capítulo 4: O conflito da Alma

Nos dias seguintes, Luísa se viu em um turbilhão de sentimentos. Cada passo que ela dava dentro da fazenda parecia a aproximar de uma vida que ela nunca imaginara, mas que, de algum modo, sentia que precisava. O campo, o trabalho simples e despretensioso, a conversa com Pedro — tudo parecia tocá-la de uma forma que nada, nem mesmo o futuro casamento com Rodrigo, conseguia mais fazer. Ela sabia que, ao dar esse passo em direção à liberdade, estava deixando para trás a segurança de tudo o que a mãe lhe prometera: o status, o luxo e, talvez, uma vida sem surpresas.

Sua mente estava cheia de pensamentos conflitantes. Durante o dia, ela tentava se concentrar nas atividades da fazenda, como lhe sugerira tia Clara, e passava mais tempo observando o trabalho de Pedro, mas à noite, quando a casa se silenciava, o peso das responsabilidades da sua vida anterior a esmagava. Ela não conseguia dormir. As conversas que tivera com sua mãe antes de viajar vinham à tona, e ela se via como uma marionete nas mãos de alguém que sempre a tratara como um objeto, mais uma peça a ser colocada no tabuleiro da sua vida social.

Rodrigo estava vindo para a fazenda, para passar um fim de semana com ela. Ele era perfeito para os padrões que sua mãe tinha em mente: educado, bonito e com um futuro promissor. Mas o que Luísa mais sentia era que ele nunca realmente a conhecera, nem sequer se importava em entender o que ela desejava. Para ele, ela era apenas uma imagem de "boa esposa", não uma mulher com sentimentos e desejos próprios.

Na noite que antecedeu a chegada de Rodrigo, Luísa se encontrou novamente com Pedro. Dessa vez, ela caminhava pelos campos sozinha, afastando-se da casa para encontrar algum tipo de paz. Ela não sabia o que procurava, mas seu coração ansiava por algo mais do que a vida que estava prestes a levar. Quando viu Pedro ao longe, encostado em uma árvore, descansando de um longo dia de trabalho, seus passos ficaram mais rápidos, sem que ela quisesse.

Ele estava com a camisa levemente suada, o olhar cansado, mas ao vê-la, ele se ergueu imediatamente, como se esperasse por ela. Sua presença tinha uma energia simples, mas muito forte, e isso fazia o coração de Luísa acelerar.

"Eu pensei que não viria hoje", ele disse com um sorriso discreto, mas que ela sentiu ser genuíno.

"Não consegui dormir", respondeu Luísa, sem saber bem como explicar os sentimentos confusos que a dominavam. "Eu... precisei de um pouco de ar. Sabe, Pedro, minha vida... parece que está se tornando uma prisão. Eu não consigo mais ignorar as coisas que você me disse."

Pedro a observou por um momento, com os olhos estreitos e profundos. Ele parecia ver além de suas palavras, como se soubesse o que estava acontecendo em seu coração.

"Eu entendo", disse ele, dando um passo à frente. "Às vezes, a vida nos empurra para um caminho que não escolhemos. Mas, no final, a escolha sempre está em nossas mãos."

Luísa sentiu um nó na garganta. O que ele dizia fazia sentido, mas parecia impossível para ela. Como poderia ela, alguém criada para viver entre os altos círculos da sociedade, escolher um caminho que a separasse de tudo o que sempre conhecera?

"Eu não posso... eu não posso ir contra minha mãe", disse ela, o som da sua voz traindo a incerteza. "Ela fez tantas coisas por mim. O casamento com Rodrigo, o futuro... tudo está desenhado."

"Eu sei que é difícil", Pedro respondeu, com a voz suave, mas firme. "Mas será que você quer viver para sempre nas sombras do que os outros esperam de você? Será que é isso que vai fazer seu coração feliz?"

Luísa o olhou com os olhos cheios de dúvida. Pedro não estava apenas questionando sua situação; ele estava desafiando sua visão de vida. E isso era aterrador.

"Eu... não sei se tenho coragem", ela murmurou, as palavras saindo baixas. "Eu sou filha da minha mãe, sou prometida a Rodrigo. Como poderia eu..."

"Você é mais do que isso, Luísa", interrompeu Pedro, se aproximando um pouco mais. "Você tem escolhas, mesmo que não consiga ver isso agora. Só você pode decidir o que é melhor para o seu coração."

O silêncio que se seguiu foi carregado de uma tensão que Luísa nunca tinha experimentado. Ela podia sentir a pressão de sua vida inteira em cima de seus ombros. Sua mente estava dividida, mas seu coração começava a entender algo que ela havia ignorado: talvez, mais do que tudo, ela desejasse ser ela mesma, sem as amarras da promessa de sua mãe ou do destino que lhe fora imposto.

"Pedro", ela disse, a voz um pouco trêmula, "e você... você acha que um homem como você pode realmente me dar algo que eu preciso? Eu sei que sua vida é simples, mas é isso que me atrai. Talvez seja isso que me atraia mais do que qualquer outra coisa."

Pedro a olhou, seus olhos agora mais suaves, e ele deu um passo atrás, como se estivesse ponderando o que ela dissera.

"Luísa", ele começou, com uma voz calma, "não se trata de ser 'melhor' ou 'pior'. Eu não posso te dar riqueza, nem os luxos que você conhece. Mas posso te oferecer algo que talvez você nunca tenha experimentado: a liberdade de ser quem você realmente é."

Luísa ficou em silêncio, absorvendo suas palavras. Ela sentia que Pedro falava com o coração, sem promessas, apenas com uma honestidade bruta que a tocava profundamente. Mas a realidade estava voltando com força: ela não poderia simplesmente virar as costas para sua mãe, para sua vida. E Rodrigo...

Ela engoliu em seco, tentando organizar seus pensamentos.

"Eu preciso ir", disse ela finalmente, com a voz baixa. "Rodrigo chega amanhã. Eu... eu não sei o que fazer."

Pedro assentiu, com um olhar que misturava tristeza e compreensão. "Seja quem você é, Luísa. Não deixe ninguém decidir isso por você."

Ela deu-lhe um sorriso tímido e virou-se, caminhando lentamente de volta à casa. Mas seu coração estava diferente. A semente da dúvida havia sido plantada, e Luísa sabia que, em algum momento, ela teria que fazer uma escolha — e essa escolha mudaria sua vida para sempre.

Na manhã seguinte, Rodrigo chegou à fazenda. Ele trouxe consigo todo o seu charme, como sempre fizera. Seu sorriso largo e suas palavras gentis eram exatamente o que Luísa esperava: educado, respeitoso, mas distante. O que ela já sabia, mas não queria admitir, é que ele nunca a viu como uma pessoa com desejos próprios. Para ele, ela era apenas a futura esposa que se encaixava no seu futuro brilhante.

O tempo que passaram juntos foi marcado por conversas leves e promessas vazias de felicidade. Mas, enquanto ela sorria e se esforçava para ser a noiva perfeita, seu coração estava com Pedro. E, mais do que isso, Luísa sabia que sua vida, de alguma forma, estava prestes a mudar para sempre.

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