Caminhei sob a chuva na volta do mercado, já a apenas uns 200 metros da minha nova casa. Meu avô me havia instruído a comprar alguns ingredientes para preparar algo delicioso após o jantar desta noite.
Voltar ao Japão com a intenção de se estabelecer em um lugar parecia um tanto estranho após tantos anos viajando por diversos países, mas fazer o que...
Com o guarda-chuva em mãos, me permiti desviar um pouco o olhar para a praça, agora pontilhada com poças d'água, mas o que realmente chamou minha atenção foi uma garota de cabelos escuros, com reflexos violeta sutis.
Seus olhos eram tão escuros quanto a noite, e ela estava usando um moletom escuro sobre um vestido xadrez cinza, sentada no balanço enquanto encarava o chão.
Surpreendentemente, ela não parecia se importar em estar sob a chuva, e seu corpo estava completamente encharcado.
Após alguns segundos, a garota notou que os pingos de chuva haviam cessado.
— Hm...? — expressou, demonstrando leve confusão, olhando para cima e me vendo protegendo-a com o guarda-chuva.
— Você está bem? — perguntei, genuinamente preocupado com sua situação.
Ela me analisou por um momento antes de decidir responder.
— Você se importa? Seria mais fácil simplesmente me ignorar… — comentou a garota, com um tom monótono.
— Mmm, é verdade, mas não consegui fazer isso, — respondi com um sorriso. — Então, qual é o seu nome? Me chamo Renier, a propósito...
— Estranho, — ela comentou, erguendo a sobrancelha. — Me chamo Ro-Nyami Homura...
— Um nome bonito, — sugeri. — Posso chamar você de Nya? E você pode me chamar apenas de Ren, se preferir. Apenas as pessoas que considero especiais podem me chamar assim, — expliquei.
Embora, na verdade, só meu avô e ela se enquadrariam nessa categoria, já que não tenho amigos desde que me lembro.
Meu avô havia sugerido que eu tentasse fazer amigos agora que estávamos morando e estudando no Japão.
— Sou especial para você? Nós acabamos de nos conhecer… — comentou ela, levantando uma sobrancelha, curiosa.
Nya pareceu intrigada com minha resposta, mas então soltou um suspiro leve, quase como um riso abafado.
— Bem, se você insiste, Ren, — ela disse, pronunciando meu nome de uma maneira que de alguma forma parecia mais íntima do que o normal.
— E, sim, é um nome peculiar, mas eu gosto dele. Pode me chamar de Nya, está bem — ela acrescentou com um leve brilho de mistério em seus olhos.
Essa resposta me fez sorrir ainda mais.
— Obrigado então é o que farei, então você agora é uma pessoa especial na minha vida, hehe — disse sorrindo por ter encontrado alguém diferente.
Ela pareceu ponderar minhas palavras por um momento e depois sorriu, um sorriso que iluminou seu rosto como um raio de sol rompendo as nuvens.
— Você sabe, Ren, você é diferente de qualquer pessoa que já conheci. E eu gosto disso, — disse ela, sua voz suave como uma melodia.
Aquele momento, com a chuva ainda pingando do guarda-chuva e o cenário ao nosso redor parecendo mais vívido por causa dela, fez meu coração acelerar.
O sorriso que Nya me dirigiu naquele momento parecia tão genuíno que me fez questionar se era a primeira vez que ela sorria assim em toda a sua vida. Não esperava experimentar essa sensação, mas era inegável que ela era...
*
*
*
Perdido em meus pensamentos, mergulhei profundamente em minha própria reflexão.
— Ren? — Rosa chamou, interrompendo meus devaneios. — Ren! — ela gritou mais alto, quase próximo ao meu ouvido.
Meu rosto no reflexo se contorceu momentaneamente, uma reação causada pelo toque inesperado da água, o que me trouxe de volta à realidade.
— Desculpe, estava apenas perdido em pensamentos por um momento, — comentei, virando o rosto em direção a Rosa. — Aconteceu alguma coisa? — perguntei, sorrindo para dissipar qualquer preocupação.
Rosa suspirou levemente, aparentando estar um pouco frustrada com alguma coisa, antes de responder.
— Estávamos chamando você por um bom tempo, e você não respondia. Não nos assuste assim, — disse ela, olhando-me com uma expressão preocupada.
— Haha, talvez o calor da fonte termal tenha me afetado um pouco, — comentei, exibindo um sorriso leve. — Acho que estou apenas um pouco cansado. Vou sair da água por um tempo...
Saí da água e, ao chegar na varanda de uma das cabanas, enrolei-me em um roupão de banho estilo ocidental.
— Este lugar é realmente incrível, — murmurei baixinho, observando as estrelas e sentindo o clima agradável da noite.
— "Palácio" é um nome perfeito para um lugar tão magnífico, — disse Seraline chegando por trás de mim, apoiando-se de costas na sacada.
— Terminou sua conversa com minha mãe? — perguntei, apoiando-me de forma descontraída na sacada.
— Não era a visão que eu tinha da Deusa Criadora, mas sua mãe é cativante de certa forma, — comentou ela, olhando-me atentamente. — Vejo que ela se importa muito com você…
— De fato, minha mãe é uma presença única, — respondi, ainda apreciando a vista das estrelas. — Mas então se não for algo da minha conta, o que vocês discutiram? Se deu bem com ela? — perguntei, curioso sobre como foi a intenção delas.
Embora seja improvável que Yggdrasil tenha algo contra ela, Seraline, mesmo com essa mudança, continua sendo uma mulher agradável...
Seraline suspira antes de dizer algo, movendo suas mãos pela sacada.
— Hey, Renier, por que não me conta como morreu? Você está com seus poderes de Guardião, não é? Então deve lembrar, — disse Seraline, agindo de maneira vaga. — Afinal, não é uma experiência agradável; falo por experiência própria...
Desviei o olhar, meio sem jeito, enquanto levantava o dedo para explicar.
— Mmm, bem, foi apenas um acidente normal, — disse, sorrindo. — Hehe, caí da escada na minha escola. Provavelmente devo ter quebrado meu pescoço ou algo do tipo. Provavelmente uma morte bem patética...
Seraline deu um passo na minha direção, um grande pulso de ar se expandindo dela, enquanto seus olhos exibiam uma mistura de fúria e frustração.
— Sabe o que mais odeio, Ren? — sua voz carregava uma intensidade palpável. — Como rainha, há duas coisas que não posso deixar passar de maneira alguma, e são," disse, puxando minha gola e me erguendo.
— Traidores e mentiras são coisas que não suporto, e meu marido parece estar envolvido em uma delas — respondeu, mostrando suas presas, visivelmente irritada.
A tensão pesava no ar enquanto eu estava agarrado pela gola, encarando Seraline de volta.
— Seraline, eu não… — tentei explicar, mas fui cortado pela voz carregada de frustração dela.
— Morreu por acidente? Nem você acredita em uma morte tão banal como essa, — disse, sua voz uma mistura de acusação e incredulidade.
— Você foi atacado e morto por uma sombra, não foi?" perguntou, exigindo uma resposta.
— Isso é… — Eu não conseguia terminar de falar, apenas acenei com a cabeça em concordância, desviando o olhar.
— Agora, sua rainha irá perguntar novamente, — disse Seraline com uma autoridade incontestável. — Como você morreu? — exigiu, mostrando que não aceitaria desculpas.
Acho que não faz diferença. Eu sabia que lembrava de tudo, era impossível esquecer...
— Fui atravessado por uma lâmina, assassinado, — respondi, a voz trêmula e baixa.
— Pelo modo como você tem agido desde que despertou, não parece ser apenas isso. Conte exatamente o que aconteceu, — disse Seraline, dessa vez com uma calma penetrante, colocando-me no chão.
—Minha namorada, Nyami Homura, foi ela quem atravessou meu peito no terraço da escola, — respondi, encolhendo um pouco os ombros, ainda incapaz de olhá-la nos olhos.
Seraline suspirou, provavelmente compreendendo a razão por trás do meu comportamento.
— Eu vejo... essa morte, vinda da pessoa que você confiava e amava, é dolorosa, — disse Seraline, mostrando empatia.
— Tenho tentado esquecer, mas é difícil. Quanto mais eu tento, mais eu lembro, — comentei, sentindo o vazio dentro do meu peito crescer. — Não consigo esquecer esse sentimento...
Sem aviso, Seraline segurou meu rosto e me beijou por um breve instante, soltando então nossos lábios.
Por um breve momento, meu corpo esquentou, acho que ela fez isso para focar nela.
— Então, só basta fazer você esquecê-la, — respondeu Seraline, sorrindo de forma ousada. — Teremos bastante tempo nessa viagem para você me contar sobre seu passado. Assim como você me ajudou alguns dias atrás, irei retribuir o favor. Afinal, você tem a felicidade de estar casado com uma Rainha.
Nunca fui muito de ser ajudado, nem mesmo na Terra. Com minha habilidade de ler as pessoas, é sempre mais fácil ajudar do que ser ajudado, por conhecer as reais intenções delas em relação a mim.
Essa característica sempre me tornou um solitário, alguém que preferia lidar com seus próprios problemas.
— Agora que a situação já está resolvida, vamos para o banho, — Seraline ponderou por um momento, seus olhos buscando os meus. — Eu tinha visto, mas tem outra fonte termal?
Minha resposta não demorou a surgir, apontando para um grande bosque nas proximidades.
— Pergunta meio redundante, qualquer coisa pode ser criada aqui, então sim, tem outra fonte por aqui… — expliquei, indicando o local com um gesto.
Seraline, por sua vez, parecia intrigada e, ao mesmo tempo, sugestiva.
— Oh? Você parece gostar de criar um clima romântico. Gosto do seu estilo ao tratar sua rainha como ela merece, então vamos? — perguntou ela com um olhar malicioso.
Aquele mesmo olhar que havia me tirado o fôlego antes…
— Você quer tomar banho comigo?" arrisquei, me senti surpreendentemente corajoso.
Seraline se aproximou, sussurrando no meu ouvido de maneira provocante.
— Ora, seus olhos quando viram meu corpo alguns momentos atrás, com as minhas roupas rasgadas, me fizeram chegar a essa conclusão, — disse ela em um tom sedutor.
A situação se tornou mais quente de repente e nem entrei no banho ainda, acho que ela vai seguir em frente querendo me fazer esquecer a Nyami…
Continua…
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Atualizado até capítulo 42
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