CAPÍTULO 19

Imaginei que o Gabriel ficaria triste por conta daquela notícia. Muitas vezes ele havia comentado que se sentia culpado por tudo que eu estava passando, apesar de serem sentimentos contraditórios, porque ele estava feliz de poder realizar seu sonho e, ao mesmo tempo, triste pelo que eu estava passando.

— Você não sabe o quanto fico feliz em escutar isso. Muitas vezes me perguntei se o que estava fazendo por mim, teria acabado com seus sonhos, mas agora você acaba de me confirmar que não. Sinto por talvez termos que ficar tão distante, mas a tecnologia de hoje em dia facilita nossa aproximação. Então desde já você prometerá que quando estiver em Toronto, irá fazer uma videochamada comigo todos os dias, para você acompanhar a evolução de seu afilhado ou afilhada.

Aquilo me pegou de surpresa, porque não esperei que eles me escolhessem como madrinha, e esses hormônios de grávida estavam me deixando mais sensíveis que o normal. Então me vi chorando emocionada pela descoberta.

— Você não gostou da notícia? — Biel me perguntou preocupado.

— Pelo contrário, gostei tanto que estou emocionada. — Então meu irmão, ainda sorrindo, voltou a me abraçar. — Tudo bem, hormônio de grávida, eu entendo. Vamos ali que pagarei um sorvete para você parar de chorar.

— Gabriel, não sou mais nenhuma criança. Não preciso de sorvete, mas eu gostaria de um rolinho romeu e julieta, daquele restaurante chinês que sempre costumávamos comer.

— Vamos lá minha criança, eu pago para você! — Gabriel colocou a mão em meu ombro e saímos caminhando, enquanto dou um tapa no ombro, fazendo bico por ele ter me chamado de criança.

São esses momentos que eu amava passar com meu irmão e tinha certeza que me faria falta quando estivesse longe, mas, como ele mesmo disse, teríamos a tecnologia a nosso favor. Esse hospital para onde estava indo, é o maior de referência na minha área, então eu tinha uma oportunidade incrível de me destaca como uma médica cardiologista de referência.

Sabia que não seria fácil, porque mesmo em um século tão avançado, não era uma área que havia muitas mulheres se destacando. Porém, quem disse que eu gostava de facilidade? Minha vida nunca foi fácil. Lamentava uma única situação: meus pais. Eles não aceitaram muito bem a situação da minha gravidez. Eles eram muito conservadores, então o fato de eu estar grávida, sem nem ao menos ser casada, era algo inaceitável.

Mesmo argumentando ser o sonho de Gabriel, meus pais disseram que essa situação poderia ter sido resolvida de outra maneira e não dessa maneira tão “trágica”. Aquilo me machucou bastante, porque esperávamos preconceito sempre de pessoas de fora, não de nossa própria casa. Começou com o Matheus, depois meus pais e uma boa parte da equipe do trabalho.

Meus pais pensavam igual ao Matheus. Estavam muito preocupados com os comentários de outras pessoas sobre sua família. Não conseguia entender como as pessoas se preocupam tanto com a opinião dos outros, a ponto de se deixarem influenciar em suas próprias decisões.

Sempre fui alguém de opinião forte em relação ao que eu queria e ao que quero. Pouquíssimas vezes me deixei influenciar por outras opiniões, e quando isso acontecia, era porque eu percebia que, de certa forma, aquilo era melhor do que a minha ideia inicial. O fato de pensar dessa forma me tornava inadequada para algumas pessoas. Sinceramente, sentia muito por elas. Não iria mudar minha opinião, conceito ou atitude para me adequar aos outros. Jamais faria isso. Não me arrependia de nada que fiz até agora.

Enquanto estávamos no restaurante comecei a sentir o bebê mexer, peguei a mão do Gabriel e coloquei em minha barriga para que ele pudesse sentir também. A alegria de meu irmão era contagiante. Percebi algumas pessoas olhando aquela cena, admirando nossa alegria e sorrindo.

Perguntava-me se agiriam da mesma forma se soubessem que o Gabriel era meu irmão e o filho que eu carregava era dele. Quando se mencionava algo assim, era impressionante como as pessoas pensavam primeiro em incesto, e não avaliavam o quanto a tecnologia estava avançada ao ponto de não precisar de qualquer tipo de contato físico para termos um filho de outra pessoa. Gabriel abaixou sua cabeça e falou próximo a minha barriga.

— Papai já ama muito você! — Como uma demonstração que ouviu, o bebê empurrou a minha barriga sobre a mão do Gabriel, o que fez meu irmão ficar com um sorriso ainda maior.

— Biel como vocês vão fazer após o bebê nascer? A Katie trabalha muito. Você pretende contrata uma babá? — Percebi que a fisionomia do Gabriel mudou um pouco.

— Ainda não pensei nisso, Bia. Às vezes penso que a Katie não desejou isso tanto quanto eu. — Nesse momento fiquei calada, então ele me olhou, avaliando-me. — Você já havia percebido isso, né? — Ele me perguntou. Fiquei indecisa no que falar, mas assim como eu, sei que o Gabriel prefere a dura verdade, do que a doce mentira.

— Sinceramente, Biel, já havia percebido isso antes mesmo de fazer todo o procedimento. — Ele me olhou chocado.

— Por que você não falou nada, ou até mesmo não desistiu?

— Se a Katie não quisesse esse filho, você teria desistido? — Ele baixou a cabeça por um momento e depois me olhou nos olhos, negando com a cabeça. — Não fiz por ela, irmão, fiz por você. Sabia o quanto você desejava isso. — Ele tinha lágrimas nos olhos.

— Mas e se o tratamento não der certo, Bianca? O que será dessa criança? — Ele parecia perdido nesse momento. Segurei seu queixo e o fiz olhar para mim.

— Estou confiante que seu tratamento dará certo. Não consigo pensar em outra possibilidade, mas se algo acontece, essa criança será muito amada pela madrinha dela. No entanto, tudo pode mudar quando ela nascer e a Katie olhar para ela. Já ouvi muitos relatos sobre isso, então temos que ter paciência, Gabriel.

— Talvez você esteja certa, Bianca.

— Isso não é novidade para mim, Gabriel. Eu sempre estou certa! — Falei brincando com ele, que logo me deu um empurrão de ombro e sorriu para mim.

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