Capítulo 19

O professor Ricardo, um ômega por volta dos trinta anos, entrou com passos calmos e confiantes. Tinha o hábito de ser uma pessoa alegre, e naquele momento não era exceção.

— Bom dia, pessoal — cumprimentou. E os alunos responderam com entusiasmo, especialmente as meninas. A despeito de todos ali serem do mesmo gênero secundário, Ricardo tinha seu charme e maturidade, o que o tornava uma pequena celebridade entre os alunos, principalmente nas turmas ômega.

— O professor Bill não vai vir? — questionou alguém do fundo da sala. E ele olhou na direção da voz.

— Claro que virá. Só estou aqui para passar um comunicado rápido.

— Qual é?

— Se bem se lembram, este ano a escola comemora seu cinquentenário — disse ele, apoiando-se na mesa com uma postura despojada.

— Professor, vai ter algum evento especial nesse dia?

— Haverá competições esportivas?

— Estou aqui justamente para passar essas informações, pessoal. — Havia um ímpeto evidente, e Ricardo teve que lidar com ele. — É por causa do aniversário que a diretora aceitou a proposta do grêmio estudantil de realizar uma viagem escolar para comemorar.

*“Viagem escolar!”*\, Matt ficou surpreso com a notícia. Não podia ter certeza absoluta se a festa anterior tinha sido o início da narrativa ou não\, mas com a viagem não restavam dúvidas. Isso aconteceria após Kaleb e Oriel se conhecerem.

O protagonista 'bottom' era convidado à viagem pelo Matt original, e o vilão também era incluído. Ali ocorria algo que convencia Daryl a amar Oriel até o fim de seus dias... porém Matt se deparava novamente com essa barreira em suas memórias. Sabia que algo significativo acontecia durante a viagem; todavia, não conseguia se lembrar exatamente do "o quê".

O ômega passou a mão na testa, limpando o suor provocado por sua memória falha.

*“De qualquer forma\, não planejo convidar ninguém...”*\, resistiu do fundo do coração. “O enredo pode encontrar uma forma de acontecer sem eu interferir."

Olhou em volta e percebeu que a viagem era aguardada por todos. Quase podia ver o brilho nos olhos de cada um. Seria mentira dizer que ele também não estava animado, contudo sentia-se ligeiramente irritado ao pensar nos protagonistas, perdidos por acaso na montanha e vivenciando um momento romântico, tal como descrito no livro.

*“Se Kaleb e Oriel já se apaixonaram\, isso não me interessa; mas não vou facilitar os encontros deles”*\, nem percebeu que seu coração batia acelerado ao considerar a ideia de ser um cupido para os outros. “E Daryl pode sobreviver sem ir a essa viagem escolar. Além do mais, ele estará bastante ocupado com dois pais saudáveis.”

Uma garota pediu a palavra naquele momento e perguntou: — Professor, para onde será a viagem?

— Boa pergunta — assentiu Ricardo. — O destino é o Centro Turístico Yuria. Se não conhecem, vou dar uma descrição rápida. Tem montanhas para trilhas, tirolesas; é possível acampar; ah, e eu quase me esqueci, também tem um rio onde poderão nadar se o clima permitir.

*“Então é possível se perder nas montanhas para ter um bom momento...”*\, pensou com desgosto.

Os gritos de ânimo na sala eclodiram com as boas notícias, mas o professor Ricardo pediu silêncio. — Não se animem tão rápido. Essa viagem estará disponível apenas para as três melhores turmas de toda a escola no próximo parcial. A diretora espera que isto sirva como incentivo para tirarem o melhor de si no exame.

A alegria palpável deu lugar à decepção. E isso por um motivo simples: a turma 3D-Ômega nunca havia figurado nas primeiras posições do ranking escolar. Eles não eram ruins... mas não eram tão bons assim.

*“Então... como é que foram à viagem? Será que realmente se empenharam?”*\, questionou-se o rapaz de cabelos negros.

— Que caras são essas? — Ricardo zombou. — Já estão se dando por vencidos? Não, pessoal! Estudem bastante, prestem atenção nas aulas e se esforcem nos exames. Ainda têm tempo; e a propósito, tenho uma boa notícia para vocês: as notas do primeiro parcial não serão contabilizadas, então todas as classes têm a mesma chance de ganhar.

— Sério?

— Claro que sim. A viagem pode ser de qualquer turma. Vocês sabem quanto vão se empenhar para conseguir ou não. Além disso, vale a pena tentar. Ou querem apenas entregar essa viagem nas mãos das outras turmas?

— Não! — Foi um grito coletivo.

— Então tá. E me digam, não seria bom ver as caras daqueles alfas após terem o passeio tirado deles?

Todos começaram a rir, e o ânimo ela renovado. E desta vez, veio acompanhado de um sentido intenso de competição.

Não era segredo que praticamente todas as turmas alfa menosprezavam os demais — especialmente os ômegas nos primeiros anos —, por isso adicionar a imagem deles chorando era mais motivador que a própria viagem.

Após seu anúncio, o homem se despediu e saiu da sala. E pela primeira vez, Matt viu todos os seus colegas — que antes se dedicavam apenas aos boatos alheios — deixando as distrações de lado e abrindo os livros didáticos. Até mesmo Henry acompanhava o ritmo.

*“Bem\, se as coisas continuarem assim\, não seria estranho se ganhássemos um dos três lugares."*

— Achei que detestava estudar... — Cochichou para o castanho com incredulidade.

— Detesto, mas saber que esses alfas vão se contorcer de inveja é motivação suficiente para eliminar minha aversão aos estudos — ele respondeu com um sorriso meio torcido. Matt entendeu que a luta de seu amigo ia além do que parecia, pois provavelmente ele via em cada alfa um Leo desagradável, aumentando assim seu espírito de conquista.

— Vamos nos empenhar! — concordou, ressoando com o espírito de luta do amigo. A viagem não era seu foco, porém não se importaria de ir.

.

A semana seguinte fez Matt reavaliar seriamente seu conceito sobre os colegas de classe.

Inicialmente acreditou que após um ou dois dias, quase todos regressariam aos velhos hábitos, ignorando professores ocasionalmente e copiando tarefas uns dos outros sempre que possível.

Contudo, para sua surpresa, com o passar dos dias, percebeu que o entusiasmo coletivo não esmorecia. Tanto era assim, que até o último da classe estudava com diligência.

E ao contrário, parecia ser uma febre que contagiava todos os grupos da escola.

Sempre que ia à cantina, podia observar que em todas as salas havia vários alunos dedicados aos estudos. Chegou até a se sentir culpado por se distanciar dos livros para comer ou ir ao banheiro.

— Eles realmente querem ir nessa viagem... — murmurou distraído enquanto mordia seu sanduíche, tentado aproveitar o sol banhando seu corpo.

— Claro que sim! — exclamou Henry com energia suficiente para correr dez maratonas. — Imagine se conseguirmos um daqueles lugares!

— Só de pensar, já me animo! — interveio Fania, com estrelas nos olhos.

— Vocês querem tanto ir ao Centro Turístico? — perguntou Matt, sorrindo. — Não sabia que gostavam de atividades ao ar livre.

— Claro que não — disse ela com repugnância. — Não gosto de acampar ou fazer trilhas.

— Também não gosto de nadar ou de alturas — completou Aldo.

— Então, por que esse esforço todo? — Ele não conseguia acreditar. — Para que tanto empenho?

— Matt, meu querido, doce e jovem Matt... — negou Fania com reprovação. — O próprio professor Ricardo nos deu um motivo para batalhar.

— Ah é?

— Se tem um vencedor, tem muitos perdedores! — Seu pequeno ser maligno era inegável. — Se ganharmos, significa que outros perderam!

— Especialmente aqueles alfas arrogantes — disse Henry com um brilho desafiante nos olhos.

Vendo-os, Matt lamentou não ter um borrifador à mão para borrifá-los um pouquinho... pois pareciam uns gatinhos malvados que precisavam de correção.

— Também estou empolgado — disse Aldo, sem deixar de comer seus nuggets. À medida que os dias passavam, e os quatro conviviam, ele havia se soltado e já não encontrava dificuldades em conversar quando estavam juntos.

— Mal posso esperar para ver a cara deles chorando quando ganharmos! — exclamou Henry. — Esses alfas nem vão saber o que os atingiu.

Os três riram com o entusiasmo do castanho, mas antes que pudessem continuar brincando sobre o assunto, ele foi empurrado ao chão. O impacto soou alto e, só de ouvir, Matt sentiu dor nos ossos.

— Henry! — gritaram em uníssono.

Ao olharem mais detidamente, perceberam que o responsável — que ainda tinha a mão estendida no ar — era um alfa magro e alto. A única coisa marcante nele parecia ser seu gênero secundário. Nem mesmo os outros quatro que o acompanhavam pareciam mais impressionantes.

Aldo e Fania se apressaram em ajudar Henry a levantar.

— Que m3rd@ vocês têm? — perguntou Matt, levantando-se para enfrentá-los. Seria mentira dizer que não estava interiormente tremendo ao imaginar cinco contra um, mas sabia que seus amigos não eram exatamente material de briga.

— Nós não temos problema nenhum. O problema é com essa p3rra pequena que fica falando coisas que não sabe — disse o tipo esguio com desdém. — Alguma vez você viu um alfa chorar?

— Pelo menos ele fala as coisas na cara, não sai empurrando os outros pelas costas — rebateu Fania, com hostilidade.

— Fique quieta, ômega pequena. Se não querer que a gente passe dos limites "por acidente" agora mesmo. Mesmo que sua cara seja feia, a gente dá um jeito.

— Podemos fazer esse "favor" para você. — Disse outro com um sorriso repulsivo.

A ameaça era clara, e Fania não ousou levar mais longe, temendo trazer problemas para os quatro. Contrariada, apertou a mandíbula com frustração.

— É você! — exclamou Henry, erguendo-se com a ajuda de Aldo.

— Que é? Conhece ele? — perguntou Matt, confuso.

— Claro que já vi um alfa chorar — afirmou o castanho sarcástico, e isso era uma clara declaração de guerra. Mesmo que o golpe doesse e seu cotovelo estivesse sangrando, ele avançou um passo olhando fixo para o responsável pelo empurrão. — Era um pobre diabo que não parava de implorar para que eu o perdoasse. Devia ter visto a cara patética dele chorando tanto.

— Você! — O cara esguio se aproximou de Henry e o agarrou pelo pescoço. Embora Matt não entendesse de onde vinha a provocação, deu um passo à frente para afastar o amigo. No entanto, os outros quatro bloquearam seu caminho.

— Não se meta, ômega. Isso é entre eles — rosnou alguém.

— Mas por que te conto? — prosseguiu Henry, mantendo o sorriso cínico. — Era seu irmão, então provavelmente você viu melhor do que eu.

Matt compreendeu de quem se tratava aquele garoto. O irmão mais novo do Leo.

*"M3rd@... Isso vai piorar..."*\, pensou.

E de fato, piorou.

...

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