Quando entrei na sala, o clima já estava pesado.
Algumas garotas estavam em pé, outras sentadas, todas com um ar de expectativa.
Todas tinham uma coisa em comum: olhares ansiosos, quase desesperados, como se estivessem esperando a aprovação de um homem que parecia mais um juiz do que um simples diretor.
A sala estava fria, a iluminação forte fazia as sombras parecerem mais intensas, e eu sentia que minha presença ali era apenas mais uma tentativa de preencher um vazio.
Ele estava lá, atrás da mesa, parecendo um rei distante. Heitor Guedes. Suas mãos estavam descansando na mesa, e seus olhos azuis observavam cada uma das garotas com uma frieza que me fez arrepiar. Ele não sorriu para nenhuma delas, não havia empatia, apenas um julgamento que tornava tudo ainda mais difícil. Eu tentei não demonstrar meu nervosismo, mas não consegui evitar.
Quando finalmente senti o seu olhar se fixar em mim, um calafrio percorreu a minha espinha.
Ele estava me observando com atenção, como se estivesse tentando decifrar cada movimento, cada expressão. Não sabia se estava sendo avaliada ou desconsiderada, mas seu olhar parecia pesar, e isso me deixou desconfortável.
Tentei disfarçar, fazendo o possível para parecer confiante, mas o que eu realmente queria era fugir dali.
Respirei fundo, tentando disfarçar minha insegurança, e fui até a marcação no centro da sala. Minhas mãos estavam suando, e o peito apertado, mas eu sabia que precisava passar a impressão errada — ou melhor, a impressão certa.
Fingi ser alguém com o que ele esperava. Uma mulher de presença forte, segura de si, sem as inseguranças que ainda me dominavam. Era quase um truque de ilusão, uma forma de esconder o que eu realmente sentia.
“Ela é brasileira.” Heitor murmurou, os olhos ainda fixos em mim, antes de desviar rapidamente o olhar. Seu comentário me fez sentir uma pontada no estômago. Ele estava me julgando, e eu sabia disso. Como ele era capaz de fazer isso com tanta facilidade? Como eu poderia ser diferente das outras?
“Exótica, mas encantadora.” - Rogério, o agente, estava ao meu lado, tentando me vender como um produto. A frase parecia mecânica, como se já tivesse sido repetida várias vezes.
Eu tentei manter a postura, mas meu coração batia acelerado, e eu sabia que não era suficiente para me proteger de Heitor. Ele me estudava com olhos penetrantes, como se estivesse procurando falhas em meu desempenho. Eu senti o peso do julgamento no ar.
“Você tem experiência, certo?” Ele perguntou, finalmente se dirigindo diretamente a mim. Sua voz era fria, direta, sem rodeios. Eu tentei não hesitar, mas dentro de mim, um turbilhão de dúvidas surgia.
“Sim, claro.” Respondi rapidamente, tentando soar convincente. Mesmo sem nenhuma experiência real, sabia que precisava vender a ideia de que eu era quem ele queria.
"Você parece ser do tipo que faz qualquer coisa para chamar atenção." Ele falou, mais para si mesmo do que para mim, mas suas palavras acertaram em cheio. O que ele estava tentando fazer comigo? Me testar? Me enfraquecer?
"Eu..." Tentei continuar, mas ele já estava me analisando com aquele olhar crítico. Era como se eu estivesse sendo desmontada aos poucos.
“Não.” Ele finalmente disse, virando-se para Rogério, como se minha presença ali já não fosse mais relevante. “Ninguém me impressionou hoje. Vamos tentar outra coisa.” Ele se afastou, sem nem mesmo olhar de novo para mim.
As outras garotas estavam com a expressão de derrota no rosto, algumas já indo embora. Eu permaneci ali, estática, tentando processar o que tinha acabado de acontecer. Mais uma decepção. Mais um fracasso. Eu sabia que nada ia mudar se eu continuasse tentando ser o que ele queria. Talvez fosse hora de ser quem realmente sou, mas não naquele momento.
“Droga! Perdi mais um dia de trabalho por nada.” Uma das meninas, uma japonesa, tirou a peruca loira com um gesto exagerado.
“Trabalho? É só fachada para os paparazzi não me perseguirem, e eu poder fazer umas peças de teatro pequenas.” A loira riu, mas sua risada era amarga, e eu não consegui esconder a minha frustração.
“Com esses papéis, você mal paga a sua passagem de ônibus. Isso é se você conseguir algum papel.” A morena disse com um tom de alerta.
As palavras dela acertaram o alvo. Eu sabia que ela estava falando a verdade.
Quando cheguei em casa, Poliana me aguardava, sempre com aquele sorriso radiante. Mas, ao me ver, ela logo percebeu que algo estava errado.
“Ei, conseguiu o papel?” ela perguntou com um olhar curioso, mas cheio de simpatia.
“Não.” Respondi, minha voz saindo quase como um sussurro. Eu não queria que ela visse a decepção estampada no meu rosto, mas não consegui esconder.
“Sinto muito. Ouvi dizer que é bem difícil atuar e se manter ao mesmo tempo.” Poliana disse, seu tom gentil me fez sentir um pouco melhor, mas a dor ainda estava lá.
“Eu sei, mas… por um momento, eu pensei que ia conseguir. Eu já estava até lendo nos lábios dele.” Falei, tentando manter a compostura.
“Lábios, é?” Poliana fez uma brincadeira. “Aposto que ele é sexy.”
“E era, mas se ele tivesse um bigode quadrado, eu teria certeza de que o Hitler ainda estava vivo.” Eu ri sem vontade, tentando amenizar a situação.
“Então, ele é um bad-boy.” Poliana disse, como se já soubesse a resposta.
“Pior. Ele não me deu o papel, e ainda soltou aquele sorrisinho de arrogância no final.” Eu suspirei, sentindo o peso da rejeição.
“Credo, que cara escroto. Até parece alguém que conheci uma vez.” Poliana fez uma careta, como se estivesse lembrando de alguém que não era muito agradável.
“Você não faz ideia.” Eu respondi, ainda absorvendo a situação. “Agora, vou ter que arrumar um emprego enquanto isso.”
“Em que você tem experiência?” Poliana perguntou, um pouco mais séria agora.
“Ilusão serve?” Eu dei de ombros. “Antes, eu estudava e fazia aulas de teatro na comunidade, então nunca tive tempo para trabalhar.”
“Vai ser difícil, muitas empresas exigem experiência.” Poliana refletiu, pegando sua bolsa. “Mas se você me entregar algum currículo, talvez eu consiga te ajudar. O mercado está sempre mudando, saindo e entrando funcionários. Eu mesma já teria saído, se não precisasse tanto do dinheiro.”
“Não tenho no momento. Quando eu entregar a declaração para a escola de teatro, faço uns currículos e te entrego.” Eu me senti um pouco mais leve com a ajuda de Poliana.
“Certo, já estou indo. Se não, vou perder o ônibus, e minha vaga de caixa no mercado fica livre.” Poliana sorriu, balançando os ombros, sempre leve, como se nada realmente a abalasse.
“Poliana?” Eu a chamei, esperando que ela me olhasse antes de sair.
“Sim?” Ela virou os olhos em minha direção, e eu sorri com gratidão.
“Muito obrigada. Você está sendo de grande ajuda.” Eu falei com sinceridade.
“Bobagem, é para isso que servem as amigas… Quer dizer, somos amigas, não somos?” Poliana mexeu nos óculos de forma descontraída, sem jeito.
“As amigas que eu tinha me abandonaram quando mais precisei. E você, foi o oposto. Pessoas como você? Eu costumo chamar de anjo.” Eu sorri, um pouco emocionada com a sinceridade que eu mal conseguia admitir.
“Ah, obrigada! Fico até emocionada. Posso te abraçar?” Poliana perguntou, parecendo genuinamente tocada.
“Não me faça retirar o que disse.” Eu brinquei, negando o abraço. Eu nunca fui muito de demonstração de carinho.
“Tá bom, nada de abraços.” Poliana sorriu antes de sair, e, ao fechar a porta, disse: “Saiba que, mesmo assim, me senti abraçada com suas palavras.”
“Vai perder seu ônibus com essa baboseira.” Eu a aconselhei, tentando disfarçar o sorriso que se formava no meu rosto enquanto ela partia.
A porta se fechou atrás dela, e eu fiquei ali, sozinha, mas com uma sensação estranha de que talvez, só talvez, as coisas não estivessem tão ruins assim.
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Atualizado até capítulo 28
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