Capítulo 27: O Chamado da Humanidade
Lúcifer caminhava entre os humanos, misturando-se às multidões como se fosse um deles. As cidades estavam em constante movimento, iluminadas por tochas e fogueiras que tremulavam contra a escuridão da noite. Ele sentia os olhares desconfiados, o medo implícito nas expressões das pessoas, mas também via esperança nos olhos daqueles que ainda acreditavam em algo maior.
Pela primeira vez, Lúcifer não se via como um exilado, mas como um observador. Ele estava ali não para julgar, nem para interferir diretamente, mas para entender. E o que ele viu foi fascinante. Os humanos eram frágeis, limitados pelo tempo e pelo corpo mortal, mas dentro deles ardia uma chama que nem mesmo os anjos possuíam: a vontade de continuar lutando, mesmo quando tudo parecia perdido.
Ele observou um pai sacrificando sua comida para alimentar seu filho. Viu guerreiros enfrentando inimigos muito mais fortes, não por glória, mas para proteger aqueles que amavam. Viu uma mãe rezando, mesmo sabendo que talvez suas preces nunca fossem atendidas.
Esses atos, por menores que fossem, intrigavam Lúcifer.No Céu, a fé era absoluta, incontestável. No Inferno, era inexistente. Mas na Terra, a fé dos humanos oscilava entre esperança e desespero, criando um equilíbrio que Lúcifer nunca havia compreendido totalmente. Eles não eram como os anjos, que obedeciam sem questionar, nem como os demônios, que seguiam apenas seus impulsos. Os humanos tinham escolha.
E foi nesse pensamento que ele se viu questionando sua própria existência. Durante séculos, ele buscou um propósito, uma identidade. Antes, ele queria vingança; depois, redenção. Agora, ele percebia que talvez nunca tivesse realmente entendido sua própria liberdade. Se os humanos podiam escolher quem queriam ser, por que ele não poderia?
O vento soprou forte, trazendo consigo o cheiro da terra molhada. Ele continuou andando pelas ruas de uma vila, ouvindo sussurros sobre uma praga que devastava a região. Os corpos de doentes estavam amontoados nos cantos, e o desespero era palpável. Algumas pessoas oravam por ajuda divina; outras amaldiçoavam os deuses por não responderem.
Uma jovem com cabelos desgrenhados e olhos cheios de lágrimas segurava a mão de seu irmão mais novo, que tremia de febre. Ela não pedia a ninguém que o salvasse, pois sabia que ninguém viria. Apenas o segurava, oferecendo seu calor e sua presença.
Lúcifer se ajoelhou ao lado dela, observando a cena.
— Você não reza? — ele perguntou.
A garota olhou para ele, surpresa. Seus olhos estavam cansados, mas sua expressão era firme.
— Já rezei antes, mas os deuses não responderam. Então, só estou aqui. Ele não pode ficar sozinho.
Lúcifer viu algo naquela resposta que o tocou profundamente. Não era desespero puro, nem fé cega. Era apenas aceitação. A menina sabia que poderia perder seu irmão, mas ainda assim ficava ao lado dele, porque essa era sua escolha.
Sem pensar, Lúcifer estendeu a mão e tocou a testa do garoto. Uma leve centelha de energia brilhou em seus dedos, e a febre começou a ceder. O garoto respirou fundo, seu corpo relaxando aos poucos. A irmã arregalou os olhos, sem saber o que dizer.
— Quem... quem é você? — ela murmurou.
Lúcifer apenas sorriu, levantando-se.
— Alguém que está aprendendo.
Ele se afastou antes que pudesse ouvir qualquer outra palavra. Ele não precisava de reconhecimento, nem de agradecimento. O que importava era que, naquele momento, ele escolheu ajudar.
E talvez, só talvez, essa fosse sua verdadeira missão.
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Atualizado até capítulo 32
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