O Refúgio, localizado no interior de uma zona industrial deserta, escondia os horrores de Martín sob uma fachada decadente. Maria estava lá e este era o nome dela. Eu sabia disso. Elena havia me implorado para salvar sua irmã, mas garantir sua segurança significava agir nas sombras, sem que Martín sequer suspeitasse de minha participação.
Era por isso que Navarro estava comigo. O inspetor era a única pessoa em quem eu confiava para liderar uma operação que precisava ser impecável. A polícia pensava que esta era apenas mais uma missão para desmantelar uma quadrilha, mas para mim era algo maior.
— Isso não é apenas um resgate para você, não é? — Navarro perguntou, ajustando o rádio em seu ombro.
— Não. Isso é pessoal — respondi, enquanto checava meu equipamento.
A luz da madrugada começava a tocar o horizonte quando Navarro deu o comando.
— Equipe Alpha, posição. Invadimos em três... dois... um!
O estrondo da explosão inicial foi como o rugido de uma tempestade. A polícia irrompeu pelas portas do Refúgio, armas apontadas, gritos preenchendo o ar.
— Polícia! Mãos onde eu possa ver! —
Corri com Navarro pelo corredor principal enquanto o caos se instalava. O cheiro de pólvora e cimento preenchia minhas narinas. Apesar do plano meticulosamente traçado, o inesperado sempre acontecia. Homens de Martín resistiam, mas caíam um a um diante da força policial.
— Maria deve estar no subsolo. Vamos! — Navarro indicou uma escada estreita.
Descemos às pressas, mas uma porta reforçada bloqueava nosso caminho. Dois capangas surgiram armados, mas Navarro cuidou deles com tiros rápidos e certeiros.
— Me dê cobertura! — gritei enquanto trabalhava para arrombar a porta.
Quando finalmente consegui, a visão que me esperava era sufocante. Mulheres estavam acorrentadas em cantos escuros da sala, seus olhos exaustos refletindo a ausência de esperança. Mas então eu a vi: Maria.
— Você de camiseta vermelha...! — chamei, meu coração acelerando.
Ela levantou a cabeça devagar, reconhecendo meu rosto.
— Quem... quem é você?
Eu não podia responder. Não ali. Para ela, eu era apenas um estranho entre os policiais.
— Estou aqui para te tirar daqui. Vamos.
Quebrei as correntes que a prendiam e a puxei para cima, mas ela parecia hesitante, ainda desconfiada.
— Confie em mim, Maria. Você estará segura agora.
Navarro, ao fundo, mantinha a guarda, mas os passos de mais capangas se aproximavam.
— Temos que sair! Agora! — Navarro gritou.
Subimos rapidamente. Maria tropeçou algumas vezes, e a segurei com firmeza. Os tiros ainda ecoavam pelos corredores enquanto a polícia continuava a varredura. No caminho, a garota olhava ao redor, como se estivesse tentando entender como tudo aquilo estava acontecendo.
Finalmente, alcançamos a saída. O ar fresco da madrugada nos envolveu, mas Maria não relaxou.
— Por que estão me ajudando? Quem planejou isso?
Ignorei a pergunta, guiando-a até os veículos da polícia.
— Você está segura agora, e é isso que importa.
Ela me lançou um olhar curioso, mas não insistiu.
Na mansão de Martín, o silêncio na sala era ensurdecedor. Martín estava sentado em sua poltrona, o rosto obscurecido pela raiva contida. Seus olhos percorriam os rostos de seus subordinados, parando no informante que tremia diante dele.
— Repita — ordenou, a voz baixa, mas carregada de ameaça.
— A polícia... invadiu o Refúgio. Eles levaram as garotas... inclusive a Maria.
Martín apertou o punho, e o copo de uísque que segurava estilhaçou-se em sua mão.
— E como diabos isso aconteceu sem que ninguém me avisasse?
— Eles... eles tinham informações precisas, senhor. Foi uma operação muito bem planejada.
— Bem planejada, é? — Martín se levantou lentamente, o sangue escorrendo por sua mão cortada. Ele ignorou a dor. — Isso não foi obra da polícia sozinha. Tem alguém por trás disso.
Seu olhar era um misto de ódio e determinação. Ele sabia que havia algo mais acontecendo. Não era coincidência que Maria, entre tantas outras garotas tivesse sido resgatada.
— Quero que descubram quem está envolvido. Vão. Agora!
Os homens saíram apressados, deixando Martín sozinho em sua sala. Ele caminhou até a janela, olhando para o jardim de sua mansão.
— Quem quer que tenha feito isso vai pagar caro.
No esconderijo com a garota, Elena abraçou a irmã com força.
— Eu achei que nunca mais ia te ver, irmã.
Maria estava em silêncio, seus olhos fixos em mim. Ela parecia estar tentando juntar as peças.
— Foi você, não foi? Você armou tudo isso.
— Eu só queria ajudar — respondi, evitando seu olhar.
— Por quê? — ela perguntou, sua voz carregada de dúvida.
Elena interveio antes que eu pudesse responder.
— Zeus nos ajudou porque era o certo. Não importa como ele conseguiu, o importante é que você está aqui.
— Agora que acabou, sumam da cidade!
— Zeus, posso fazer uma pergunta?
— Diga...
— Como conseguiu a ajuda tão rápida da polícia? Que poder tem um simples segurança, que trabalho com um salário mínimo?
A pergunta de Elena ficará sem resposta; ninguém jamais saberá quem eu realmente sou ou o poder que exerço nos bastidores. O dinheiro compra liberdade e elimina obstáculos.
Encaro as garotas e digo friamente:
— Eu só faço o que é necessário. Agora, sumam daqui...
Maria ainda parecia desconfiada, mas assentiu lentamente. Ela não sabia que eu era mais do que um aliado casual. Que Martín era meu verdadeiro alvo.
Eu a deixei com Elena e saí para o terraço. As estrelas estavam desaparecendo enquanto o sol surgia no horizonte. Isso era apenas o começo. Se Martín desconfiasse de minha participação, tudo poderia desmoronar.
Mas, no momento, o mais importante era que a garota estava a salvo.
Chego na mansão sem fazer muito alarde. A porta se abre diante de mim, e logo o cheiro de couro e madeira me envolve. Os empregados passam por mim, olhos baixos, respeitosos. Não falo com ninguém. Não é necessário. Eu sei onde tenho que estar. O escritório de Martín. Sempre o escritório.
Martín me chama logo que piso na mansão. Seu tom, como sempre, autoritário, sem espaço para hesitação. Ele não gosta de ser ignorado ou de esperar. Deixo a porta se fechar atrás de mim com um estrondo suave e sigo em direção ao escritório, meu passos ecoando no corredor silencioso.
Ao entrar, ele já está sentado atrás da mesa. Seu olhar pesado encontra o meu, esperando algum sinal. Ele não diz nada, mas sua expressão já fala por ele. Desconfiança. Sempre uma desconfiança. Nunca me sai da cabeça que ele está me observando, tentando ver além das palavras, além das ações. Martín quer mais. Quer o controle.
— Zeus... — ele diz, com um tom de quem já sabe a resposta, mas vai perguntar assim mesmo. — Vem aqui agora, tenho algumas coisas para discutir.
Eu me aproximo da mesa e fico em pé, imóvel. Como sempre. Nunca sento. Eu sou o que está de fora. O que está sempre em movimento. Ele pode me comandar, mas não pode me prender.
— Sobre O Refúgio, — Martín começa, e logo percebo que o assunto é sério. Ele me observa por um momento, como se estivesse pesando o que dizer. Eu apenas fico quieto, esperando. Ele quer saber se estou em cima disso. Se sei mais do que deixei transparecer. Mas ele não sabe que, para mim, isso é só mais um problema que será resolvido. Não me afeta. — A polícia destruiu tudo ontem, — ele continua, um tom de frustração em sua voz, mas há algo mais ali, algo escondido, como se ele não estivesse totalmente surpreso com o que aconteceu. — Acho que precisamos conversar sobre o que realmente aconteceu. A polícia tem informações que, pelo visto, nós não temos. Como você explica isso, Zeus?
Mantenho o olhar fixo nele, sem expressão. Ele quer saber o que eu sei. Ele quer respostas rápidas, claras. Mas não vou dar isso a ele. Não ainda. Ele tem que confiar, ou pelo menos, acreditar no que eu digo.
— Você sabe o quanto é difícil controlar tudo, — respondo com uma voz fria, calma, quase impessoal. — Os bastidores têm suas próprias regras. A polícia agiu sem saber tudo. E é isso que eles não conseguem entender. Não foram as coisas erradas que aconteceram ontem. O erro foi de quem pensou que tinha o controle.
Martín me observa, sua testa franzida. Não está convencido, mas ele tenta. Acredito que ainda tem dúvidas sobre minha lealdade. Sempre tem. E eu gosto disso. É no medo e na dúvida que a verdadeira lealdade se encontra.
— Você estava no seu apartamento ontem, — ele diz, sem rodeios, com os olhos estreitos. — Ouvi dizer que você estava... bem, mais 'relaxado' do que o normal. — Ele dá ênfase na palavra, como se estivesse procurando alguma falha na minha história. — Eu quero saber o que estava acontecendo, Zeus. Como você explica isso?
Não me movo. Não altero meu tom. Eu sou uma rocha.
— Eu estava apenas descansando, — respondo, com um sorriso leve, quase irreconhecível. — O que acontece fora do horário de expediente não é de sua conta, Martín. Se você está tão preocupado com o meu comportamento, talvez seja hora de contratar outro segurança. — Eu deixo a ameaça no ar, sem precisar enfatizar. Ele sabe o que está em jogo.
Martín me encara, a tensão no ar entre nós quase palpável. Ele está tentando decifrar se estou sendo sincero ou se há algo mais ali, algo que ele não sabe. Mas ele não tem nada em que se apoiar. Não tenho como provar o que fiz ou deixei de fazer no apartamento. Não sou um homem fácil de pegar em mentiras.
— Não me faça repetir, — ele diz finalmente, a voz mais baixa agora, mais controlada. — Estou começando a me questionar sobre a sua lealdade.
A ameaça é clara. Martín quer uma resposta direta, quer sentir que o estou respeitando. Mas eu sei jogar com ele. Eu sei como ele funciona. Ele vai duvidar de mim, mas não vai fazer nada agora. Não sem provas.
— Eu sou leal ao que paga minhas contas, — digo, com uma leve ênfase na última palavra. — Mas se você acha que isso é motivo para questionar minha competência, me avise. Eu não vou ficar aqui se não for para fazer meu trabalho como sempre fiz.
Martín fica em silêncio por um momento, seus olhos se fixando em mim. Ele provavelmente está ponderando se me manda embora ou se me dá outra chance. O jogo de poder está sempre em andamento, e eu sei jogar. Ele sabe que não posso ser facilmente manipulado, mas ele também sabe que preciso do trabalho. Ele não vai me dispensar tão facilmente.
— Você ainda continua aqui! — ele diz finalmente, a voz mais tranquila agora, mas com um toque de frieza. — Mas vou estar de olho em você. Não pense que pode fazer o que bem entender, Zeus.
Eu levanto e saio pela porta, Martín acha que me pega facilmente porém, sou muito mais ágil que ele e nunca saberá como o seu negócio foi destruído ontem a noite e que prazer fazer parte daquilo.
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Atualizado até capítulo 102
Comments
Thaliaa Vieira
Afinal é Ana ou Maria? No capítulo anterior ele ja não tinha resgatado ela? pq apareceu o resgate de outra forma?
2024-12-28
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