Reencontrando aquele traidor

Enviei uma única mensagem para Leoni, pedindo que me encontrasse na frente do apartamento das meninas. Era o lugar onde eu me sentia mais segura. Talvez fosse um exagero, mas depois do que ouvi sair de sua boca, não restava dúvida: eu não o conhecia de verdade. Contudo, para realizar minha vingança, precisava encenar. Fingir que tudo estava bem, mesmo que meu sangue fervesse de ódio.

— Espero que tenha uma boa desculpa para a humilhação que passei hoje. E sem contar a fuga. Quem é que usa um incêndio para escapar do próprio noivado? E foi você quem organizou tudo isso! Não faz o menor sentido o que fez. Se fosse por mim, teríamos casado discretamente e pronto. O que diabos está passando pela sua cabeça, Noemi? — Leoni não me deu chance de abrir a boca. Mal desceu do carro e já estava despejando suas frustrações.

Respirei fundo, ajustando meu semblante para o de uma mulher vulnerável. A máscara que eu precisava usar. Ele não poderia desconfiar de nada, para o plano continuar dando certo.

— Eu... não sei. Você sabe como sou tímida, não é? Introvertida. Organizei o jantar para anunciar o noivado porque queria mostrar ao seu pai o grande homem em que você se tornou. Só nosso círculo íntimo sabe sobre nós, enquanto a mídia apenas especula e vive espalhando mentiras de que você está saindo com várias mulheres... Achei que essa seria a melhor forma de acabar com os rumores, mas foi além dos meus limites. Me desculpa. Talvez seja melhor voltarmos ao plano original. Continuo organizando o casamento, e anunciamos tudo com uma foto nas redes sociais. O que acha? Até podemos adiantar o casamento para daqui a um mês. — Cada palavra saiu como uma linha de roteiro. Ensaiada. Calculada. Não podia deixar que Leoni suspeitasse de nada.

Ele cruzou os braços, mas relaxou um pouco. Talvez tivesse mais chateado com seu ego ferido, por eu não ter dito sim de imediato, do que minha fuga do noiva propriamente.

— Tudo bem. Imaginei que fosse demais para você. Apareceram mais jornalistas do que o previsto... talvez a informação tenha vazado. Até imagino quem iria gostar disso, mas deixe para la. Então, sim, será melhor assim. Organize algo íntimo, apenas para nossa família. Não precisa se preocupar com anúncios. Meu pai estará no casamento de qualquer jeito. Isso é o que importa.

Leoni parecia estranhamente despreocupado. Talvez confiante demais. Não fazia ideia do que estava por vir. Talvez houvesse algo recíproco entre nós dois afinal, no fim, nenhum dos dois conhece realmente o outro.

— Quer que eu te leve para casa? Vi que saiu sem carro do noivado, sua irmã levou ele para casa. Te deixo e depois vou para o hotel... Os bombeiros ainda estão avaliando os estragos na mansão, depois do incêndio. Parece que começou no meu quarto, perto da lareira. Provavelmente deixei acesa sem querer.

— Que pena... Ainda bem que ninguém se feriu. Vou ficar com as meninas por alguns dias. Elas são minhas madrinhas, afinal, e me ajudarão a organizar tudo. — A mentira escorregou fácil dos meus lábios, e por um segundo, me admirei com a frieza que eu já havia esquecido que possuía.

Leoni deu de ombros, indiferente. Como não percebi antes o quão desinteressado ele estava em mim? Me sinto uma idiota por ter deixado passar algo tão notório. Será que todos sabiam? E apenas respeitaram minha opinião? As meninas eu sei que nunca suportaram sequer ficar perto dele.

— Faz sentido. Minha mãe ainda está nervosa com o incêndio. Para piorar, meu pai não atende as ligações dela, o que só aumentou o drama. Agora há rumores de que eles estão em crise no casamento, já que ele não estava em casa na hora do incêndio. O que é uma grande piada, já que sequer foram casados alguma vez na vida.

Não sabia muito sobre o pai de Leoni, nunca o vi pessoalmente, apenas pela televisão, mas algo era notório, ele desprezava Leoni e sua mãe. Como o homem não gosta de falar da sua vida pessoa, ela aproveita para mentir que são casados, pensando que jamais será desmentida.

Leoni me viu pensativa, me envolveu em um abraço, e por dentro, eu queria gritar, queria afastá-lo com um soco. Mas segurei firme, forçando um sorriso quando ele beijou minha testa fingindo ter afeto por mim. Meu estômago se revirou.

— Ela parece amar muito seu pai. — Menti com um sorriso gélido, quando o que realmente queria era gritar de nojo.

— Amor? Não me faça rir. Minha mãe ama o poder que tem por ser a esposa do presidente. Meu pai, por outro lado, não se importa com fofocas e acha que é uma perda de tempo lidar com o drama dela. Apenas me mandou resolveu como todas as vezes que ela surta. — Leoni se afastou, caminhando de volta ao carro. — Te ligo amanhã. Boa noite.

Antes que ele entrasse no veículo, lembrei-me do próximo passo do plano.

— Espera! Acho que esqueci algo no seu carro, no porta-luvas. — Abri a porta do passageiro e fingi procurar.

— O que você esqueceu? — Ele me observou, sem desconfiança.

— Um batom. — Respondi sem hesitar. Ele jamais se lembraria da última vez que me viu passar batom no carro dele.

— Ah, aqui está. — Leoni entregou-me um batom vermelho, da marca preferida da minha irmã. — Estava testando quanto tempo você levaria para se dar conta de que o tinha esquecido.

— Você até percebe essas coisas? E eu pensando que o senhor não era de reparar nos detalhes — Debochei, escondendo o desprezo.

— Você fica linda com batom vermelho. Como eu esqueceria? — O mentiroso sorriu, sem imaginar que suas palavras o empurravam cada vez mais para a cova que eu estava cavando. Eu odiava batom vermelho.

— Boa noite, Leoni. — Beijei sua bochecha e corri para dentro. Não queria lidar com ele mais nenhum segundo. O trabalho estava feito. Agora era a vez de Lívia agir.

Antes de chegar à varanda, ouvi as sirenes ecoando pela rua. Minha amiga era perfeita na arte da pontualidade. Não consegui conter o riso ao imaginar sua expressão quando visse os policiais.

— Isso é só o começo... — Sussurrei, observando da janela enquanto Leoni era arrancado do carro, sem a menor delicadeza dos policiais, com toda certeza, ainda não reconheceram ele, mas logo Leoni fará o favor de informar a todos.

A vingança estava só começando, e para ela funcionar, eu precisava que Leoni permanecesse o idiota imaturo que sempre foi. Só assim eu chegaria ao verdadeiro alvo: o pai dele.

— Noemi! Vamos! O Uber chegou! — Lívia gritou apontando para o celular.

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