Rafael Costa observava o horizonte, com os olhos fixos no mar que se estendia à sua frente. As ondas batiam suavemente na praia, mas em sua mente, a tempestade nunca cessava. Ele estava longe do mundo que conhecia, tentando escapar das sombras do passado. Não sabia se fugia de si mesmo ou se apenas procurava um lugar onde pudesse finalmente se redimir.
Era uma pequena cidade à beira-mar, com suas ruas tranquilas e casas simples, onde o silêncio parecia se estender como uma promessa de paz. Mas para Rafael, a paz era algo distante, uma ilusão que ele sabia que nunca alcançaria. O que ele fizera não podia ser apagado, e os rostos de suas vítimas ainda o perseguiam nas noites silenciosas, onde ele se via acordado, lutando contra os próprios demônios.
A decisão de deixar para trás a vida que construíra, marcada pelo crime e pela violência, não fora fácil. Ele sabia que não era bem-vindo em nenhum lugar, mas aqui, no meio daquele vilarejo isolado, ele encontrou uma chance de começar de novo. Mas, por mais que tentasse, não conseguia escapar de quem realmente era.
Foi quando ela apareceu. Lara.
Ele a notou pela primeira vez enquanto caminhava pela praça central da cidade. Uma mulher simples, mas com um olhar forte, determinado. Seus cabelos castanhos e ondulados balançavam ao vento, e seu sorriso, embora tímido, tinha algo de genuíno, como se ela carregasse uma paz que ele jamais conhecera.
Rafael não acreditava em coincidências, mas algo naquela mulher fez com que ele se sentisse atraído, como se ela fosse a chave para algo que ele nem sabia que ainda procurava. Ela estava trabalhando na clínica local, e era ali que Rafael, com suas feridas invisíveis, decidiu procurar ajuda. Não que acreditasse que uma simples enfermeira poderia curá-lo, mas talvez um pouco de cuidado, uma atenção que ele nunca soubera receber, fosse o primeiro passo para a redenção que tanto almejava.
Lara era diferente de todas as pessoas que Rafael conhecera. Ela não o olhava com medo ou desprezo, como se ele fosse um monstro. Ao contrário, havia uma curiosidade no olhar dela, uma vontade de entender, de se aproximar. Como se ela soubesse que havia mais por trás do homem que estava diante dela.
O encontro com Lara não foi um grande evento, nem um momento de grandes revelações. Foi um simples "olá", um breve contato, mas algo ali marcou o começo de algo que Rafael não sabia que precisava. Ele tentou se manter afastado, com medo de que, ao se permitir aproximar de alguém, acabaria magoando a única pessoa que demonstrava um mínimo de compreensão por ele. Mas Lara não desistiu. Ela o viu, mesmo quando ele tentava se esconder nas sombras.
Durante os dias seguintes, Rafael se viu atraído pela tranquilidade da cidade e pela força silenciosa de Lara. Algo nele começou a mudar. Não era uma mudança visível, nem uma transformação repentina. Era mais como se as camadas de gelo que ele havia construído ao redor de seu coração começassem a derreter. E, sem querer, ele foi se entregando.
Mas havia algo mais no ar, uma sensação de que o passado de Rafael não estava tão distante quanto ele imaginava. Alguém estava vindo, alguém que ele não queria ver, e com isso, a paz que ele acreditava ter encontrado começaria a ruir. Rafael sabia que não poderia escapar de seus próprios erros, mas talvez, só talvez, o amor e a compreensão que Lara oferecia pudessem ajudá-lo a enfrentar o que estava por vir.
O verdadeiro teste estava prestes a começar, e ele não sabia se estava preparado para isso.
A rotina de Rafael na cidade seguia uma simplicidade desconcertante. Ele acordava cedo, passeava pela orla, observava o movimento das ondas e tentava se perder no som do mar. Mas, como um eco distante, a lembrança do que ele fizera nunca o deixava. O passado estava como uma sombra constante, algo que ele não podia simplesmente deixar para trás, apesar de estar quilômetros afastado de sua antiga vida.
Lara, por sua vez, não fazia questão de forçar uma amizade. Ela era paciente, observadora, e, como um farol, sabia que cada pessoa tem seu tempo de se abrir. Quando Rafael procurou a clínica, ela foi sua enfermeira naquele primeiro atendimento, mas não foi apenas sua condição física que a interessou. Ela notou o quanto ele estava retraído, evitando olhares e evitando falar sobre si mesmo. Como se o peso do mundo estivesse sobre seus ombros, algo que ele se recusava a dividir com qualquer um.
"Você não precisa falar se não quiser", disse Lara certa manhã, enquanto trocava o curativo em seu braço, após uma lesão superficial que ele fizera em um momento de desatenção. "Mas saiba que eu estou aqui. Se mudar de ideia, posso ouvir."
Ele apenas assentiu, grato por não ser pressionado. Às vezes, o silêncio dizia mais do que mil palavras. Ela o tratava com uma gentileza que ele não sabia como responder. Não estava acostumado a ser tratado dessa forma. Na sua antiga vida, a frieza e a indiferença eram o padrão. Sentimentos e gentilezas eram sinais de fraqueza, e Rafael sempre fora um mestre em esconder os seus.
À medida que os dias passavam, algo em Rafael começava a mudar. Ele não sabia exatamente o que era, mas sentia uma leveza crescente, como se as correntes que o prendiam estivessem se soltando, uma de cada vez. Ele ainda se via às vezes perdido em seus pensamentos, mas não estava mais tão inclinado a fugir para as ruas escuras da sua mente. Lara parecia ser a âncora que o impedia de se perder totalmente.
Mas o alívio durou pouco.
Uma tarde, enquanto caminhava pela praia, Rafael viu um carro desconhecido estacionando perto de onde ele costumava caminhar. Não fez muito caso até ver a silhueta de um homem sair do veículo. Seu coração acelerou. Era ele. Era alguém do seu passado. O medo tomou conta de sua mente, e o peso de seu erro voltou com uma força esmagadora.
Ele se virou, tentando se afastar sem ser visto, mas a figura já o havia notado. Rafael sentiu o estômago revirar. Como podia escapar de uma vida que nunca parava de cobrar sua dívida?
Lara apareceu, chamando-o pelo nome. Ele olhou para ela, tentando esconder a tensão em seu rosto, mas Lara sabia. Ela sempre soubera quando algo não estava certo. Seus olhos se encontraram por um momento, e ele teve que desviar o olhar, incapaz de encarar aquele que começava a ser seu alicerce. Ele não queria envolver Lara em seu passado. Não queria arrastá-la para o inferno que ele mesmo criara.
“Rafael, está tudo bem?” ela perguntou, sua voz suave, mas cheia de preocupação.
Ele respirou fundo e, com um sorriso forçado, respondeu: “Sim, só... só preciso de um tempo sozinho. Estou bem.”
Mas Lara não se afastou. Ela continuou ali, ao seu lado, seus olhos fixos nos dele, como se tentasse desarmá-lo, quebrar a resistência que ele estava tão desesperado para manter.
“Eu não vou te pressionar, Rafael. Mas saiba que você não precisa enfrentar isso sozinho.”
E, por um breve momento, ele acreditou nela. Mas sabia que o que estava por vir era inevitável. A sombra de seu passado não iria deixá-lo em paz, não importava o quanto ele tentasse esconder.
O homem que havia visto na praia estava apenas começando a aproximar-se de sua nova vida, e Rafael sabia que, no momento em que ele decidisse confrontá-lo, tudo o que ele construíra até ali poderia desmoronar.
Mas ele não podia fugir para sempre. Havia algo dentro dele, algo que, pela primeira vez, lhe dava uma razão para lutar. Lara. Ela era o que ele mais temia perder, e agora ele teria que escolher: esconder-se novamente ou lutar para proteger o que de mais precioso ele jamais imaginara encontrar.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 20
Comments