Na manhã seguinte, eu estava no quintal com Dante. O ar frio enchia meus pulmões, revigorante e gelado. A neve cobria o chão e os galhos das árvores, formando uma paisagem tranquila e silenciosa.
Então, Dante se aproximou, carregando um bornal e um embornal que havia preparado. Com cuidado, colocou o embornal sobre meus ombros; o peso denunciava a quantidade de suprimentos para a longa jornada. No bornal, organizados com cuidado, estavam os itens essenciais: um mapa com marcações precisas, uma bússola, uma pederneira e outros objetos indispensáveis para o caminho. Coloquei a espada firmemente na bainha e a prendi ao cinto. O peso do aço pressionava minha lateral de um jeito estranho, uma sensação incomum para mim. Não estava acostumada a carregar uma arma, mas, naquele momento, não havia outra escolha.
Enquanto ajustava minha capa e puxava o capuz para proteger o rosto do vento cortante, ouvi a voz grave de Dante quebrar o silêncio:
— Tem certeza de que vai ficar bem?
Levantei o olhar para ele, captando a preocupação estampada em seus olhos. Queria dissipá-la, então sorri com confiança.
— Claro. Prometo que tentarei mandar notícias assim que chegar a Elarian.
Ele assentiu lentamente, como se quisesse acreditar em minhas palavras.
— Então, boa jornada. E se precisar de um lugar... sempre será bem-vinda aqui.
Seu tom era sincero, e aquilo fez algo em meu peito apertar de leve. Mas não me permiti hesitar.
— Obrigada, Dante.
Ficamos ali por um instante, apenas nos encarando, como se houvesse algo a ser dito, mas que nenhum de nós tivesse coragem de expressar. Então, inspirei fundo, virei-me e comecei a caminhar, sentindo a neve ranger sob minhas botas. Quando já havia me afastado o suficiente, parei e olhei por cima do ombro. Dante continuava ali, imóvel, observando-me. Levantei a mão em um último aceno, e ele retribuiu com um gesto simples, quase hesitante.
Por que estava sendo tão difícil deixá-lo para trás? Ele era apenas um humano. Sim, havia me ajudado, mas isso não deveria significar nada. Eu precisava seguir em frente. Precisava esquecê-lo. Engolindo o nó que se formava em minha garganta, apertei o passo e deixei Dante e aquele lugar para trás.
Passei o dia inteiro caminhando, seguindo atentamente as rotas marcadas por Dante no mapa. Ele havia escolhido os caminhos mais seguros, evitando áreas perigosas e possíveis emboscadas. A viagem levaria cerca de dez dias a pé—um percurso longo e cansativo. Estava longe de Orinthar por tanto tempo, que minha mana baixou consideravelmente. O suficiente para que eu não conseguisse nem mesmo voar.
Quando a escuridão começou a envolver a paisagem, percebi que precisava encontrar um abrigo antes que o frio se tornasse insuportável. Meus olhos percorreram os arredores até avistar uma pequena gruta entre as rochas, parcialmente escondida por galhos secos e neve acumulada. Aproximando-me com cautela, verifiquei o interior—não havia sinais de animais ou qualquer outro perigo aparente.
Ali seria um bom lugar para passar a noite. A gruta me protegeria do vento e permitiria que eu acendesse uma fogueira sem chamar muita atenção. Aliviada por ter encontrado um refúgio, soltei o embornal no chão e comecei a preparar o fogo, deixando que a dança bruxuleante das chamas trouxesse um pouco de calor àquele ambiente gélido.
Peguei algumas torradas cuidadosamente embaladas por Dante e as passei a geleia de morango que ele havia separado para mim. O sabor adocicado contrastava com o frio ao meu redor, trazendo um breve conforto. Também belisquei alguns biscoitos de chocolate. Depois de comer, estiquei as pernas sobre o chão de pedra e comecei a girar os pés lentamente, tentando aliviar a rigidez causada pela longa caminhada. Meus músculos protestavam, doloridos pelo esforço, mas ignorei o desconforto e soltei um suspiro cansado, tentando relaxar.
No entanto, a tranquilidade era ilusória. A ansiedade roía meu peito como uma fera silenciosa. Será que eu conseguiria salvar Orinthar?. Encostei-me na parede da gruta, sentindo o toque gelado da pedra atravessar minhas roupas. Peguei o mapa e o desenrolei sobre o colo, estudando atentamente o percurso que deveria seguir no dia seguinte.
Assim que os primeiros raios de sol tingiram o céu com tons dourados, preparei-me para continuar a jornada. Conferi o mapa mais uma vez e confirmei minha rota: teria que atravessar uma longa floresta antes de chegar a um descampado. O dia estava surpreendentemente ensolarado para aquela época do ano, e embora o ar ainda fosse frio, a luz do sol criava uma sensação passageira de aconchego.
Caminhei em silêncio, ouvindo apenas o farfalhar das folhas e o som ritmado dos meus passos sobre o solo coberto de musgo. No entanto, minha mente parecia incapaz de manter o foco na trilha à minha frente. Sem perceber, deixei meus pensamentos vagarem até Dante. O que ele estaria fazendo agora? Será que estava praticando com as anotações que lhe deixei sobre poções? Ou talvez estivesse imerso em um livro, as sobrancelhas ligeiramente franzidas em concentração? Qualquer que fosse a resposta, uma coisa era certa: ele provavelmente estaria com aquela expressão tranquila e serena, como se nada no mundo pudesse perturbá-lo. Um pequeno sorriso escapou antes que eu percebesse.
Frustrada, fechei os olhos por um instante e sacudi a cabeça, tentando afastar aquelas distrações inúteis. Cerrei os punhos, irritada comigo mesma. Por que diabos não conseguia tirá-lo da cabeça? Que coisa mais absurda e constrangedora. Dante era apenas um humano que me ajudou—nada mais. Ele provavelmente já havia seguido com sua vida, sem sequer lembrar que eu existia. E era assim que deveria ser. Resmunguei baixinho e apertei o passo, determinada a ignorar qualquer pensamento que não envolvesse minha missão.
No meio do dia, parei para conferir o mapa mais uma vez, franzindo a testa em confusão. Virei a folha de um lado para o outro, tentando entender onde exatamente eu estava. Olhei ao redor, tentando encontrar um ponto de referência, mas tudo parecia igual—árvores retorcidas, galhos secos e a trilha coberta por folhas caídas. Será que eu tinha me perdido? Mas eu segui exatamente o caminho indicado no mapa... Não fazia sentido.
Soltei um suspiro frustrado e cocei a cabeça, tentando reorganizar meus pensamentos. Virei-me para trás, observando o percurso que havia trilhado até ali. Em que momento eu tinha cometido um erro? Bati a mão na testa, me sentindo uma completa idiota. Como Orinthar poderia depender de alguém como eu, se eu sequer conseguia seguir um simples caminho sem me perder?
— Syl?
A voz familiar fez meu coração acelerar. Me virei rapidamente e, para minha surpresa, vi Malrik parado ali, me observando com um meio sorriso. O calor da familiaridade se espalhou em meu peito, dissolvendo parte da tensão.
— Rik! Que bom ver você! — Caminhei até ele, mas logo olhei ao redor, preocupada. — Os guardas...?
— Está tudo bem. Eles estão longe. — Ele garantiu, sua voz firme e tranquila.
Soltei um suspiro de alívio antes de perguntar:
— Como me encontrou?
— Somos gêmeos, lembra? Eu sempre sinto onde você está, minha irmãzinha.
Era verdade. Eu e Rik sempre tivemos uma ligação diferente, algo que parecia nos unir de uma maneira que poucos poderiam entender. Sempre sentíamos a presença um do outro.
O sorriso sincero dele fez meu peito se aquecer ainda mais. Depois de tanto tempo sozinha, era um alívio ver um rosto familiar.
— Você está andando? — Perguntei, estranhando.
Malrik suspirou e assentiu.
— Temos que economizar nossa mana para a viagem de volta a Aurelith. Então, a caçada a você está sendo feita a pé.
Ele fez uma pausa, lançando-me um olhar significativo antes de acrescentar:
— Essa foi uma ordem minha. Assim, você tem mais chances de fugir.
Sorri para ele, satisfeita por vê-lo ali.
— E como estão as coisas em Aurelith?
Sua expressão endureceu antes que ele dissesse, a voz carregada de preocupação e tensão:
— A situação em Aurelith está ficando cada vez mais complicada. Orinthar está cada vez pior... As rachaduras continuam se espalhando, exalando aquela seiva vermelha. Reuni alguns Elunaris para lançar um encantamento que, por enquanto, está retardando o avanço da doença. Mas isso não vai durar muito.
Meu peito apertou ao ouvir aquilo. Malrik continuou:
— Também mandei investigar todos os Elunaris que estiveram próximos da árvore na noite em que a primeira rachadura apareceu. Todos estão sob investigação... mas você ainda é a principal suspeita.
Soltei um longo suspiro, tentando conter a frustração. Claro que eu ainda era a culpada aos olhos deles. Mesmo assim, forcei um sorriso e respondi com firmeza:
— Tudo bem, irmão. Eu vou resolver tudo.
Malrik franziu a testa e ergueu uma sobrancelha, cético.
— O quê? Como assim?
Mantive o queixo erguido e a voz firme:
— Eu vou atrás de uma cura. Vou salvar Orinthar e, assim, provar minha inocência.
Vi os ombros dele caírem levemente, o peso da realidade se abatendo sobre ele.
— Isso é sério, Syl?
— Achei que Drakion tivesse te contado! — Respondi, confusa.
— Não tenho falado muito com Drakion...
Ele ficou em silêncio por um instante. Pensei em perguntar o motivo do afastamento entre os dois, mas decidi me calar. Antes que o silêncio se prolongasse demais, ele continuou:
— Mas, mesmo que você encontre uma cura, se chegar perto do reino, eles não vão nem te dar a chance de falar.
Franzi o cenho, confusa.
— Ora, Rik! Você é o rei. Pode muito bem fazer com que me ouçam.
Ele desviou o olhar por um instante antes de voltar a me encarar com uma expressão amarga.
— Você sabe que não é assim que funciona. As leis de Aurelith são absolutas. O último decreto do rei anterior sempre deve ser cumprido, independentemente do que o sucessor queira.
As palavras dele me atingiram como uma lâmina fria.
— Então que seja. Eu posso me entregar, ir até o reino e contar minha versão no julgamento. Se eu levar a cura comigo, eles não terão escolha senão me ouvir.
O olhar de Malrik se encheu de uma dor silenciosa. Ele hesitou por um momento antes de dizer, em um tom baixo, quase pesaroso:
— Você não entende, irmã... O último decreto do papai não foi para te capturar.
Ele respirou fundo, como se as palavras queimassem em sua garganta antes de finalmente dizê-las:
— Foi para te matar.
O ar pareceu congelar ao meu redor. Fiquei encarando Malrik, esperando que ele desfizesse aquelas palavras, que dissesse que tudo não passava de um engano. Mas seu olhar permaneceu firme, carregado de algo que parecia uma mistura de culpa e tristeza.
— O quê? — Minha voz saiu num sussurro incrédulo.
— Você ouviu bem, Syl. — Malrik desviou o olhar brevemente, apertando os punhos. — Antes de morrer, nosso pai decretou que você deveria ser executada por traição.
Meu coração batia freneticamente, uma tempestade de emoções se formando dentro de mim. Raiva, dor, descrença.
— Isso é um absurdo! — dei um passo à frente, sentindo a indignação tomar conta de mim. — Como ele pôde...? Ele nem sequer ouviu minha versão!
Malrik suspirou pesadamente.
— Você acha que eu não tentei argumentar? Que eu não tentei convencê-lo de que precisávamos de mais tempo, de uma investigação justa? Mas a corte... eles estavam apavorados, desesperados para encontrar um culpado. — Ele passou uma mão pelos cabelos, parecendo tão frustrado quanto eu. — Quando papai deu a ordem, o conselho a acolheu sem questionar.
Engoli em seco, sentindo um nó se formar na garganta.
— Então... é isso? Você vai simplesmente obedecer? Vai me caçar como se eu fosse uma criminosa qualquer?
Ele apertou os lábios, os olhos brilhando com algo que não consegui identificar de imediato.
— Eu não quero isso, Syl. Você é minha irmã. — Sua voz tremeu levemente. — Mas meu poder como rei não pode anular o último decreto do nosso pai. Se eu desafiar a ordem, corro o risco de ser deposto... ou pior.
Eu não queria que meu irmão sofresse as consequências de tudo isso. Eu sabia que o povo de Aurelith sempre fora cruel com Malrik. Agora, ele se tornaria um rei sem a reverência de seu próprio povo, alguém cuja autoridade seria constantemente questionada. Ele precisava de tempo para conquistar o respeito necessário antes de poder me ajudar.
A injustiça que pairava sobre nós me corroía por dentro. Virei de costas, tentando esconder a raiva que se agitava em meu peito. Antes que eu pudesse dar outro passo, ele me pegou pelos ombros com força e me virou suavemente. Seus olhos estavam firmes, mas havia uma preocupação visível neles. Então, sem dizer uma palavra, ele me envolveu em um abraço apertado, um abraço que eu não esperava, mas que me aqueceu por um momento. No entanto, o alívio durou pouco. Malrik se afastou rapidamente, ainda segurando meus ombros, e franziu o nariz, com uma expressão que misturava desgosto e raiva.
— Você está fedendo aquele humano, Syl... Mas, pelo menos, se afastou dele.
Aquelas palavras atingiram-me como um golpe. Fechei a cara, sentindo a raiva crescer.
— Não fale assim de Dante!
Malrik deu uma risadinha abafada, sem entender a gravidade da situação para mim.
— Qual é, irmã... tá defendendo um humano?
A irritação subiu em meu peito como uma chama.
— Ele não é como os outros.
Malrik fez uma careta, ainda mais cético.
— Todos são iguais!
— Não... não são. Ele me ajudou, Malrik. Salvou minha vida. Você deveria agradecer a ele! Se não fosse por Dante, eu provavelmente estaria morta agora!
Malrik ficou em silêncio por um momento, seus braços cruzados, encarando-me com um olhar severo. A expressão dele endureceu, os olhos fúlgidos de algo que eu não conseguia identificar.
— Isso é sério? Agora você quer que eu agradeça a um humano? Fala sério, Syl. Os únicos que podemos confiar somos nós, a nossa própria raça.
Olhei para ele, os olhos faiscando de raiva. Como ele podia ser tão... cegamente obstinado?
— É mesmo? Mas é a minha própria raça que quer me matar, que está me caçando! — disse, quase gritando. — Dante foi o único que me estendeu a mão quando ninguém mais acreditou em mim!
— EU ACREDITEI EM VOCÊ!
Eu congelei. Era a primeira vez que eu via meu irmão perder a compostura. Ele sempre fora tão calmo, sereno, a voz de razão entre nós. Mas agora ele estava claramente fora de si. Ele passou uma mão pela testa e começou a caminhar de um lado para o outro, visivelmente irritado, tentando se controlar.
— Eu acredito em você, Syl... — Ele murmurou, a voz baixa e cheia de uma emoção que eu não sabia como decifrar.
Fiquei parada por um momento, absorvendo suas palavras. Então me aproximei e coloquei minha mão no ombro dele, oferecendo-lhe um gesto silencioso de apoio.
— Então, se você acredita em mim... me ajude a achar a cura. É o único jeito.
Malrik me olhou por um instante, como se estivesse ponderando minha proposta. Seus ombros caíram, como se um peso invisível tivesse sido retirado dele. Finalmente, ele assentiu, forçando um sorriso cansado.
— Certo... mas não posso te acompanhar por muito tempo. — Ele hesitou, como se procurasse palavras. — Onde você está indo?
— Elarian.
Malrik franziu a testa, mas logo seu semblante se suavizou.
— Muito bem, você me explica mais detalhes no caminho. Acho que sei de um atalho que pode ajudar a chegar mais rápido lá.
Meu coração deu um salto de alívio. Finalmente, alguém em quem eu podia confiar, alguém que não me veria apenas como a suspeita, como a traidora. Eu não precisava mais seguir sozinha. Sorri para ele, antes de dar um passo à frente.
— Obrigada, Malrik.
Ele acenou com a cabeça, seu sorriso se alargando um pouco mais.
— Vamos, então. Temos um longo caminho pela frente.
Enquanto caminhávamos juntos, comecei a explicar a ele os planos que tinha para tentar curar Orinthar.
Malrik me guiava pela floresta em silêncio, os passos dele firmes e decididos, mas eu podia sentir a tensão no ar. Ele estava claramente irritado com a discussão que tivemos antes. Embora fôssemos irmãos e brigássemos com certa frequência, desta vez a conversa tinha sido diferente, mais carregada, mais séria.
Não me sentia culpada por defender Dante, mas não podia negar que, ao focar tanto em minha própria visão da situação, deixei de lado o esforço e a preocupação que Malrik sempre teve por mim. Ele também havia feito o possível para me proteger, para me manter segura, mesmo que de uma forma que eu não entendesse muito bem. De alguma forma, eu nunca tinha considerado o impacto emocional que isso tudo causava nele.
A raiva que Malrik sentia dos humanos era, de certa forma, a mesma raiva que eu já havia carregado, antes de conhecer Dante melhor. Eu também vi os humanos como ameaças, como os inimigos que destruíam e que só causavam dor. Mas Dante, com sua simplicidade e seu jeito, havia me mostrado que nem todos eram iguais. Ele se destacava, e isso foi suficiente para que eu visse as coisas de outra maneira.
Mas, por agora, tudo o que eu podia fazer era caminhar ao lado dele, em silêncio, dando-lhe o tempo que ele precisava para processar tudo o que havíamos discutido. Eu queria que ele visse, algum dia, que minha lealdade a Dante não diminuía o amor que eu tinha por ele. Eu só precisava de tempo... e talvez, ele também precisasse de tempo para entender que, às vezes, até a nossa própria raiva precisa ser superada para que possamos ver o que realmente importa.
— Ali! — Malrik apontou, seu tom firme, e eu segui seu olhar.
À frente, havia um enorme tronco caído, um caminho improvisado que formava uma ponte sobre um rio de correnteza forte. O tronco parecia resistente, mas, à medida que nos aproximávamos, percebi o perigo imediato. Pedregulhos de gelo se desprendiam das bordas do rio logo abaixo, tornando a correnteza ainda mais traiçoeira. O som da água batendo contra as pedras era alto, quase ameaçador.
— Tem certeza que isso é seguro, Rik? — Perguntei, a preocupação clara na minha voz, enquanto observava o curso furioso do rio abaixo da ponte natural.
Malrik olhou para mim com um sorriso irônico e um ar de confiança.
— Ora, irmã, você nunca teve medo de nada!
Ele estava certo. Eu sempre fui a primeira a me arriscar, a buscar novas experiências, a encarar o desconhecido com a ousadia que vinha da minha natureza aventureira. Mas, naquele momento, uma sensação estranha se apossou de mim. O frio na espinha não era algo que eu costumava sentir. Algo naquele lugar parecia... errado.
Respirei fundo, tentando afastar a sensação de pânico que começava a crescer dentro de mim. Olhei para o tronco, e então para Malrik, tentando parecer mais confiante do que realmente me sentia.
— Se fazer você se sentir mais segura, eu posso ir primeiro e mostrar que o tronco é firme. — Malrik disse me olhando-me com um sorriso encorajador.
Eu franzi a testa, ainda incerta.
— Não sei, e se você cair? — Minha voz saiu um pouco mais tensa do que eu pretendia.
Malrik riu suavemente, um riso que transbordava confiança.
— Eu vou ficar bem. — Ele disse, com a segurança de quem acreditava plenamente em suas palavras. — Se passarmos pelo tronco, serão três dias de viagem a menos.
Ele respirou fundo, antes de subir no tronco. Suas botas bateram na madeira com um som firme, e ele começou a atravessar com passos cautelosos. À medida que ele avançava, notei seus lábios se movendo. Ele parecia murmurar algo, mas o som do rio era tão forte dificultava qualquer tentativa de entender. Talvez estivesse rezando, ou apenas falando consigo mesmo. A sensação de que ele precisava de algum tipo de conforto aumentou a tensão no meu peito. Quando Malrik chegou à outra margem, ele pulou para o chão firme com um salto ágil, e olhou para mim, acenando.
Respirei fundo, tentando afastar os pensamentos que me perturbavam. Agora era a minha vez. Subi no tronco com cuidado, e o som da madeira estalando sob meus pés fez meu coração acelerar. Um arrepio percorreu minha espinha à medida que o frio do ambiente e a sensação de precariedade me envolviam. Não olhava para os lados, não olhava para o rio, apenas fixava o olhar à frente, como se isso fosse me manter focada e segura.
Quando estava no meio do tronco, senti o estalo repentino que cortou o som do rio. O tronco cedeu sob meus pés e uma onda de pânico tomou conta de mim. Imediatamente, tentei firmar meu corpo, forçando os músculos a se ajustarem e evitando perder o equilíbrio. Mas, antes que pudesse reagir, o tronco começou a rachar.
— CORRE, SYL! — Gritou Malrik, esticando a mão para mim, seus olhos arregalados de preocupação.
O pânico me dominou, sem pensar, comecei a me mover. Mas, antes que pudesse reagir direito, o tronco cedeu, partindo-se ao meio. Meu corpo foi lançado para a frente, e, num reflexo instintivo, agarrei a parte que ainda permanecia presa à margem do rio. Meus dedos se firmaram na casca úmida, escorregando levemente enquanto eu lutava para me manter segura.
— Segure, Syl! — Disse Malrik com desespero, se esticando tentando me alcançar.
Tentei alcançar a mão dele com todas as forças que restavam em mim, mas minha mão escorregou do tronco. A última coisa que eu vi foi Malrik estendendo desesperadamente a mão para mim, e então, o rio me arrastou. O frio cortante da água gelada me atingiu como um choque elétrico. A correnteza era forte, e eu mal conseguia manter a cabeça para fora da água.
— Rik! — Gritei, minha voz sufocada pela água que invadia minha garganta, mas apenas o som distante de sua voz chegava aos meus ouvidos, ficando cada vez mais baixo.
Meu corpo estava sendo arrastado para longe dele, e a sensação de impotência tomou conta de mim. A água gelada invadia minhas narinas as queimando enquanto eu lutava para respirar. A correnteza, forte e impiedosa, me puxava para baixo, tornando cada tentativa de emergir um esforço inútil. Agitava as mãos, tentando me equilibrar ou encontrar algo a que me agarrar, mas a força da água desfazia qualquer controle.
Quando bati contra uma pedra que se projetava do fundo, a pancada me fez perder o ar. A dor nas minhas costas foi quase insuportável, e por um momento, tudo ficou embaçado, como se o mundo ao meu redor estivesse se distorcendo. Meus pulmões queimavam, e o desespero se misturava à sensação de afundamento. Lutava para manter a cabeça fora d'água, erguendo o queixo o máximo que podia, mas a correnteza tornava até esse pequeno esforço inútil. A cada segundo, meus músculos cediam um pouco mais, a força escapando do meu corpo. Não sabia por quanto tempo ainda conseguiria resistir.
De repente. Senti algo firme me agarrando. Meu corpo foi erguido, e minha cabeça foi suavemente apoiada em um ombro. Rik? A correnteza ainda rugia ao meu redor, mas aquela força não me deixava ir. Havia uma corda, que parecia estar amarrada a uma árvore próxima, sendo usada para nos puxar para fora da água. Quando finalmente chegamos à margem, fui colocada no chão com uma suavidade . Meu corpo estava pesado e tremendo pela exaustão e pelo frio que congelava meus ossos.
Tossi violentamente a água que eu havia engolido forçando minha garganta a se contrair de forma agonizante. A sensação de sufocamento era aterrorizante, por um momento, a luta para respirar parecia interminável. Meu corpo se contorcia, tentando expelir toda a água, mas a força da tosse me deixava cada vez mais fraca. Aos poucos, o cansaço tomou conta de mim e sem conseguir mais resistir, senti minhas forças escapando, meu corpo desabando, até que finalmente cedi ao esgotamento, então, tudo ao meu redor se apagou.
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Atualizado até capítulo 55
Comments
Gaby G.B.R.
É só ele voar horas bolas, agora você não consegue voar nesse momento né 😑
2025-04-02
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Gaby G.B.R.
Esse irmão tá estranho hein... essa murmuração é MA CUM BA 🫣
2025-04-02
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Gaby G.B.R.
Eu disse, não disse 😏
2025-04-02
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