Confiança

Gustavo passou toda a sua vida sem conseguir confiar em ninguém. Foi obrigado esconder suas feridas sob uma capa de força para entrar no mundo dos tubarões, a empresa no qual dirigia. Lá não tinha espaço para homens traumatizados, fracos... Dessa forma sobreviveu dia após dia engolindo o veneno que foi injetado em suas veias desde tão pequenino. Pela primeira vez sentia poder confiar em alguém, Denise estava ali disposta a dividir com ele aquele peso tão grande que levava dentro de si.

_ Sabe... _ Gustavo começou falar ainda meio receoso. _ Minha mãe sempre foi uma mulher maravilhosa, casou cedo com o meu pai. Não tinha dinheiro ou profissão... conheceu meu pai na casa em que morava com os meus avós, eles eram caseiros de lá e minha mãe muito nova ajudava a minha avó nas obrigações. Minha mãe conta que meu pai ficou encantado com ela... logo casaram-se. Minha mãe passou anos de sua vida se dedicando ao lar, ao meu pai... A mim. Meu pai sempre teve dinheiro, família rica... Nada faltava a minha mãe, a não ser o amor. Ele foi ensinado que um homem forte não se entregava a apenas uma mulher e com isso traia minha mãe das piores formas... Ela sempre soube de tudo. Agora a pouco tempo ela contou-me que uma vez havia pego meu pai com uma prostituta em sua cama, na nossa casa... Para você ver como meu pai era. Perante a sociedade era o homem perfeito, mas em casa... _ Gustavo parou um pouco antes de continuar. _ Nunca entendi porque minha mãe não saia daquele relacionamento, preferia entrar em depressão e se esconder da vida em lugares distantes da cidade... me trazia sempre junto e para mim, sobrava a obrigação de cuidar dela e esperar pacientemente que ela se soltasse daqueles grilhões psicológicos que meu pai havia colocado nela.

Denise ouvia a tudo calada, não queria atrapalhar Gustavo. Apenas encostou sua cabeça em seu ombro como forma de demonstrar cumplicidade. Ele passou o braço por sua cintura, queria sentir ela ao seu lado... O dava força para cuspir tudo aquilo que guardou e o fazia tão mal.

_ Por várias vezes vi a minha mãe tomar remédios tentando tirar a própria vida por causa do meu pai. Eu não entendia como ela conseguia ter coragem de me abandonar daquela forma por causa de um homem e não conseguir se libertar dele. Eu estava ali, sempre estive ali... Junto dela, mas parecia que ela nunca me via…

Denise o abraçou falando :

_ É, imagino o quanto seja triste para você passar por isso tudo. Sua mãe não sabia como se livrar dessa dor. Entregar sua vida a alguém, confiar e ser traída é uma dor muito grande... Nem todas conseguem se reerguer sem a ajuda de um profissional adequado.

Gustavo alisou seus cabelos e continuou:

_ Sim, hoje eu entendo. Quando somos pequenos não entendemos muito, mas hoje imagino como minha mãe sofreu. Meu pai nunca agrediu fisicamente minha mãe, mas suas traições se tornavam o pior castigo para ela, não feria o seu corpo, mas cortava a sua alma... Quando meu pai foi diagnosticado com câncer foi um choque para toda a família, da descoberta até o falecimento dele foi muito rápido, achei que minha mãe não aguentaria perder ele... Estava enganado. Acredito que isso foi o melhor para todos. Minha mãe sobreviveu, se curou e hoje é uma mulher cheia de alegria. Vive me cobrando uma posição, diz ela que quer ter a alegria de me ver casado antes de partir... _ Ele ri mais leve.

Denise ri e não aguenta se manter calada.

_ Acho que ela terá que esperar bastante._ Denise falava rindo. _ Você não é um cara que se envolve assim... A mulher para te conquistar tem que ser muito especial.

Gustavo Olha para Denise e surpreso com a confissão dela, a interroga:

_ Como assim, "não sou um cara que se envolve" ? _ pergunta repetindo a fala de Denise. _ Acha mesmo que não tenho sentimentos?

Denise percebe que falou demais e tenta disfarçar:

_ Não é isso, mas olha sua idade... Nunca teve nenhum relacionamento que possa se dizer, firme. _ falava olhando para a água do lago. _ Na empresa te chamam de "O chefe gelado" ...

Gustavo ri. Quando ele ia abrir seus sentimentos para Denise, Mário e Mariana se aproximam.

_ Caramba! Já viu a cachoeira que tem aqui, Dê? _ fala Mariana enquanto se senta ao lado de Denise. _ Muita água mesmo! Temos que ir lá amanhã. Vamos Gustavo?

_ Claro que sim, Mariana _ Gustavo concorda enquanto ria. Não era possível... toda vez que tentava alguma aproximação com Denise, algo o atrapalhava _ O que está achando do passeio Mário? Está curtindo ?

Mário puxa Mariana dando um selinho discreto antes de responder à pergunta de Gustavo todo sorridente.

_ Claro! A garota que me acompanha é maravilhosa... Quer o quê? Estou adorando. Há tempos não me divertia tanto assim, ultimamente tem sido só trabalho e trabalho... Até que chegou enfim a minha vez de relaxar! _ todos riam enquanto Mário continuava. _ Gustavo, sem querer desrespeitar sua casa... vou te pedir logo porque não quero que se chateie caso a Mari aceite o pedido que farei.

Todos se assustaram, não era possível que Mário seria tão louco ao ponto de assumir um compromisso com Mari tão rápido assim... Ele, vendo a confusão estampada nos olhos de seus amigos, se adianta em desfazer esse mal-entendido.

_ Calma gente!!!_ ele explica levantando as mãos num gesto de defesa._ Eu iria pedir a Mari se eu podia dormir no quarto junto com ela. Só isso.

Todos respiraram aliviados e caíram na gargalhada.

_ Cara, você me assustou ! _ Gustavo falava rindo._ Não acredito que era só isso... Todo esse drama para isso? E aí, Mari??? O que diz? _ Gustavo virou- se para Mariana esperando a resposta.

_ Claro que siiimmmmm!!! _ Mariana falava enquanto corria para beijar Mário. _ Não há nada de diferente do que já fizemos na casa de sua mãe, porque não continuar por aqui???

Eles estavam lindos juntos, Denise e Gustavo se olhavam enquanto Mário e Mariana se beijavam. Denise sabia o que Gustavo queria dizer sem nem mesmo pronunciar palavra alguma, mas ela não estava disposta a se entregar àquela loucura.

_ Vamos Pessoal! _ Chamava Denise. _ Está anoitecendo e já estou cheia de fome.

Gustavo ri enquanto sacaneia Denise:

_ Caraca! A mulher vive com fome! Meu Deus! O cara que ficar com ela definitivamente terá que ter uma distribuidora de alimentos. _ Todos riram e Gustavo continuou. _ Vamos para a sede. Clara já deve estar nos esperando para jantar. Aqui a janta é cedo porque se dorme com as galinhas!

Eles seguiram em direção a casa principal conversando. Tudo estava tão bom que a vontade era de nunca mais ir embora dali. Voltar para a realidade será algo muito ruim a se fazer. Tudo ali era mágico... Denise queria curtir tudo o que tinha naquele campo, não desperdiçaria seu domingo de forma alguma.

_ Amanhã vamos à cachoeira, pessoal. Não quero ir embora sem antes aproveitar aquela água. _ Comentava Denise enquanto entrava pela porta da sede. _ Amanhã será um dia curto para tantas coisas que quero fazer por aqui.

Dona Clara os recebe com um sorriso no rosto.

_ Que maravilha ver vocês assim, tão animados… _ falava dona Clara. _ Até Gustavo sorrindo? É um milagre mesmo!! Bom, para deixar vocês mais alegres tenho uma notícia… Fiz porco assado com batatas douradas. Espero que todos comam...

O cheiro estava delicioso, Denise agarrou Dona Clara dando beijinhos em suas bochechas enquanto a agradecia:

_ Com certeza estará delicioso, dona Clara. _ Denise virou-se para o pessoal e continuou._ Estão esperando o que pessoal? Anda!! Lavar as mãos e correr para a mesa! Já falei que estou faminta.

Todos riram e correram para se lavar. O jantar estava quentinho e não queriam deixar esfriar.

Tudo estava delicioso, o jantar correu bem tranquilo. Mário e Mariana era só amores enquanto Denise e Gustavo conversavam com senhor Pedro e Dona Clara que foram convidados a participar do jantar junto ao pessoal. Enfim, nada mais agradável que um jantar entre pessoas queridas. Denise se sentia muito bem naquele lugar, não queria ir embora, mas uma hora teria que enfrentar a realidade... enquanto esse dia não chegava , ela queria aproveitar.

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