11 - Julia

O primeiro dia do hospital foi bem corrido. Reencontrei

muitas pessoas queridas e descobri que alguns conhecidos haviam saído da nossa

matilha. Fiquei triste, mas não tive muito tempo de pensar nisso.

Estava encerrando meu plantão, quando fui chamada para

atender uma emergência junto com Guilherme.

Entrei na sala e vi um furacão loiro fazendo um grande

escândalo. Era Emily. Ela chorava como se tivesse passado por um desastre.

Quando levantou a cabeça, seus olhos cruzaram com os meus e

por um instante tive a impressão que eram ódio puro. Mas ela sorriu para todos

na sala e com uma voz fina disse:

- Por favor\, preciso que somente o doutor Guilherme me

atenda. Ele é meu médico e tem a minha ficha.

Todos saíram em silêncio, ficando na sala apenas a Emily,

Guilherme e eu, que era sua enfermeira.

- Ela vai ficar\, doutor?

- É minha enfermeira\, está me auxiliando.

- Tudo bem\, então.

- O que você está sentindo\, Luna?

- Enjoos e tonturas.

- Vou pedir um exame de sangue completo\, e receitar um pouco

de soro para hidratação... Julia, por favor, pegue o material para coleta.

- Sim\, doutor\, com licença. - Assim que saí pela porta\, pude

ouvir os dois conversando.

“É bom que agora eu esteja grávida. Preciso segurar esse

homem...”

“Calma, vamos descobrir em breve!”

Segui pelo corredor imaginando o que aquilo queria dizer.

Segurar esse homem?

“Talvez ela esteja deixando ele maluco” Ceci falou em minha

cabeça.

“Pode ser. Só depois de me afastar que eu percebi o quanto

ela é maluca e manipuladora. Mas eles se merecem... e são companheiros, afinal.

A deusa não juntaria duas pessoas à toa, não é?”

“Acho que não. Mas vai ser interessante acompanhar essa

situação”.

Peguei todos os materiais e segui para o consultório. O

corredor estava movimentado e assim que abri a porta, Guilherme pulou de cima

de Emily e começou a ajeitar o jaleco...

Meu deus, eles estavam se beijando!

Mas eu não poderia falar nada. A minha sorte é que eles não

perceberam que eu vi, pois foi muito rápido. Fingi que estava distraída lendo

as instruções do cateter, e emendei uma conversa fiada para disfarçar.

- Doutor\, eu costumava usar uma outra marca na capital\, era

muito boa... Talvez pudéssemos pedir para experimentar aqui...

- Oh\, é... Julia\, você chegou?

- Sim\, desculpa a demora. É que eu não conhecia essa marca.

Estava olhando o fabricante.

- Claro... Bem\, é... pode fazer a coleta. Luna\, Julia irá

cuidar de tudo.

Comecei a fazer a assepsia para coletar o sangue de Emily.

Ela me olhava de cima a baixo, com cara de poucos amigos. Estava desconfiada de

algo, é claro.

- O que você viu?

Respirei fundo e fiz a minha melhor cara de inocente.

- Vi o quê? Tinha que ver alguma coisa?

- Você sabe do que eu estou falando!

- Que você virou Luna? Eu já sabia disso antes de sair

daqui, Emily. Fora isso, vi que estão usando marcas baratas nesse hospital, que

merecia um melhor investimento. Também vi que o corredor está lotado, talvez

devêssemos pensar em solicitar mais pessoal para trabalhar aqui.

Emily suspirou com cara de poucos amigos.

- Anda logo com isso. Tenho compromissos importantes.

- Tudo bem\, Luna.

Terminei o meu serviço e saí da sala, antes que ela tivesse

tempo para falar alguma coisa.

Segui pelo corredor tentando imaginar o que estaria

acontecendo na matilha. Eu havia saído, mas ainda tinha um carinho muito grande

pelo lugar em que cresci. Isso apertava meu coração e me entristecia, pois era

visível que Emily continuava só pensando nela, mesmo sendo quem deveria cuidar

da cidade.

“Essa é uma péssima Luna, Julia...”

“Eu sei Ceci! Me sinto tão mal por isso. Nossa alcateia

merecia muito mais.”

“O que podemos fazer agora?”

“Não sei. Mas eu vou trabalhar da melhor forma aqui no

hospital. Espero trazer um pouco de conforto para as pessoas que dependem dos

meus cuidados”.

“Você é uma boa garota, Julia. É uma pena que o Alfa não

tenha sido seu companheiro, você teria sido uma boa Luna para eles.”

“Hoje eu nem penso nisso. Foi melhor assim. Tenho certeza de

que a deusa está preparando alguém pra mim, e vou aceitar de coração aberto!”.

Segui para o laboratório conversando com minha loba, quando

trombei com Guilherme saindo da sala de entrega de material com pressa.

- Doutor... a Luna já está saindo.

- Ok\, obrigado. Já estou encerrando meus atendimentos por

hoje. Nos vemos amanhã.

- Tudo bem. Então até amanhã.

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