Audiência

……………

O dia da audiência de André chega. Nycie está calma, mas a mãe de André está com os nervos à flor da pele. Pedro tenta acalmar a esposa mas não há resultado. Eles haviam chegado ao tribunal quase duas horas antes do horário.

– Viemos muito cedo, Meuri.

– Mas, Pedro, eu não conseguiria ficar em casa! – Lamenta Meuri. O marido a abraça.

***

No caminho para o tribunal, Nycie não via a hora de ver André sem aquele uniforme de presidiário, imaginando se ele ficaria tão bonito como em seu sonho. Ela até saiu num sábado à noite em busca de um bom sexo, mas os homens que se aproximaram não eram tão charmosos para ela.

Ela estaciona o carro na garagem, pega sua pasta e segue para o elevador. Ao sair, vê um casal que se abraça, sentados no banco do corredor. Pela semelhança, supõe que sejam os pais de André. Ela se aproxima.

– Bom dia – cumprimenta o casal à sua frente.

– Bom dia! – Os dois respondem juntos.

– A senhorita é quem vai defender meu filho?

– André? Sim, mas como sabem? – Nycie pergunta meio confusa.

– Meu filho falou de sua beleza.

Nycie se ruboriza e agradece com um sorriso.

– Como meu filho vai ser julgado hoje? – pergunta Meuri.

– Bem, hoje a audiência é para julgar o ato de abandono, já o de agressão, ou das acusações de assassinato, ainda não foram marcadas. Vou pedir o habeas corpus sob fiança para que ele seja julgado em liberdade provisória. Fique tranquila, estou confiante que hoje mesmo ele dormirá em sua casa.

Num ato impensável, dona Marie abraça Nycie, agradecendo-a. No mesmo instante, ela avista seu garoto entrando pela porta, sai do abraço de Nycie e corre para os braços de seu filho algemado.

– Filho, sua linda advogada disse que hoje você estará lá em casa – Meuri diz alegre.

André olha para Nycie, que ainda se mantém de costas para a porta, cumprimentando seu pai. Ele não tem essa convicção, de que terá a liberdade. Nycie vira o corpo para trás, observa o senhor Pedro ir em direção ao filho, ela fica o admirando. Ele usa uma blusa polo azul-marinho para fora da calça jeans escura e um tênis esportivo, também azul-marinho. Não está como em seu sonho, mas, ainda assim, está tão lindo quanto.

As portas da sala de tribuna se abrem e os respectivos presentes começam a entrar e a ocupar seus acentos. Nycie segue à frente e André admira sua postura elegante, com seu scarpin preto e um conjunto de blazer com a calça na cor rútilo (castanho-avermelhada), uma blusinha rosa-danação, pequenos brincos de pérolas, que ele nem sabe se são verdadeiros, e em torno de seu pescoço, uma corrente fininha de prata com um pequeno pingente. No cabelo, uma presilha de laço preto que o prende em um coque.

Colocando a pasta em sua cadeira, Nycie retira os papéis e deposita-os sobre a mesa, sentando-se em seguida. Logo o guarda coloca André sentado ao lado dela e retira a algemas de seus pulsos. Ele olha para trás e vê seus pais se sentarem logo em seguida, nos primeiros bancos da plateia, logo atrás dele. Seu pai repousa uma mão em seu ombro e o massageia carinhosamente. Sua mãe lhe manda um beijo.

– Senhoras e senhores, levantem-se, o excelentíssimo juiz Cold está presente! – O escrivão pronunciou.

Todos se levantam e o juiz se senta, sinalizando para que todos se sentem também.

Ele pega seu papel e começa a leitura.

– No julgamento de hoje, o caso é de abandono de menor incapacitado, cometendo o delito do código previsto no ART.133 do CP (crime penal). O réu, André Luiz Piotto, fique de pé. O senhor se considera culpado ou inocente?

– Culpado!

As pessoas presentes começam o burburinho, uns o encaram com pena, outros, com raiva.

– Muito bem, vamos a sentença! Quem falará agora é o promotor, senhor Diego Souza. Diga-nos qual é o seu argumento de acusação.

O promotor se levanta, direcionando-se ao juiz. Este é o trabalho do promotor, acusar o réu com evidências para o júri que é formado por vinte e cinco jurados, dos quais sete, são escolhidos para o conselho de sentença que determina a condenação ou absolvição do réu.

– Senhoras e senhores, temos aqui em mãos os depoimentos assinados por vizinhos do réu, onde alegam que sua criança, filha, ficou sozinha por horas. Os depoimentos foram retirados pelo delegado Fernando Pimentel da delegacia 23 de Pitaraa. Por enquanto, nada mais a dizer. – O promotor entrega os depoimentos ao juiz, que os entrega ao seu auxiliar para que leve até o jure.

– Com a palavra agora, a defesa, senhora Nycie Freire Melo. – Anuncia o juiz.

Ela se levanta e pega seus papéis.

– Obrigada, vossa excelência. Bem espero que o jure veja a necessidade de avaliar, em forma objetiva, todos os relatos que entregarei. Não com autopunição, que aperta o pescoço do meu cliente. Vou dar um belo resumo, caso alguém não se interesse em ler. – Ela faz uma pequena pausa e continua. – Hoje não vivemos mais em vilarejos com alamedas de chão batido…

– Protesto, excelentíssimo! O que tem a ver com o caso? Não nos faça perder tempo!

– Isso tem lógica doutora? – pergunta o juiz.

– Sim, vossa excelência!

– Então, continue. Protesto negado!

Diego fica puto. Queria que isso acabasse logo, mas pelo visto, demoraria.

– Continuando, não andamos em carroças, não temos mais a vida em ritmo arrastado, dos tempos primordiais, onde, até mesmo para tirar uma fotografia com a família, tinha que ser planejado com hora e data marcada. Vivemos numa corrida obsessiva contra o relógio, nossas atividades não cabem mais em nosso tempo de um dia. Nesse corre, corre, para fazer que caibam, atropelamos as horas, transbordando resultados inesperados. Então, fria e tecnicamente, vamos analisar este terrível fato, que não chamaria de tragédia. No ocorrido, a criança, Ingrid Piotto, foi encontrada sozinha e chorando, mas que graças a perícia médica, não teve dano algum e sim uma infecção de ouvido que já ocorria. Meu cliente estava ausente e não esquecido. Foi procurar pela ex esposa que, essa, sim, estava abandonada. Meu cliente esteve no bar por instantes, não horas…

– Protesto, meritíssimo! – exclama o promotor de acusação.

– A senhora não pode afirmar isto depois das provas que o promotor nos apresentou. A não ser que a senhora tenha outras provas – diz o juiz Cold, torcendo para que sim. Não porque é fã da advogada, mas pelo que estudou sobre o réu. Não parece ser um mal pai, não quer fazer um falso julgamento.

– Sim, meritíssimo! – afirma Nycie.

– Então, continue! – Concede o juiz.

– Eu chamo para depor o dono do bar, e com ele, as câmeras de vigilância que a polícia nem se deu ao trabalho de averiguar, já o julgando antecipadamente.

A mãe de André nem chora, mas sim, sorri. Ela segura a mão do marido, agradecendo a Deus por colocar essa advogada no caminho de seu filho.

Depois que Jorge, o dono do bar, mostra a gravação, a mesma é levada até a sala de averiguação para uma análise de autenticidade.

– Peço que analisem com cautela, pois ele não merece ser “dissecado”. Julgue sabiamente, pois é merecedor do perdão judicial. Sobre a questão da guarda de sua filha, por enquanto ele gostaria que ela ficasse com seus pais, pois como sabem, ele terá outro julgamento sobre seus ombros. Apenas gostaria que ele respondesse este em liberdade, sob fiança. Julguem-no hoje, e não pela outra acusação, não cabe se misturarem. Isso é tudo, obrigada! – Nycie se retira, saúda o juiz e se senta.

Dona Meuri pousa a mão no ombro de Nycie, que cobre com a sua, a mão dela.

– Silêncio! Vamos nos retirar por uns minutos até a decisão do júri. Voltamos em meia hora! – anuncia o juiz.

– Levantem-se para que o excelentíssimo juiz se retire.

A mãe de André abraça Nycie, mesmo que um mural de madeira as mantenha separadas do público, dos advogados e do júri. André também agradeceria com um aperto de mão. Ele não estava convencido que seria tão boa assim sua defesa, mas depois desta apresentação de Nycie, com certeza, não vai pegar prisão perpétua caso o verdadeiro culpado do assassinato não aparecesse. Quando ele estende a mão para agradecê-la, logo depois de seu pai, é pego de surpresa, pois Nycie está tão contente que depois de abraçar o pai de André, ela o abraça.

“Que delícia de perfume” – Pensa ele.

Nycie cai em si e se afasta, sem graça.

– Tem uma lanchonete aqui perto, podemos ir comer alguma coisa e trazemos para André, o que vocês acham? – sugere Nycie.

– Ah, querida… você é um anjo que caiu do céu! Acho uma boa ideia.

– Pode ir meu bem, vou ficar com nosso filho e vocês também trazem para mim – diz o marido. A esposa consente.

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Comments

Aldenice Costa

Aldenice Costa

autora parabéns estou amando a história ❤😘🥰

2022-10-04

2

Nete Roque

Nete Roque

o amor ,e capaz de transformar tudo,e um bom advogado ,e capaz de fazer um diabo virar um anjo aos olhos do júri....Estou amando o conteúdo do seu livro

2022-07-03

5

Stephany Ricarte

Stephany Ricarte

ahh,🥰🥰

2022-06-30

1

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