Zeus era exatamente como ele: impecável, organizado e sem qualquer traço de desordem. A cama estava perfeitamente arrumada, o closet exibia ternos escuros alinhados como soldados em fileira, e os sapatos brilhavam sob a luz. Cada detalhe parecia refletir a disciplina e o controle que ele exercia sobre tudo ao seu redor.
Foi então que vi uma caixa no fundo do closet. Era pequena, mas pesada, e tinha um cadeado que a mantinha fechada.
— O que será que Zeus esconde aqui? — murmurei, tocando a superfície da caixa.
O metal frio em minhas mãos despertou uma curiosidade quase irresistível, mas o medo de ser pega me fez hesitar. Antes que pudesse decidir o que fazer, ouvi o som distante do telefone tocando.
Apressei-me em guardar a caixa exatamente onde estava e desci as escadas rapidamente para atender. Peguei o telefone, ainda recuperando o fôlego, e então ouvi aquela voz grave e inconfundível do outro lado.
— O que você estava fazendo no meu quarto, Anna?
Meu coração parou por um momento.
— Zeus… Eu não estava mexendo…
— Não minta para mim. Responda. O que fazia lá?
Havia algo em seu tom que fazia minha pele arrepiar.
— Como você sabe que eu estava lá? — perguntei, tentando manter a calma.
— Esta casa é monitorada por mim. Eu vejo tudo, Anna. E vou repetir só mais uma vez: não entre no meu quarto de novo. Entendeu?
Antes que eu pudesse responder, ele desligou.
As horas seguintes foram um misto de medo e frustração. Saber que a casa estava sendo monitorada por ele me deixou inquieta. Cada movimento meu poderia ser observado, cada pensamento traduzido em desconfiança.
No terceiro dia de sua ausência, resolvi explorar outros lugares da mansão. Descobri um escritório trancado, mas pela fresta da porta pude ver arquivos organizados em estantes e uma mesa com o que parecia ser uma arma. As perguntas na minha mente se multiplicavam. O que Zeus fazia? Quem ele realmente era?
Enquanto isso, o silêncio da casa parecia ganhar vida própria. À noite, ouvia passos no corredor, mas quando saía para ver, não havia ninguém. As luzes piscavam de vez em quando, e o vento assobiava pelas frestas das janelas. A sensação de estar sendo observada me acompanhava o tempo todo.
No quarto dia, Marena ligou novamente, e eu desabafei:
— Marena, eu não aguento mais. Zeus controla tudo e me deixa às cegas. Eu sinto que tem algo grande acontecendo, mas ninguém me diz nada!
— Anna, escute-me. Há coisas que você não está pronta para saber. Zeus está tentando te proteger.
— Proteger de quê? — insisti.
— De um mundo que você não entende.
Suas palavras, embora gentis, não trouxeram conforto.
No quinto dia, quando finalmente ouvi o som do carro de Zeus entrando na garagem, meu coração disparou. Ele entrou na casa com a mesma expressão séria de sempre, seus olhos me atravessando como se pudesse ler meus pensamentos.
Observei a camisa dele, manchada de sangue. Meu coração disparou, e meu instinto imediato foi verificar se ele estava ferido. Antes que eu pudesse dar um passo em sua direção, ele levantou o braço rapidamente, os olhos sombrios e incisivos como lâminas.
— Não se aproxime... — disse com um tom grave, quase cortante.
Engoli em seco, mas minha voz vacilou.
— Zeus, sua camisa está... cheia de sangue! O que aconteceu?
Ele desviou o olhar, como se evitasse revelar algo sombrio demais para ser dito.
— Vou tomar um banho. Já desço. — Suas palavras saíram ríspidas, deixando um eco incômodo no silêncio que se seguiu.
Com passos firmes e calculados, ele subiu as escadas, cada degrau rangendo como se carregasse um peso que não era apenas físico. A porta do quarto dele se fechou com um som seco, deixando-me sozinha com o silêncio inquietante.
Fiquei parada no mesmo lugar, com um nó se formando em meu estômago. Minha curiosidade agora era engolida por um medo crescente e insuportável. Por que ele estava daquele jeito? O que havia acontecido para deixá-lo tão tenso, tão evasivo?
Meus olhos fixaram-se na escada, como se ela pudesse me dar respostas. Mas, em vez disso, apenas me fazia imaginar o que Zeus escondia atrás daquela porta trancada. E, principalmente, de onde vinha aquele sangue?
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Atualizado até capítulo 102
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