O Limiar do Desconhecido

Capítulo 2 – Ecos da Noite

Subcapítulo 4: O Limiar do Desconhecido

Sera ainda sentia o peso da conversa com Damian enquanto subia para seu quarto. Cada palavra dele parecia uma ameaça velada, uma promessa de que o mundo que ela conhecia estava prestes a ruir. O eco de seus passos nos corredores amplos e frios era sua única companhia. As sombras dançavam nas paredes, alimentadas pela fraca luz das velas, criando formas inquietantes.

Ao fechar a porta atrás de si, ela exalou um suspiro pesado. A sensação de segurança que buscava, no entanto, não veio. A presença de Damian parecia impregnar o ambiente, como se mesmo à distância ele ainda a observasse. Ela sabia que estava sendo testada, mas não entendia até onde isso a levaria.

Sera caminhou até a janela e puxou as cortinas, observando a vastidão da noite lá fora. A floresta que cercava a mansão era uma escuridão impenetrável. A lua cheia pairava no céu como um olho atento, e ela não conseguiu evitar sentir que algo ou alguém estava escondido naquelas árvores. Uma parte dela queria fugir, mas para onde? Damian tinha razão: não havia saída.

Do lado de fora, um movimento chamou sua atenção. Uma silhueta. Alguém estava lá. Seu coração disparou, mas ela não desviou o olhar. Forçando-se a manter a calma, Sera tentou distinguir o que via. A figura estava parcialmente oculta pelas árvores, mas parecia observar diretamente sua janela. Era alta, imponente, e parecia mais uma sombra viva do que um ser humano.

Sem pensar, ela se afastou da janela, seu corpo colidindo com algo atrás dela. Um grito escapou de seus lábios antes que pudesse se conter, mas quando se virou, não havia nada ali. Sua respiração acelerada preencheu o silêncio da sala. Tudo parecia errado, fora do lugar.

A maçaneta da porta girou. Sera congelou. O medo subiu pela sua espinha enquanto a porta se abria lentamente, revelando Damian. Ele entrou sem pedir permissão, sua presença preenchendo cada canto do quarto. O olhar intenso dele varreu o ambiente antes de pousar nela.

"Você viu algo lá fora?" ele perguntou, como se já soubesse a resposta.

Sera hesitou. "Alguém está lá. Eu vi uma figura... na floresta."

Ele inclinou a cabeça, estudando-a. "Você não está imaginando coisas. O que você viu é real, e é perigoso. Não abra essa janela novamente, não importa o que veja ou ouça."

Ela queria questioná-lo, mas o tom dele não deixava espaço para debate. "Quem... ou o que era aquilo?"

"Algo que não deveria estar aqui," ele respondeu, sua voz baixa, mas carregada de um peso sombrio. "Algo que você atraiu."

"Eu?" Ela deu um passo para trás. "Como posso ter feito isso?"

Damian se aproximou, parando tão perto que ela pôde sentir o calor de seu corpo. "Você tem um poder dentro de si, Sera. E ele está despertando. Criaturas como aquela sentem isso. Elas virão até você, e cabe a mim garantir que você sobreviva."

O medo e a indignação a dominaram. "Eu não pedi por isso! Não pedi para ter esse poder, nem para ser perseguida por... seja lá o que aquilo era!"

Damian não recuou. "Não importa o que você pediu. Isso é quem você é. E quanto mais cedo aceitar, mais rápido poderá se proteger."

A intensidade do olhar dele era sufocante, mas Sera não recuou. Apesar do medo, uma chama de determinação começou a crescer dentro dela. Ela não sabia como ou por que, mas sabia que precisava lutar.

Damian a observou em silêncio por um momento antes de se virar para a janela. "Descanse esta noite. Amanhã começaremos seu treinamento. Você precisa estar pronta."

Antes que ela pudesse responder, ele deixou o quarto, fechando a porta com firmeza. Sera ficou sozinha novamente, mas agora, o silêncio parecia mais ameaçador do que nunca.

O som do clique da porta ecoou no quarto, deixando Sera em um misto de alívio e desconforto. Damian sempre tinha uma presença tão imponente que sua ausência parecia criar um vácuo. Mas agora, sozinha no quarto, a sensação de estar sendo observada pela figura na floresta voltou com força total. Cada sombra parecia viva, cada pequeno ruído um sussurro de algo oculto.

Ela sentou-se na beirada da cama, os pensamentos correndo como um turbilhão. O que Damian queria dizer com "treinamento"? E como ela poderia ter despertado algo tão perigoso? As perguntas a sufocavam, mas havia algo mais... algo que ela não podia ignorar. A maneira como ele a olhava, como se enxergasse cada camada de quem ela era, a desconcertava profundamente. Damian não era apenas um enigma; ele era um perigo e, ao mesmo tempo, uma atração irresistível.

Sera balançou a cabeça, tentando afastar aqueles pensamentos. Levantou-se e foi até o espelho sobre a cômoda. Seu reflexo parecia estranho, como se não fosse ela mesma. Havia um brilho em seus olhos que não estava lá antes, algo mais intenso, mais... sombrio. O mesmo brilho que havia visto nos olhos de Damian.

Uma batida seca na janela interrompeu seus pensamentos, e seu coração disparou. Ela se virou rapidamente, os olhos fixando o vidro. Por um momento, não viu nada, apenas a escuridão lá fora. Mas então, um movimento sutil chamou sua atenção. A mesma figura estava lá, mais próxima desta vez. Os contornos eram indistintos, mas sua presença era inegável. Algo nela parecia errado, desumano.

Sera deu um passo para trás, o medo dominando-a. A figura parecia observá-la, imóvel, como se estivesse esperando algo. Damian havia dito para não abrir a janela, mas a curiosidade e o desespero lutavam dentro dela. Se aquilo era uma ameaça, como poderia se defender? E se Damian não estivesse ali para ajudá-la?

A figura moveu-se lentamente, pressionando uma mão contra o vidro. O contato produziu um som agudo e quase insuportável, como unhas arranhando uma lousa. Sera cobriu os ouvidos instintivamente, mas manteve os olhos fixos na cena. A palma da figura era alongada, os dedos terminando em garras afiadas que arranhavam o vidro com uma força que parecia quase quebrá-lo.

"Damian!" O nome escapou de seus lábios como um grito, mas antes que ela pudesse sequer se mover, a porta se abriu com força, e ele estava lá.

"Não olhe para ele!" Damian ordenou, sua voz cortante como um aço. Em um movimento rápido, ele atravessou o quarto e posicionou-se entre Sera e a janela. A figura do lado de fora pareceu hesitar por um momento, mas então se afastou, desaparecendo nas sombras.

Sera respirava com dificuldade, os olhos arregalados. "O que era aquilo?" Sua voz tremia, mas ela precisava de respostas.

Damian se virou para ela, a expressão mais sombria do que nunca. "Você não está pronta para saber ainda. Só o que importa é que isso era apenas o começo."

"Como assim, o começo?" Sera perguntou, a frustração transbordando em sua voz. "Eu mereço saber no que estou envolvida!"

Damian deu um passo em sua direção, sua presença dominadora se tornando mais evidente. "Eu estou te protegendo, Sera. Mas para isso, você precisa confiar em mim. Existem coisas lá fora que você ainda não consegue compreender, e se tentar enfrentá-las sem estar preparada, elas irão destruí-la."

Ela sentiu a raiva fervilhar. "E quem vai me proteger de você, Damian? Porque até agora, você parece tão perigoso quanto qualquer coisa lá fora!"

Ele a encarou por um momento, os olhos negros brilhando com uma intensidade que a fez estremecer. "Talvez você devesse me temer, Sera," ele disse em um tom baixo, quase como um aviso. "Mas há uma diferença entre mim e eles. Eu quero que você viva."

As palavras dele a atingiram como um soco, deixando-a sem fôlego. Havia algo inegavelmente verdadeiro na voz dele, algo que ela não podia ignorar. Mas a tensão entre eles continuava a crescer, pulsando como uma corda prestes a se romper.

"Descanse," ele disse, sua voz suavizando levemente. "Amanhã será um dia longo." E com isso, ele saiu do quarto novamente, deixando Sera sozinha com seus pensamentos e a escuridão.

Ela se sentou na cama, abraçando os joelhos. Apesar do medo e da confusão, uma parte dela começava a perceber que não poderia escapar. Não de Damian, nem do que havia sido despertado dentro dela. E, no fundo, uma voz sussurrava que talvez ela não quisesse fugir.

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