capítulo 4

Dois meses atrás.

Passaram-se oito anos desde a morte dos meus pais, agora vivemos em 2525. As coisas mudaram; de alguma forma, os humanos conseguiram salvar o planeta, impedindo-o de sucumbir ao aquecimento global ou à ebulição. Suspeito que isso tenha a ver com a quantidade de pandemias e epidemias ao longo desses anos. Muitos humanos morreram, aliviando a superlotação do planeta com milhões de mortes anuais. Acredito que Sulgá tenha relação com isso, já que a existência lá depende da sobrevivência da Terra.

Acho que a Deusa do Caos aprisionou os dois mundos em uma gaiola, fazendo com que um dependa do outro.

Desde a morte dos meus pais, me isolei, evitando qualquer expressão emocional, pois Sulgá pode detectar meu poder sem o chip de rastreio devido à minha condição de gestrice, um nome ridículo para um híbrido.

Nos últimos oito anos, mergulhei nos estudos sobre Sulgá no mundo humano, mas senti a necessidade de uma observação mais próxima. Tornei-me guarda florestal, vivendo em uma montanha na Mata Atlântica, próxima ao portal. Lá, vigiava atentamente, estudando cada ser que emergia dele.

Adorava quando o portal se abria, ciente do risco, mas atacava cada vampiro ou lobisomem que surgia enquanto a passagem estava aberta. Era minha oportunidade para treinar meus poderes com cautela, uma estratégia que desenvolvi ao longo do tempo.

Na Terra, aprendi diversas formas de combate, reconhecendo que não podia depender apenas dos meus poderes. Se quisesse adentrar Sulgá, precisava ser hábil, astuta e inteligente. Nos primeiros quatro anos, observei. Nos seguintes, enfrentei qualquer ser que atravessasse o portal, chegando até a eliminar alguns. Vi vampiros e lobos fugirem diante da minha resistência.

Creio que despertei atenção aqui fora, pois, nesta noite de lua cheia, nenhum lobo apareceu, e o portal permanece trancado. Está claro que é uma cilada; querem descobrir quem está atacando os que atravessam a passagem.

Decidi não cair na armadilha. Montei acampamento a cerca de um quilômetro do portal, utilizando minha caminhonete e erguendo a barraca, simulando a imagem de uma humana comum acampando. Ao sentir a abertura do portal algumas horas depois, percebi que quanto mais próximo estava, mais forte me tornava, como se uma corrente me puxasse em direção a Sulgá. Deitei-me na barraca, fingindo estar dormindo, pois percebi que não se tratava de uma criatura amaldiçoada que emergia, mas sim sentinelas. Confesso que um misto de medo e nervosismo me invadiu, especialmente por não estar totalmente preparada para enfrentá-los diretamente. Tentei acalmar meus ânimos.

Ao ouvir passos ao redor da barraca e o som de alguém vasculhando a caminhonete, mantive a calma. Então, ouvi uma voz grave e ao mesmo tempo suave, instruindo os outros a investigarem os arredores da floresta. Senti uma arma apontada para mim. Em um movimento surpreendente, abri os olhos e deparei-me com ele: loiro, alto, trajando um uniforme de tecido resistente, um traje de combate. Dei um salto e me ergui rapidamente.

— Quem é você? Por que está apontando uma arma para mim? — Representei tremores em minha voz, fingindo medo.

— O que faz aqui? — Ele questionou, mantendo a arma direcionada para mim.

— Estou apenas acampando. — Respondi, tentando parecer inocente.

— Por que escolheu acampar aqui? — Ele continuou, vasculhando o interior da barraca.

— Não sinto necessidade de dar explicações a você.

— Não vai querer que eu faça a pergunta novamente, agora com uma bala envolvida, vai? — Ele ameaçou, derrubando a barraca com um único puxão.

— Está bem, desculpe — respondi, deixando minha voz tremer. — Hoje marca o aniversário da morte dos meus pais. Costumávamos acampar aqui quando eu era criança, então venho todos os anos para me sentir mais próxima deles. — Menti, forçando lágrimas nos olhos.

— Não deveria estar sozinha na floresta. Existem coisas que desconhece e que podem causar grande mal. — Ele disse, abaixando a arma, mas seu olhar permanecia intenso.

— Já está amanhecendo, posso ir embora? — Perguntei, antecipando a resposta.

— Eu vou te acompanhar.

— Acho que não é necessário, sei o caminho da minha casa. — Respondi de maneira hesitante.

— Eu insisto.

Não podia recusar; sabia que não precisavam de armas para me subjugar, e que as armas eram, provavelmente, disfarces para despistar os humanos. Não podia voltar para minha casa na montanha; lá, tudo poderia me entregar em questão de segundos. Assim, fui forçada a retornar à cidade, à casa dos meus pais. A residência havia passado por reformas alguns anos atrás, e desde que me mudei para cá, evitei voltar. Era mais fácil ignorar o que aconteceu. Agora, teria que confiar na ignorância do sentinela, torcendo para que ele não soubesse que naquele endereço morreram Luara e Clark.

Enquanto reunia minhas coisas e as colocava na caminhonete, ouvi-o dizer aos outros que me acompanharia até em casa para garantir que eu não representasse uma ameaça, enquanto eles continuavam vasculhando a área e esperando seu retorno, já que ele usaria teletransporte.

Fiz-me de desentendida, queria saber mais sobre o teletransporte, mas não poderia perguntar, nem dar a entender que escutei a conversa. Enquanto arrumava as coisas, resmungava coisas do tipo: "Babaca, só porque tem uma arma acha que me assusta." Acho que ele riu.

— Vamos logo, não tenho o dia todo. — Ele me apressou.

— Você sabe dirigir? — Ele fez que não com a cabeça. — Ótimo, então não me apressa, porque eu já estou indo.

Ele apenas fez uma cara séria. Entrei no carro, e ele sentou no carona. Tentei evitar conversa, mas não pude deixar de estar curiosa. À medida que dirigíamos, a tensão no ar era palpável, e minha mente estava repleta de perguntas que eu ansiava por fazer.

— O que são vocês, e o que estão procurando nesta floresta tão tranquila? — perguntei, tentando extrair informações.

— Somos da guarda florestal, soubemos de ataques e estávamos fazendo patrulha. — Ele mentiu.

— Urso? — fingi não saber.

— Não sabemos ainda, por isso estamos procurando. — Ele fez uma pausa, olhando pela janela do carro. — Vai sempre à floresta?

— Depende, meu trabalho exige muito de mim, mas sempre que posso, gosto de aproveitar a natureza. — Menti novamente.

— Nunca tinha visto um de vocês…

— Vocês? — Parecia que ele nunca tinha vindo à Terra.

— Quis dizer, na floresta. Nunca vi alguém acampando. — outra mentira.

— Talvez você devesse acampar um dia, acho que iria gostar.

Eu disse, chegando em frente à casa e estacionando o carro. O silêncio pairava entre nós, uma oportunidade que eu poderia aproveitar a meu favor. Então, lancei meu charme.

— Caso um dia queira, estarei lá na próxima semana. — Disse com um sorriso, colocando o cabelo atrás da orelha. — Meu nome é Lua, aliás...

— Você mora aqui? — ele disse, me cortando.

— Moro.

— Se importa se eu der uma olhada?

Fiz que não com a cabeça, abri a porta da casa, e ele entrou, verificando tudo. Eu permaneci parada na porta, relutante em entrar. Quando ele passou próximo a mim, disse.

— Tudo certo. — Abaixou a cabeça, então me olhou, dizendo em voz baixa — Filipe.

— Como? — respondi.

— Meu nome é Filipe.

Eu apenas forcei um sorriso simpático e atraente, respondendo.

— Obrigada por me acompanhar.

Fechei a porta e fiquei observando pelo olho mágico. Ele olhou para a porta e depois desapareceu.

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