Capítulo 4

Para ser sincero, sua antiga vida não era o que se poderia descrever como memorável. Seus pais morreram cedo, e dos seis aos dezoito anos, viveu em um orfanato. Graças a isso, não pôde ir para a universidade, mas não reclamava.

Conseguiu um bom emprego em um restaurante, e embora o salário não fosse alto, as gorjetas eram generosas, o que lhe permitia se sustentar e levar uma vida decente.

Assim tinha sido, pelo menos até voltar para casa... já lembrava como o trem havia descarrilhado... e então... estava apenas na sala de aula.

*"Bem... acho que devo agradecer a Deus por essa nova oportunidade? Agora sou Matt Northman\, o filho mais novo de uma boa família"*\, disse a si mesmo com um toque de otimismo e uma forte construção psicológica. "E voltei à adolescência. Dessa vez posso fazer o que antes não pude, certo? Nada está perdido..."

—Melhor? —perguntou o garoto que não tinha ido embora. Matt tinha se esquecido dele e assustou-se um pouco ao ouvi-lo. —Você realmente esqueceu que eu estava aqui?

Matt olhou para ele com um pedido de desculpas nos olhos. A resposta era óbvia.

O garoto se chamava Henry e era o melhor amigo do antigo dono. Assim como sua nova identidade, ele era um ômega; e tinham a mesma idade, dezesseis anos.

Por um momento, Matt ficou um pouco assustado em ter que lidar com alguém que convivia quase diariamente com o antigo dono assim que chegava; mas ao perceber que na realidade suas personalidades eram bastante similares, soltou um suspiro de alívio para si mesmo.

Pelo menos não seria descoberto tão facilmente por esse amigo.

Também sabia pelos memórias do original que esse garoto era bom, então não se incomodou em mantê-lo como seu próprio amigo.

—Sim... —sussurrou. Embora a dor de cabeça tivesse desaparecido, seu corpo ainda se sentia um pouco fraco. —Estou melhor, obrigado...

—Tá, parece que ainda precisamos ir para a enfermaria. —Henry não estava muito contente com ele por tê-lo esquecido em alguns segundos, mas era um bom amigo e sabia que não reclamaria nada por causa de sua aparência fraca. —Eu te espero lá fora, ficar aqui me deixa nervoso. Ah, e não se esquece de cobrir o pescoço rápido. Nunca se sabe que tipo de pervertidos você pode encontrar em banheiros como esse.

—Certo. Já saio... —disse Matt sem entender a que o garoto se referia, o que tinha de especial em um banheiro? E por que ele deveria cobrir o pescoço?

*"De onde esse cheiro vem?"*\, perguntou-se também enquanto cheirava o ar. Um cheiro doce invadiu seu nariz. "Morango? O antigo usava perfume?"

Sem dar muita importância ao assunto, inclinou-se sobre a pia e jogou água no rosto pela terceira vez. A temperatura gelada finalmente limpou sua mente, embora suas bochechas e nariz tenham ficado vermelhos, formando um contraste claro com a pele branca.

Estava prestes a secar o rosto com uma toalha de papel, quando a porta de entrada se abriu.

—Voltou por mim, querido? —perguntou, comovendo-se um pouco. "Digno de um melhor amigo, se preocupa com a saúde de Matt mesmo quando está chateado com ele."

O ômega virou-se para a porta, sorrindo pela nova amizade de ouro que tinha encontrado no caminho.

Seu rosto limpo e com várias gotas escorrendo pelas bochechas criava uma aura hipnotizante e agradável aos olhos. Qualquer um poderia se apaixonar por sua aparência bonita. No entanto, seu sorriso congelou quando percebeu que não era Henry, mas sim um adolescente alto e muito bonito, embora um pouco machucado.

Também não pôde deixar de notar os diversos piercings que adornavam o rosto e as orelhas do garoto. Matt os contou inconscientemente: três argolas na orelha esquerda, duas na outra; mais duas na sobrancelha esquerda; e um piercing no lábio.

Sem dúvida, era uma imagem que gritava "garoto problema" a vários quilômetros.

Embora isso não fosse a primeira coisa que alguém percebia quando olhava para o garoto, na verdade ele era albino. Não era uma aparência que se encontrava todos os dias; e esses óculos escuros que escondiam seus olhos apenas tornavam sua presença mais chamativa. Claro que os óculos logo foram retirados ao fechar a porta e ele pôde ver os olhos do outro, eram azuis.

Matt nem sequer precisou da memória do original para saber que aquele garoto era nada mais nada menos que o protagonista top do romance, Kaleb, um jovem alfa que procurava problemas a cada passo do caminho.

Por um segundo, os dois ficaram em silêncio enquanto se olhavam. Kaleb estava em pé na porta; e Matt apenas olhou para seu rosto um tanto atordoado. Felizmente, ele reagiu primeiro e desviou o olhar.

Graças ao romance, ele sabia o quanto irritava o protagonista ser visto com tanta intensidade; ao ponto de várias vezes ter arranjado problemas com quem o olhava além do necessário, não importando seu gênero secundário.

E isso também era evidenciado pelas diversas marcas que ele tinha nos braços, e pelo hematoma ao lado do seu queixo, claramente resultado de uma briga recente.

É claro que ele não queria brigar com ninguém no seu primeiro dia de chegada, ou pelo menos não antes de se adaptar à sua nova identidade. E o mais importante, ele ainda não sabia o que fazer em relação à trama do romance.

Ele não havia pensado se deveria se envolver com os protagonistas e vilões, ou se afastar. Afinal, ele era apenas um extra que morria por uma bala perdida. Sua segunda vida deveria ser valorizada.

—Desculpe. Te confundi com meu amigo. —Ele se desculpou da forma mais educada possível.

Em vez de apreciar a bela face magoada do outro, ele se concentrou em secar seu próprio rosto, enquanto tentava ignorar o fato de que suas orelhas estavam ficando vermelhas.

"Deveria ser o protagonista, é tão bonito apesar dos machucados", ele disse para si mesmo. "Uma pena que sua personalidade seja uma droga, pelo menos até ele conhecer Oriel. Devo fazer de cupido? Supostamente Matt tem um bom relacionamento com o bottom da história, não?"

O adolescente que ainda estava na porta não entrou, mas observou seus movimentos com cuidado. O que, é claro, deixou Matt ainda mais nervoso.

"Será que ele nunca viu alguém secar o rosto com um papel?", reclamou interiormente. "Esqueça essa ideia de ser cupido. O destino encontra quem deve encontrar. E talvez não demorem muito tempo para se conhecerem de qualquer maneira."

O que ele não sabia é que o banheiro em que ele estava era dos alfas, e Kaleb não entrava por suspeitar de estar diante de um assediador, já que não era a primeira vez que encontrava um ômega assim.

—Você me confundiu, de verdade? —questionou o alfa enquanto Matt jogava a toalha no lixo.

—Ah? —O ômega o olhou com dúvida escrita no rosto. —De outra forma?

—Por que você está aqui? Está tentando me seduzir? —Kaleb foi direto em suas palavras, tanto que o moreno se sentiu atordoado.

"O protagonista era tão egocêntrico que achava que todos deveriam vê-lo apenas a ele? Eu não me lembro dele assim..."

—Desculpe, seduzir você?

—De outra forma, por que você está nessa condição? —questionou o alfa, apontando para ele da cabeça aos pés sem delicadeza alguma.

Matt ficou surpreso e até um pouco ofendido com as acusações, mas mesmo assim olhou seu reflexo no espelho. E compreendeu...

Não era que ele parecesse um pequeno assediador, mas sim que sua aparência atual...era um pouco sedutora.

—Suponho que não possa esconder meu encanto natural... —refletiu com seriedade, e Kaleb não soube como reagir ao ouvir isso.

Matt se olhou com cuidado. Seu rosto estava molhado e corado nas partes certas. A gravata estava solta em seus ombros. Vários botões haviam sido abertos de forma desordenada. E o mais "indecente" de sua aparência, seu pescoço branco estava à mostra, o que neste mundo poderia ser considerado semelhante a uma pessoa seminua em pleno banheiro escolar...

Por isso Henry havia lhe lembrado para cobrir o pescoço. E aparentemente o cheiro de Moreias que ele estava sentindo era sua própria feromona, não um perfume.

Já entendia a confusão, mas não deixou de pensar que o protagonista era egoísta demais ao assumir que estava naquelas condições apenas para seduzi-lo. Apertou os punhos e se recusou a reconhecer o crime.

- Quem disse que eu quero te seduzir? - replicou com orgulho. - Você não é o único que vem a esse banheiro\, sabe? Tsk\, tão narcisista.

- O que? Não sou narcisista! - O jovem alfa não esperava receber esse tipo de resposta. - Você não está aqui para me seduzir? Quem acreditaria nisso?

Kaleb não se sentiu contente ao ser ridicularizado assim, mas mal havia começado sua discussão quando uma terceira pessoa entrou no banheiro.

- Matt\, por que está demorando tanto? Nem pense em escapar de ir à enfermaria! Aliás\, esqueci de te perguntar se trouxe uma faixa extra... - repreendeu Henry\, que fechou a boca ao ver o alfa mais popular da escola. - Oh! Desculpe. Meu amigo não está se sentindo bem e precisava usar o banheiro com urgência. Vamos embora agora mesmo!

- Ele está doente?

- Sim\, mas vamos embora!

Henry tomou a iniciativa de se aproximar de Matt e colocou sem delicadeza a faixa que segurava na mão em seu pescoço descoberto, arrastando-o em direção à porta. Não permitiu que ele dissesse uma palavra de protesto e o tirou do banheiro. Claro que o rapaz de cabelos negros não esqueceu de confrontar o albino com o olhar enquanto partiam.

" E daí se ele for o protagonista? Não é como se fosse intocável", com uma sensação estranha de confiança, Matt permitiu-se ser um pouco problemático e enfrentar o filho dourado do céu. Era como se um sentimento rebelde estivesse impregnado em sua alma, instigando-o a confrontar o garoto.

Naquele momento, ele esqueceu que sua idade mental era de vinte anos, mesmo que seu corpo tivesse apenas dezesseis.

Kaleb os viu ir embora e sentiu-se um tanto incrédulo quando a porta se fechou e ninguém se jogou nele.

- Aquele ômega estava doente? - perguntou com dúvida. - Eu interpretei errado?

Do lado de fora, Matt mal conseguiu arrumar seu uniforme antes de Henry levá-lo à enfermaria. Claro que o rapaz não parou de falar o caminho todo.

- Viu aquilo? - perguntou animado.

- Vi...

- Aquele era o Kaleb!

- Era...

- Nunca o tinha visto de tão perto. Ele é realmente bonito\, mesmo com todos aqueles machucados no rosto.

- Mas a personalidade dele é uma...

- O que você disse?

- Que ele é bonito.

- Eu sei!

Diante de um fã sem cérebro, Matt decidiu ser prudente e se abster de comentários ácidos.

E em menos de cinco minutos chegaram à enfermaria, onde uma jovem médica estava de plantão. Depois de uma rápida revisão, ela não encontrou nenhum problema além de um leve desequilíbrio, permitindo-lhe descansar um pouco antes de voltar para as aulas.

Henry, por sua vez, foi mandado para a sala imediatamente. O garoto, relutante, foi embora. E a médica, tendo cumprido seu trabalho, desapareceu da enfermaria, deixando-o sozinho. Mas ele preferiu assim.

...

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Analu Matsuo 1106

Analu Matsuo 1106

Tomou, papudo?

2024-02-12

0

ZGDX

ZGDX

se achando a última bolacha do pacote

2024-02-07

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