# BALADAS DE REBELIÃO
## Capítulo 2: Refúgio nas Sombras
O cheiro de óleo queimado e metal oxidado permeava o ar da estação abandonada. Recortes de jornais e mapas digitais cobriam as paredes descascadas, conectados por fios vermelhos que formavam uma teia complexa. Sob a luz tremulante das lâmpadas improvisadas, a Linha 7, como chamavam seu esconderijo, ganhava vida.
Lia se deixou cair em um sofá rasgado, finalmente cedendo à dor que ignorara durante a fuga. Igor "Sombra" Rurik, um homem de feições eslavas e olhos atentos, aplicava um gel medicinal em seus ferimentos. Sua habilidade de manipular sombras e se mover entre elas havia sido crucial para o resgate, mas agora, na segurança relativa do esconderijo, ele voltava a ser o médico que fora antes do Grande Colapso.
"Você devia ter me deixado quebrar pelo menos um daqueles malditos dentes perfeitos do DEEP IMPACT," Lia grunhiu enquanto Igor enfaixava suas costelas.
"E ativar os sensores de agressão?" Igor respondeu em seu sotaque leve, sem tirar os olhos do trabalho. "Sua impulsividade vai nos matar um dia."
Do outro lado do amplo espaço da estação, Artur "Trickster" Mendes trabalhava em um terminal improvisado, seus dedos dançando sobre múltiplos teclados holográficos. Alto, magro, com cabelos cacheados que escapavam do coque desalinhado, Artur era o cérebro tecnológico do grupo. Ex-funcionário da Virtutec, a corporação por trás dos Homens de Aço, ele conhecia seus sistemas por dentro e por fora.
"O vazamento está repercutindo em todas as redes," anunciou ele com um sorriso satisfeito. "Eles estão tentando derrubar os vídeos, mas já foram copiados milhares de vezes. É um tsunami de informação."
Sofia "Raiz" Almeida entrou no recinto, carregando uma caixa de suprimentos. Seus dreads verdes se moviam como vinhas com cada passo, pequenas flores brotando e murchando entre eles—uma manifestação sutil de seus poderes de manipulação da vida vegetal. Anos de ativismo ambiental haviam se transformado em uma conexão literal com a natureza após o acidente no laboratório da Virtutec.
"As pessoas estão se mobilizando nos Setores Leste e Sul," disse ela, depositando a caixa sobre uma mesa improvisada. "Pequenos protestos espontâneos começaram a surgir. A semente foi plantada."
Lia observou seus companheiros com um misto de orgulho e preocupação. Cada um deles carregava cicatrizes—físicas e emocionais—dos Homens de Aço. Cada um deles tinha desistido de uma vida normal pela causa. Pela verdade.
"E qual o próximo passo?" perguntou Sofia, sentando-se em um banco e fazendo uma pequena planta crescer entre seus dedos. "Agora que chacoalhamos a colmeia, os zangões virão com tudo."
"Não apenas os zangões," Artur interrompeu, virando a tela para que todos pudessem ver. "Os sistemas de vigilância da cidade estão em alerta máximo. Captain Virtue convocou uma coletiva de imprensa para daqui duas horas."
A imagem do líder dos Homens de Aço apareceu na tela: um homem de quase dois metros, cabelos dourados e um uniforme reluzente nas cores da bandeira. O símbolo na sua fôrma de gelo de peito—uma espada cruzando uma balança—brilhava como uma promessa que Lia sabia ser vazia.
"O homem mais virtuoso do mundo vai mentir através daqueles dentes perfeitos," Lia murmurou, levantando-se com dificuldade. "Precisamos estar prontos para a segunda fase."
Igor terminou os curativos e se afastou, suas sombras se contorcendo ao seu redor, refletindo sua inquietação.
"Fale com a Oráculo," sugeriu ele, referindo-se à misteriosa aliada que fornecia informações ao grupo através de canais criptografados. "Precisamos saber se os arquivos que obtivemos são suficientes para expor o Projeto Divindade."
Lia assentiu e caminhou até um terminal separado, inserindo uma série de comandos e chaves de criptografia. A tela piscou várias vezes antes de exibir um único símbolo: um olho estilizado dentro de um triângulo.
"Oráculo, estamos em terreno seguro," Lia digitou. "Os arquivos do nível três estão protegidos. Qual é a situação?"
A resposta veio quase instantaneamente: *"A tempestade que vocês desencadearam é apenas o começo. Captain Virtue ativou o Protocolo Arcanjo. Lady Vex está voltando à cidade. A coletiva é uma distração. O verdadeiro alvo deles é o Setor 9."*
Lia sentiu seu sangue gelar. O Setor 9 era a área onde sua oficina mecânica ficava antes de ser destruída no "acidente" que matou sua família. Agora era um bairro de refugiados, pessoas deslocadas pelos "heroicos feitos" dos Homens de Aço.
"Eles vão fazer uma limpeza," concluiu Lia, voltando-se para o grupo. "Eliminar testemunhas, destruir evidências... tudo sob o pretexto de combater 'elementos subversivos'."
Sofia se levantou de um salto, as plantas ao seu redor estremecendo em resposta à sua raiva. "Não podemos permitir outro massacre."
"E não vamos," respondeu Lia, a determinação endurecendo seu olhar. Ela se aproximou de um armário trancado no canto da estação e inseriu um código. A porta se abriu revelando várias peças de equipamento, incluindo um exoesqueleto parcial que se assemelhava a uma armadura rudimentar. "É hora de mostrar a esses falsos deuses que não somos mais apenas vítimas."
Enquanto Lia começava a vestir o exoesqueleto—sua criação, forjada das mesmas ligas especiais que ela costumava usar para construir motores—as luzes da estação piscaram. Um som distante de trovão fez o chão tremer levemente.
"Eles sabem onde estamos," Artur alertou, seus olhos fixos nos monitores de segurança que mostravam relâmpagos no céu noturno, aproximando-se rapidamente.
"Edward Graham," Lia reconheceu o padrão das descargas elétricas. "Como ele nos encontrou tão rápido?"
"Isso não importa agora," Igor disse, as sombras da estação começando a se mover em direção a ele, como se atendessem a um chamado silencioso. "Precisamos evacuar."
Lia terminou de ajustar seu exoesqueleto, sentindo a familiar sensação de poder quando os sistemas se conectaram aos seus nervos. Não era nada comparado aos trajes dos Homens de Aço, mas lhe dava força e resistência suficientes para enfrentar um deles, mesmo com suas costelas quebradas.
"Não," ela decidiu, sua voz firme. "Se recuarmos agora, o Setor 9 será sacrificado. Esta é a nossa chance de mostrar à cidade que há uma alternativa."
"Isso é suicídio, Ferro," Artur argumentou, já coletando drives de dados essenciais. "Edward Graham pode fritar todos nós com um único relâmpago concentrado."
Um sorriso lento se formou nos lábios de Lia, enquanto ela ativava um dispositivo em seu pulso que fez as luzes da estação brilharem mais intensamente.
"Não se estivermos preparados para canalizar essa energia," respondeu, olhando para os outros. "Lembrem-se do que nos trouxe até aqui. Cada um de nós já deveria estar morto, de acordo com os planos deles. Cada dia que vivemos é um ato de rebelião."
Sofia se aproximou, tocando o solo da estação. Imediatamente, raízes começaram a se espalhar, fortalecendo a estrutura. "O que você tem em mente?"
"Uma armadilha para um deus do trovão," Lia respondeu, enquanto o som de eletricidade estática preenchia o ar. "E uma mensagem para todos os outros."
No céu acima da estação abandonada, as nuvens se agitavam em um redemoinho antinatural, carregadas com a fúria elemental de Edward Graham. O caçador havia encontrado sua presa, sem saber que isso era exatamente o que a presa desejava.
A rebelião estava prestes a mostrar suas garras.
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