O dia ocorria normalmente, estava organizando as notícias da programação da noite quando vi um caso, aparentemente parecia um caso de latrocínio em uma residência. Os vizinhos ouviram barulhos de briga no noite anterior à chegada da polícia que foi a residência na manhã seguinte. Os policiais não encontraram sinais de arrombamento, nem a causa da morte do casal que segundo relatos viviam sozinhos. E o mais esquisito é que segundo a perícia, nada foi roubado da residência.
“Tudo que encontramos foi uma mancha roxa fluorescente nos lábios das vítimas.”
Isso não passava de um mistério para a polícia. Mas pelos relatos e a pista da mancha roxa ficou claro para mim que era a ação de um Inferi Parasita, um corpo morto reanimado por necromancia, que se alimenta da alma humana para se manter vivo, e apenas isso é o seu objetivo. Dependendo da idade e da quantidade de humanos que ele se alimente, sua expectativa de “vida” pode passar de séculos, caso contrário ele volta a forma de cadáver até se tornar pó.
O casal já tinham uma idade bem avançada, o que significava que não havia muita vida para ele poder se manter, então ele atacaria novamente se eu não entrasse nesse caso. Peguei todos os arquivos daquela matéria e delete substituindo por uma história de uma celebridade que adotou gêmeos num trabalho voluntário na África. Avisei a Daneel que iria sair mais cedo porque tinha um compromisso marcado caso o Hans, meu chefe perguntasse por mim, e assim que saí do prédio tomei um táxi até o endereço da matéria.
Chegando a residência o taxista disse que aquela casa agora lhe dava arrepios, provavelmente ele tinha algum nível de mediunidade, pois dificilmente humanos comuns sentem algo em um lugar que nunca estiveram. Caminhando até a entrada da casa, a presença da magia escura do Inferi ainda estava bastante forte. Por dentro a casa parecia em ordem, apenas o quarto do casal estava um caos e os corpos já haviam sido levados.
(Ótimo! Vou ter que esperar a perícia do corpo então?)
Mas um barulho no andar superior da casa me tirou o resto de bom humor que eu ainda tinha. Sentindo a tensão no ar me direcionei as escadas subindo silenciosamente cada degrau, porém no penúltimo um ranger veio dele o que me fez avançar para cima e...
– EXOT-
– MIAAAAAAAU!
— Mas que porra!
Era a porra de um gato! Um gato preto!
Recuperei o fôlego olhando as escadas a tempo de ver o gato correndo por elas para o corredor.
— Gato desgraçado!
Infelizmente depois disso não senti mais a aura mágica que estava na casa, quase como se o gato tivesse feito com que ela desaparecesse. Desci as escadas novamente indo para a sala de estar, era uma casa bem arrumada com várias fotos do casal espalhadas pelo corredor e pela sala, mas em nenhuma delas haviam um gato.
(Pode ter sido adotado recentemente. Ou talvez…)
Saí da sala de estar e fui em direção à cozinha, encontrando o gato sentado na frente da porta que dava para o quintal da casa, me encarando com o olhar mais irritado que já vi num gato. Eu não liguei e fui procurar indícios na cozinha, quando encontrei rastros da mancha roxa deixada pelo inferi. Os policiais tinham razão, parecia um cenário de latrocínio, mas não havia pistas que indicasse isso porque o que foi roubado não era nada físico. Nesse momento um barulho de algo metálico caindo no chão me chamou atenção, então novamente olho o gato que agora estava na bancada que dividia a cozinha da sala de jantar. Peguei a colher e a coloquei de volta na bancada apenas para encontrar um par de olhos amarelos brilhantes me encarando.
— O que foi? Está com fome?
– Miau.
— Hum?
(Estão adestrando gatos para responder agora?)
O olhar do gato voltou a ser raivoso, parecia que a qualquer momento ele pularia na minha cara e rasgaria ela completamente até que ninguém pudesse me reconhecer. Quando o gato começou a se armar peguei a colher novamente, mas para minha surpresa o gato apenas me usou como um impulso. Quando me virei, o gato havia saltado para cima do Inferi que estava atrás de mim, pronto para atacar. O gato conseguiu se segurar na pele deformada do cadáver, o que me deu tempo de reagir e ir para cima do Inferi.
– Ecxodum Lockio.
O corpo do Inferi foi finalmente paralisado por correntes e o gato agora me olhava com menos ódio, não parecia assustado, mas também havia se machucado certamente pelo Inferi.
— Se vinher comigo posso cuidar disso depois!
O gato nem miou, apenas se levantou e saiu andando pela cozinha como se nada tivesse acontecido. O Inferi, por outro lado, grunhia de ódio tentando se soltar, mas para o azar dele o feitiço só o aprisionava ainda mais.
— Se acalma aí! Logo você vai estar livre dessas correntes, mas não sei se vai viver o suficiente para aproveitar essa liberdade. Vamos bichano!
Com alguns toques no ar formando um octograma conjurava um portal em forma de hexagrama diretamente para o ACS juntamente com o gato. Assim que chegava ao saguão lembrava que tinha que falar os direitos do prisioneiro, então o fazia enquanto caminhava em direção às celas.
— Bem, pela lei tenho que te falar os seus direitos… Tem o direito de ficar calado, qualquer coisa que disser guarde para a suprema corte por que eu não tô nem aí. — Não era verdade, mas era uma boa tática para arrancar confissões sem pressão. — Você só será ouvido uma vez durante o interrogatório, então eu não ficaria de gracinha se corresse o risco de retornar ao pó.
O Inferi riu, eu acho que ele riu.
[Inferi]
— Como se um imortal tivesse medo da morte. Sua alma seria perfeita para alimentar todos de nós eternamente!
[Liam]
— Como eu disse, eu não tô nem aí. Bai Jing!
Bai Jing é a gerente atual da subdivisão leste desde que a líder anterior desapareceu. Eu e ela treinamos juntos e somos praticamente como irmãos, mas desde que assumiu o posto de gerência, além de viver ocupada, também prefere que eu a trate como uma superiora. Eu tento não me importar com todas essas exigências mesmo sendo abaixo do nível empresarial dela. Enquanto estamos diante de seres importantes ela é minha chefe, mas diariamente ela sempre é minha irmã mais nova.
[Bai Jing]
— Você trabalhou hoje Liam. O que temos aqui?
Ela caminhou até mim quase sem tirar os olhos da sua prancheta e com um copo de café na outra mão.
[Liam]
— Te mando os dados depois, já tô vendo que você está cheia de trabalho.
[Bai Jing]
— Você não faz ideia! A subdivisão do norte está cheia de problemas na América do Sul. Ainda acho que despachar nossos agentes para outras partes do mundo é um desperdício, não é?
[Liam]
— Mas você tem visto o trabalho que temos tido nos últimos três meses, eles precisam da nossa ajuda. E você… precisa parar com o café, ou vai fazer seu pelo cair!
Bai Jing é uma Raposa Vermelha de Nove Caudas do clã das raposas vermelhas (Hóng hú), porém muito viciada em café. Uma das dificuldades das raposas vermelhas é controlar seus vícios e desejos e Bai Jing infelizmente foi muito mimada por mim antes de saber dessa informação, e o vício dela em café a deixa extremamente agitada. Pode ser bom no trabalho, o que fez dela a gerente geral, mas é um empecilho para sua magia que se torna limitada. Por isso tomei o copo de café dela apenas para receber seu olhar irritado.
[Bai Jing]
— Prefere que eu chame os guardas?
Ela se referia a mim, mas aproveitando que já estava com uma ameaça ao meu lado, sorri, levitando o café passando por ela e colocando numa mesa distante.
[Liam]
— Ah, sim, por favor. Esses bichos fedem mais que um demônio!
[Bai Jing]
— Hum… Deve ter tido trabalho para pegar esse parasita.
[Liam]
— Bem, na verdade, bem menos do que o de costume… espera, cadê ele?
Começava a olhar no chão em volta procurando pelo gato. O pestinha de repente desapareceu.
[Bai Jing]
— Ele quem?
[Liam]
— Um gato que veio comigo, ele…
Bai Jing riu e se aproximou para olhar ma mesma direção onde eu procurava ver se o gato não havia ficado para trás no meio do caos do saguão.
[Bai Jing]
— Liam, você ainda fala com gatos? Não tinha nenhum com você quando chegou aqui!
[Inferi]
— Hahahaha, ele fala com gatinhos!
[Bai Jing]
— Você continua aqui?
Ela se afastou se voltando para o Inferi Parasita. Eu também havia ignorado que esse monstro estava ali, mas a voz mórbida e a risada sem graça dele me fez lembrar do pobre casal morto. Bai Jing acenou para dois guardas da prisão dimensional que se aproximaram.
[Bai Jing]
— Podem levar, logo farei o interrogatório!
Os guardas agarraram as correntes do Inferi e o puxaram até o portal da prisão, por onde desapareceram. Eles são os carcereiros desses non-regis. As prisões eram dimensões de vácuo, onde nada existe além do próprio prisioneiro, ele tinha liberdade total lá, porém não tinha nada o que utilizar, nem nada para fazer, muito menos poderes para saírem de lá, por isso muitos enlouqueciam ou morriam antes mesmo de irem à corte. (Uma pena.)
[Liam]
— Eu vou dar uma olhada por aí, talvez ele tenha se perdido. Mais tarde eu prometo que mando um relatório!
[Bai Jing]
— Tudo bem, boa sorte com seu novo gato!
Alguma coisa nessa fala me dizia que ela sabia onde estava, ou de qual gato eu estava falando, mas infelizmente ninguém havia visto gato em lugar nenhum, então resolvi acreditar que o gato deve ter recuado e ficado na casa dos seus donos. Eu retornei para o saguão onde conjurei um portal para uma rua algumas quadras do prédio onde fica o meu apartamento, fiz umas compras para o jantar e segui para casa.
No caminho recebi uma mensagem da Daneel falando que o Hans me pôs de castigo e queria algo diferenciado para ser noticiado no jornal de domingo a noite.
(Que maravilha, trabalhar no final de semana!)
Assim que abri a porta do apartamento ouvi o barulho da água do chuveiro. Eu deixei as minhas compras no balcão da cozinha enquanto caminhava em direção ao banheiro pronto para conjurar um feitiço de aprisionamento. Eu me perguntava quem seria maluco o suficiente para invadir meu apartamento e usar meu banheiro, mas em seguida me dei conta de que a porta da frente não estava arrombada.
(Devem ter feito cópia das chaves… Algum morador antigo… Não, nenhum ser iria invadir a casa de alguém só para tomar banho…)
Pensava enquanto atravessava a sala chegando próximo e vendo que a porta do banheiro estava apenas encostada, então, em vez de um feitiço de aprisionamento, invoquei um feitiço revelador que abriu a porta apenas para eu dar de cara com um homem tomando banho… Mas não era um homem. Ele tinha orelhas de gato e uma cauda preta em volta da sua cintura e tentava se esconder no vapor do chuveiro, mas eu consegui ver muito bem o que era, ou pior, quem era!
– QUAL É NÃO SABE O QUE É PRIVACIDADE?
[Liam]
— Um Neko???
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Atualizado até capítulo 31
Comments
Syaifudin Fudin
Que história incrível, não consigo parar de ler! 😍
2023-08-17
2
o^┢┦apΡy
Meu Deus, o final foi tão inesperado! Preciso de um tempo para processar...
2023-08-17
2