Nova vida

Após pagar o taxista, Syara aproximou-se de Damian enquanto o mesmo observava o apartamento onde ela morava. A aparência não era muito agradável, parecia um local abandonado e que estava em ruínas. O mesmo engoliu em seco, imaginando o quanto aquela mulher era desprovida de uma boa vida. 

— Eu sei, é horrível — Syara disse após um suspiro, ela não tinha vergonha de onde morava, mas sabia que não era um local muito agradável de se ver. — Mas não desanime, é apenas por um tempo. Logo o senhor vai se recuperar e voltará para sua vida.

— Estou cansado, essa cadeira também não é nada confortável. — Damian cortou o assunto, pois sequer sabia onde vivia antes do acidente. Então para ele era como se estivesse sendo encurralado em um momento tão crítico. 

Apesar de tudo, Damian entendia muito bem o que Syara estava passando.  O medo de conviver com um estranho não passava despercebido para ele, pois o mesmo se sentia da mesma forma. Sem memórias e uma família, era como se estivesse em um labirinto cercado por pessoas que também poderiam lhe fazer mal. No entanto, ele confiava em Syara, de alguma forma.

— Que ótimo! Consertaram o elevador! — Syara abriu um enorme sorriso após ver o aviso ao lado do elevador que Damian cogitou ser perigoso e duvidoso. 

— Syara! O que está fazendo aqui? — Uma senhora de meia idade acenou enquanto aproximava-se da mesma, estava bastante surpresa com sua aparição, já que tinha acabado de retornar de viagem e lembrava-se perfeitamente de que a jovem tinha mencionado que iria se mudar.

— Olá, senhora Jú! — Ela sorriu em resposta, era bom vê-la naquele momento, mas sabia que ela lhe encheria de perguntas após ver um homem estranho aos seus olhos ao seu lado. — Bem, estou de volta. 

Juliet era uma senhora bastante educada, estava no auge dos cinquenta anos e era viúva, além de dona da maioria dos apartamentos no local, e que alugava para algumas pessoas para conseguir alguma renda todos os meses, exceto o que Syara morava, já que pertencia somente a ela.

— Algo aconteceu? E quem é esse rapaz bonito? É seu namorado? — perguntou Ju, visivelmente curiosa e encantada com o homem na cadeira de rodas, mas sequer percebeu a última parte, estava mais atenta à beleza do mesmo.

— Não, é um amigo distante — respondeu de forma descontraída, não seria legal dizer a verdade quando poderiam julgar sem ao menos conhecê-lo. — Nos encontramos por acaso em um acidente, sorte a nossa que não foi nada grave.

— Como assim? Você também estava envolvida? Se machucou muito? — A senhora Jú a tocou em quase todo o seu corpo como quem quisesse averiguar sua situação, mas se confirmou ao saber que ela estava bem. — Como isso aconteceu? 

— Foi culpa minha, meu carro estava com problemas nos freios, então não consegui evitar o acidente. — Syara se sentiu um pouco abalada por lembrar disso, então Damian decidiu investir nesse assunto.

— Mas estamos bem agora. A única coisa boa desse acidente foi o nosso encontro, eu não esperava encontrá-la depois de muito tempo. — Damian sorriu, chamando a atenção da senhora que ficou ainda mais encantada com sua gentileza. — Estou feliz em poder conviver com ela, pelo menos até eu me recuperar. 

— E quem sabe se tornem um belo casal, não é mesmo? — Juliet deu uma piscadela para ambos, fazendo-os rir por seu comentário, afinal acreditavam que isso jamais aconteceria. — Enfim, aproveitei meu retorno para mandar consertar o elevador, agora ficará mais fácil para vocês.

— Sim, muito obrigada senhora Jú. Agora precisamos subir, estamos exaustos. — Eles se despediram amigavelmente e adentraram no elevador, que causou um certo medo em Damian, mas ele estava apenas exagerando. 

Quando Syara abriu a porta do seu apartamento, ela o convidou para entrar e se sentir em casa. Damian observou tudo atentamente, era um local grande para uma pessoa, era arejado e confortável. Tudo estava perfeitamente organizado, limpo e a simplicidade o encantou.

— Onde irei dormir? Aqui tem dois quartos? — perguntou Damian visivelmente animado. 

— Sim, meu quarto é na primeira porta à esquerda, há um outro quarto no final do corredor mas está inutilizável. — disse enquanto observava atentamente a porta que estava muito bem trancada, mas que fazia seu coração doer apenas por pensar que alguma vez ele já foi ocupado por alguém, mas logo se voltou para Damian. — Você dormirá no sofá.

No momento exato em que ela pronunciou a palavra sofá, Damian arregalou os olhos desacreditado. Piscou algumas vezes para ter certeza se aquilo era real, então deu um leve risada, imaginando que aquilo era brincadeira.

— O que foi? Estou falando sério, mas não é só isso. Você irá cozinhar sua própria comida, irá limpar o que sujar e lavar suas próprias roupas. Por fim, tomar banho sozinho. — Syara enfatizou a palavra lembrando-se do que quase passou no hospital, quando o ajudou com praticamente tudo. 

Por sorte, Daniel conseguiu a ajuda de um enfermeiro que ajudava os pacientes mais necessitados nos banhos, então Syara se livrou disso antes que Damian recebesse alta. E agora que não tinha mais enfermeiro, ele tinha que se virar sozinho.

— Tudo bem, eu posso fazer tudo isso sozinho. Mas dormir no sofá é maldade, não acha que vou congelar aqui? — Damian fingiu estar magoado, seu semblante parecia de um cachorrinho abandonado. 

— Não seja dramático, aqui não é tão frio assim. Em todo caso, eu tenho lençóis suficientes. — Syara quase caiu em seu jogo, mas logo se recompôs. Ela não poderia deixá-lo dormir em seu quarto quando sequer o conhecia, mesmo que seu estado a deixasse com pena. — Enfim, na geladeira tem comida, você pode aquecer no microondas. O banheiro fica em frente ao meu quarto. 

— Espera, você vai sair? — Damian ficou preocupado, logo engoliu em seco imaginando o que poderia acontecer se ficasse sozinho. 

— Sim, preciso voltar ao trabalho. — Ela suspirou, sentindo-se cansada antes mesmo de voltar a rotina. — Voltarei antes do anoitecer, cuide de tudo por aqui. E deixe a porta trancada, não abra para ninguém além da senhora Jú ou meu amigo Daniel. 

Syara pegou sua bolsa e seu celular, estava prestes a sair quando lembrou-se de algo importante. Damian apenas observava seus movimentos, sabia que nada poderia fazer para impedi-la de sair e deixá-lo para trás. Ela retornou após pegar uma caixa no armário da cozinha, e o deixou sobre a mesa de centro, próximo ao sofá.

— Se sentir alguma dor, aqui tem remédios. — Ela olhou para ele como se quisesse dizer algo, mas apenas lembrou-se de algo importante que sempre fazia, então disse: — Cada remédio tem escrito para que serve, enfim… Eu vou indo.

Syara o deixou antes que ele a impedisse, pois o mesmo parecia uma criança indefesa que necessitava de sua atenção. A mesma desceu até o térreo, e então caminhou em direção a cada da senhora Jú, que já estava de saída também.

— Senhora Jú! — chamou, e tão logo a mesma sorriu para ela, aproximando-se.

— Olá, minha querida. Já está indo trabalhar? — perguntou, recebendo um sim como resposta. — Posso ajudá-la com alguma coisa? Eu sei que há preocupação nesses olhinhos. 

— É que eu vou deixar Damian em casa, já que ele não pode vir comigo. A senhora poderia passar lá mais tarde para vê-lo? — perguntou ela, receosa. Ela sabia que poderia confiar em Juliet com essa situação, mas ainda assim sentia-se nervosa em pedir esse favor. 

— É claro! Será um prazer, vou aproveitar e fazer um lanchinho para ele, estou indo às compras agora. Quer vir comigo? — perguntou a senhora animada.

— Ah, eu não quero incomodar. — Syara sorriu, envergonhada. 

— Não vai ser incômodo nenhum, venha! — Juliet a puxou para que a mesma a seguisse até o seu carro. — A cafeteria é bem perto do mercado, seria injusto não lhe dar uma carona. 

Ambas as duas entraram no carro e tão logo a senhora deu partida. O local onde moravam era um pouco afastado da pequena cidade, um carro era essencial em momentos como este. Mas agora que Syara não estava mais com o seu carro, tão cedo não o mandaria para o concerto, pois sabia que isso lhe tiraria um grande dinheiro. 

— Desculpe perguntar, mas como minha menina está? Não estou me referindo ao acidente, você sabe o que quero dizer. — Juliet deu uma rápida olhada em Syara, constatando que ela tinha entendido sua pergunta.

— Eu acho que agora posso dizer que estou conseguindo seguir em frente. Mesmo que minha mudança tenha dado errado, acredito que tudo tem o seu tempo. — ela respondeu, olhando para a vista que tanto admirava. — Eu pensava que deixando aquele lugar para trás iria me sentir melhor, mas depois do acidente, percebi que não posso me desfazer de algo que foi importante para mim.

— Minha menina está tão crescida, estou orgulhosa de você. Eu tenho certeza que você vai superar a perda. A vida é assim, afinal. Mesmo que não estejamos preparados para perder alguém, as lembranças que ficam são as que nos fazem ser mais fortes — disse Juliet com um sorriso meigo e acolhedor. — Quanto a sua mudança, acredito que o momento certo chegará.

— Obrigada, a senhora tem sido como uma mãe para mim, assim como ela foi. — Assim que chegaram no destino, Juliet estacionou o carro próximo a cafeteria onde Syara trabalha. — Nunca vou me esquecer quando me acolheram quando mais precisei. 

— Sempre estarei por perto caso precise de mim, e não fique com vergonha de pedir ajuda. — Juliet a abraçou, dando leves tapinhas em suas costas. — Tenho certeza que minha irmã está muito orgulhosa de você, onde quer que ela esteja. 

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