Capítulo 3 – O Limiar da Escuridão
Subcapítulo 4: À Beira do Caos
A noite trouxe um silêncio inquietante para a mansão. Sera, incapaz de dormir após os sonhos perturbadores, vagava pelos corredores. Cada sombra parecia ter vida própria, cada som amplificado pelo vazio ao seu redor. Era como se a casa estivesse respirando, observando seus passos hesitantes.
Ela desceu a grande escadaria em direção ao salão principal. As velas ainda estavam acesas, lançando um brilho bruxuleante nas paredes decoradas com tapeçarias antigas. Sera sempre achou o ambiente opressor, como se as histórias escondidas naquela mansão estivessem à espreita, esperando para revelar seus segredos.
Ao entrar no salão, encontrou Adrian, sentado no sofá de couro próximo à lareira. Ele segurava um copo com um líquido âmbar que refletia as chamas. Seus olhos, normalmente brilhantes e cheios de humor, estavam sombrios.
"Não consegui dormir?" ele perguntou, sem desviar o olhar do fogo.
"Você também parece não ter conseguido," respondeu Sera, aproximando-se.
Adrian deu um sorriso breve, mas melancólico. "É difícil dormir quando o mundo parece estar desmoronando."
Sera sentou-se ao lado dele, sentindo a tensão no ar. "O que você acha que aqueles caras queriam? Eles me chamaram de 'especial', mas não sei o que isso significa."
Adrian girou o copo em sua mão, observando o líquido se mover. "Significa que você é mais importante do que imagina, Sera. E, ao mesmo tempo, isso a torna mais perigosa."
"Mais perigosa para quem?"
"Para eles. Para nós. Para você mesma, se não aprender a controlar o que tem dentro de você."
Ela franziu a testa, frustrada. "Por que ninguém nunca me explica as coisas claramente? Estou aqui, sendo atacada, treinada contra minha vontade, e tudo que recebo são meias respostas."
Adrian finalmente olhou para ela, seus olhos suavizando um pouco. "Não é por mal, Sera. Mas há coisas que nem mesmo Damian pode explicar. Ele é bom em guardar segredos... às vezes, até demais."
"Você sabe o que ele está escondendo?"
Adrian hesitou, como se estivesse ponderando se deveria falar. Finalmente, suspirou. "Damian carrega muita culpa, mais do que qualquer um de nós. Ele já perdeu pessoas que tentava proteger. Ele acha que, se não conseguir mantê-la viva, será mais uma adição à sua lista de falhas."
"Não sou responsabilidade dele," disse Sera, cruzando os braços.
"Talvez não," respondeu Adrian. "Mas, para Damian, você é. E isso o consome."
Sera sentiu um nó se formar em sua garganta. Ela não sabia como lidar com isso, com a ideia de ser o peso que alguém carregava. Antes que pudesse responder, o som de algo se quebrando ecoou pelo corredor.
Adrian estava de pé em um instante, a mão indo para a faca presa em sua cintura. "Fique atrás de mim," ordenou, sua voz séria.
"Estou começando a odiar essa frase," murmurou Sera, mas ela obedeceu.
Os dois saíram do salão e entraram no corredor. As sombras pareciam se mover de maneira mais agressiva, como se estivessem sendo puxadas por uma força invisível. Um vento frio cortou o ar, apesar de todas as janelas estarem fechadas.
"Adrian," sussurrou Sera, apontando para o fim do corredor. Uma figura estava parada ali, quase indistinguível da escuridão ao seu redor.
Adrian avançou lentamente, a faca brilhando à luz das velas. "Quem está aí?"
A figura deu um passo à frente, revelando um rosto pálido e olhos vermelhos brilhantes. Sera reconheceu imediatamente — era um dos homens que os haviam confrontado naquela manhã.
"Vocês acham que podem nos evitar?" a figura disse, a voz baixa, mas carregada de ameaça. "Acham que podem esconder o que ela é?"
Adrian não respondeu. Em vez disso, avançou com rapidez impressionante, a lâmina em um arco perfeito. O estranho desviou com facilidade, movendo-se como uma sombra viva.
"Você não vai sobreviver a isso," disse o estranho, com um sorriso cruel.
Sera, instintivamente, pegou a adaga que sempre carregava. Ela sabia que não era páreo para ele, mas não podia ficar parada. Antes que pudesse decidir o que fazer, o estranho se lançou em direção a Adrian, e o som de lâminas se chocando ecoou pelo corredor.
"Sera, corra!" gritou Adrian, mas ela não se moveu.
O coração dela batia como um tambor, e uma sensação estranha começou a crescer dentro dela. Era como uma corrente elétrica percorrendo seu corpo, fazendo sua pele formigar. Ela não sabia o que era, mas sabia que vinha de dentro.
O estranho olhou para ela, os olhos estreitando. "Então, você tem algo especial afinal," ele murmurou, quase como se estivesse admirando-a.
Sera não sabia o que estava fazendo, mas levantou a mão instintivamente. Uma luz fraca começou a brilhar em sua palma, e o estranho recuou, como se tivesse sido queimado.
Adrian aproveitou o momento para desferir um golpe rápido, cortando o braço do intruso. Ele gritou, mas antes que pudesse contra-atacar, uma explosão de sombras o envolveu, e ele desapareceu.
Sera caiu de joelhos, o brilho em sua mão desaparecendo. Adrian correu até ela, os olhos arregalados.
"O que foi aquilo?" perguntou ele, ofegante.
"Eu... não sei," respondeu Sera, a voz trêmula.
Antes que pudessem discutir mais, Damian apareceu, a expressão sombria. Ele olhou para Adrian, depois para Sera, e franziu a testa.
"Você ativou algo, não foi?" perguntou ele, sem rodeios.
Sera apenas assentiu, sem palavras.
Damian suspirou, passando a mão pelo cabelo. "Isso complica as coisas."
"Por que?" perguntou Adrian, ajudando Sera a se levantar.
"Porque agora eles sabem do que ela é capaz," respondeu Damian, olhando para Sera como se ela fosse tanto uma ameaça quanto uma promessa.
Sera sentiu o olhar de Damian pesar sobre ela como uma sentença. Ele parecia avaliar cada movimento, cada respiração, como se estivesse diante de algo que não podia controlar. O silêncio entre os três era opressor, preenchido apenas pelo som do vento que uivava do lado de fora.
"Você sabia que isso aconteceria?" Adrian quebrou o silêncio, encarando Damian.
"Eu suspeitava," admitiu Damian, a voz fria. "Mas não tão cedo."
"Suspeitava o quê?" Sera se forçou a perguntar, mesmo com o cansaço esmagando seu corpo.
Damian caminhou lentamente pelo corredor, analisando as sombras como se esperasse outro ataque. Ele parou em frente a uma janela, os olhos fixos na noite escura. "Que dentro de você existe algo além do humano. Algo que pode destruir ou salvar — dependendo de como for usado."
"Você está falando como se eu fosse uma bomba prestes a explodir," retrucou Sera, tentando mascarar o medo com sarcasmo.
"Porque é isso que você é," respondeu Damian sem rodeios. Ele se virou para encará-la, os olhos duros, mas também... protetores? "Essa energia, esse poder que você sentiu, não é comum. E agora que eles sabem que você pode usá-lo, eles vão atrás de você com ainda mais intensidade."
"Ótimo," disse Adrian com uma risada seca. "Como se já não fosse difícil o suficiente manter essa casa em pé."
"Adrian," Damian o cortou com firmeza. "Isso não é brincadeira. Eles vão usar qualquer brecha, qualquer fraqueza para chegar até ela. E se conseguirem..." Ele não terminou a frase, mas o peso das palavras pairou sobre eles.
Sera respirou fundo, tentando processar o que acabara de ouvir. "Então, o que eu faço? Como eu... controlo isso?"
Damian caminhou em sua direção, parando a poucos passos dela. "Você treina. Você aprende a entender o que está dentro de você antes que eles o manipulem."
"Mais treino," murmurou ela, cansada. "Como se isso fosse resolver todos os problemas."
"Você quer sobreviver ou não?" a voz de Damian era dura, mas não havia raiva. Apenas a verdade brutal.
Sera desviou o olhar, sentindo-se uma peça deslocada em um jogo que não entendia. "Eu quero respostas. Quero saber por que isso está acontecendo comigo."
"E terá," prometeu Damian. "Mas primeiro, você precisa estar pronta. Porque as respostas que você procura podem não ser o que espera."
Antes que ela pudesse responder, um som distante os interrompeu. Era fraco, mas distinto — passos ecoando pelos corredores da mansão. Damian ergueu a mão, sinalizando silêncio. Adrian sacou sua faca novamente, e Sera instintivamente levou a mão à adaga em sua cintura.
Os passos ficaram mais altos, mais próximos. O coração de Sera disparou, e ela prendeu a respiração enquanto olhava para Damian em busca de orientação. Ele gesticulou para que ela ficasse atrás dele.
"De novo isso," murmurou Sera baixinho, mas obedeceu.
A tensão era palpável quando a figura finalmente apareceu na curva do corredor. Era um homem alto, com cabelos escuros e um casaco longo que balançava com seus passos. Ele tinha um sorriso que não alcançava os olhos, e seu andar era tranquilo, quase casual, como se não tivesse acabado de invadir a mansão de Damian.
"Não quis interromper a reunião de família," disse o homem, sua voz gotejando sarcasmo. "Mas parece que deixaram a porta aberta."
"Quem é você?" perguntou Adrian, sua postura defensiva.
"Ah, onde estão meus modos?" o homem colocou a mão sobre o peito de forma teatral. "Meu nome é Kael. E, bem, estou aqui para buscar algo que não pertence a vocês."
Os olhos de Kael pousaram em Sera, e ela sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Havia algo nos olhos dele, algo que parecia olhar diretamente através dela.
"Você não vai levar nada," disse Damian, sua voz firme.
Kael riu, um som frio e desagradável. "Ah, Damian. Sempre o protetor. Sempre o homem das regras." Ele deu um passo à frente, e a tensão no ar se tornou quase insuportável. "Mas sabe tão bem quanto eu que não pode me impedir. Não por muito tempo."
Antes que alguém pudesse reagir, Kael ergueu a mão, e uma onda de energia invisível atravessou o corredor. Damian foi jogado para trás, colidindo com a parede com um impacto que fez Sera gritar. Adrian tentou atacar, mas foi interrompido pela mesma força, sendo lançado contra o chão.
Sera ficou paralisada, o pânico congelando seu corpo. Kael sorriu, caminhando lentamente em sua direção. "Você sente, não sente? Essa energia dentro de você, pulsando, querendo ser liberada."
Ela recuou, mas ele continuou avançando. "Não tenha medo, pequena. Eu posso ensiná-la a usá-la. Eu posso torná-la mais forte do que jamais imaginou."
"Fique longe de mim," ela conseguiu dizer, a voz trêmula.
Kael parou, o sorriso ainda presente. "A escolha é sua. Mas não demore muito. Outros não serão tão pacientes quanto eu."
Com isso, ele desapareceu, como uma sombra sendo engolida pela noite.
Damian e Adrian se levantaram lentamente, ambos parecendo abalados, mas não gravemente feridos. Damian olhou para Sera, os olhos sombrios.
"Agora você entende por que precisa estar pronta?"
Sera apenas assentiu, sem palavras. O que quer que estivesse por vir, ela sabia que seria pior do que tudo que havia enfrentado até agora.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 54
Comments