Três colegas estavam lá dentro e me cumprimentaram com a cabeça ou com os olhos. Matt era um garoto de estatura mediana e olhos cinza, o novato para quem todos sempre empurravam as tarefas menos agradáveis. Todos menos eu. Mirella estava lá, em toda a imponência de seus longos cabelos de cachos dourados e seus olhos verdes. Pendurada no ombro de Colin, ela dizia algo em voz baixa.
Virei de frente para o painel e foquei os olhos no grande T iluminado. “Ignoreos, Nahia”, disse para mim mesma. A voz melodiosa de Mirella atrás de mim tentava ser discreta – ou fingia tentar –, mas era perfeitamente audível ainda assim.
– Umas oito horas, pode ser?
– Pode. Claro.
– Obrigada pela carona. Eu iria sozinha, mas não tenho certeza se sei ocaminho.
– Eu te pego. Não é problema algum. Além do mais, não gosto de chegarnesses lugares sozinho.
Eles riram um para o outro e eu respirei fundo.
Minha porta ia receber minha frustração mais uma vez. Claro, não era culpa dela, então me segurei. Não era culpa de Mirella ou Colin. Não era culpa de ninguém. Era culpa minha. Todas as minhas frustrações. A pessoa só pode se frustrar quando tem expectativas e eu tinha expectativas demais e ações de menos.
Alinhei minhas posses no aparador e me joguei embaixo do chuveiro. A água quente escorreu pelo meu corpo com delicadeza e eu me lembrei do toque do meu visitante. Meu amigo no sonho. Talvez eu fosse dormir e sonhasse com ele de novo. Sim… isso seria bom.
Enxuguei meus braços e procurei um pijama confortável. Ia comer bobagens sentada no sofá assistindo à reprise de algum seriado de comédia e dormiria lá mesmo.
Vesti o pijama e observei a mim mesma no espelho de corpo inteiro no canto do meu quarto e, de repente, senti uma raiva imensa. Não de Colin, Vicent, Mirella, do elevador ou da minha porta. Senti raiva de mim. Lá estava eu, vestindo pijamas confortáveis e preparada para mais uma noite de autocomiseração.
Você tem que aprender a dizer “sim”.
Olhei determinada para o meu reflexo e arranquei o pijama. Se meus colegas de trabalho podem se divertir sexta à noite, eu também posso.
Mordi meu lábio inferior com a excitação do momento. Vesti uma saia colada e uma blusa com um decote profundo. Usei quase todos os itens do meu estojo de maquiagem e penteei meus longos cabelos negros. Sorri para mim. Okay, Nahia… Vamos lá!
***
Sentei em um banco elevado beirando o bar e comecei a me arrepender do que fiz. Não tinha amigos do tipo que saem pra bares e vir sozinha tinha sido uma péssima ideia. Tentei me lembrar da coragem que senti quando resolvi arrancar o pijama e do meu reflexo determinado me olhando de volta. Mas nenhuma das duas lembranças era clara o suficiente e eu fiquei ali sentada, em silêncio, tentando não ficar no caminho de ninguém.
O lugar estava apinhado de gente. Aparentemente tinha um jogo de basquete acontecendo e um grupo de torcedores estava reunido ali. A partida terminou e os fãs começaram a esvaziar o local assim que o comentarista anunciou a derrota do time da casa. Olhei ao redor, a calmaria tornou o lugar bem mais agradável.
Dei mais um gole na taça de vinho e respirei fundo. Certo… quanto tempo ainda teria que ficar ali até provar para mim mesma que eu podia fazer isso? Seja lá quanto tempo fosse, eu esperava que não demorasse muito. Assim, eu poderia correr de volta para minha casa, para o meu chuveiro e a segurança do meu edredom.
– Longo dia?
A voz não era familiar, e de início não achei que estivesse falando comigo.
Levantei os olhos despretensiosamente e quase congelei onde estava.
Ele estava ali. O homem que eu tinha visto no meu sonho. O mesmo rosto, os mesmos olhos verdes, o mesmo cabelo loiro, o mesmo topete. Maldição. Até a camisa de basquete era a mesma.
As palavras fugiram e eu fiquei ali prendendo a respiração. Ele sorriu confuso.
– Ah…Você tá legal?
Acho que devo ter balbuciado algumas coisas sem sentindo antes de finalmente conseguir dizer:
– Não. Não. É só que… – olhei ao redor para me certificar de que ele estavarealmente falando comigo e não com alguém atrás de mim. – A gente se conhece de algum lugar? Você é muito familiar.
Ele se virou no banco elevado na minha direção.
– Isso foi uma cantada? – sorriu.
– Não! Não! – abanei as mãos na minha frente em rendição. Esperavaprofundamente que ele não tivesse entendido errado. Mas uma voz lá no fundo da minha mente, uma voz que definitivamente não era minha, recitou “E qual o problema se fosse uma cantada?”.
– Certo – ele acenou em compreensão. – Não foi uma cantada – brincou comminha negativa enfática, antes de voltar para sua cerveja. – Uma pena.
Bebi um longo gole de vinho. Será que ouvi direito? Por acaso ele teria dito que era uma pena eu não estar dando em cima dele?
Você tem que dizer “sim” para o homem certo.
Respirei fundo. Passei as mãos nos cabelos. Vire-se para ele, Nahia. Sorria. Puxe algum assunto interessante. Eu repetia as informações para mim mesma como um mantra. Mais um pouco de vinho e me virei. Não conseguia pensar em nada interessante para dizer, mas estava plenamente consciente do sorriso estúpido que deveria estar plantado na minha cara. O sorriso estúpido que ele sequer chegou a ver, porque acabou sua cerveja e se levantou. Vi suas costas enquanto ele caminhava em direção ao banheiro.
Minha mente começou a argumentar comigo em uma tentativa desesperada de quebrar minha inércia. Certo, Nahia. Ele vai voltar. E quando ele voltar você vai fazer algo louco. Vai dar em cima dele e vai dizer sim. É! Vai fazer isso, sim. E ou vai dar certo, ou vai dar errado. E se der errado, o que é o pior que pode acontecer?
Bem, ele pode ser um estuprador psicopata.
Ótimo! Então, ele vai te comer bem gostoso. Hã? Essa não era minha voz.
Não era minha mente. Minha consciência nunca me dizia coisas desse tipo.
O loiro na camisa de basquete estava de volta. Ia estar ao meu lado mais uma vez em poucos segundos. Olhei para frente e tentei me recompor. Os segundos passaram e ele não chegou. Arrisquei olhar para trás. E lá estava ele. Tinha encontrado uma mesa com duas garotas, estava sentado, conversando e sorrindo.
A frustração tomou conta de mim mais uma vez. O que eu podia fazer agora? Passei a mão nos cabelos e terminei minha taça de vinho. Levantei e coloquei o dinheiro em cima do balcão. Uma boa gorjeta para o garçom e um “boa noite” atravessado.
Olhei uma última vez para a mesa com as duas mulheres. Mas elas estavam sozinhas, o homem loiro estava de pé mais uma vez. Estava voltando para o
balcão.
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Atualizado até capítulo 61
Comments
Amanda
🤔🤔🤔🤔
2023-08-19
0
Ana Carla Soares
Negros? não era ruivos?
2023-08-01
1