Zeus - O Labirinto das Emoções.
A noite caía como um manto pesado sobre a mansão de Martín. Do meu posto, podia ver as luzes douradas iluminando os vitrais imponentes, uma ironia gritante para o tipo de homem que habitava aquele lugar. Não importava o luxo ou a opulência ao meu redor; para mim, tudo parecia vazio. Apenas paredes e sombras.
Estava no terceiro mês como segurança particular aqui. Mantinha meu disfarce intacto, sem revelar meu passado ou minha fortuna. Preferia assim. Menos complicações. Mas, naquela noite, algo estava diferente. Um peso no ar, como se o silêncio escondesse um grito prestes a ecoar.
O vento quase gelado carregava o aroma de jasmim do jardim, mas minha atenção estava fixa na entrada principal. No rádio no meu bolso, apenas o chiado usual dos colegas em outros postos. Era uma noite tranquila, pelo menos na superfície.
Enquanto observava a propriedade, minha mente se perdia em pensamentos. Lembranças de um passado que eu lutava para enterrar. A mansão me lembrava da casa onde cresci, cheia de riquezas que mascaravam uma família despedaçada. Meu pai, um homem tirânico e manipulador, não era tão diferente de Martín. Talvez por isso eu tivesse aceitado este trabalho. Era como uma punição autoimposta, um lembrete constante de onde eu nunca deveria retornar.
O rádio crepitou, me arrancando do transe.
— Zeus, movimento no portão lateral. — A voz de Marco soou firme, mas com um toque de urgência.
Peguei a lanterna e respondi de imediato:
— Vou checar.
Movi-me pelo caminho de pedra que contornava a mansão. Cada passo era calculado, silencioso, como havia aprendido em anos de treinamento. A escuridão era minha aliada, e a força, minha arma.
Quando me aproximei do portão lateral, vi uma figura agachada, mexendo na fechadura com movimentos rápidos, mas nervosos. Era um intruso. Apertei a lanterna com mais força, mas hesitei antes de apontá-la diretamente. Queria observar primeiro.
— Pare. — Minha voz soou grave, cortando o silêncio como uma lâmina.
A pessoa congelou no mesmo instante, mas não fugiu. Estranho. Normalmente, invasores corriam assim que percebiam ter sido flagrados.
Caminhei até ela, mantendo a postura firme, a mão perto do coldre na cintura. Com um movimento brusco, apontei a lanterna para o rosto da pessoa. Era uma jovem, com olhos claros e arregalados, o medo estampado em cada traço do rosto.
— Quem é você? — pressionei, tentando decifrar suas intenções.
Ela hesitou, os lábios trêmulos. Sua respiração estava acelerada, mas ela parecia determinada a não desmoronar.
— Eu... sou... Elena. Preciso falar com Martín.
Revirei os olhos. Outro problema. Martín sempre atraía gente desesperada ou perigosa.
— Ninguém fala com Martín sem passar por mim. — Cruzei os braços, estudando-a com cuidado.
Ela engoliu em seco, mas não recuou. Havia algo estranho nela. Não era uma ladra. Talvez uma vítima, mas ainda não podia confiar.
— Por favor, é urgente! — insistiu, a voz quase um sussurro. — É sobre minha irmã. Ele... ele a levou!
Minha mandíbula se contraiu ao ouvir aquilo. Não era a primeira vez que ouvia algo assim sobre Martín, mas nunca ninguém havia tido coragem de vir até aqui para enfrentá-lo.
— Vá embora. Isso não é problema meu. — Tentei soar indiferente, mas a verdade é que suas palavras ecoavam na minha mente.
— E vai continuar não sendo, até ser tarde demais? — O tom dela mudou, ganhando força. — É isso que você faz? Obedece sem questionar?
As palavras dela me atingiram como um soco no estômago. Fiquei imóvel por alguns segundos, o silêncio entre nós mais pesado que qualquer resposta. Eu sabia que ela estava certa. Sabia do que Martín era capaz, mas meu trabalho era claro: proteger o homem, não julgar seus atos.
Dei um passo à frente, deixando minha sombra cair sobre ela.
— Se entrar aqui sem permissão, será o fim para você. Vá para casa.
Ela me olhou como se eu fosse o monstro da história, mas não disse mais nada. Apenas se levantou, ajeitou a mochila que carregava e correu para a escuridão.
Quando voltei ao meu posto, uma inquietação tomou conta de mim. As palavras de Elena ecoavam na minha mente, como um chamado que eu tentava ignorar. Sabia que Martín estava envolvido em negócios sujos, mas nunca tinha me permitido questionar o quanto disso era verdade. Meu trabalho era proteger, não me envolver.
O rádio crepitou novamente, trazendo a voz de Marco.
— Zeus, alguma coisa?
Hesitei antes de responder.
— Nada. Só o vento. — Mentira fácil.
O resto da noite passou arrastado. Permaneci em alerta, mas minha mente estava longe. Lembranças do meu pai voltaram como um furacão. Ele também era um homem que destruía vidas sem pensar duas vezes. E eu? Tinha fugido daquele inferno apenas para me tornar o braço direito de outro tirano?
Quando o sol começou a nascer, a mansão parecia mais imponente sob a luz dourada do amanhecer. Cada detalhe arquitetônico gritava riqueza, mas para mim, aquilo era apenas uma fachada. A verdadeira podridão estava dentro.
Terminei meu turno e fui para o pequeno quarto que usávamos como alojamento. Era simples, com paredes brancas e uma cama estreita, mas era o suficiente. Enquanto tirava os sapatos, ouvi uma batida na porta.
— Entre.
Marco entrou, com um café na mão. Era um homem robusto, de poucas palavras, mas confiável. Ele colocou o café na mesa e me olhou com curiosidade.
— Você parece distraído hoje.
Dei de ombros.
— Noite longa.
Ele franziu a testa, mas não pressionou.
— Martín vai querer você no escritório às dez. Tem uma reunião importante e quer a segurança reforçada.
— Entendido. — Minha voz saiu automática.
Marco assentiu e saiu, deixando-me sozinho novamente. Sentei-me na cama, segurando o café nas mãos, mas não o bebi. Minha mente estava na garota. Elena. Quem era ela? E o que Martín tinha feito com sua irmã?
Decidi que precisava de respostas. Não por ela, mas por mim mesmo. Eu não podia continuar assim, ignorando o que acontecia ao meu redor.
Às dez, estava no escritório de Martín, em pé ao lado da porta. Ele estava sentado atrás de uma mesa de madeira maciça, usando um terno perfeitamente ajustado. Seus olhos frios e calculistas estavam fixos em um homem que tremia do outro lado da mesa.
— Você sabe o que acontece com quem me trai, certo? — A voz de Martín era suave, mas carregada de ameaça.
O homem balbuciava desculpas, mas Martín apenas gesticulou para outro segurança, que o arrastou para fora. Tudo aquilo parecia normal para ele, como uma rotina.
Quando a sala ficou vazia, Martín olhou para mim.
— Algo a dizer, Zeus?
— Não. — Minha resposta foi curta.
Ele sorriu de canto, mas seus olhos permaneciam frios.
— Gosto de você. É eficiente, não faz perguntas. Continue assim, e terá uma boa vida aqui.
Assenti, mas por dentro, algo se revirava. Não sabia por quanto tempo mais poderia suportar aquilo.
Quando terminei meu turno, fui até o portão lateral. O local onde Elena tinha aparecido ainda estava fresco na minha memória. Olhei ao redor, certificando-me de que ninguém estava por perto, e depois segui para fora da propriedade.
Não sabia exatamente o que estava procurando, mas precisava tentar. Se Elena estivesse certa, e Martín fosse responsável por mais uma tragédia, talvez fosse a hora de agir.
Afinal, o que era mais forte? Meu medo de enfrentar o passado ou minha necessidade de fazer o que era certo?
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Atualizado até capítulo 102
Comments
Aline Conceição da Silva
Começando a ler dia 3/12/2024
primeiro capítulo top🫶🏻
2024-12-04
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