Antes de chegar à escola, as palavras de Heitor ainda ecoavam na minha mente.
'Não precisa se preocupar com o contrato agora. Primeiro, entre na Escola de Talentos, conheça as pessoas, e se enturma. O resto a gente resolve depois.'
Ele não deu mais detalhes. Apenas me garantiu que tudo estava encaminhado e que, quando chegasse a hora, eu seria avisada.
E agora, olhando para a enorme construção à minha frente, engoli em seco.
Escola de Talentos Martins Muniz.
As letras douradas brilhavam na fachada clássica, imponente, como se rissem da minha hesitação. Eu deveria estar radiante agora. Esse era o meu sonho desde criança. Oportunidade única. A minha oportunidade de tornar-me atriz.
Martins Muniz não era apenas uma escola, era uma ‘vitrine’ de talento e sucesso. Eu podia sentir os olhares curiosos dos estudantes passarem sobre mim, como se eu estivesse a ser avaliada a cada passo.
Mesmo o ar parecia mais denso, carregado de expectativas, como se até o vento sussurrasse ‘você precisa ser mais’. O peso de ser uma ‘novata’, uma inexperiente, se tornava ainda mais evidente entre aquelas paredes que respiravam fama e excelência."
E se eu não fosse boa o suficiente?
Respirei fundo, tentando afastar o pensamento. Era ridículo. Pessoas passavam anos tentando entrar ali, e eu tinha conseguido em um piscar de olhos. Deveria estar comemorando. Só que, em vez disso, tudo que eu sentia era um nó apertado no estômago.
E se eu fosse a pior da turma?
Afinal, eu nunca tinha pisado num palco de verdade. Nunca tinha feito um curso profissional. Tudo que eu sabia vinha de vídeos na internet, ensaios no espelho e alguns teatros escolares que ninguém levava a sério. Agora, eu estava prestes a entrar no mesmo ambiente que os filhos de diretores de cinema e os queridinhos da mídia.
Eu repeti para mim mesma como um mantra, tentando reunir coragem para subir os degraus.
Você nasceu para isso.
Foi para isso que sonhou sua vida inteira.
Você merece.
Mas, antes que eu pudesse dar o primeiro passo, meu celular vibrou no bolso, e uma música familiar ecoou no ar.
Meu celular vibrou no bolso, e uma música familiar ecoou no ar.
Counting Stars, do OneRepublic.
Minha prima.
"Está tudo bem aí?" — a voz cautelosa de Celine veio do outro lado da linha. "A vovó pediu pra te ligar por que disse que acabou de sentir arrepios."
Soltei um suspiro e revirei os olhos com um sorriso.
"A vovó só deve estar com frio, ou talvez só estivesse sendo dramática como sempre."
Mas, apesar de rir da paranoia dela, já sentia falta dessas superstições sem sentido das duas.
"Talvez." — Celine riu baixinho, mas sua voz ainda carregava preocupação. "É só que... estamos preocupadas. Você está sozinha, numa cidade escondida no meio do nada..."
"Sel, eu sei o que estou fazendo, lembra?"
"Eu sei, eu sei. E, sério, parabéns pela bolsa! Eu sabia que você conseguiria."
Senti meu peito apertar. Era mais fácil deixá-las acreditar que eu tinha conquistado tudo sozinha.
"Obrigada."
"Mas eu sinto saudades de você e a vovó também." — ela disse, e pude imaginar seus olhos marejados.
"Também estou sentindo." — sorri, tentando não me emocionar. "Mas não se preocupe. Daqui a pouco eu volto rica e famosa."
Ela riu.
"Vou te esperar na TV, hein!"
Desligamos, e eu finalmente tomei coragem para subir os degraus. Peguei meu celular e virei a câmera para registrar o momento. O prédio parecia ainda maior visto pela tela trincada.
E então, em um piscar de olhos, tudo saiu do lugar.
Pisei em falso.
Meu coração disparou, e eu já me preparava para o pior — meu destino sendo selado no asfalto cinzento — quando mãos firmes me seguraram antes que eu atingisse o chão.
Minha mente precisou de alguns segundos para processar.
Olhei para cima e encontrei um sorriso divertido. Um homem, aparentemente da minha idade, me segurava como se estivesse protagonizando um romance de época.
Algo nele parecia... familiar. Não pelo rosto em si, mas pela energia que exalava. A confiança despreocupada, o jeito como os olhos brilharam em diversão... Como se eu já o tivesse visto em algum lugar, mas não consegui lembrar onde.
"Qual a graça?" — resmunguei, tentando me afastar dele.
"Parece cena de filme." — ele riu, sem soltar minha mão: "O mocinho encontra a mocinha, eles se esbarram, e aí se apaixonam perdidamente..."
Eu pisquei.
Ele só podia estar brincando.
"Amor à primeira vista? Sério? Sai dessa, cara."
"Não acredita? E na segunda vez que a gente se esbarrar…?
"Eu vou estar apaixonada?" - eu interrompi, sem acreditar em suas fantasias."
Ele arqueou a sobrancelha.
"Talvez. Eu posso tropeçar em você de novo, só para testar."
Segurei uma risada.
"Vai atrás da sua Julieta, Romeu. Porque aqui não vai rolar."
Ele suspirou teatralmente.
"Não dá, ainda não encontrei a minha Julieta."
Eu encarei ele, incrédula.
"Isso é algum tipo de pegadinha com as calouras?"
"Juro que não, mas e se fosse você a minha Julieta?
Um leve sotaque puxado escapou na frase, como se ele tivesse tentando esconder a forma natural de falar. Algo que me deu um arrepio estranho, mas que ignorei.
"Você é doido. Se trata vai."
Rindo da situação surreal, peguei minhas malas e continuei subindo os degraus, sem me importar mais com minha hesitação inicial.
"Nem vai me dizer seu nome?"— ele perguntou, ainda atrás de mim: "Você quem sabe. Na próxima vez que nos esbarrarmos, pode ser que estejamos apaixonados de verdade."
Revirei os olhos, sem olhar para trás.
Mas, honestamente?
Se a situação fosse outra, eu até poderia ter ficado um pouco admirada. Ele realmente parecia um príncipe de conto de fadas.
Mas eu não tinha tempo para isso.
Meu destino me esperava.
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Atualizado até capítulo 33
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